OFENSA AO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ: Rompimento de contrato gera dever de indenizar

DECISÃO: *TJRS – O cancelamento de contrato com legítima expectativa de continuidade é contraditório e deve gerar indenização, pois rompe com os princípios da boa-fé e da probidade nas relações empresariais. A decisão da 19ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do RS reverte parcialmente juízo da Comarca de Piratini e condena Fibria Celulose SA (Votorantim Celulose e Papel SA) a ressarcir a apelante Wacchol & Filhos.

Caso

A relação entre as partes começou em 2004, com a empresa apelante prestando serviços de silvicultura (limpeza, preparo do solo para adubação, plantio etc.). Seguiram-se vários aditamentos e em 2007 houve a primeira suspensão das atividades, com a apelante tendo de arcar com os custos de manutenção da estrutura planejada para serviços que não ocorreram. A solução veio com novo aditivo, através do qual a ré adiantou valores (R$ 200 mil) à apelante, que seriam pagos com a renda das atividades futuras.

A prática foi repetida em 2008, com outros valores, mas, no ano seguinte, a autora viu o rompimento definitivo do contrato e bens (máquinas e veículos) dados em garantia de nova operação serem tomados pela ré. Foi à Justiça pleiteando o reconhecimento do inadimplemento da ré, por violação da boa-fé objetiva, que veda o comportamento contraditório e a ofensa à legítima expectativa e indenização pelas máquinas.

No Juízo do 1º Grau, o pedido de indenização foi considerado improcedente.

Recurso

Para o Desembargador Marco Antonio Angelo, relator do recurso, toda a prática usada para levar adiante a relação entre as empresas envolvidas mostra a quebra da legítima expectativa, passível de responsabilização. Na análise dos documentos, disse que, além das seguidas continuidades na prestação dos serviços mesmo quando superados os prazos, todas as referências são a antecipação ou adiantamento de valores referentes a serviços a serem prestados e à viabilização destes mesmos serviços.

Considerou os documentos apresentados pela ré para provar que anunciara o encerramento da prestação do serviço mais um elemento de contradição. Enquanto uma das atas não continha data, outras, segundo testemunha, sempre escritas pela parte ré, omitiam partes do conteúdo das reuniões. A cronologia das atas também revelava incoerência. Disse o Desembargador Angelo: Assim, se por um lado indicava que as atividades estavam se encerrando, por outro lado adiantava valores para que a autora pudesse continuar prestando os serviços contratados.

Quanto à indenização, estabeleceu em nove meses o período de expectativa de duração do contrato pela qual a autora deve receber. O valor foi definido pela aplicação da média mensal de toda a contratação, dividida pela metade (art. 603 do Código Civil). O julgador levou em conta o fato de que a natureza dos serviços prestados era variável e pagos pelo cumprimento, portanto de difícil mensuração tratando-se de presunção de continuidade.

O julgador negou, por fim, o pedido da apelante por indenização relativa às máquinas entregues em garantia: Explicou: Caso, além da indenização, ainda seja ressarcido das máquinas dadas em quitação, receberia em duas vezes pelo serviço que não prestou: o valor adiantado e o valor indenizatório.

Acompanharam o voto do relator os Desembargadores Eduardo João Lima Costa e Voltaire de Lima Moraes. Processo nº 70062275599


 

FONTE: TJRS, 19 de junho de 2015

Clovis Brasil Pereira
Clovis Brasil Pereirahttp://54.70.182.189
Advogado; Mestre em Direito; Especialista em Processo Civil; Professor Universitário; Coordenador Pedagógico da Pós-Graduação em Direito Processual Civil da FIG – UNIMESP; Editor responsável do site jurídico www.prolegis.com.br; autor de diversos artigos jurídicos e do livro “O Cotidiano e o Direito”.

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