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Reencontrar a infância

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CRÔNICA:  * João Baptista Herkenhoff  –

 

Reencontrar a infância é descobrir o menino que vive dentro de nós. Esse reencontro exige um despojamento. Libertar-se de amarras.

Grilhões nos prendem: agenda, compromissos de mil espécies, coisas a comprar, projetos de “ter”. Ter cada vez mais, como se a vida fosse uma conta-corrente. Mais importante é “ser”: ser falho, ser autêntico, ser pessoa, ser feliz.

Fernando Sabino e Rubem Braga foram sócios numa editora que fundaram e afundaram. Já pelo nome escolhido para a casa – Editora Sabiá, podemos concluir que o projeto era mais poético do que econômico. O sabiá é uma ave especialmente amada pelos poetas: "minha terra tem palmeiras onde canta o sabiá – as aves que aqui gorjeiam não gorjeiam como lá" (Gonçalves Dias); "vou voltar para o meu lugar – e é lá – que eu hei de ouvir cantar – uma sabiá" (Chico Buarque).

Fernando Sabino, bem mineiro, estava preocupado com compromissos que se acumulavam sem as competentes providências. Rubem Braga desanuviou a mente do companheiro de aventura editorial: “Desde quando temos de resolver todas as coisas, Fernando”?

O mundo precisa mais de sonho do que de pragmatismo. Esse povo que faz guerra, que joga bomba em cidades matando populações civis, não pertence ao grupo que sonha. Esse povo justifica sua conduta em argumentos pragmáticos.

Tendo completado 71 anos dias atrás, ando à procura da infância que deixei em Cachoeiro de Itapemirim há sessenta anos atrás. Convido os leitores que tenham mais de trinta anos a fazer esse mesmo caminho de volta. No itinerário de regresso ao passado, todos nos convenceremos, tenho certeza, de que foi essencial, e não meramente acidental, o conselho de Jesus Cristo para que fôssemos como as criancinhas.

Um dos expedientes que estou usando para reencontrar a infância consiste em estudar alemão. Tenho uma professora particular – Gisele Cervare, que me ensina com competência, paciência, didática. As aulas de alemão constituem para mim uma volta à infância. Lembro-me de meu Pai, cuja língua materna era o alemão e que, até morrer, falou português com sotaque germânico. Lembro-me dos acordes e da letra da canção “Noite Feliz”, que eu cantava em alemão e que alegrava, quer em português, quer em alemão, os Natais em nossa casa.

Escrevo esta página olhando para o mar, na Praia da Costa, uma das mais belas do Espírito Santo. Contemplo o mar e novamente volto à infância, recordando os Verões passados em Marataíses, praia localizada no sul capixaba.

Referências de tempo e de espaço são referências existenciais. Nós perdemos o leme da vida quando nos desgarramos do espaço e apagamos as marcas do tempo. Nós nos integramos psicologicamente quando o tempo volta à memória e o espaço da infância revive em nossa retina.

João Baptista Herkenhoff é Livre-Docente da UFES – professor do Mestrado em Direito, e escritor. E-mail: jbherkenhoff@uol.com.br Homepage: www.joaobaptista.com.br

 

 

 

 


Publicadas três novas súmulas da Turma Nacional de Uniformização

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DECISÃO:  Foram publicadas no Diário da Justiça desta quarta-feira (20) as súmulas n. 37, 38 e 39 da Turma Nacional de Uniformização da Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais (TNU). A súmula 37 refere-se à pensão por morte devida ao filho até os 21 anos; a de n. 38 trata da utilização da tabela de cálculos da Seção Judiciária de SC, e a 39 refere-se a juros de mora em ações contra a Fazenda Pública que versem sobre diferenças nos vencimentos de servidores públicos. As súmulas foram publicadas na Seção I do DJ, p. 798.

A TNU funciona junto ao Conselho da Justiça Federal (CJF), sendo presidida pelo coordenador-geral da Justiça Federal, ministro Fernando Gonçalves, que nesta data (20/6) encerra seu mandato, o qual passará a ser exercido pelo ministro Gilson Dipp. Compete à Turma harmonizar a jurisprudência dos Juizados Especiais Federais em nível nacional, decidindo sobre os casos de divergências entre decisões das turmas recursais de diferentes Regiões ou entre essas e a jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Íntegra das novas súmulas

SÚMULA N. 37

A pensão por morte, devida ao filho até os 21 anos de idade, não se prorroga pela pendência do curso universitário.

SÚMULA N. 38

Aplica-se subsidiariamente a Tabela de Cálculos de Santa Catarina aos pedidos de revisão de RMI – OTN/ORTN, na atualização dos salários de contribuição.

SÚMULA N. 39

Nas ações contra a Fazenda Pública, que versem sobre pagamento de diferenças decorrentes de reajuste nos vencimentos de servidores públicos, ajuizadas após 24/08/2001, os juros de mora devem ser fixados em 6% (seis por cento) ao ano (art. 1º-F da Lei 9.494/97).


FONTE:  STJ, 21 de junho de 2007

A justiça a serviço da impunidade

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OPINIÃO: * Siro Darlan –  

Em 1993 uma pesquisa realizada pelo Instituto Osvaldo Cruz constatou que em 500 notícias de crimes praticados contra crianças no Rio de Janeiro apenas 8 haviam sido denunciadas e dessas somente uma chegara à sentença judicial com a absolvição do agente criminoso por falta de provas do abuso praticado contra a criança.

Essa noticia repercutiu no aparelho policial e no Ministério Público que reagiram. A secretaria de segurança criou uma Delegacia Especializada em crimes contra crianças e adolescentes a DECAV, e o Ministério Público criou uma Promotora Especial para acompanhar essa modalidade de crimes praticados contra inocentes e indefesas criaturas.

O resultado, embora ambos os órgãos criados necessitem de melhor aparelhamento, não podia ter sido outro, reduziu a impunidade dos agentes criminosos. Vários foram presos e respondem a processos e o trabalho da DECAV já é reconhecido, tendo se transformado num importante instrumento de combate a violência contra crianças.

No início do ano o ISP – Instituto de Segurança Pública, órgão vinculado á Secretaria de Segurança divulgou uma pesquisa elaborada com base nos inquéritos policiais distribuídos no Estado do Rio de Janeiro esclarecendo que dentre os crimes praticados com participação de crianças seja como agentes seja como vítimas, 90,8% aparecem como vítimas e em apenas 9,2% são agentes.

A pesquisa revela dados que desmistificam a falsa idéia passada à sociedade de que há uma significativa participação de jovens na criminalidade e aponta na direção da necessidade de criação de outros mecanismos de proteção à criança e ao adolescente.

No Dia Nacional de Combate à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes foi reivindicado pelos movimentos sociais a necessidade de mudança da postura machista e insensível de alguns magistrados que se colocam na posição de julgadores das vítimas quando elas são atingidas por abusos sexuais praticados por adultos, e esse é mais um elemento patrocinador da impunidade.

Alguns casos foram pontuados e merecem uma profunda reflexão ante o despreparo de alguns julgadores que repetem jargões populares, como o caso de um juiz que ao ouvir uma adolescente de 15 anos vítima de estupro lhe perguntou se ela havia atingido o orgasmo. E outros que atribuem à vítima, por estar trajando essa ou aquela vestimenta, a responsabilidade de provocar os instintos do criminoso e conduzido à prática delituosa. E, ainda caso de um juiz que ao tomar conhecimento de um atentado violento ao pudor praticado contra uma adolescente de 13 anos, desqualificou a vítima afirmando que não se tratava de uma adolescente e sim de uma prostituta. Afirmou o magistrado como motivação para a absolvição que “o acusado está nitidamente na figura de cliente de alguém que se oferece como prostituta em via pública”.

E ainda o caso de uma juíza criminal que rejeitou o pedido de prisão preventiva de um Pai de Santo que havia estuprado em seu terreiro uma criança de dez anos, alegando em seu despacho que deixava de deferir a prisão do provável criminoso porque “não se pode conferir total credibilidade a versão de M face a seu histórico familiar e lamentável, repita-se, desvirtuamento sexual e moral”. Vale lembrar que a vítima tinha apenas 10 anos.

Diante desses poucos exemplos citados dentre muitos casos de despreparo para a função de julgador desses crimes contra crianças e adolescentes, evidencia-se a necessidade de especialização e melhor aparelhamento da máquina judiciária visando evitar que tantas crianças continuem sendo vítimas de violência e os acusados continuem sem punição.

