* José Mechango Antunes
CONCEITO
Para iniciar o trabalho sobre o tema proposto, vejamos primeiramente o conceito de De Plácido e Silva,(1) do que seja rito e, também, sumaríssimo.
“RITO. Do latim ritus (modo, forma, maneira), no sentido jurídico entende-se o conjunto de formalidades ou de regras instituídas para que sirvam de forma ou de modelo à execução de um ato ou de uma diligência.
O rito, portanto, prescreve as regras formais ou as solenidades indispensáveis à validade jurídica do ato.
Na linguagem forense, rito e processo trazem o mesmo sentido: consignam as regras para que se promovam as ações ou se executem os atos necessários a seu andamento.”
“SUMARÍSSIMO. Superlativo de sumário” – do latim summarium – (resumo, compêndio) – “é a expressão usada para designar o processo, em que tudo se faz com brevidade, ou em que tudo se resolve de plano, isto é, sem a satisfação de formalidades usualmente dispostas para os processos comuns.”
“Assim, é o sumaríssimo indicativo do processo que deve ser tratado com uma brevidade superlativa, para que de igual modo seja pronunciada a decisão da questão, ou do assunto, que nela se debate.”
IDÉIA DE BREVIDADE
Em alentado comentário ao tema, o Professor Amador Paes de Almeida,(2) inicia dizendo que a expressão sumaríssimo designa “um procedimento despido de maiores formalidades, sucinto, breve, simples, rápido”. Observa o autor que a expressão pode a princípio parecer inadequada, como ocorreu com idêntico instituto no processo civil ao prever a modalidade ritual, sem que existisse um procedimento sumário, ensejando a que o legislador alterasse para sumário a anterior denominação, por via da Lei nº 8.952, de 13 de dezembro de 1994.
Diz ainda o mestre, que tal equívoco “não ocorre no processo do trabalho, em que, desde 1970, existe o procedimento sumário, instituído pela Lei nº 5.584/70”.
Conclui-se, pois, que o rito sumaríssimo é caracterizado pela brevidade, pela redução das formalidades processuais, em benefício das partes, que vêem de imediato a solução da pendência apresentada ao Juízo.
Diz célebre frase, que deve merecer permanente reflexão dos julgadores, que “justiça tardia é injustiça”.
Entretanto, não é nova a proposta de brevidade nos julgamentos de dissídios trabalhistas; ao contrário, a idéia é de que sejam unas as audiências.
A Consolidação das Leis do Trabalho, no artigo 849, prevê que será contínua a audiência de julgamento e concluída no mesmo dia, salvo na hipótese de força maior, em que o Juiz Presidente da Junta (hoje, Vara) marcará a sua continuação, “para a primeira desimpedida”. Quer-se dizer, não é nova a idéia de brevidade dos julgamentos na Justiça do Trabalho. Nesse sentido, o artigo 845 dispõe que as partes comparecerão à audiência acompanhadas das suas testemunhas, bem como naquela apresentarão as demais provas. Cuida-se aqui do princípio da concentração, a exigir que todas as provas sejam ofertadas naquela audiência, ressalvando-se, por óbvio, as que demandam tempo maior à sua produção, tais como perícia, oitiva de testemunhas por precatória, ou não-comparecimento de testemunha a que se pode requerer condução coercitiva, etc.
Ponto que merece destaque, e não de todos conhecido, é o que dispõe o parágrafo único do artigo 850 da CLT, no sentido de que o Presidente da Junta (hoje, Vara), após propor a solução do dissídio, tomará os votos dos juízes classistas e, em caso de empate “poderá desempatar ou proferir decisão que melhor atenda ao cumprimento da lei e ao justo equilíbrio entre os votos divergentes e ao interesse social”.
Tal observação se faz necessária, eis que os juízes classistas, peças importantes na solução dos conflitos, foram aos poucos perdendo o sentido, na medida em que deixaram de exercer corretamente os misteres conciliatórios, ou por despreparo dos que eram nomeados, ou por atropelamento dos juízes presidentes, cujos motivos determinantes da atitude refogem a este tratado. Daí a inevitável extinção da representação classista.
Também merece consideração o fato de que, na audiência de julgamento (artigo 843 da CLT) é facultado ao empregador fazer-se substituir por gerente ou qualquer outro preposto – cujas declarações obrigarão o proponente (§ 1º), bem como, em caso de doença ou motivo ponderoso (e não “poderoso”, como equivocadamente vêm grafando algumas obras), devidamente comprovado, o empregado poderá fazer-se substituir por outro, da mesma profissão, ou pelo sindicato (§ 2º).
Bem de ver que, no caso de representação do empregador, a interpretação jurisprudencial tem se direcionado a que seja o representante sócio, diretor ou empregado da empresa representada, portanto pessoa jurídica. Não é, contudo, o que diz o artigo consolidado, por isso mesmo mais abrangente, porquanto alude no caput, a que o representante “tenha conhecimento do fato”.
A REALIDADE
O que tem se verificado, entretanto, é que a Justiça do Trabalho, malgrado as disposições supra citadas, não tem acompanhado a demanda das ações, com sérios prejuízos principalmente aos empregados, partes hipossuficientes nas relações de emprego. Impotente, ante o elevado número de ações e as absurdas possibilidades recursais, máxime na fase de execução (que beneficiam apenas o empregador), tem deixado esta Justiça especializada rolarem-se os processos por anos seguidos, em detrimento da eficaz prestação jurisdicional, sendo comum o reclamante receber seus haveres após a morte, através do espólio, ou simplesmente não recebê-los. Outra ocorrência é quando o empregado, ante a demora da solução, acaba por fazer acordo aviltante, muitas vezes instigado pelo seu patrono, ávido por receber seus honorários.
Tudo isso ensejou o advento do Rito Sumaríssimo, acolhido com insólito entusiasmo por grande segmento do mundo jurídico, vislumbrando a possibilidade de que o novel instrumento venha a ser o ponto de partida para a aceleração das pendengas trabalhistas.
