OPINIÃO: * Luiz Guilherme Marques
A ENCICLOPÉDIA JURÍDICA LEIB SOIBELMAN consigna sobre o abandono moral:
(dir. pen.) Constitui crime permitir alguém que menor de 18 anos, sujeito a seu poder ou confiado a sua guarda ou vigilância, freqüente casa de jogo ou mal afamada, conviva com pessoa viciosa ou de má vida; freqüente espetáculo capaz de pervertê-lo ou de ofender-lhe o pudor, ou participe de representação de igual natureza; resida ou trabalhe em casa de prostituição; mendigue ou sirva a mendigo para excitar a comiseração pública
Como se sabe, o Código Penal reflete a mentalidade do país na década de 1940. Há, portanto, atualmente, uma defasagem de mais de 60 anos.
Atendo-nos ao texto legal, podemos verificar que o legislador pretendia: afastar os menores de 18 anos das casas de jogos ou mal afamadas, da companhia de pessoas viciosas ou de má vida, da freqüência a espetáculos capazes de pervertê-los ou ofensivos ao pudor, da participação em representações de igual natureza, da residência ou trabalho em casa de prostituição, da mendicância ou de serviço a mendigo para excitar a comiseração pública.
A enumeração, em resumo, visava explicitar as situações de risco para a formação moral das crianças e jovens.
Parece-me que o legislador estava longe de se mostrar conhecedor das necessidades mais profundas do ser humano.
Simplesmente afastar crianças e jovens dessas situações extremas não significa realizar grande coisa pela sua formação moral…
Os casos enumerados no dispositivo penal representam atitudes de imoralidade extrema.
Para dizer a verdade, nunca vi, nesses quase 30 anos de vivência forense, nenhum processo criminal por abandono moral… Trata-se o dispositivo em apreço de verdadeira letra morta…
Mas existem outras formas de abandono moral além das enumeradas no Código Penal.
Uma criança ou jovem a quem seus responsáveis deixem de aconselhar, orientar através de bens exemplos e convivência sadia costumam, cedo ou tarde, apresentar quadros de desvio moral, talvez irreversível.
A criança e o jovem são pequeninas plantas sensíveis que, se não aguadas e adubadas na medida e da forma certas, têm sérias chances de fenecer.
Muitos responsáveis, infelizmente, descuram desse munus.
Muitos corruptos e corruptores são meros seguidores de pais ou assemelhados que vivem de expedientes escusos…
O desinteresse desses responsáveis faz muitos dos seus pupilos enveredarem por caminhos ínvios…
A prática da incomparável regra do Direito Romano do viver honestamente, dar a cada um o que é seu e não lesar a ninguém seria suficiente para a orientação moral de crianças e jovens. Todavia, é desacreditada por muitos responsáveis. Há muitos péssimos exemplos (inclusive entre as elites) de desonestidade na vida pública e na vida privada, injustiças cometidas contra terceiros e intenções claras de lesar outrem em situações várias. Tudo isso agride a sensibilidade natural das crianças e jovens, empurrando-os, indiretamente, para desacertos de vários tipos.
Representam verdadeiras situações de abandono moral. Infelizmente, o Código Penal parou no tempo e não ampliou o conceito do crime de abandono moral contemplando hipóteses mais condizentes com as exigências éticas do século XXI…
Verificam-se muitos casos desse tipo: crianças e jovens condenadas por pais ou assemelhados a penosas caracterizações de abandono moral não punido pelo Código Penal
REFERÊNCIA BIOGRÁFICA
LUIZ GUILHERME MARQUES: Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG).
Site: www.artnet.com.br/~lgm