Já há exemplos em outros estados da federação de instrumentos eficazes como a criação de Varas Criminais Especializadas no combate à criminalidade contra crianças e adolescentes. Essas Varas Especializadas são dotadas de equipe técnica com médicos, assistentes sociais, psicólogos, salas especiais para o chamado depoimento sem danos, que evita que a vítima seja obrigada a repetir a violência sofrida diante de vários servidores diferentes. Serviços integrados do Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Policia e Instituto Médico Legal que abreviam o processo e livram a pequena vítima da repetição exaustiva de sua triste história.

Levamos à superior administração do Tribunal de Justiça a informação da gravidade dessa modalidade de violência, que consideramos a “mãe” de todas as outras formas de criminalidade, já que uma criança violentada certamente repetirá essa prática e se transformará em agente da mesma violência que a vitimou. Imploramos a urgente necessidade de se criar mecanismos de defesa e proteção à infância, com prioridade absoluta, como impõem a norma constitucional e aguardamos a resposta afirmativa uma vez que acreditamos na sensibilidade e no compromisso do Presidente Murta Ribeiro de uma administração participativa e construída para melhor atendimento dos jurisdicionados.

AUTOR:  Siro Darlan,   Desembargador do TJRJ

FONTE:  TJ-RJ

Morte do empregado suspende prazo prescricional

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DECISÃO: TST – A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve o entendimento, firmado em decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR), mediante aplicação subsidiária de norma do direito civil, estabelecendo a suspensão do prazo para prescrição de direito do trabalho, em razão da existência de herdeiros menores, quando falecido o trabalhador.

O caso refere-se a uma ação movida pelo espólio de um vigilante, contratado por uma empresa para prestar serviços em uma agência do Banco do Brasil, no interior do Paraná. Três anos após a rescisão contratual, a viúva e os filhos do trabalhador – incluindo três menores – ajuizaram, em nome do espólio, ação contra a Ondrepsb – Serviço de Guarda e Vigilância Ltda. e o Banco do Brasil, reclamando o pagamento de aviso prévio, horas extras, intervalo intrajornada e outras diferenças salariais.

A sentença da 3ª Vara do Trabalho de Maringá (PR) afastou as preliminares de ilegitimidade de parte (levantada pelo Banco do Brasil) e as relativas à prescrição bienal, argüida por ambos os reclamados. E condenou a empresa de vigilância e o banco, subsidiariamente, ao pagamento de horas extras e outras diferenças salariais, determinando a divisão do crédito apurado em cotas iguais entre os dependentes. As partes destinadas aos menores deveriam ser depositadas em caderneta de poupança até a sua maioridade.

Daí em diante, a empresa insistiu, em sucessivos recursos, na tentativa de reverter a sentença – seja em relação às diferenças salariais concedidas, seja na questão relativa à prescrição bienal. O TRT da 9ª Região, além de manter a sentença inicial, aplicou à Ondrepsb multa de 1% sobre o valor da causa, em face da interposição de embargos de declaração tidos como protelatórios.

Inconformada, a empresa apelou ao TST, na tentativa de reverter a decisão do regional. Sustentou, inicialmente, não serem aplicáveis as normas do Código Civil relativas à prescrição em razão da menoridade dos herdeiros, já que a CLT trata expressamente da prescrição quanto ao menor, protegendo apenas o empregado menor de idade, e não o herdeiro menor.

Após considerar que a controvérsia deveria ser solucionada à luz do Direito Civil, o ministro Aloysio Corrêa da Veiga, relator do recurso, reporta-se ao fato de que, quando do falecimento, o empregado deixou, dentre outros filhos, dois menores de 16 anos, e que eventuais direitos trabalhistas passaram ao domínio e posse da herança transmitida aos herdeiros. E conclui que o prazo prescricional, que teve seu curso iniciado com a extinção do contrato de trabalho, foi suspenso com a morte do ex-empregado, e só recomeçaria a ser contado a partir da maioridade civil dos herdeiros, sendo correta, portanto, a decisão do TRT. Ao aprovar o voto do relator, por unanimidade, a Sexta Turma negou provimento ao recurso da empresa, mantendo a condenação inicial. (RR-3676/2003-661-09-00.6)

 


FONTE:  TST, 20 de junho de 2007

Dano Moral: Ocorrência e Valoração

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* Márcio Archanjo Ferreira Duarte –

R E S U M O

Este estudo objetivou compreender e entender os requisitos e pressupostos de como se viabiliza a ocorrência e a valoração do dano moral, na seara da responsabilidade civil. O sensato conhecimento de tais elementos se faz tão necessário para a correta punibilidade estado-judiciária, que sem os quais, as pretensões jurisdicionadas, devidamente tuteladas, se tomariam de completo desvanecimento na credibilidade da Segurança Jurídica. Pois, o cerne do presente trabalho é vislumbrar um paradigma, um parâmetro que delineie o limite máximo e o mínimo do Jus Puniendi nas questões de responsabilidade civil, afetas a uma possível e subjetiva compensação pecuniária por dano a um bem extrapatrimonial, juridicamente tutelado. Assim, buscou-se o aparecimento do referido instituto do Dever de Reparar o Dano Moral desde os primórdios dos tempos, a partir da era em que surgiu a escrita. Igualmente, delineou-se sua origem , conceito e objetivos de tal instituto nos dias atuais. Cotejaram-se divergências doutrinárias e jurisprudenciais, culminando na sua mais adeqüada caracterização. Pinçou-se também o entendimento deste instituto em ordenamento jurídico de outros países, na seara do Direito Comparado. Por fim, demonstrou-se o quão demandado está sendo hoje, o dano moral, pela sociedade no Poder Judiciário.

Palavras-chave: Responsabilidade Civil. Dano Moral. Ocorrência. Valoração.

A B S T R A C T

This study aimed at to comprehend and to understand the requirements and presuppositions of as it is made possible the occurrence and the worth of the moral damage, in the wheat field of the civil liability. The wise knowledge of such elements is made so necessary for the correct state-judiciary punishability, that without the ones which, the pretensions jurisdicionadas, properly protected, they would be taken of complete fading in the Juridical Safety´s credibility. Because, the duramen of the present work is to glimpse a paradigm, a parameter that delineates the Jus Puniendi´s maximum limit andminimum in the civil liability subjects, you affect to a possible and subjective financial compensation for damage to a asset extrapatrimonial, juridically protected. So, seeked the emersion of the referred institute of the Duty of Repairing the Moral Damage from the origins of the times, starting from the era in that the writing appeared. Equally, it was delineated sweats origin, concept and objectives of such institute in the current days. Doctrinaire divergences and jurisprudenciais were compared, culminating in his/her more suitable characterization. Gather also the understanding of this institute in legal system of other countries, in the wheat field of the Compared Right. Finally, the was demonstrated how disputed is being today, the moral damage, for the society in the Judiciary Power.

Keywords: Civil liability. Moral damage. Occurrence. Worth.

 


 

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem o objetivo de analisar a ocorrência e a valoração do dano moral, dentro da perspectiva da Reparação Civil, quando diante de um efetivo prejuízo causado a um bem juridicamente tutelado – no caso em tela, extrapatrimonial – há a obrigatoriedade de ser compensado pelo causador do respectivo dano diretamente ao prejudicado, em razão da proteção aos direitos individuais fundados na vigente Constituição da República Federativa do Brasil, ou seja, direito à indenização, quando a ofensa é, especialmente, à personalidade da pessoa. Sendo tal direito à reparação pelo dano, inaugurado expressamente sob o Magno Art. 5º, nos seus incisos V e X.

Expondo-se a problemática que cerca o tema em questão, especificamente no tocante ao referido título deste trabalho, qual seja, a ocorrência e a valoração do dano extrapatrimonial, percebe-se na prática forense que do mesmo não se está possibilitando a completa integração na compreensão de todos os juristas, principalmente na compreensão dos demais cidadãos.

A indenização por dano moral, considerada tanto na ocorrência quanto na valoração deste, aparenta estar, de uma certa forma, velada pelo Direito Clássico, eis que seus estudiosos o conheceram antes da sua renovação jurídico-social dada pela atual Constituição Federal (1988).

Tal corrente clássica sempre perquiriu pela reparação de dano, mas somente quanto ao patrimonial.

Porém, foi quando alguns operadores do Direito, mais modernos, experimentaram perseguir pela Tutela Jurisdicional também quanto ao dano extrapatrimonial, que passou este a tomar vulto no ordenamento jurídico brasileiro, e assim, o legislador brasileiro se viu na iminência de inscrevê-lo, mormente para a satisfação da sociedade, na vigente Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, não obstante já ter sido ilustrado em tempos idos, como se verá adiante.