Os mais céticos, entretanto, propalam inevitável desengano dos que se revelam exageradamente entusiasmados com a novidade, isto com respaldo na tradicional morosidade da justiça brasileira, e, sem sombra de dúvida da do trabalho.
Ainda no entender de Amador Paes de Almeida,(3) o procedimento sumaríssimo, embora inquestionavelmente melhor estruturado,
“não colherá resultados tão promissores. E isso porque o problema maior na prestação jurisdicional no Brasil, nas três esferas, estadual, federal e trabalhista, reside, sobretudo, no campo estritamente processual, ou seja, na pletora de recursos”.
“O número e as espécies de recursos (e o mal está presente na Lei nº 9.957/2000) existentes no processo do trabalho tornam impraticável a prestação jurisdicional trabalhista.”
LEGEM HABEMUS
Veio a lume, aos 13 de janeiro de 2000, sancionada que fora na data antecedente, a Lei nº 9.957, a qual “acrescenta dispositivos à Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, instituindo o procedimento sumaríssimo no processo trabalhista”.
Restou assim acrescida a lei trabalhista da “Seção II-A – Do Procedimento Sumaríssimo”, por acréscimo à “Seção A” e, por conseguinte, acrescidos os artigos de 852-A a 852-I, assim como alterados os artigos 895 e 896, adicionando-se ainda o artigo 897-A àquele diploma.
O artigo 852-A dispõe que os dissídios individuais, não excedentes ao valor de quarenta vezes o salário mínimo (hoje, R$ 9.600,00) na data do ajuizamento da reclamação, submetem-se ao novel procedimento na esfera trabalhista. Excluem-se (parágrafo único) as demandas em que for parte a Administração Pública direta, autárquica e fundacional.
Na dicção do artigo 852-B, o pedido deverá ser certo ou indeterminado, indicando o valor correspondente, bem como que não será feita citação por edital, constituindo incumbência do autor a correta indicação do nome e do endereço do reclamado (incisos I e II). Prevê o inciso III que a apreciação da reclamatória deverá ter lugar no prazo máximo de quinze dias, sendo possível, caso se revele necessário, de pauta especial.
Há que se observar que o prazo máximo de 15 dias determinado para julgamento, se necessário em pauta especial, representa certo privilégio aos autores, frente aos milhares de outros que aguardam em fila de vários anos a solução de suas causas, submetidas ao procedimento ordinário, deixando-se aqui escapar, por analogia, a equanimidade exigida para todos.
Manoel Antonio Teixeira Filho,(4) assim afirma:
“No fundo, como se percebe, o legislador, ainda que não o desejasse, acabou por criar ato discriminatório ao separar as causas de “pequena monta” das de “grande monta”, sob a perspectiva econômica, como se esse critério fosse correto para definir a necessidade que possui o trabalhador, quando em juízo, de obter, em menor ou maior espaço de tempo, a prestação da tutela estatal. Toda discriminação é odiosa; a discriminação entre miseráveis, além disso, é perversa.”
Verifica-se portanto que, se por um lado, o sumaríssimo beneficia alguns trabalhadores, vem por certo em detrimento de muitos outros, remanejados ao fim da fila, por assim dizer, falando-se em causas de maior valor. Neste ponto, já demonstram habilidade os patronos dos reclamantes, criando, na peça exordial, direitos utópicos com o fito, nada profissional, de escapar ao novo rito.
Em contrapartida, outros patronos, ávidos de ganho imediato, reduzem o petitório, na busca de imediatos resultados financeiros, principalmente objetivando o acordo na primeira audiência, nem sempre benéfico ao reclamante.
Dispõe o artigo 852-B que as demandas pertinentes ao rito sumaríssimo serão instruídas e julgadas em audiência única – de resto o objetivo primeiro do processo trabalhista, já citado alhures, e reiteradamente descumprido, pelo que já também se disse.
Já o artigo 852-D repete prerrogativa processual (artigos 126 a 128 e 131 do CPC), no sentido das prerrogativas e da persuasão racional do julgador.
Todas as provas deverão ser produzidas em audiência, ainda que não requeridas previamente, a teor do artigo 852-H, tal como leciona o artigo 845 da CLT, igualmente se procedendo no tocante às testemunhas e com as mesmas ressalvas, por comparação.
No tocante à exclusão da Administração Pública direta, autárquica e fundacional, do procedimento sumaríssimo, soa ela como absurda, na medida em que, se todos são iguais perante a lei, sem qualquer discriminação (artigo 5º, caput da Constituição Federal), não se justificando, a princípio, tal exclusão.
Nesse sentido, ainda, a opinião de Amador Paes de Almeida:(5)
“Lamentamos a exclusão da Fazenda Pública, responsável direta pelo acúmulo de recursos que abarrotam os tribunais brasileiros, e não encontramos qualquer justificativa plausível para a exclusão das fundações, ainda que públicas.”
Ficamos contudo com aqueles que atribuem a limitação ao fato de que os entes públicos são beneficiários do Decreto-lei nº 779/69, que lhes confere prazos elásticos para os recursos processuais, aliás, situação que está a merecer reflexão, à vista inclusive de que tais entes são detentores de estruturas jurídicas satisfatórias para responderem em tempo igual às interpelações de que são alvo.
Já sob o aspecto ético, é possível assegurar-se que não se justifica tal discriminação, sendo cediço que, conquanto maus pagadores (os piores) são os beneficiários do decreto-lei, arrastando à exaustão os recursos permitidos, mormente na fase executória, em detrimento dos que já têm a seu favor a res judicata. Haja vista a lentidão dos precatórios da Fazenda Pública, em detrimento de quem, desventuradamente, demanda contra a mesma.
