*Clovis Brasil Pereira
Sumário: 1. Introdução
1. Introdução
Os idosos no Brasil, assim consideradas as pessoas com mais de 60 anos de idade, ganharam tutela especial pela Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003, denominada de Estatuto do Idoso.
Cresce a importância do referido instituto legal, na medida em que cresce o número de idosos, em razão da melhoria dos índices sociais, que medem a qualidade de vida da população brasileira, fato notório nos últimos anos.
Pelo último censo demográfico realizado pelo IBGE, no ano de 2010, a população brasileira atingiu 190.755.799 habitantes, e segundo a Sinopse do Censo Demográfico divulgado pelo órgão, mais de 14 milhões de pessoas tem mais de 65 anos de idade.
Analisando as estatísticas, encontramos que a população com mais de 65 anos, em 1991, correspondia a 4,8% da população do país, passando a 5,9% em 2000, crescendo para 7,4%, no ano de 2010.
Pelos índices do IBGE, em
Anteriormente ao Estatuto do Idoso – Lei 10.741/2003, a Constituição Federal de 1988, que prestigiou de forma ampla o respeito aos direitos humanos, e invocou em seus fundamentos o respeito à dignidade humana, inseriu em seu texto, vários preceitos visando o respeito aos direitos dos idosos.
Esse processo se intensificou gradualmente, principalmente em razão das transformações sociais constantes na nossa sociedade e dos movimentos crescentes em favor dos direitos humanos, que emergiram a partir do texto constitucional cunhado de ”Constituição Cidadã”, pelo Presidente da Assembléia Nacional Constituinte, Deputado Ulisses Guimarães, quando de sua promulgação em 05 de outubro de 1988.
Entre os direitos fundamentais dos idosos previstos na Constituição Federal de 1988, merecem destaque o Direito Previdenciário (art. 201, I CF), e o Direito à Assistência (art. 203 I CF), bem como a norma do artigo 230, que faz menção especificamente a “pessoas idosas”, atribuindo como sendo um dever da família, do Estado e da sociedade, amparar as pessoas idosas e garantir a sua qualidade de vida.
O artigo 5º da Constituição, implicitamente trata da proteção ao idoso, ao afirmar que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”.
Ao se referir à igualdade, , está a proibir a discriminação, principalmente quanto à diferença de idade. A Constituição ainda preteje o direito a saúde, direito à moradia, este garantido como um direito social (artigos 6º e 23, inciso IX, da CF).
A Lei 8.842/94, que regulamenta a Política Nacional do Idoso, determina em seu artigo 10, V, que nos programas habitacionais sejam destinados moradias em regime de comodato para os idosos que não tenham família ou com renda insuficiente para se manterem.
Esse é um direito que muitas vezes se torna um verdadeiro tormento para o idoso, uma vez que muitos familiares próximos, mesmo tendo condições para manter o idoso dentro de suas casas, preferem hospedá-los em asilos ou casas de repouso, onde são muitas vezes relegados ao abandono e ao esquecimento.
Outro direito fundamental do idoso é o direito à aposentadoria. Sabe-se que a Previdência Social contempla milhões de idosos todos os anos, em cumprimento ao artigo 201 da Constituição Federal, que atribui à previdência a obrigação de dar cobertura aos cidadãos em eventos como doença, invalidez, morte, velhice e ajuda na manutenção de dependentes dos segurados.
Neste aspecto, é sabido que muitas são as exigências para a concessão do benefício da aposentadoria, e quando esta para ao idoso, seu valor é insignificante, não conseguindo suprir as suas necessidades básicas.
Muitos são os requisitos exigidos para que o idoso possa se aposentar, aliando-se tempo de contribuição, idade e o famigerado fator previdenciário, e quase sempre o valor da aposentadoria não consegue suprir as necessidades básicas do idoso.
O texto constitucional protege também o idoso contra maus-tratos e violências, asseverando em seu artigo 5º, inciso XLI, que “a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”.
Por sua vez, a Lei 8.842/94, no seu artigo 3º, inciso III é taxativo ao determinar que “o idoso não deve sofrer discriminação de qualquer natureza”, e estabelece uma responsabilidade generalizada no artigo 10, § 3º do mesmo diploma legal, que “todo e qualquer cidadão tem o dever de denunciar a autoridade competente qualquer forma de negligência ou desrespeito ao idoso”.