Mas os operadores do Direito e magistrados que se graduaram antes da Constituição Federal de 1988, ainda parecem relutar quanto ao entendimento da caracterização do dano moral, elementar no Magno Art. 5º, incisos V e X.

O que não deixa de ser compreensível, mas não aceitável, pois essas gerações de profissionais, que se formaram antes da Constituição Federal de 1988, não tiveram outrora qualquer alusão expressa deste direito em legislações anteriores, de forma geral, provavelmente devido pela constante mudança de forma e regime de governo, o que deveras dificultou um aprimoramento do ordenamento jurídico brasileiro. Contudo como profissionais desta dinâmica ciência social, reaprendizagem e atualização são imprescindíveis.

Assim, do presente estudo, no Capítulo 1, explana-se, de forma sucinta, o Dever – em sua segunda forma – de indenizar o dano, desde seu aparecimento nos primeiros diplomas legais de que se tem registro, na história da humanidade, até as leis que o prescrevem, que o determinam, nos dias contemporâneos. Destarte, concluindo, pela concepção do Dever de indenizar como um dos ramos do Dever lato sensu, nos dias atuais. Ou seja, sabe-se que na existência da raça humana, onde concentrada, compartilhando um mesmo meio, necessário é a determinação de Direitos e Deveres. Assim, todo indivíduo, dentro de uma sociedade, tem Direito e tem Dever. Enfocando o Dever, neste trabalho, eis compreendendo Obrigação, como um Dever primário, e Responsabilidade, como um Dever secundário. Sendo este último, aqui aprofundado.

No Capítulo 2, suscitam-se as divergências doutrinárias e jurisprudenciais quanto ao entendimento ainda não pacificado das causas, dos fatos, que legitimam a ocorrência do dano moral para ser judicialmente tutelada, bem como, quanto às discordâncias referentes ao quantum, ao valor que deve ser padronizado para os diversos tipos de danos morais. Possibilitando, assim, pelo entendimento pleno quanto à caracterização de tal ofensa a outrem, a isonomia de tratamento e de Tutela recebida, dentre todas as lides levada ao Poder Judiciário, com relação ao dano moral.

No Capítulo 3, pinçam-se ordenamentos jurídicos internacionais, sob o prisma do Direito Comparado, para auxiliar na perfeita compreensão da ocorrência e da valoração do dano moral, por intermédio da acepção de tantas outras nações que se valem para Tutelar sobre o Dever de indenizar o dano.

No Capítulo 4, se traz a conseqüência da notoriedade do respectivo direito à reparação por dano moral, resultando assim em uma intensa demanda da sociedade, incluindo até os menos letrados, no Poder Judiciário brasileiro.

1. CAPÍTULO 1

Do Dever de Reparar o Dano

1.1. Lineamentos Históricos

É importante contextualizar onde se deu, historicamente, o aparecimento do Dever de reparar o dano, num sentido amplo, ou seja, tanto da obrigação como da responsabilidade. Para tanto, regressar-se-á aos anos primórdios da sociedade, folheando o tempo, até os dias contemporâneos, tanto em nosso ordenamento jurídico, como no Direito Comparado.

Voltando aos idos tempos, ante a era cristã, quando surgiu a primeira grande codificação normativa da qual se tem registros, seja, ao século XXI a.C., com o chamado Código de Hamurabi, com 282 Artigos redigidos em caracteres cuneiformes, donde muitos de seus dispositivos legais abrangem as responsabilidades civis de reparar um ocasionado dano a outrem.

Extraindo alguns dispositivos legais do retro referido diploma egípcio, já traduzido (1), se vê a seqüência de Artigos, pois um completa o outro:

Art. 22. Se um homem cometeu um assalto e foi preso, deverá ser morto.

Art. 23. Se o assaltante não foi preso, o assaltado declarará diante de deus todos os objetos roubados; a cidade e o governador, em cuja terra e distrito foi cometido o assalto, o compensarão por todos os objetos perdidos.

Art. 24. Se o que se perdeu foi uma vida, a cidade e o governador pesarão uma mina de prata para sua família. [g.]

Ainda no Código de Hamurabi, em seu Artigo 53, determina:

Se um homem foi negligente na fortificação do dique de seu campo ou não fortificou o dique de seu campo e abriu-se um rombo e as águas carregaram um terreno irrigado, o homem em cujo dique se abriu o rombo indenizará pelo grão que se perdeu. [g.]

Verifica-se que já naquele tempo, quase 5.000 anos atrás, a lei determinava o dever de compensar, de indenizar, caso houvesse alguém ocasionado um dano a outrem.

Na primeira citação acima, o Estado deve indenizar quando houver sua falha, na sua obrigação de prover a segurança pública. Assim, resultando na sua responsabilidade civil de compensar o dano.

Na segunda citação, o dever de indenizar se perfaz pelo cidadão que danificou um bem de um concidadão seu.

Outra grande compilação de leis, igualmente histórica de registros na antigüidade, porém mais aproximada do fim da era pré-cristã, foi a renomada LEI DAS XII TÁBUAS, escrita em 451 – 450 a.C., que também aludiu ao Dever de reparar um dano a outrem. Têm-se registros de que a escrita original se perdeu após o incêndio de Roma, em 390 a.C. O que existe hoje são fragmentos e citações

por outros autores, que demonstram haverem sido as Doze Tábuas redigidas em latim:

Tábua VIII (De delictis – Dos delitos)

[…]

VII- Cabe ação de dano contra aquele que faz pastar o seu rebanho no campo de outrem.

[…]

X- Aquele que causa incêndio num edifício, ou num moinho de trigo próximo de uma casa, se o faz conscientemente, seja amarrado, flagelado e morto pelo fogo; se o faz por negligência, será condenado a reparar o dano; se for muito pobre, fará a indenização parceladamente. (2)

Outro histórico documento jurídico, de origem hindu, foi o CÓDIGO DE MANU, escrito em sânscrito, entre 1.300 e 800 a.C., contendo 12 livros, também previa a obrigação de reparar o dano, neste visto mais claramente quanto ao prejuízo extrapatrimonial, como v.g. em seu Art. 125, do Livro Oitavo: “Por meios conforme ao dever moral, por demanda, pela astúcia, pela ameaça e, enfim, pelas medidas violentas, pode um credor se fazer pagar da soma que lhe devem.”

Os históricos códigos citados acima, foram alguns de muitos outros que aduziram a obrigação de reparar um dano juridicamente tutelado, mas que por não ser a especialidade deste tema, a História do Direito, nos ateremos tão-somente aos já mencionados, ressalvando a possibilidade de outros mencionarem também sobre a indenização por dano moral, modernamente falando.

Em suma, saltando para nossa era, porém ainda não em tempos contemporâneos, tem-se a indenização por dano moral já integrada em nosso ordenamento jurídico de forma tácita, já existindo antes da Constituição Federal de 1988, em disposição do Código Civil de 1916, no seu Art. 159, caput. De forma bem abrangente, o revogado Código (1916) determinava:

Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

No regime militar, surgiu a Lei de Imprensa, com a figura da indenização por delito de imprensa, já de forma expressa, porém especial, quando do Art. 49, Lei nº. 5.250/67:

Art. 49. Aquêle que no exercício da liberdade de manifestação de pensamento e de informação, com dolo ou culpa, viola direito, ou causa prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar: (sic)

I – os danos morais e materiais, nos casos previstos no art. 16, números II e IV, no art. 18 e de calúnia, difamação ou injúrias;

Aí estavam os primeiros traços do dano moral, ainda que de forma geral e tácita, como também especial e expressa.

Somente a Constituição Federal de 1988 veio definir de forma geral e expressa, em seu Magno Art. 5º, incisos V e X:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[…]

V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenizaçãopor dano material, moral ou à imagem;

[…]

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; [g.]

Em 1990, com o advento do Código de Defesa do Consumidor – CDC, como é mais conhecido, no corpo da Lei nº. 8.078/90, regulou-se o Dever de indenizar pelo dano sofrido, atinente ao plano do Direito Consumerista.

Em seu Art. 6º, Incs. VI e VII, o CDC aduz:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

[…]

VI – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

VII – o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados; [g.]

Um exemplo de que a Teoria do Risco estaria sendo absorvida pelo ordenamento jurídico brasileiro, já no bojo dos Arts. 12 e 14, caputs, CDC:

 Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. [g.]