Outro ponto que merece crítica é o inciso II do artigo 852-B, na medida em que impõe ao autor injustificado ônus, no que pertine à correta indicação do nome e endereço do reclamado, exigência inexistente no rito ordinário trabalhista:
“não se fará citação por edital, incumbindo ao autor a correta indicação do nome e endereço do reclamado;”
Com efeito, trata-se de verdadeiro grilhão imposto ao reclamante (aqui tratado autor, em contraposição à forma tradicional adotada no processo do trabalho), na medida em que não poucas vezes o reclamado desaparece sem deixar vestígios; uma cômoda inversão de atribuições, que bem poderia ser evitada, mantendo-se a prudente figura do oficial de justiça. São maiores as dificuldades e as limitações impostas a quem pretender invocar a tutela jurisdicional a bem do direito pretendido, vislumbrando-se que não serão raras as oportunidades de desistência ante a dificuldade de localização do possível devedor. Assim haverá, embora de forma caolha, uma diminuição de ações, a bem do decantado desafogamento.
Ressalte-se aqui a desídia de alguns patronos, habituados às ações fáceis, com possibilidades de acordos – ganho imediato – no sentido de que não orientam suficientemente o seu constituinte-trabalhador no sentido de buscar a localização do empregador “fugitivo”.
Assim, não serão raras as vezes em que o empregado ver-se-á na contingência de recorrer, munido de alguns artifícios talvez, ao “antigo” procedimento, à míngua de informações mais detalhadas sobre o seu ex-empregador.
De resto, o que se verifica é que pouco de novidade trouxe o novo procedimento, porquanto o rito sumário instituído pela recém promulgada norma adota, como medidas de celeridade, algo idêntico ao já existente no texto consolidado, não se falando, obviamente, da questão dos prazos, estes, certamente de impossível cumprimento, na grande maioria dos casos, como estudado neste trabalho.
Portanto, o legislador não criou nada de novo, uma vez que a legislação existente já previa uma forma ritual mais rápida no processo do trabalho. Além disso, o sumaríssimo da nova lei, não é assim tão sumário; na verdade, o é menos que o da Lei n 5.584/70, considerando-se a possibilidade de interposição de recurso ordinário, bem como de revista, nas hipóteses que a lei prevê.
O que, na verdade, atravanca a possibilidade de que a prestação jurisdicional seja rápida são o número e as espécies de recursos possíveis no processo trabalhista:
· Da sentença de 1º grau cabem embargos declaratórios (artigo 897-A da CLT);
· Julgados os embargos, cabe recurso ordinário ao TRT (art. 895 da CLT);
· Se denegado seguimento ao RO, cabe agravo de instrumento (art. 897, b da CLT);
· Julgado o RO, cabem embargos declaratórios (art. 897-A da CLT);
· Do RO cabe recurso de revista ao TST (art. 896 da CLT);
· Negado processamento pelo juízo de admissibilidade a quo (Presidência do TRT), cabe agravo de instrumento (art. 897, b, da CLT);
· Denegado processamento pelo Juízo ad quem (relator da Turma do TST), cabe agravo regimental para a mesma Corte (RITST, art. 332, parágrafo único);
· Do julgamento do RR (se houver divergência entre Turmas ou entre Turmas e a Seção Especializada em Dissídios Individuais), cabem embargos de infringência para a mesma Seção (Lei nº 7.701/88, art. 3º, inciso III, alínea b;
· Em caso de violação à Lei Federal ou à Constituição, cabem embargos de nulidade para a Seção acima (Lei nº 7.701/88, art. 3º, inciso III, alínea b, in fine;
· Na hipótese de a decisão contrariar disposição constitucional, cabe recurso extraordinário para o STF (CF, art. 102, III, alíneas a, b e c;
· Negado processamento pelo Juízo de admissibilidade a quo (Presidência do TST), cabe agravo de instrumento (artigo 897, alínea b da CLT);
· OBS – É obrigatória, na fase recursal, a manifestação da Procuradoria do Trabalho, ainda que a questão não envolva interesse público.
· Na fase de execução, o executado dispõe do recurso de embargos à execução (art. 884 da CLT), buscando tornar sem efeito a eficácia executiva da sentença exeqüenda;
· Das decisões proferidas pelo Juiz do Trabalho na fase executória, cabe agravo de petição (art. 897, alínea a, da CLT);
· Na fase alienatória a parte dispões de embargos à arrematação (art. 746 do CPC e art. 769 da CLT);
· Da decisão do recurso supra, cabe agravo de petição para o TRT (art. 897, alínea a, da CLT);
Nas sentenças contra a Fazenda Pública, há obrigatoriedade do recurso ex officio (recurso por imperativo legal), que no mais das vezes é acompanhado do recurso voluntário.
RECURSO ORDINÁRIO
Proferida sentença definitiva nas causas sujeitas ao procedimento sumaríssimo, cabe recurso ordinário, com efeito devolutivo, que permite a extração de carta de sentença e, bem assim, a execução provisória, nos termos do artigo 895, “a”, da CLT.
Assim, o recurso será imediatamente distribuído a uma das turmas (artigo 895, inciso II da CLT), tendo o relator o prazo máximo de dez dias para sua liberação, o qual deverá de imediato ser posto em pauta para julgamento, sem a figura do revisor. Terá parecer oral do representante do Ministério Público do Trabalho, presente à sessão de julgamento e o acórdão consistirá unicamente em certidão de julgamento, não sem as razões de decidir, embora de forma sucinta. Este fato é deveras preocupante, ante a possibilidade – natural – de o juiz relator deixar passar algum equívoco, que poderia ser verificado pelo revisor.
Os tribunais poderão designar turma específica para tais julgamentos, visualizando-se aqui, mais uma vez, atitude em detrimento àqueles reclamantes cujo valor da ação seja de maior monta que aquela jungida ao procedimento sumaríssimo, situação de difícil acomodação.