A partir de 2003, os idosos ganharam um importante instrumento infraconstitucional, que deu maior efetividade às garantias contidas na Constituição Federal, e representou um avanço na proteção dos maiores de 60 anos de idade, em relação à Lei 8.842/94, que havia estabelido a Política Nacional do Idoso, com garantias à população da chamada terceira idade.
O artigo 2º, do Estatuto do Idoso, é taxativo quanto ao alcance da proteção aos direitos fundamentais:
“O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta lei, assegurando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade”.
O direito preferencial dos idosos, está assegurado no artigo 3º, que assevera:
“É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária”.
A lei que visa maior proteção jurídica, familiar, trabalhista e previdenciária aos idosos, alterou alguns dispositivos legais, para adequá-los à filosofia de sua proteção, conforme se enumera a seguir: Decreto-Lei 2.848/1940, o Código Penal; o Decreto-Lei 3.688/1941, Lei das Contravenções Penais; Lei 6.368/1976, conhecida como Lei de Tóxico; Lei 1048/2000, Lei de Proteção aos Deficientes; Lei 8.742/93, Lei Orgânica da Assistência Social; Lei 9.455/1997, que define Crime de Tortura; e Lei 1048/2000, Lei de Proteção aos Deficientes.
4. Conquistas e garantias asseguradas no Estatuto do Idoso
Podemos dividir os direitos dos idosos em vários grupos, a saber:
I. Direitos Fundamentais: nesse grupo temos a proteção do direito à vida, à liberdade, ao respeito à dignidade, à saúde, à educação, à cultura, à habitação, ao transporte e lazer, à profissionalização, ao trabalho, aos alimentos, à previdência social e a assistência social.
É importante ressalvar, o benefício concedido ao idoso, no artigo 12 do Estatuto, que lhe garante o direito de escolher contra quem deseja acionar para exigir a obrigação alimentar, independente da ordem de preferência, podendo assim o idoso escolher quem melhor lhe convier, contrariando assim, o princípio da reciprocidade previsto no artigo 1.696 do Código Civil. Cabe ao legislador amparado na doutrina, buscar o equilíbrio entre a necessidade do idoso em receber alimentos e a possibilidade real do alimentante no pagamento.
O acordo para o recebimento dos alimentos pode ser feito perante o Ministério Público, adquirindo efeito de título executivo extrajudicial, e se a família não tem condições de fazer o pagamento o encargo fica a cargo do Estado por meio de assistência social.
II. Medidas Protetivas: no segundo grupo, encontramos as medidas protetivas, previstas no Título III, artigos
Por sua vez, o artigo 45 do Estatuto do Idoso possibilita ao Ministério Público e ao Poder Judiciário a aplicação de outras medidas como inclusão em programas oficiais ou comunitários de auxilio, orientação e tratamento a usuários dependentes de drogas ilícitas, abrigos em entidades e todas as medidas necessárias para garantir a proteção física e psíquica do idoso.
III. Política de Atendimento ao Idoso: é instituída no título IV, artigos
Para que se dê efetivamente o cumprimento destas normas, é imprescindível que ocorra uma eficiente fiscalização das entidades de atendimento, ficando esta a cargo dos Conselhos dos Idosos, do Ministério Público e da Vigilância Sanitária, sendo que o seu descumprimento poderá gerar diversas penalidades, administrativas ou judiciais, quais sejam multa, advertência, afastamento dos diretores e funcionários, interdição ou fechamento da entidade, e ainda não estão imunes de responsabilização civil e criminal previsto no artigo 64 e seguintes do Estatuto.
IV. O acesso à Justiça: compõe o quarto grupo de direitos do idoso, e para tanto, o legislador criou garantias para o idoso que busca os serviços jurídicos, definidas nos artigos
Entre as atribuições do Ministério Público, a legislação destaca as seguintes: Defender o idoso vítima de negligência, maus tratos, exploração, abuso, crueldade e opressão; intervir obrigatoriamente nas ações de interesse do idoso; instaurar a ação civil pública; atuar como substituto processual; referendar as transações relativas a alimentos para o idoso; instaurar procedimento administrativo e sindicância; requisitar a instauração de inquérito policial; inspecionar entidades de atendimento, públicas e privadas.