O vigente Código Civil (2002) aduz o aludido tema, tanto da reparação por dano, bem como quanto da Teoria do Risco, quando do seu Art. 927 determina:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Percebe-se que ainda que o atual Código Civil seja posterior à Constituição Federal em vigor, persistiu o legislador brasileiro em obscurecer, à visão do jurista mais tradicional, o entendimento do dano a ser reparado. Pois, não especificou o referido dispositivo, em parágrafos como normalmente se faz. Tampouco, estabeleceu lei que posteriormente teria o condão de regulamentar tais situações que pudessem ensejar a pretensão de obter indenização por dano. Assim, necessário integrar a interpretação dos dispositivos legais atinente ao Dever de indenizar o dano, no atual Código Civil – combinado com a Lei nº. 8.078/90 (CDC) – com o Magno Art. 5º, e seus incisos V e X. Pelo que, deve-se inferir que será todo e qualquer dano a ser reparado em caso de ofensa ao direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, sem olvidar da honra, da intimidade e outros direitos mais atinentes à personalidade pessoa. Bem como ajustado-se todos aos remissos Arts. 186 e 187, ambos do Código Civil:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

1.2. Origem, Conceito e Objetivos nos dias atuais

O Dever de reparar um dano extrapatrimonial, mais chamado como dano moral, advém da seara da Responsabilidade civil.

Consagra a máxima jurídica – oriunda do direito romano – ubi societas ibi jus, que: “onde está a sociedade, aí está o direito”. Assim, quando se diz: Direito, está se referindo à ciência jurídica que estuda e determina os direitos e deveres de cada um indivíduo dentro de uma sociedade.

Logo, na sociedade, há direitos e deveres. Referindo-se ao adágio jurídico, notório de todos os juristas: “O direito de um começa, quando o direito de outro termina”.Assim, por ilação, o deveres de um começam, quando seus direitos terminam.

O Dever, lato sensu, cuja parte secundária é foco deste trabalho, desmembra-se, primariamente, em Obrigação e, secundariamente, em Responsabilidade. Da Obrigação contraída e não cumprida, nasce a Responsabilidade. Ou seja, a Responsabilidade é uma punição legal, por não haver sido cumprida a Obrigação. Deste modo, se o Dever de uma Obrigação restou inobservado, surge como castigo legal, o Dever da Responsabilidade. (3)

A Responsabilidade, por sua vez, desmembra-se em Responsabilidade penal e em Responsabilidade civil, quando impingida de forma geral. Porém, há ainda um tercium genus, ou seja, um terceiro gênero, qual seja, a Responsabilidade administrativa, contudo, mais aplicada especificamente, como no caso de Obrigação não cumprida quando do Dever de servidores públicos.

No presente trabalho, aborda-se a Responsabilidade civil.

CARLOS ROBERTO SARAIVA ensina que: "Responsabilidade civil é, assim, um dever jurídico sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário." (4)

CÁIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA ensina que:

Na responsabilidade civil está presente uma finalidade punitiva ao infrator aliada a uma necessidade que eu designo de pedagógica, a que não é estranha a idéia de garantia para a vítima, e de solidariedade que a sociedade humana deve-lhe prestar. (5)

Inicialmente, a Responsabilidade civil se depreendia da chamada Teoria da Culpa, sendo depois admitida a Teoria do Risco. Assim, têm-se duas espécies: a Responsabilidade civil subjetiva e a Responsabilidade civil objetiva, respectivamente.

São os requisitos intrínsecos da Responsabilidade civil subjetiva: 1) ato ilícito; 2) dano; 3) nexo causal; e 4) culpa (lato sensu).

São requisitos intrínsecos da Responsabilidade civil objetiva: 1) ato ilícito; 2) dano; e 3) nexo causal.

Pela Teoria da Responsabilidade civil subjetiva, é imprescindível a comprovação do elemento culpa para que haja o Dever secundário da Responsabilidade, ou seja, o Dever de indenizar.

Segundo CARLOS ROBERTO SARAIVA:

Em face da teoria clássica, a culpa era fundamento da responsabilidade. Essa teoria, também chamada teoria da culpa, ou "subjetiva", pressupõe a culpa como fundamento da responsabilidade civil. Em não havendo culpa, não há responsabilidade.

Diz-se, pois, ser ´subjetiva´ a responsabilidade quando se esteia na idéia de culpa. A prova da culpa do agente passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável. Dentro dessa concepção, a responsabilidade do causador do dano somente se configura se agiu com dolo ou culpa. (6)

A Teoria da Culpa, no Direito Brasileiro, originou-se da Lei Aquiliana do Direito Romano, sendo esta conhecida como a primeira lei que regulamentou a questão da Responsabilidade civil, avocando o elemento culpa como sua característica. Também conhecida como Teoria Aquiliana ou Teoria Clássica.

Cita-se o ensinamento de José de Aguiar Dias:

É na Lei Aquília que se esboça afinal, um princípio regulador de reparação do dano. Embora se reconheça que não continha ainda uma regra de conjunto, nos moldes do direito moderno, era, sem nenhuma dúvida, o germe da jurisprudência clássica com relação à injúria, e fonte direta da

moderna concepção da culpa aquiliana, que tomou da Lei Aquília o seu nome característico. (7)

No Direito Brasileiro, com base na lei romana, fôra adotada a Teoria da Culpa, expressamente aduzida no Art. 159 do revogado Código Civil brasileiro de

1916, a conduta culposa do agente era pressuposto para configurar o Dever de indenizar:

Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

    A verificação da culpa e a avaliação da responsabilidade regulam-se pelo disposto neste Código, arts. 1.518 a 1.532 e 1.537 a 1.553.

[…]

Foi com a Revolução Industrial, difundida a partir de 1845 na Inglaterra, com reflexos no Brasil somente 1930, que os legisladores passaram a analisar melhor a questão subjetiva da Responsabilidade civil, pois com o aumento de acidentes de trabalho, pela inserção da própria industrialização e com ela, maquinários diversos, assim, com a dificuldade do empregado demonstrar a culpa do empregador no acidente, é que passou a se questionar a eficiência da Teoria da Culpa, passando o legislador brasileiro a procurar sanar tal adversidade jurídica. Foi assim, que, aos poucos, a Teoria da Culpa foi sendo substituída pela Teoria do Risco, ou seja, a Responsabilidade civil subjetiva foi corolariamente substituída pela Responsabilidade civil objetiva.

Pela Teoria da Responsabilidade civil objetiva, também conhecida como Teoria do Risco, que passou a ser adota pela legislação brasileira, principalmente com o advento do então conhecido Código de Defesa do Consumidor – Lei nº. 8.078/90 – e com o advento do vigente Código Civil (2002), o elemento culpa foi desconsiderado para a caracterização do dano.

Nesse diapasão, entende RUI STOCCO:

A insatisfação com a teoria subjetiva, magistralmente posta à calva por Cáio Mário, tornou-se cada vez maior, e evidenciou-se a sua incompatibilidade com o impulso desenvolvimentista de nosso tempo. A multiplicação de oportunidades e das causas de danos evidenciaram que a

responsabilidade subjetiva mostrou-se inadequada para cobrir todos os casos de reparação. (8)

Destarte, a Teoria do Risco consistiu em considerar que toda pessoa que exerce uma atividade, assume o risco de dano a outrem, obrigando a repará-lo ainda que isenta de culpa (lato sensu), como corroborou a ponderação de CARLOS ROBERTO GONÇALVES:

Uma das teorias que procuram justificar a responsabilidade objetiva é a teoria do risco. Para esta teoria, toda pessoa que exerce alguma atividade cria um risco de dano para terceiros. E deve ser obrigada a repará-lo, ainda

que sua conduta seja isenta de culpa. A responsabilidade civil desloca-se da noção de culpa para a idéia de risco, ora encarada como ´risco-proveito´, que se funda no princípio segundo o qual é reparável o dano causado a outrem em conseqüência de uma atividade realizada em benefício do responsável (ubi emolumentum, ibi onus). (9)

Robusteceu a referida Teoria da Responsabilidade civil objetiva, o entendimento de SÍLVIO RODRIGUES:

Na responsabilidade objetiva a atitude culposa ou dolosa do agente causador do dano é de menor relevância, pois, desde que exista relação de causalidade entre o dano experimentado pela vítima e o ato do agente, surge o dever de indenizar, quer tenha este último agido ou não culposamente.

A teoria do risco é a da responsabilidade objetiva. Segundo essa teoria, aquele que, através de sua atividade, cria risco de dano para terceiros deve ser obrigado a repará-lo, ainda que sua atividade e seu comportamento sejam isentos de culpa. Examina-se a situação, e, se for verificada, objetivamente, a relação de causa e efeito entre o comportamento do agente e o dano experimentado pela vítima, esta tem direito de ser indenizada por aquele. (10)

Foi assim que o vigente Código Civil (2002) abarcou a Teoria do Risco, conforme aludiu CÁIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA:

O Projeto do Código Civil de 1975 (Projeto 634-B) absorveu a doutrina e estabeleceu, no art. 929, parágrafo único: Todavia, haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para o direito de outrem.