No que toca à ausência de revisor, cabe, concessa venia dos que entendem em contrário, uma crítica, pois exsurge clara a possibilidade de julgamentos sem o necessário acuro na apreciação, dado o grande volume de feitos, de vez que o revisor, se atento à sua responsabilidade, atua verdadeiramente como um segundo relator, o que conduz a uma melhor apreciação, mesmo em se tratando do sumaríssimo.
Qualquer que seja o feito, em grau de apelação, é imprescindível a prudente figura do revisor, havendo lamentável equívoco em sua supressão.
Cabe aqui assinalar que, neste ponto, fazemos o comentário pertinente com esteio na experiência de mais de sete anos no Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, como juiz classista, em cujas sessões são julgados, regra geral, mais de uma centena de processos, dificultando uma mais acurada apreciação de cada um. Ressalto que a distribuição média, nesse período, foi de trinta e cinco processos por juiz, como relator, e outros tantos, ou mais, como revisor, sendo que os embargos declaratórios (exigíveis, para prequestionamento da matéria perante a instância ad quem) vêm por acréscimo, ensejando a reapreciação parcial dos autos.
RECURSO DE REVISTA
Havendo a pretensão ao Recurso de Revista, tal só será possível em caso de ferimento a súmula de jurisprudência uniforme do Tribunal Superior do Trabalho, ou violação direta a Constituição da República (artigo 896, § 6º), em arremedo ao caput do mesmo artigo, com a redação dada pela Lei nº 9.756/98; porém, em necessária adequação em razão da lei nova.
Entretanto, salutares reputo as críticas, equivocada se revela a redação do parágrafo 6º, na sua dicção, ipsis litteris, com grifos nossos:
“Nas causas sujeitas ao procedimento sumaríssimo, somente será admitido recurso de revista por contrariedade a súmula de jurisprudência uniforme do Tribunal Superior do Trabalho e violação direta da Constituição da República.”
Na verdade, deveria o texto ser assim grafado, na interpretação, no mínimo lógica, do legislador:
“…súmula de jurisprudência uniforme do Tribunal Superior do Trabalho ou violação direta da Constituição da República.”
Com efeito, à literal interpretação do texto (e assim se dará, indubitavelmente, máxime quando a apreciação couber aos legalistas, quer-se dizer, àqueles que, por convicção ou comodismo, atêm-se à fria letra da lei) haverá, como pressuposto para interposição do recurso “derradeiro”, a necessidade de duplo ferimento: a súmula de jurisprudência uniforme do Excelso Pretório e à Constituição da República.
Será, por certo, mais uma oportunidade para se invocar, dando asas à sanha protelatória, a interpretação do julgador, no compulsar do artigo 85 do Código Civil, aplicado subsidiariamente ao Direito do Trabalho, ex vi do artigo 8º da Consolidação das Leis do Trabalho.
Cabe consignar sábia frase do insigne magistrado Dr. Francisco Antonio de Oliveira,(6) que estudaremos neste trabalho:
“O legislador opera em sede de utopia e, lamentavelmente, demonstra desconhecer por completo a realidade trabalhista no País.”
De se lamentar, também, o desconhecimento, dos princípios e regras elementares regentes de nossa língua…
Evidentemente, o que ocorreu foi um equívoco – lamentável, diga-se – pelo que urge a adoção de providência, pelo Tribunal Superior do Trabalho, via de enunciado, a fim de que se pacifique o entendimento sobre a matéria, sob pena de se verificarem injustiças quando da denegação de seguimento do recurso de revista.
OBJETIVO PRIMEIRO DA LEI
Preconizando a celeridade na Justiça do Trabalho (a mais célere, no dizer da douta Juíza do Trabalho Dra. Catia Lungov)(7) – assertiva com a qual concordamos – embrionou-se a Lei em comento, vindo ela a lume sem o necessário burilamento, como soe ocorrer, quer-se dizer, sem a consulta prévia aos enumeráveis juristas que apreciariam opinar adrede sobre a matéria, resultando por certo em maior eficácia da norma.
Perquire a douta Juíza, em indagação que também é nossa,
“se é frutífero centrar nossa atenção na obsessão pela redução da atividade judiciária, através da criação de dificuldade à propositura de ação e ao exercício do direito de recurso, ou na extinção dos processos sem a apreciação do mérito, pelas mais variadas justificativas, como se com isso se estivesse restaurando a paz social”.
Com efeito, parece que há exacerbada decisão de, pela via inversa, resolver-se, ao revés do norte, as questões judiciais, na medida em que se depara com a dificuldade de aprimoramento da Justiça, no seu todo, atuando-se de forma canhestra na busca de uma solução para o assustador acúmulo de feitos.
Assim se manifesta a Juíza Kátia(8), abordando a questão do prazo a ser cumprido para a solução das demandas no sumaríssimo:
“Ao se fixar um prazo, desprezou-se que a Justiça do Trabalho é campeã imbatível, numericamente, na solução de litígios e que ainda é a mais célere.”
Mais adiante:
“Desprezou-se que há um acúmulo já de anos nas pautas, com processos aguardando instrução, processos esses que não merecem ser preteridos porque propostos anteriormente à nova lei.”
A mesma preocupação é verificada pelo Dr. Narciso Figueirôa Júnior,(9) que assim refere:
“Embora mereça encômios a preocupação do legislador com a agilização nos julgamentos dos processos trabalhistas, não acreditamos que os objetivos da referida lei serão alcançados, pelo menos a curto prazo, tendo em vista o acúmulo de processos existentes tanto na primeira quanto na segunda instância.”
É verdade. Necessário se faz a agilização da Justiça, a fim de que a prestação jurisdicional não se transforme, pela demora, em manifesta injustiça. Porém, inolvidável que as partes – autor ou réu – não podem se sentir mutiladas vendo que se trata dos seus direitos subjetivos de forma algo atabalhoada, a toque de caixa, sem a necessária apreciação pelo estado-juiz, como é de se esperar.
