STJ: mãe presa por dívida de pensão alimentar tem regime fechado convertido em domiciliar

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ concedeu parcialmente a ordem de ofício em habeas corpus ajuizado por uma mulher que foi presa por atrasar a pensão alimentícia do filho de 17 anos. A prisão civil será convertida do regime fechado para o domiciliar.

A guarda do jovem é exercida pelo pai e a dívida por pensão alimentícia é a única hipótese admitida no ordenamento jurídico de prisão civil, cumprida em regime fechado para incentivar o devedor a quitar a obrigação.

A devedora, no entanto, tem outro filho de apenas cinco anos, pelo qual é responsável. Ela justificou o atraso na pensão em virtude do desemprego e apontou que sua prisão prejudicará a criança, a quem exerce a guarda exclusiva.

Ao avaliar o caso, a ministra e relatora Nancy Andrighi aplicou o artigo 318, inciso V, do Código de Processo Penal por analogia, segundo o qual a prisão civil de devedor de pensão alimentar pode ser convertida do regime fechado para o domiciliar, na hipótese em que a mulher tenha filho de até 12 anos de idade.

Proteção integral da criança

Para a ministra, se a finalidade dessa regra é a proteção integral da criança mesmo diante da hipótese de possível prática de um ilícito penal pela mãe, não há razão para não aplicá-la às mães encarceradas em virtude de dívida de natureza alimentar.

Andrighi ainda autorizou que a mulher realize atividades profissionais enquanto estiver em prisão domiciliar a serem comprovadas perante o juízo da execução de alimentos.

“A segregação total e a impossibilidade absoluta de locomoção dificultam o adimplemento da obrigação alimentar e, mais do que isso, poderá colocar em risco a subsistência do filho que se encontra sob a guarda”, apontou ministra.

Aplicação inédita na esfera civil

A advogada Fernanda Las Casas, diretora do núcleo regional Santos, do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM,  afirma que o regime de prisão domiciliar concedido foi feito pelo voto do ministro João Otávio de Noronha que, seguindo a orientação do STJ, considerou ser possível a extensão do benefício de prisão-albergue domiciliar, previsto no artigo 117, inciso III, da Lei de Execução Penal, às gestantes e às mães de crianças de até 12 anos.

“O principal fundamento da obrigação de prestar alimentos está baseado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade familiar, bem como o ‘maior interesse da criança’, assim, entendo que o STJ, ao sopesar a proteção e os cuidados entre três crianças menores de 12 anos que estão sob os cuidados da mãe devedora, e o direito do alimentado de 17 anos a alimentos, agiu com parcimônia, mantendo a punição, protegendo o interesse dos demais filhos”, avalia.

Para ela, não teria qualquer benefício imediato ao alimentado a prisão em regime semiaberto para a mãe devedora. No entanto, caso a mãe devedora permanecesse em regime semiaberto o prejuízo às três crianças que estão sob sua guarda seria grande.

A advogada analisa que a decisão tem um “aparente ineditismo”, na medida em que foi aplicado por analogia o artigo 318, inciso V, do Código de Processo Penal, que é regularmente utilizado na esfera criminal.

“Esta possibilidade de substituição de regime para regime domiciliar já era utilizada, a novidade é que agora ele foi aplicado na esfera civil sob a fundamentação da proteção e do interesse das demais crianças que estão sob a guarda materna. Desta forma, o ineditismo é pelo uso da analogia, da interpretação da norma visando o princípio do integral interesse da criança”, ela afirma. HC 770.015

FONTE: IBDFAM, 13 de fevereiro de 2023.

Clovis Brasil Pereira
Clovis Brasil Pereirahttp://54.70.182.189
Advogado; Mestre em Direito; Especialista em Processo Civil; Professor Universitário; Coordenador Pedagógico da Pós-Graduação em Direito Processual Civil da FIG – UNIMESP; Editor responsável do site jurídico www.prolegis.com.br; autor de diversos artigos jurídicos e do livro “O Cotidiano e o Direito”.

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