A tendência manifesta dos dois projetos de reformulação de nosso direito privado faz prever que, de iure condendo, a teoria do risco encontrará abrigo em norma genérica de nosso direito positivo. (11)

Ultrapassada a questão quanto a origem, conceito e objetivos do dano extrapatrimonial, ou seja, o dano moral, necessário a partir, visualizar as divergências quanto a ocorrência do dano moral e sua real caracterização para a devida ponderação de valores que compensarão o prejuízo experimentado.

2. CAPÍTULO 2

O Dano Moral

2.1.Divergências doutrinárias e jurisprudenciais

Atualmente, não há qualquer amparo legal que se valha na prática quando ocorrerá o dano moral, tampouco em que base se estimará o seu valor para a justa compensação do bem juridicamente tutelado pelo qual, o ofendido deva ser ressarcido do dano, estabelecendo-se assim um paradigma.

Por tal lacuna, a confusão chega a tanto, que surgiu atualmente, oriundo da massa jurista, a expressão “indústria do dano moral”, ou seja, sem que estejam perfeitamente compreendidos os pressupostos do dano moral, uma grande fração de juristas que se graduaram antes da Constituição Federal de 1988, quando na defesa da não aceitação do dano extrapatrimonial, argumenta suas teses sob a retro citada expressão para derrubarem, na maioria das ocorrências, pedidos devidamente fundados em direitos juridicamente violados.

Hodiernamente, chamando-se aqui, precursoramente, de Direito Indenizatório, a Reparação Civil objetiva tem conquistado terreno, frente à visão arcaica dos nossos julgadores que, apoiada no Direito Positivista, denegavam as pretensões reparatórias, especificamente sobre danos extrapatrimoniais, pois até que a Lei Maior tutelasse expressamente sobre o dano moral, os doutos magistrados apenas inclinavam-se quanto ao direito patrimonial reclamado.

Pertinente citar uma obra de HANS KELSEN, que em um trecho aduz:

Direito válido é direto justo: uma regulamentação injusta da conduta humana não tem validade e não é, portanto, direito, na medida em que se deva entender por direito apenas uma ordem válida. (12)

Ainda sem um norte, ao final da década de ´90 do século passado, os magistrados brasileiros chegaram a entender que, ou seria devido a reparação pelo dano material ou seria devido a reparação pelo dano moral. Em uma lide, nunca se admitia, pelo Poder Judiciário, a cumulação dos dois pedidos, dano material e dano moral. Quando a Tutela Jurisdicional caía sobre o pedido de dano material, era denegado o dano moral, e vice-versa.

Posteriormente, com a persistência da Doutrina, a Jurisprudência cedeu e passou a admitir a cumulação dos pedidos de reparação ao dano material e ao dano moral. Contudo, até os dias atuais, como se explana neste estudo, o entendimento pacificado sobre tal instituto ainda resta obnubilado.

Devido a isto, constando do manifesto trabalho, tal estudo entendeu-se necessário e original, no sentido do seu título, no intuito de colaborar com a pacificação da compreensão sobre a ocorrência e a conseqüente valoração do dano moral, no campo da reparação civil.

Muito se escreve, muito se lê, e muito se ouve falar sobre o reconhecimento da necessária existência da responsabilização civil, quando o bem violado não é um bem material, não é um bem patrimonial, que se possa tocar-lhe as mãos, que ocupe um lugar no espaço-tempo. Mas pouco, ou praticamente nada, é demonstrado cientificamente a respeito da correta identificação dos fatores que ocasionam um dano imaterial, moral, bem como, da padronização do quantum a ser estimado para compensar os efeitos da força ofensiva que ocasionou o prejuízo extrapatrimonial.

Como este escritor costuma refletir: “Se no passado, o direito era desconhecido, no presente deve ser discutido, para no futuro próximo ser admitido.”

Desta forma, cumpre delinear as lacunas que a própria lei não pôde suprimir ao mesmo tempo em que inseria o instituto da indenização ao dano moral no nosso ordenamento jurídico.

Ressalte-se que é esta a constante falha do legislador brasileiro. Pois é realmente devido a ele a produção de toda uma discussão sobre um tema, um problema sócio-jurídico, ou seja, quando ele – o legislador – inobserva uma lacuna legal, antes de oficializar o conhecimento, por toda a sociedade, daquela nova norma. Fato que move toda a divisão do mundo jurídico, contribuindo negativamente a ocasionar também a demora excessiva na resolução de uma lide, em sede forense. Assim, uma fração de juristas, dentre operadores do Direito e magistrados, fazem a interpretação da lei sob um entendimento; uma outra fração, sob um segundo entendimento; e por vezes, não poucas, uma outra fração de juristas, sob um terceiro entendimento. Gerando assim várias correntes, dialéticas, doutrinárias ou jurisprudenciais.

Não obstante, o importante para corrigir tal falha, é perseguir a solução, através do Bom Senso do que seja verdadeiramente justo, que é o que realmente trará o entendimento, assim, pela Justiça.

Por ainda ser renegado por alguns juristas ou divergido por outros, atualmente, o entendimento da caracterização do dano moral, trazido expressamente, por pioneiro, pela Constituição de 1988, bem como do quantum a ser estimado com o intuito da compensação pelo dano extrapatrimonial sofrido, há a premente necessidade de se estabelecer e determinar um padrão para tais questões.

Diversas situações reais têm desagüado no seio do Poder Judiciário, onde apreciações judiciais têm resguardado sob sua Tutela, questões como, além das pretensões à reparação por dano aos Direitos da Personalidade, mormente protegidos na vigente Constituição Federal (1988), sob o Magno Art. 5º, como direito à liberdade, à honra, ao sigilo, à intimidade, à criação intelectual, principalmente o direito à vida. Também são perseguidas pretensões por dano à imagem da pessoa, por dano a inadimplência de contratos, por negligência, por imprudência, por quebra de sigilo bancário sem a devida cautela judicial, por atraso de pagamento de salário, por assédio no ambiente de trabalho, e até paralelamente por infrações e crimes, entre outras. Ou seja, são todas, questões de foro de personalidade, pertinente o Direito de Personalidade.

Uma concisa adenda, para MIGUEL REALE, assim elucida a origem do Direito da Personalidade:

Segundo os partidários do Direito Natural clássico, que vem de Aristóteles até nossos dias, passando por Tomás de Aquino e seus continuadores, os direitos da personalidade seriam inatos, o que não é aceito pelos juristas que, com o Renascimento, secularizaram o Direito, colocando o ser humano no centro do mundo geral das normas ético-jurídicas. Para eles trata-se de categorias históricas surgidas no espaço social, em contínuo desenvolvimento. Não cabia ao legislador da Lei Civil tomar partido ante essas divergências teóricas, ainda que fazendo referência também ao Direito   Natural Transcendental, na linha de Stammler ou de Del Vecchio.

O importante é saber que cada direito da personalidade corresponde a um valor fundamental, a começar pelo do próprio corpo, que é a condição essencial do que somos, do que sentimos, percebemos, pensamos e agimos. (13)

Assim, o próprio REALE conclui:

Não há, pois, como confundir direitos da personalidade, que todo ser humano possui como razão de ser de sua própria existência, com os atribuídos genérica ou especificamente aos indivíduos, sendo possível a sua aquisição. Assim, o direito de propriedade é constitucionalmente garantido, mas não é dito que todos tenham direito a ela, a não ser mediante as condições e processos previstos em lei.

Poderíamos dizer, em suma, que são direitos da personalidade os a ela inerentes, como um atributo essencial  à sua constituição, como, por exemplo, o direito de ser livre, de ter livre iniciativa, na forma da lei, isto é, de conformidade com o estabelecido para todos os indivíduos que compõem a comunidade. (14)

Colega jurista da mesma realidade jurídica em seus tempos, ORLANDO GOMES corrobora o raciocínio de REALE:

Sob a denominação de direitos da personalidade, compreendem-se os direitos personalíssimos e os direitos essenciais ao desenvolvimento da pessoa humana que a doutrina moderna preconiza e disciplina no corpo do Código Civil como direitos absolutos desprovidos, porém, da faculdade de disposição. Destinam-se a resguardar a eminente dignidade da pessoa humana, preservando-a dos atentados que pode sofrer por parte de outros indivíduos. (15)

Conclui-se que são diversas fontes de direitos que podem gerar ocorrência a ser apreciada para a apuração da reparação por dano moral.