Impende sopesar se necessitamos de regras novas ou se, melhor atuando, se façam cumprir as já existentes, num redimensionamento das atividades pertinentes, visando a uma agilização por vontade política, por assim, dizer, sem necessidade de adoção de novidades, nem sempre férteis.
DIFICULDADES POSSÍVEIS
Diversos juízes e advogados têm-se manifestado céticos no que toca à prática do rito sumaríssimo, segundo os quais, o cumprimento dos prazos previstos é a principal dificuldade, em especial nos grandes centros, sendo que no interior sua viabilidade é mais palpável. Um problema que não foi bem avaliado quando da elaboração do texto milagroso (assim parece que o querem) é a questão da notificação em tempo hábil no prazo exíguo de quinze dias, ponto em que se desavantaja o reclamado, quase impossibilitado de elaborar defesa adequada à lide proposta. O serviço de correio também não é adequado o bastante a essa situação, sendo necessário um segmento do mesmo à permanente disposição da Justiça do Trabalho, como seu apenso, dir-se-ia.
Verifica-se, por exemplo, a exigência de unicidade da audiência, regra processual já existente desde antanho, no ordenamento processual trabalhista, não se constituindo, pois, novidade. Se não tem sido observada, já o dissemos acima, é pelos mesmos motivos que também tornarão possível o emperramento dos feitos submetidos ao novo rito, o que vislumbro inevitável. Não se trata aqui, especificamente, de crítica, mas de análise da realidade.
Em feliz abordagem deste particular, o eminente Juiz Francisco Antonio de Oliveira,(10) supra citado, alude à dificuldade de sucesso do novo rito, nos grandes centros, decorrente do avassalador volume de ações, “que hoje se eleva a patamares preocupantes”, diferentemente das pequenas co-marcas, onde a novidade se revela desnecessária, com o procedimento ordinário satisfazendo a contento a demanda.
Transcrevo crítica do autor, no sentido de que:
“A cultura legiferante do País funciona como ato de constrição que coloca o poder político (Executivo e Legislativo) numa redoma de vidro fosco a retirar-lhe qualquer visão da realidade. Para o poder político, a lei funciona como espécie de panacéia que, editada e sancionada, passa a corrigir todos os males, ungida que estaria de poderes deificantes” (di-los-ia apoteóticos), “como se ato proveniente dos deuses.”
Seria, por assim dizer, um lavar-de-mãos bíblico (tal como quando Pilatos entregou à malta ululante o inocente Jesus de Nazaré) com a edição de texto tido e havido como milagroso – já se disse alhures – deixando aos enfermos o remédio duvidoso, não suficientemente elaborado no laboratório que deveria primar pela competência.
Parida a norma, gestada que foi currente calamo, entregam-na envolta na placenta irremovível às partes e aos julgadores, partindo para outra gestação, na busca de justificar sua permanência nos postos que ocupam, por delegação popular.
Mais adiante, arremata o mestre que a Lei sob comento, apesar de bem intencionada, eiva-se de utopia, não tendo vocação para milagreiros os juízes:
“Não existe possibilidade de exigir-se julgamento em 15 dias na primeira instância ou que o relator libere o processo em dez dias para julgamento nos tribunais. Aconselha-se que os senhores deputados e senadores conheçam o País e verifiquem a realidade de cada região (são 24 regiões trabalhistas) e as dotem de varas, turmas, funcionários e de todas as necessidades materiais para que a lei não permaneça em berço esplêndido, como quase tudo no País.”
Manoel Antonio Teixeira Filho,(11) é enfático:
“O legislador, como se nota, fez ouvidos moucos à sábia ponderação de Chiovenda de que, no terreno das leis processuais, devemos sempre ‘aspirar a uma reforma profunda, ou renunciar à esperança de um certo progresso’. O que nos deu o legislador foi um texto tímido, quase inexpressivo, produto de pastiches e de amálgamas de normas legais forâneas, com os quais procurou fazer crer, visionariamente, que este seria ‘o melhor dos mundos possíveis, na expressão de Pangloss, personagem de Voltaire em ‘Cândido’.”
De se observar, por oportuno e necessário, que o texto em comento se amolda perfeitamente, comparativamente e pela via inversa, fato abordado acima, com referência à extinção da representação paritária na Justiça do Trabalho, quando o entendimento era no sentido de que impossível a cura do membro enfermo, culminando-se pela amputação.
POSSIBILIDADES DA LEI
Tentemos buscar as vantagens da nova modalidade, com certeza bem poucas.
Daqueles que consideram o Rito Sumaríssimo como grande conquista para a modernização do processo do trabalho, ousamos discordar, data venia, à vista de razões já acima expostas, quais sejam, de que o processo do trabalho já seria, por si próprio, suficientemente célere, nos moldes do Sumaríssimo (artigo 849 da CLT). Os motivos são aqueles já supra expostos, no sentido de que, por vezes, torna-se difícil a prática prevista no indigitado artigo, por impossível a produção das provas necessárias.
Com efeito, hoje, quase quatro anos após, verifica-se que pouco ou nada mudou, no sentido de agilização do processo trabalhista.
Curial observar-se que, muitas vezes, pretender-se-á, debalde, aplicar o novo rito para solução de pendência decorrente de relação empregatícia duradoura, quer-se dizer, por vários anos, cuja relação jurídica ocorreu diariamente, oito ou mais horas por dia, cuja prestação e contraprestação foi variada nas suas peculiaridades: marcação diária de ponto; atrasos; excedimento da jornada ou carga horária contratual, mesmo que em minutos diários; repouso semanal não cumprido; turnos de revezamento; labor em condições agressivas, nem sempre reconhecido pelo empregador e de demorada comprovação; desvio de função; afastamento do empregado por motivo de enfermidade, inclusive da gestante; comportamento inadequado das partes – empregado e empregador, este, inclusive por seus prepostos – ensejando a ruptura do pacto laboral por justo motivo; etc.
