DECISÃO: *TRT-MG – Em 13 de maio de
A história geralmente acontece assim: aliciadores, chamados ¿gatos¿, recrutam trabalhadores em lugares distantes, prometendo a eles bons salários. Na esperança de melhores condições de vida, esse trabalhadores deixam suas famílias, muitas vezes sem ter a mínima ideia de para onde estão indo. Ao chegarem ao destino, a surpresa: condições precárias de vida e trabalho. Nenhum direito reconhecido. Pelo contrário, tudo é cobrado e a relação já começa com uma dívida. O empregador normalmente se esconde por trás de uma empresa de fachada para dificultar a apuração de sua responsabilidade. Isolados e com liberdade de ir e vir cerceada, esses trabalhadores se vêem capturados por uma armadilha.
Na Vara do Trabalho de Januária, o juiz Anselmo José Alves analisou um caso assim. O reclamante pediu o reconhecimento da relação de emprego com a empresa Rotavi Industrial Ltda e o pagamento de indenização por danos morais. Ele alegou que foi submetido à condição de escravo e, por isso, entrou em depressão. A reclamada, por sua vez, negou qualquer relacionamento com o trabalhador, dizendo-se sediada na Bahia. Afirmou que teve seu nome vinculado a uma fiscalização que encontrou em suas terras pessoas trabalhando em regime de escravidão, mas que, na verdade, quem atuava era a empresa de nome J. J. Serviços Florestais Ltda, o que a levou a ajuizar ação penal para penalização dos sócios. Foi, assim, segundo alegou, mera vítima também.
Após analisar as provas – um relatório do grupo de fiscalização móvel do Ministério do Trabalho e depoimentos de testemunhas – o magistrado concluiu que a versão do reclamante era verdadeira. No caso, a empresa J. J. Serviços Florestais Ltda, indicada na defesa, pertence a gatos e não contava com qualquer cliente antes da contratação pela Rotavi. Na convicção do juiz, a criação dessa empresa se deu exclusivamente para prestar serviços para a reclamada, em uma fazenda de sua propriedade. Um dos gatos mencionados foi quem contratou o reclamante e todo o serviço era controlado pela Rotavi. Era ela quem consumia o produto da atividade de carvoejamento, que, por sua vez, é essencial à sua atividade. A relação de emprego entre reclamante e reclamada estava comprovada. "Não resta a menor dúvida de que a ré montou toda uma estrutura valendo-se de terceiros (pessoas físicas e jurídicas) para levar a cabo o seu intento de obter matéria prima para a sua produção a baixo custo", destacou o magistrado.
Os danos morais também foram reconhecidos, entendendo o juiz sentenciante que eram evidentes, diante de tudo o que o reclamante havia passado. "É desnecessária qualquer prova, muito menos pericial, para ficar caracterizado o menoscabo que sente o empregado que deixa sua família para buscar o próprio sustento e dos seus através de seu trabalho, em outro estado, sem sequer saber que estado seria esse (em todo o feito está claro que o autor não sabia se trabalhava na Bahia, em Minas ou em Goiás) e, ao final, volta para casa sem dinheiro e o contrato de trabalho formalizado, sem o acerto das verbas resilitórias, trazendo na bagagem apenas a narrativa de sua odisséia sem paga e sem pão", registrou o julgador. Por isso, condenou a empresa a pagar indenização de R$10.000,00.
A Rotavi foi condenada ainda a pagar ao reclamante a importância de R$11.311,27, por demandar de má-fé. Houve recurso por parte da empresa, mas a condenação foi mantida pelo TRT da 3ª Região, que também determinou a remessa do processo ao Ministério Público do Trabalho para as providências eventualmente cabíveis na esfera de suas atribuições, diante das condições em que os trabalhadores eram submetidos. (0065100-23.2009.5.03.0083 RO )
FONTE: TRT-MG, 02 de março de 2012