Nem tanto a ocorrência gera dissensões no entendimento do dano sofrido a ser reparado, na Doutrina e na Jurisprudência. Maior divergência se tem na quantificação das condenações, ou seja, no momento em que o Poder Judiciário determina o valor compensatório pelo direito ofendido.

Assim, quanto à valoração, em especial, as apreciações judiciais têm decidido de diversos prismas, alguns magistrados mais jurídicos, outros mais sociais, e outros ainda, em maior corrente, mais políticos. Contudo, todos sem um paradigma, sem um molde que figure um padrão para a aplicação em cada caso concreto.

Algumas sentenças judiciais proferidas em questões tais, ponderam o peso de dez vezes o valor do bem ofendido; outras, trinta vezes; outras, cinqüenta vezes; outras, cem vezes; e outras sentenças, por extremas, até aquilatando o peso de apenas uma vez o valor do bem ofendido, e outras, de duzentas vezes o valor objeto a ser reparado.

O que, destarte, revela na forma generalizada que o único meio oficial de se aplicar a Justiça, qual seja, via Poder Judiciário, em verdade está sendo injusto.

Pode-se constatar o explanado conforme a decisões para casos concretos, abaixo colacionados, dos sites de tribunais brasileiros, por exemplo, um caso de protesto de título executivo extrajudicial, no Estado do Paraná, sendo a condenação em danos morais, em sede de Tribunal de Justiça, no valor de 10 (dez) vezes o valor do título protestado, tendo, por conseguinte em grau de recurso, a condenação de apenas 5 (cinco) vezes o valor do título protestado, objeto da contenda, sem sede do Superior Tribunal de Justiça [vide ANEXO 1].

Outro caso concreto ocorrido no Estado de São Paulo, em que o Tribunal de Justiça entendeu ser justa uma considerável condenação por danos e em sede de Superior Tribunal de Justiça, a condenação foi minorada, comprovando mais uma vez que os tribunais brasileiros não possuem um paradigma para tais questões [vide ANEXO 2].

Deixando a questão de quantificações diversas sobre um mesmo caso nos hierárquicos graus de jurisdição do Direito brasileiro, no decurso de um processo – quanto ao problema levantado no presente estudo, ou seja, acerca da valoração do dano moral – e frisando a questão da ocorrência do dano, nota-se abaixo, que o Estado do Amazonas, representado através do seu Judiciário estadual, entendeu que havia dano moral a ser reparado quando, v.g., um consumidor que enfrenta aborrecimentos, em razão de defeito em um veículo automotor comprado, contudo, em vias recursais, a decisão a quo fôra reformada no Superior Tribunal de Justiça, entendendo que não houve agressão à dignidade do autor da ação judicial [vide ANEXO 3].

Percebe-se uma tendência latente, neste retro caso concreto citado em termos de jurisprudência, pois a douta decisão ad quem foi mais política que jurídica, ou mesmo social. Estava estampada a devida compensação pela via-crúcis que o consumidor deste caso atravessou. Mas infelizmente, o Direito foi preterido para satisfazer aos interesses do mais poderoso, financeiramente falando. Mas não se fará alusões às fraquezas do homem, neste trabalho.

Em suma, admite-se que a ciência do Direito nunca foi e nunca será absoluta, pois é justamente sua relativização dinâmica que garante a apreciação justa da cada caso levado ao Estado-juiz. Pois, no julgamento de uma contenda social, são analisadas as peculiaridades do fato a ser jurisdicionado, aplicando-lhe, pelas diretrizes que norteiam a justiça, com a ponderação do poder estatal, o equilíbrio entre os litigantes, dando a cada um o que devidamente lhe faz jus.

Contudo, é necessário coibir as desigualdades que eventualmente e injustamente possam ser infligidas sobre os jurisdicionados, fazendo assim garantir a satisfação plena da sociedade.

2.2.Caracterização do Dano Moral

Há que se identificar os requisitos para a ocorrência do dano moral; bem como, que se determinar os efeitos da força da ofensa sobre o bem atingido para se aquilatar a justa reparação.

Assim, a apuração da ocorrência é o escopo-meio e a apuração da valoração é o escopo-fim na constatação do dano sofrido.

Procurar-se-á demonstrar, no presente trabalho, as causas que geram um dano extrapatrimonial, bem como os efeitos, dele produzidos, para se delinear os fatores que pesarão para a devida valoração da reparação do dano na esfera civil.

Atualmente, o dano extrapatrimonial ou dano moral, como é mais conhecido, pode decorrer da ofensa a diversos bens imateriais, juridicamente tutelados. Por exemplo, sentimentos poderão ser objetos de dano moral, como dano à honra, à dignidade da pessoa, ao equilíbrio emocional, e até a uma satisfação temporária, pois principalmente a dignidade humana está intrínseca ao dano moral. Quando a pessoa se vê ofendida por discriminações, situações vexatórias e humilhantes, contratos não cumpridos e até por simples aborrecimentos, concisamente falando.

A caracterização do dano trata dos direitos oriundos da personalidade humana, ou seja, para haver dano moral, necessário se faz que a moral do homem seja atingida, seja violada.

Assim, se o homem não puder mais ter o domínio absoluto do seu espírito, ou seja, da sua serenidade, do seu equilíbrio, e se essa desarmonia for causada por outro indivíduo, então este será obrigado a compensar a interceptação da sua moral.

Segundo o renomado AURÉLIO BUARQUE DE HOLANDA FERREIRA, lexicógrafo brasileiro, moral que dizer:

1. Filos. Conjunto de regras de conduta consideradas como válidas, quer de modo absoluto para qualquer tempo ou lugar, quer para grupo ou pessoa determinada. [Cf. amoral (4 e 5) e ética.]

[…]

3. O conjunto das nossas faculdades morais; brio, vergonha.

[…]

7. Relativo ao domínio espiritual (em oposição a físico ou material). (16)

Sobre a questão do quantum indenizatório, nos ensinamentos de Cáio Mário da Silva Pereira, segundo o qual: “a soma não deve ser tão grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva.” (17)

São as condenações excessivas, bem como as atenuações que levam à desmoralização do instituto da reparação por dano moral. Mas principalmente são as inobservações e falta de proteção da Tutela Jurisdicional, quando devidamente necessária, que mais desvanecem e banalizam a Segurança Jurídica, sendo necessário que seja considerada em conjunto, igualmente, com os princípios da equidade, da razoabilidade, e principalmente o bom senso do julgador.

Merecendo destaque neste trabalho, colaciona-se uma entrevista em 2005 que o então Presidente do STJ, Ministro EDSON VIDIGAL, atualmente aposentado, concedeu a um jornalista, sobre a visão que o Superior Tribunal estaria tendo do referido tema, na Lei de Imprensa [vide ANEXO 4].

Um ilustre profissional deste sacerdócio jurídico que é a Advocacia, SÉRGIO GABRIEL, advogado na área empresarial em São Paulo, professor da Universidade São Francisco, coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Cruzeiro do Sul, conclui em um trabalho seu, publicado eletronicamente:

Na falta de parâmetros objetivos para fixar o quantum indenizatório, devem os magistrados, em atenção as suas finalidades, arbitrá-lo dentro dos princípios mencionados, sempre considerando o gravame em relação ao todo, respeitando elementos como: a gravidade do dano; a extensão do dano; a reincidência do ofensor; a posição profissional e social do ofendido; a condição financeira do ofensor; a condição financeira do ofendido.

Sua fixação não pode, assim, ultrapassar os limites do bom senso, fazendo-se a necessária justiça através da aplicação da já mencionada teoria do desestímulo. (18)

Pelo que reconhecidamente, norteia-se pelo bom senso, pelo justo, qualidades que devem ser íntimas de todo jurista.

Não podendo ficar excluído deste trabalho, está o douto Desembargador Sergio Cavalieri Filho, que concatena acerca do Dano Moral em perspectiva a ordem constitucional, assim aduzindo:

Temos hoje o que pode ser chamado de direito subjetivo constitucional à diginidade. Ao assim fazer, a Constituição deu ao dano moral uma nova feição e maior dimensão, porque a dignidade humano nada mais é do que a base de todos os valores morais, a essência de todos os direitos personalíssimos. O direito à honra, a imagem, ao nome, à intimidade, a vida privacidade ou a qualquer outro direito da personalidade – todos estão englobados no direito à dignidade, verdadeiro fundamento e essência de cada preceito constitucional relativo aos direitos da pessoa humana.