Para uma melhor adequação ao novo sistema, necessário que as convenções coletivas prevejam as possibilidades aqui elencadas, no sentido de viabilizar a aplicação legal sem qualquer possibilidade de perda para os trabalhadores – parte frágil da relação trabalhista, máxime nestes tempos de desemprego, com os sindicatos enfraquecidos e nem sempre representando os legítimos interesses profissionais, preferindo seus dirigentes a cômoda situação de mando e poder perante a categoria.
Não se afigura possível, a curto prazo, esta possibilidade, dada a existência de perpetuação dos dirigentes sindicais, no “poder”, quase sempre danosa ao bom exercício de seus misteres, de vez que o continuísmo é sempre pernicioso, tal como nos mandatos legislativos, onde, no meu entender, deveriam ser limitados, a bem da renovação.
Contrariamente a este entendimento, vêm os argumentos no sentido de que o dirigente sindical teria dificuldades de retornar às suas atividade produtivas na empresa, ou noutra qualquer, ficando “marcado” pelos empregadores. Entretanto, repito que a renovação é necessária.
ENTRE PARÊNTESES:
Comissões de Conciliação Prévia
Em auxílio à nova lei, foram instituídas as Comissões de Conciliação Prévia (Lei nº 9.958, de 12 de janeiro de 2000), dispondo ainda sobre a execução de título extrajudicial na Justiça do Trabalho.
Assim, acresceu-se à Consolidação das Leis do Trabalho o “Título VI-A – das Comissões de Conciliação Prévia”.
As Comissões de Conciliação Prévia repita-se, representam uma possibilidade alentadora de solução dos conflitos à margem do Poder Judiciário. Entretanto, sempre com a possibilidade de prejuízo para os hipossuficientes, a não ser que estes estejam convenientemente assistidos por seus lídimos representantes, principalmente sindicais.
José Eduardo Haddad(12) é de opinião que,
“o procedimento sumaríssimo, dentro de uma máquina judicial menos acionada, em vista da triagem prévia, e, por isso, mais ágil, poderia ser imposto a todas as demandas trabalhistas, até porque adota princípios que a própria CLT já prevê para o rito ordinário trabalhista. De nada adianta a instituição de um procedimento mais célere dentro de uma estrutura que sofre com a acúmulo de processos, posto que, para o cumprimento dos exíguos prazos impostos pelo procedimento sumaríssimo, os juízes serão obrigados a privilegiar os feitos regidos por este, em detrimento das ações impulsionadas no rito ordinário.” (Grifo nosso.)
Não é demais, nem representa lucubração negativa, lembrar que a parte mais forte da relação de emprego poderá valer-se de expedientes inescrupulosos, coagindo, por assim dizer, os conciliadores a fim de que se rendam a uma solução forçada, mediante determinada vantagem. Bem melhor seria a atuação dos representantes classistas, na primeira instância, desde que devidamente preparados para tanto. É certo que, ultimamente, o que se verificou foi que os classistas quase nunca se empenharam na solução do litígio em primeira audiência, quer por despreparo, omissão, ou porque, simplesmente, não tinham a necessária representatividade. Quer-se dizer, ou pertenciam a entidades criadas com o fito único de indicar classistas, ou, o mais lamentável, eram pessoas que não diziam respeito, absolutamente, à classe que representavam, lá estando apenas atraídos pelo considerável ganho e pela possibilidade de aposentadoria com vencimentos maiores.
Abordando a matéria em ora inserta, o Doutor Jorge Pinheiro Castelo(13), ressalta a condição desfavorável do trabalhador, assim:
“Aliás, a vulnerabilidade econômica do trabalhador após a rescisão contratual, ou seja, como desempregado, é maior do que a do empregado, acentuando-se, ainda mais, se tiver idade avançada ou for aposentado.”
O autor aborda ainda a questão da constitucionalidade da Lei nº 9.958/2000, uma vez que a “conciliação” é obrigatória, afastando a priori a faculdade, constitucionalmente assegurada, de recorrer ao Judiciário; este fato que deve merecer estudos mais aprofundados dos estudiosos. Considera ele patente inconstitucionalidade a imposição de uma etapa “administrativa” conciliatória ao trabalhador que já sofre a inadimplência do empregador, para então, num segundo momento (ou num terceiro, a se considerar o ato de homologação) ingressar em juízo.
Com efeito, seria de se perguntar: se é obrigatória, como pode ser tratada como conciliação?
Transcrevo excerto:
“Manifestamente inconstitucional a exigência ou obrigatoriedade da conciliação prévia, visto que com o afirmado inadimplemento, no plano material, está configurado e satisfeito o interesse de agir processual próprio do direito constitucional de ação, não se podendo exigir a presença de um segundo interesse de agir administrativo, para só então se poder demandar em juízo.”
No que tange ao decantado desafogamento da Justiça do Trabalho, não creio que possa ocorrer, ainda pela possibilidade de que, apostando na brevidade da solução, muitas ações temerárias sejam intentadas, buscando-se acordos, estes muitas vezes aceitos pelos empregadores, por se tornarem menos onerosos que o arrastamento da ação por tempo maior, referência, é claro, àqueles que primam pelo cumprimento de suas obrigações perante os trabalhadores, quer por detestarem a intervenção judiciária, quer porque simplesmente preferem estar conformes à lei, e nisto estão corretos, obviamente.
Como se pode verificar, as possibilidades de sucesso são poucas, vislumbrando-se que não haverá desafogamento da Justiça do Trabalho e, tampouco, benefício às partes.
Fosse adotado o princípio da irrecorribilidade das decisões (Lei nº 5.584/70) – regra que não fere o dispositivo constitucional (art. 5º, inciso LV), porquanto a Constituição Federal assim o prevê (art. 121, § 3º) – o resultado seria mais satisfatório, fechando as portas às irresignações de caráter meramente protelatório, que beneficiam, repita-se, apenas a parte mais forte na relação de trabalho, a empresa, conquanto interesse a alguns advogados inescrupulosos que, patrocinando ações dos trabalhadores, apostam no “desaparecimento” destes, aos quais não repassam, após longo tempo de espera, os valores auferidos na demanda.