V. Dos Crimes contra o idoso: O último grupo de direitos em análise, previstos no Título VI do Estatuto, a partir do artigo 93, do Estatuto do Idoso, trata especificamente de matéria criminal. Estão tipificadas as condutas lesivas aos direitos dos idosos, tendo sido estabelecidas punições que variam de dois meses até o máximo de 12 anos de prisão, dependendo do crime e sua tipificação.
A atenção maior volta-se ao artigo 94 do Estatuto, visto que é o que mais tem chamado à atenção e gerado controvérsias na doutrina e na jurisprudência.
Rege o artigo 94 do Estatuto do Idoso que: “Aos crimes previstos nesta Lei, cuja pena máxima privativa de liberdade não ultrapasse 4 (quatro) anos, aplica-se o procedimento previsto na Lei 9.099 de 29 de setembro de 1995, e, subsidiariamente, no que couber, as disposições do Código Penal e do Código de Processo Penal.”
Observa-se que o Estatuto teria alterado conceito de infração penal de menor potencial ofensivo que era de dois anos e passou a ser de quatro anos. A partir dele, todo delito cuja pena máxima abstrata não ultrapasse quatro anos submeter-se-á ao procedimento previsto na Lei 9.099/95.
O já referido artigo 94 faz a ressalva de que o procedimento da Lei 9.099/95 só será aplicado “aos crimes previstos nesta Lei”, ou seja, aos delitos tipificados no Estatuto do Idoso. Logo, delitos tipificados em outras leis, ainda que possuam pena máxima não superior a quatro anos e sejam praticados contra o idoso, não se submeterão aos moldes da Lei 9.099/95, exceto se a pena máxima não ultrapassar dois anos.
Segundo o artigo
5. Síntese dos direitos dos idosos
Em síntese, eis os principais direitos e garantias assegurados aos idosos, na Lei 10.741/03:
a) Distribuição gratuita de medicamentos e próteses dentárias pelos poderes públicos;
b) Desconto de 50% no ingresso de atividades culturais e de lazer, além de preferência no assento aos locais onde as mesmas estão sendo realizadas;
c) Proibição e limite de idade para vagas de empregos e concursos, salvo os acessos em que a natureza do cargo exigir;
d) Nos contratos novos feitos pelos planos de saúde não poderá haver reajustes em função da idade após os 60 anos;
e) O critério para desempate de concursos será a idade, favorecendo-se aos mais velhos;
f) Idosos com 65 anos ou mais que não tiverem como se sustentar terão direito ao benefício de um salário mínimo;
g) Processos judiciais envolvendo pessoas com mais de 60 anos terão prioridades, nos programas habitacionais para aquisição de imóveis e transporte coletivo urbano e, semi-urbano gratuito para maiores de 65 anos.
6. Conclusão
Ao garantir a realização de direitos fundamentais aos idosos, assim compreendidas as pessoas com mais de 60 anos, o Estatuto do Idoso representa importante contribuição para a formação e o fortalecimento dos laços da cidadania e a valorização da dignidade humana, fundamentos garantidos na Constituição Federal.
Não conseguiremos eliminar de uma só vez, todas as discriminações e violências praticadas contra os idosos, que na pratica representam o futuro das gerações mais jovens, porém, devemos atuar de forma positiva, vencendo barreiras de natureza cultural, e do desconhecimento da população idosa de seus próprios direitos, visando a construção de um espaço onde prevaleça a dignidade humana, exigindo-se ainda, do Estado e da sociedade, ações efetivas voltadas às garantias dos direitos humanos fundamentais das pessoas envelhecidas.
REFERÊNCIA BIOGRÁFICA
CLOVIS BRASIL PEREIRA: Advogado. Especialista em Processo Civil. Mestre em Direito. Professor Universitário. Presidente do Departamento Cultural da OAB/Guarulhos (SP). Coordenador da ESA –Escola Superior da Advocacia, núcleo Guarulhos (SP). Editor responsável do Site Jurídico Prolegis – www.prolegis.com.br . Produtor e apresentador do Programa “Direitos e Deveres – A Cidadania em Ação”, na TV Destaque, Canais 11 e 15, NET, em Guarulhos.