* Felicia Ayako Harada
Trata-se aqui do exercício do direito de preferência que tem o locatário do imóvel na aquisição do imóvel no caso de venda.
Dispõe o art. 27 da Lei 8.245/91 (Lei do Inquilinato):
“Art. 27 – No caso de venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de direitos ou dação em pagamento, o locatário tem preferência para adquirir o imóvel locado, em igualdade de condições com terceiros, devendo o locador dar-lhe conhecimento do negócio mediante notificação judicial, extrajudicial ou outro meio de ciência inequívoca.
Parágrafo único. A comunicação deverá conter todas as condições do negócio e, em especial, o preço, a forma de pagamento, a existência de ônus reais, bem como o local e horário em que pode ser examinada a documentação pertinente.”
O locatário terá 30 dias para manifestar-se sobre a aceitação de maneira clara e integral. Esclareça-se, neste passo, que o Novo Código Civil não alterou disposições da Lei do Inquilinato, porquanto ser esta lei especial, e o prazo de 90
dias lá estabelecido não se aplica em sede de locação de imóveis.
No caso de sublocação do imóvel em sua totalidade, deve exercer o direito de preferência o sublocatário, e, em seguida, ao locatário. Se forem vários os sublocatários, a preferência caberá a todos ou a qualquer deles, se um só for o interessado. No caso de pluralidade de interessados, caberá primeiro ao mais antigo, e, se na mesma data, ao mais idoso.
O direito de preferência não alcança os casos de perda da propriedade ou venda por decisão judicial, permuta, doação, integralização de capital, cisão, fusão em incorporação.
Também não há que se falar em direito de preferência, nos contratos firmados a partir de 1º de outubro de 2001, nos casos de constituição de propriedade fiduciária e de perda da propriedade ou venda por quaisquer forma de realização de garantia, inclusive, por leilão extrajudicial, devendo esta condição constar expressamente em cláusula contratual específica, destacando-se das demais por sua apresentação gráfica. (Este dispositivo que é o parágrafo único do art. 32 foi acrescentado pela Lei nº 10.931, de 02/08/2004.
O direito de preferência não alcança estes casos anotados pela lei (o rol é taxativo, não exemplificativo) porque não há vontade do locador na venda ou porque a transmissão não é onerosa (nos casos de doação).
Parece-me, entretanto, mais justo, que nos casos acima, o inquilino, deveria ter reconhecido o seu direito de preferência, pois, a venda judicial, o leilão extrajudicial, não deixam de ser, em última análise, um ato oneroso, e, não raras vezes, o inquilino tenha interesse em permanecer no imóvel.
A lei socorre o inquilino preterido. Diz a lei específica em seu art. 33:
“Art. 33 – O locatário preterido no seu direito de preferência poderá reclamar do alienante as perdas e danos ou, depositando o preço e demais despesas do ato de transferência, haver para si o imóvel locado, se o requerer no prazo de seis meses, a contar do registro do ato no Cartório de imóveis, desde que o contrato de locação esteja averbado pelo menos trinta dias antes da alienação junto à matrícula do imóvel.”
a) contrato de locação averbado na matrícula do imóvel junto ao seu respectivo Cartório de Registro de Imóveis;
b) contrato de locação não averbado.
Se o contrato está devidamente averbado, estamos diante de um direito real. E, dessa forma, o locatário preterido tem direito, além das perdas e danos, de haver para si o imóvel locado, através da ação de adjudicação, pagando o preço e demais despesas de transferência, dentro do prazo de seis meses do ato e, desde que, o contrato de locação tenha sido averbado pelo menos 30 dias antes da alienação do imóvel. Como o objetivo é o desfazimento do negócio, todos os participantes da alienação do imóvel devem figurar no pólo passivo da ação.
Se o contrato de locação não estiver averbado na matrícula do imóvel, estaremos diante do direito pessoal. Conseqüentemente, o locatário preterido tem direito a perdas e danos. A ação é contra o locador, não envolvendo os demais participantes. O locatário deve comprovar que tinha disponibilidade financeira para pagar o preço, em igualdade de condições ajustadas com o adquirente e o conseqüente prejuízo que sofreu ao ser preterido na venda. Estamos diante de uma reparação civil devida pelo locador ao locatário. Assim, o prazo para exercer este direito prescreve em três anos, conforme o item V do § 3º do Art. 206 do Código Civil.
Por derradeiro, se houver condomínio no imóvel, o condômino tem preferência sobre o locatário na aquisição do imóvel.
Volto a afirmar , na efetivação de qualquer negócio jurídico, o contrato é de fundamental importância e deve se revestir de toda a formalidade necessária para a sua validade.
REFERÊNCIA BIOGRÁFICA
FELICIA AYAKO HARADA: Sócia fundadora da Harada Advogados Associados. Juíza arbitral pela Câmara do Mercosul. Membro do Instituto de Direito Comparado Brasil-Japão-IDCBJ e do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos-Cepejur.