NOS TRIBUNAIS
Aspecto importante é a possibilidade de lavratura dos acórdãos, nos tribunais, de forma lacônica, ou seja, por simples certidão em que restará consignado que a sentença é mantida “por seus próprios e jurídicos fundamentos”, prática omissiva, porquanto, ao revisar o julgado a quo, tem obrigação o juiz de exarar, salvo raras exceções, os motivos que o levaram a tal convencimento, tendo-se que nas razões recursais, via de regra, há questionamentos que demandam análise não apenas perfunctória do caso, mais uma completa reapreciação. Assim, não se justifica a adoção dos fundamentos objeto da irresignação da parte.
Cabe comento também no que se refere à aplicabilidade do artigo 557 do CPC (diploma processual aplicável no processo trabalhista), em que o relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente etc., em especial na aplicação da multa prevista no § 2º, na interposição de agravo inadmissível ou infundado.
Na primeira hipótese, o caput, tem-se na prática que, no Processo do Trabalho, é a empresa que mais incide no recurso protelatório, beneficiada pela vantagem econômica de que é detentora frente ao empregado. Assim, no mais das vezes, teremos a penalidade aplicada à empresa, devendo o julgador atentar também para a outra parte, sem desconsiderar tratarem-se de pólos economicamente díspares na relação comum, não podendo descurar da aplicabilidade ao mais fraco. Entretanto, isto causaria, a meu ver, constrangimento por vezes prejudicial ao empregado, dada a falibilidade possível do relator e a incorreta apreciação do agravo, pelo tribunal, em razão do excesso de trabalho. São apenas possibilidades, mas que merecem reflexão.
CONCLUSÃO
Em suma, o que se observa é que o chamado novo procedimento sumaríssimo não constitui novidade, se considerarmos que as soluções adotadas com vistas à aceleração do julgamento dos processos trabalhistas, não são novas. Ao contrário, estão há decênios na Consolidação das Leis do Trabalho – sempre atual, no nosso modesto entender, necessitando apenas de alguns reparos; jamais de ampla reforma – sendo certo que, se as novidades realmente apresentadas referem-se aos prazos, bastaria a competente adequação ao texto então vigente, o consolidado.
O que ocorre é que o Judiciário trabalhista rema contra a enxurrada de feitos, desaparelhado do ponto de vista humano – falando-se em número – com o que se vêem os magistrados e funcionários envoltos em pilhas intermináveis de processos, sem tempo para atualizar-se a pauta.
Mais grave ainda é o fato de que, dada a correria processual, surge a imperfeição dos julgados, ensejando a interposição recursal, e assim, num verdadeiro círculo vicioso, a roda d´água vai cada vez mais impregnando-se e ficando mais pesada, emperrada, o que dificulta sua normal movimentação.
A criação de novos mecanismos é medida que se impõe, na busca de soluções justas e rápidas para as demandas (e aí temos as decantadas Comissões de Conciliação Prévia, com enormes possibilidades de insucesso, já se disse), as quais, com o tempo, poderão contribuir para o desafogamento da Justiça obreira – bela na sua essência, eis que de natureza alimentar – caso, é claro, não se deixem desvirtuar, pelas possibilidades que são muitas, caso em que, mais uma vez, o grande prejudicado será o trabalhador, parte fraca na relação empregatícia, que busca, às vezes só o conseguindo post mortem, a paga dos sagrados direitos dela decorrentes.
Tivesse o legislador a sensibilidade e a sensatez necessárias para os problemas decorrentes do acúmulo de feitos, por certo o rumo tomado seria outro, que não a parição de nova lei, em respeito ao diploma trabalhista, idoso mas não envelhecido, e dotado de todos os instrumentos possíveis para a rápida solução das questões apresentadas ao Judiciário. A celeridade ritual não se resolve, no mais das vezes, com a criação de normas, mas com a correta aplicação daquelas já existentes, para tanto bastando boa vontade e método de aplicação.
BREVE RESUMO
Do estudo efetuado, pudemos extrair o seguinte:
· A condição inicial para ajuizamento pelo sumaríssimo é que o valor reclamado seja até 40 salários mínimos, incluindo-se aí todas as cominações e correções;
· Dissídios coletivos não estão abrangidos;
· A Administração Pública direta, autárquica e fundacional está excluída do novel procedimento, em prejuízo para o trabalhador;
· O pedido deve ser sempre certo e determinado, bem como e forma correta liquidado, o que facilita nos casos em que tal é possível;
· Obrigatoriedade da apreciação da reclamatória em 15 dias, nem sempre possível, como se verá e que, de resto, pretere reclamantes outros, pelo procedimento ordinário;
· Indeferimento da petição nos casos de indicação insuficiente ou incorreta de endereço, razão social e outros requisitos, situação em que haverá condenação em custas, sendo possível a isenção – ao arbítrio do juiz;
· A citação não será feita por edital, mas via postal ou oficial de justiça, dificultando a atuação quando a empresa não mais se encontrar no endereço anteriormente conhecido – cabe às partes (diga-se, reclamante) comunicar qualquer alteração de endereço, pena de ineficácia da intimação;
· Como no processo comum, o juiz indeferirá as provas que entender impertinentes;
· A conciliação será proposta em todas as fases do processo, quer-se dizer, aqui, na mesma audiência, lembrando-se que será ela sempre única; à falta de acordo, o reclamado aduzirá, em 20 minutos, a sua defesa; poderá ser dispensada a leitura da peça inicial;
· Os atos processuais são resumidos; é permitida a gravação da audiência, vislumbrando-se aqui a possibilidade de indeferimento da mesma, pois cabe ao juiz a direção do processo; de se lembrar que irrecorríveis as decisões interlocutórias e que os incidentes serão analisados na própria audiência;