Dano moral, à luz da Constituição vigente, nada mais é do que a violação do direito à dignidade. E foi justamente por considerar a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem corolário do direito à dignidade que a Constituição inseriu em seu art. 5º, V e X, a plena reparação do dano moral. (19)

3. CAPÍTULO 3

O Dano Moral e sua Reparação

3.1.Direito Comparado

O Código de Defesa do Consumidor brasileiro inscreve, no Art, 62, como direito básico deste: "a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos". 

Comparadamente, no Direito Lusitano (Portugal), poucas são as referências sobre a instituição do dano moral, porém nas Ordenações Manuelinas, Livro III, Título 71, parágrafo 31 e, Filipinas, Livro III, Título 86, parágrafo 16, assim encontra-se sua existência:

… E se o vencedor quiser haver, não somente a verdadeira estimação da cousa, mas segundo a affeição que ella havia, em tal caso jurará elle sobre a dita afeição; e depois do dito juramento pode o juiz taxá-lo, e segundo a dita taxação, assim condenará o réu, e fará execução em seus bens, sem outra citação da parte…(sic)

No Direito Canônico (disciplina eclesiástica da Itália), sob o prisma do revogado Código de Direito Canônico de 1918, nas arras esponsalícios, consagrava-se a reparação dos danos e prejuízos pela ruptura da promessa de casamento, aduzido no Cân. 1.017, § 3º (“Cân.” é o mesmo que Art., na legislação brasileira).

Recentemente, em 1983 com a adoção do Novo Código Canônico, promulgado pelo então Papa, D. João Paulo II, caracterizada ficou a indenização por danos morais, como se vê: “Can. 220 – Non è lecito ad alcuno ledere illegittimamente la buona fama di cui uno gode, o violare il diritto di ogni persona a difendere la propria intimità.” (20). Que traduzindo, fica assim: "Cân. 220 – a ninguém é lícito lesar ilegitimamente a boa fama de que alguém goza, nem violar o direito de cada pessoa de defender a própria intimidade."

O direito brasileiro, influenciado pela Igreja, e principalmente pela legislação de Portugal, também adotou esse princípio, na Lei de 6 de outubro de 1784 – posto que as Ordenações Filipinas e demais diplomas lusitanos vigoraram no Brasil, a partir da determinação de lei imperial datada de 20 de outubro de 1823, até que fosse promulgado o próprio Código Civil brasileiro. O que veio a se concretizar com sua consolidação e aprovação pelo então Imperador D. Pedro II, em 24 de dezembro de 1858. (21)

Assim, do Artigo 76 ao Art. 94, da consolidação do Código Civil de 1858, ficou normatizada a questão dos esponsais.

No entanto, com a codificação do novo, na época, Código Civil de 1916, ratificado, na dita questão, pelo atual Código Civil de 2002, foi banida a figura dos esponsais, pois na visão moderna, o consentimento no Matrimônio não pode ser dado coercitivamente contra a parte que não o deseja, para que não haja dano moral à parte que o deseja.

Como diz o Desembargador e professor Carlos Roberto Gonçalves (22):

…o fato de nosso legislador não ter disciplinado os esponsais como instituto autônomo demonstra, conforme assinala a doutrina, que preferiu deixar a responsabilidade civil pelo rompimento da promessa sujeita à regra geral do ato ilícito. Nosso Código Civil vigente, artigo 186, prevê: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. E o artigo 927 complementa: “Aquele que, por ato ilícito (artigos 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Na Declaração Universal dos Direitos dos Homens proclamada em 10 de dezembro de 1948 pela Organização das Nações Unidas, a questão da honra vinha tutelada, como se vê: "Art. 12 – Ninguém será objeto de intromissões arbitrárias em sua vida particular, em sua família, em seu domicílio, ou em sua correspondência, nem padecerá, seja quem for, atentados à sua honra e à sua reputação".

Com isso, é de se verificar que desde que o Direito passou a ser codificado, a ressarcibilidade por danos morais sempre esteve presente, ainda que indiretamente, e de outra forma não poderia ser, acabou por ser positivado no direito brasileiro, ainda que tardiamente.

Cabe lembrar, que no Brasil, mesmo antes da Constituição Federal de 1988, o Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei nº 4.117/62), a Lei de Imprensa (Lei nº 5.250/67) e a Lei dos Direitos Autorais (Lei nº. 9.610/98), já consagravam a reparabilidade por danos morais.

Talvez até por essa delonga, e pela conseqüente demanda reprimida, é que hoje o instituto do dano moral enfrenta dois grandes questionamentos: o da caracterização do dano moral; e o quantum indenizatório.

Notório conhecimento de que, até mesmo dos indivíduos menos estudados, nos Estados Unidos, a questão de buscar a Tutela Jurisdicional quanto à pretensão de indenização por danos morais é amplamente pacificada. Inclusive, não há limites para condenações, que chegam até a milhões de dólares.

O legislador francês, quando da redação do Código Napoleônico de 1804, apesar de ter preservado as fontes obrigacionais Romanas, haja vista a concepção do seu Art. 1.370, deixou de fazê-lo com referência à punibilidade dos danos extrapatrimoniais que, no Direito Romano se fazia.

Assim, não há no referido texto legal a previsão expressa de reparabilidade do dano moral, o que acabou influenciando os demais sistemas modernos, como foi o caso, notadamente, do Brasil.

Dessa forma, coube aos intérpretes e à jurisprudência franceses, com base na amplitude da disposição contida no napoleônico Art. 1.382, que regula a questão da responsabilidade resultante de delito e quase-delito, encontrar fundamentos para a concessão também de reparação por dano moral.

Assim, em que pesem as divergências, a França adota como princípio a aceitação de que os danos morais são objeto de Reparação Civil, prevalecendo a corrente positiva, que tem como aliados Demoque, A. Laurent, George Ripert e outros. (23)

Destarte, verifica-se que o Código Civil francês, não teve preocupação adequada em relação aos direitos da personalidade, ao contrário, denotando apenas uma grande atenção com os bens materiais, deixando à doutrina e à jurisprudência a tarefa da construção de uma teoria para a reparação do dano moral.

Semelhante ao que ocorreu com o Código Civil francês, foi com o Código Civil italiano, que em seu Art. 1.651 aduziu previsão genérica do Dever de reparar o dano causado por ato ilícito. Assim, como no diploma napoleônico, o legislador italiano igualmente deixou à doutrina e à jurisprudência, a incumbência de complementar a interpretação da lei para o dano extrapatrimonial. Por fim, firmou-se na Itália, a corrente positivista que defende a reparação dos danos morais sem qualquer limitação.

No Direito norte-americano, de essência principiológica, há numerosos casos – para corroborar que não há necessidade de lei escrita para se pesar o justo. Pois com o Bom Senso aplicado a princípios direcionadores, já é suficiente para sacramentar a incidência de dano moral, não sendo delimitado por qualquer limite legal. A exemplo, podem ser referidos os casos: Leonard Ross x New York Times, que rendeu US$705 milhões em indenização; Richard Sprague x Philadelphia Inquirer, que rendeu US$34 milhões; Houston Money Management x Wall Street Journal, rendendo US$232 milhões de indenização. E nunca, nenhuma instância, nem ninguém chegou a dizer que a legislação americana seria uma violência contra a democracia. (24)

3.2. Reparação ou Compensação: uma análise

Em adenda, cumpre pertinentemente compor a questão da semântica do mencionado Dever de indenizar, no que tange ao comando jurídico, à pretensão que se deve corretamente perseguir em Juízo.

Afinal, a expressão mais correta é REPARAÇÃO ou COMPENSAÇÃO?

Tampouco a legislação brasileira, e até mesmo os mais célebres doutrinadores e escritores da ciência jurídica não fazem abstração entre uma e outra acepção, como se pode constatar de todas as citações neste trabalho.

Porém, há na Doutrina, inclusive na Jurisprudência, quem defenda a diferença entre os vocábulos. Os mais consagrados entendem que REPARAÇÃO se deve por dano material, para que seja restabelecido o statu quo ante. Quanto à COMPENSAÇÃO, alguns entendem que só cabe na indenização por dano moral, pois da ofensa sofrida não há que se falar em statu quo ante, pois em caso de bem imaterial, não há qualquer possibilidade de restabelecimento, devendo-se apenas ser compensado do que se sentiu perdido, sofrido.

Coloca-se tal distinção na possibilidade ou impossibilidade de mensuração do dano experimentado. Entendendo-se, principalmente pela Doutrina que somente o bem material pode ser mensurado. O imaterial, não.