· Será necessário um maior preparo dos advogados, principalmente do reclamante, para que não sofra, este, prejuízo de difícil ou impossível reparação;
· As testemunhas serão convidadas – não, intimadas – via carta contra recibo; se não comparecerem, poderão ser conduzidas coercitivamente, além de multadas (neste caso, a audiência não mais será uma); provas orais, técnicas e documentais sempre permitidas, mesmo que não requeridas previamente;
· A manifestação sobre os documentos juntados será oral, pela outra parte, na própria sessão – prática por vezes difícil ou impossível, conforme a característica e/ou o teor do documento;
· Havendo necessidade de perito, será nomeado na própria audiência, com prazo para entrega do laudo específico – novamente não será uma a audiência;
· Quesitos sobre o objeto da perícia serão ofertados em audiência, bem assim a indicação de assistente técnico, ensejando acuidade do advogado para o preparo dos quesitos;
· Haverá cinco dias para manifestação sobre as conclusões do laudo técnico, sendo esse prazo comum;
· O relatório da sentença é dispensável (não dispensado, a meu ver), e resumida a sentença, que é definitiva, da qual cabe recurso ordinário em oito dias; neste caso, indispensáveis os pressupostos de admissibilidade, como no procedimento comum;
· O recurso ordinário, tão logo recebido, será distribuído a um relator, que terá 10 dias para elaborar o voto e devolver os autos – lapso temporal de difícil cumprimento, pelo menos por ora; não existe a figura do revisor, medida que sugere preocupações, dado o acúmulo de feitos e a possibilidade de excessiva confiança no trabalho do relator – pessoa humana; portanto, falível;
· O parecer do Ministério Público será oral, situação já verificada em algumas situações, no procedimento comum (que, por vezes, como já visto, desagrada a julgadores e advogados);
· O acórdão será resumido, permitindo-se, em caso de manutenção da sentença, será bastante a alusão aos termos da mesma e a certidão – o que pode ensejar, pura e simplesmente, uma perfunctória apreciação dos autos, em velada e cômoda negativa de prestação jurisdicional;
· Caberá recurso de revista de acórdão, desde que haja contrariedade a súmula do TST e (!…) violação à Constituição Federal; deveria a redação – como supra citado – dizer: “…súmula de jurisprudência uniforme do Tribunal Superior do Trabalho ou violação direta da Constituição da República.”; os pressupostos de admissibilidade são os mesmos do procedimento comum;
· Sempre cabem embargos de declaração – em cinco dias – inter-rompendo-se o prazo para os demais recursos; se manifestamente protelatórios, assim declarados pelo juiz ou tribunal, haverá condenação em multa, não superior a 1% do valor da causa; em caso de reincidência, a multa será de até 10%; o depósito de tais valores é condição para a interposição do recurso seguinte;
· Eventuais erros de ordem material são passíveis de correção, ex officio ou mediante a provocação da parte interessada.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1.SILVA, De Plácido e – “Vocabulário Jurídico”, 13ª edição atualizada por Nagib Slaibi Filho e Geraldo Magela Alves, Forense, Rio de Janeiro, 1997.
2.ALMEIDA, Amador Paes de – (“Procedimento Sumaríssimo no Processo do Trabalho – Comentários à Lei nº 9.957/2000” – Boletim Informativo Saraiva, LTr, Ano 9, Número 1, Março de 2000). Magistrado aposentado do TRT da 2ª Região e professor doutor, titular de Direito Comercial e do Trabalho da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, da qual é vice-diretor. Autor de inúmeros livros, em especial nas áreas de Trabalhista (Direito e Processo) e Comercial.
3.ALMEIDA, Amador Paes de, ob cit.
4.TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio – (“O Procedimento Sumaríssimo no Processo do Trabalho” – Comentários à Lei nº 9.957/2000, LTr, São Paulo). É Juiz do Trabalho – Professor da Faculdade de Direito de Curitiba – Membro do Instituto Latioamericano de Derecho del Trabajo y de la Seguridad Social – da Societé Internationale de Droit du Travail et de la Securité Sociale – do Instituto dos Advogados do Paraná – da Academia Nacional de Direito do Trabalho – da Academia Paranaense de Letras Jurídicas.
5.ALMEIDA, Amador Paes de – ob. cit.
6.OLIVEIRA, Francisco Antonio de – (“Tribuna do Direito”, de Abril de 2000). Juiz do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, presidente do Egrégio Sodalício – gestão de Setembro/2000-Setembro/2002. Doutor em Direito do Trabalho.
7.LUNGOV, Catia – (“Rito Sumaríssimo”, Tribuna do Direito, Junho de 2000). Juíza do TRT da 2ª Região.
8.LUNGOV, Catia – ob. cit.
9.FIGUEIRÔA JÚNIOR, Narciso – (“Tribuna do Direito, Abril de 2000). Advogado, pós-graduado em direito do Trabalho pela PUC-SP. Foi juiz classista do TRT da 2ª Região.
10 OLIVEIRA, Francisco Antonio de – ob. cit.
11.TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio – ob. cit.
12.HADDAD, José Eduardo – (“Comissões de Conciliação, o Procedimento Sumaríssimo e a crise do Judiciário Trabalhista” LTr, 64-02/187, Fevereiro de 2000). Advogado, mestre em Processo Civil, Professor de Direito do Trabalho e Processo do Trabalho na UNIP – Campinas.
13.CASTELO, Jorge Pinheiro – (LTr, 64.04, Vol. 04, Abril de 2000). Advogado, especialista (pós-graduação lato sensu), livre docente em Direito do Trabalho pela FADUSP.
Referência Biográfica
José Mechango Antunes – Advogado; Professor de Direito; Especialista em Direito da Cidadania; Mestrando pela UNIMES (Universidade Metropolitana de Santos). Foi Juiz Classista da 2º Região, por três mandatos (um como suplente). 2004
jmechango@adv.aobsp.org.br