Deste modo, vislumbra-se que um dano em um veículo, v.g., é objeto de possível avaliação pecuniária, para que seja assim reparado, se restabelecendo seu estado anterior ao dano. Porém, um constrangimento público, como ofensa a honra da pessoa, cotejando-se os exemplos, seria impossível avaliar pecuniariamente, para que se pudesse tornar tal dano imperceptível ou inexistente. Seria impossível restabelecer o estado anterior ao dano, pois seria impossível consertá-lo fisicamente, ou seja, sopesando sua natureza imaterial, seria impossível apagá-lo da memória.

Por isso, até se compreende que a ordem jurídica queira pôr uma distinção entre uma e outra acepção, para se perseguir em Juízo. Mas, analisando semanticamente, não se consegue perceber uma relevante diferença.

O próprio renomado e popular Dicionário Aurélio, do ilustre lexicógrafo Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (25), leciona:

reparação, s.f. – ato ou efeito de reparar; restauração; reforma; indenização; …

compensação, s.f. – ato ou efeito de compensar; reparar um mal, com um bem correspondente; ressarcir; indenizar; …

Dessa forma, não se absorve qualquer diferença entre as acepções utilizadas. Entendendo assim, poder ser empregada qualquer uma para referência ao Dever de indenizar em razão de dano moral.

4. CAPÍTULO 4

Reflexos da Notoriedade do Dano Moral

4.1.Demanda Social

A Responsabilidade Civil vem ganhando destaque no meio social, principalmente quando tocante ao dano moral.

Atribuiu-se este movimento a partir da Constituição de 1988, onde a existência do dano ganhou referência expressa. A Constituição foi um grande estímulo, inclusive na indenização por dano moral. O Código do Consumidor, que entrou em vigor em 1991 também impulsionou a responsabilização do ofensor.

Aponta-se a influência norte-americana na procura pela indenização por danos morais. A partir da década de 90, muito por influência americana, o brasileiro começou a dar mais importância para o tema, a procurar pelos seus direitos. A expansão responsabilidade civil, principalmente na última década, é decorrente do amadurecimento da sociedade brasileira no sentido de buscar o cumprimento dos direitos que lhe assiste.

A postura verificada na busca pela reparação e garantia do cumprimento dos deveres é fruto da facilitação do acesso ao Poder Judiciário, com a criação dos Juizados Especiais e a especialização da legislação.

O novo Código Civil veio corroborar a possibilidade de as pessoas naturais e jurídicas pleitearem indenização por danos físicos, patrimoniais e materiais. A expansão do conceito de responsabilidade civil e a procura pelo reparo do dano moral, tem um fundo cultural.

Realmente tem aumentado a conscientização de que um dano pode e deve ser cobrado. Porém, ressalta-se a dificuldade da Justiça brasileira em fixar os danos. Nos EUA há júri popular para decidir as indenizações, que costumam ser bilionárias.

Houve o crescimento das ações contra o Poder Público e contra todo aquele que causa dano a outrem, dentro do conceito de responsabilidade civil. Um dos motivos a serem buscadas as pretensões, seria a demora da Justiça na definição de casos, para tanto sendo o próprio Estado, acionado.

Veja-se que o número de ações de indenização por danos morais que, v.g., chegaram no STJ nos últimos 12 anos, tem sobressalto em escalas desproporcionais, como se pode constatar que foram autuados: 28 processos em 1993; 47, em 1994; 181, em 1995; 228, em 1996; 440, em 1997; 540, em 1998; 962, em 1999; 1.331, em 2000; 1.748, em 2001; 3.990, em 2002; 4.632, em 2003; 8.201, em 2004; e 10.012 processos em 2005. (26)

5. CONCLUSÃO

Por todo exposto, depreende-se do presente estudo que para a OCORRÊNCIA do dano moral, o pressuposto necessário é a violação do direito à serenidade de espírito. Ou seja, todo ser humano tem o direito de não ser afetado em seu equilíbrio psicológico, não podendo sofrer qualquer ato de terceiro que cause dissonância em sua paz interior, que faça vibrar o “diapasão” da temperança do indivíduo. O que se compreende estarem ligados, principalmente, todos os direitos da personalidade humana, como já explanados no transcorrer deste estudo. Assim, se tal ofensa a um direito da personalidade ocorrer, deve o incitado ser indenizado.

Já para a VALORAÇÃO do dano moral sofrido, entende-se que devem ser levados em conta os requisitos objetivos, ou seja: A) a natureza da ofensa, se intencional ou não; B) o meio da ofensa, se comissiva ou omissiva; e C) a conseqüência da ofensa, ou seja, a perturbação sofrida, qualificando-a em temporária, prolongada ou permanente. Bem como, os requisitos subjetivos: A) a gravidade do dano, considerando os níveis, leve, grave, gravíssima; B) a extensão do dano; C) a reincidência do ofensor; D) a posição profissional e social do ofendido e do ofensor; E) a condição financeira do ofensor e do ofendido.

Data venia, consigne-se que tal conclusão se deu por própria maturação do entendimento jurídico-científico deste Graduando.

EPÍLOGO

“O liame entre a confiança da sociedade e o Poder Judiciário é a Segurança Jurídica, que advém da imparcialidade do Julgador. Para garantir a Segurança Jurídica é imprescindível compreender que um verdadeiro Juiz não se faz. Não se estuda para saber julgar, para saber ser justo. Pois, não se aprende o Bom Senso, porque Bom Senso é um dom natural. Um verdadeiro Juiz já nasce feito. De outro lado, nem todos podem ser tornar um Julgador, pois, Bom Senso é uma virtude de poucos.”

(Márcio Archanjo Ferreira Duarte, 2006)

7. REFERÊNCIAS

7.1. bibliográficas

BRASIL. Dicionário Jurídico Universitário. Rio de Janeiro: Editora América Jurídica. 2ª edição. 2006.

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DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade Civil. 10ª ed. rev. aument. 3ª tiragem. Rio de Janeiro: Forense, 1997.

GRINOVER, Ada Pellegrini e outros. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária. 6.ª Edição. 1998.

STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 4ª Edição. 1999.

VIEIRA, Jair Lot (supervisão editorial). Código de Hamurabi : Código de Manu : Lei da XII Tábuas. 2ª edição. São Paulo: EDIPRO. 2002. (Série Clássicos Edipro).

RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil. Volume IV. São Paulo: Editora Saraiva, 19ª Edição. 2002.

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FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio – Século XXI. São Paulo: Editora Nova Fronteira. 6ª edição. 2005.

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7.2. eletrônicas

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BRASIL. STJ. Página eletrônica oficial em website. Coluna Notícias do Superior Tribunal de Justiça. 2005. Disponível em: . Acesso em: 05/mai/2006. 14:56.

7.3. normativas

BRASIL. Código Civil. Lei nº. 3.071, de 1º de janeiro de 1916. Por Marcus Cláudio Acquaviva. Vademecum Universitário de Direito. 4ª edição. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira Ltda, 2001.

BRASIL. Código Civil. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Por Marcus Cláudio Acquaviva. Vademecum Universitário de Direito. 7ª edição. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira Ltda, 2004.

BRASIL. Constituição Federal. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Por Marcus Cláudio Acquaviva. Vademecum Universitário de Direito. 9ª edição. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira Ltda, 2006.

BRASIL. Lei nº. 5.250, de 9 de fevereiro de 1967. Senado Federal. Disponível em: . Acesso em: 14/mar//2006, 16:34.

BRASIL. Código de Defesa do Consumidor. Lei nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990. Senado Federal. Disponível em: . Acesso em: 18/abr//2006, 12:54.

BRASIL. Lei dos Direitos Autorais. Lei nº. 9.610, de 19 de fevereiro de 1998. Senado Federal. Disponível em: < https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9610.htm>. Acesso em: 11/abr/2006, 17:26.

Notas:

1. VIEIRA, Jair Lot (tradução e supervisão editorial). Código de Hamurabi : Código de Manu : Lei da XII Tábuas. 2ª edição. São Paulo: EDIPRO. 2002. (Série Clássicos Edipro).

2. VALOIS, Luís Carlos. Lei das XII Tábuas. 2005. Disponível em: . Acesso em: 09/mar//2006, 13:53.

3. GRINOVER, Ada Pellegrini e outros. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária. 6.ª Edição. 1998.

4. SARAIVA, Carlos Roberto. Comentários ao Código Civil, Volume XI, São Paulo: Editora Saraiva. 2003. p. 07.

5. PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2ª Edição. 1990. p. 15.

6. SARAIVA, Carlos Roberto. op. cit., p. 28.

7. DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade Civil. 10ª ed. rev. aument. 3ª tiragem. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 18.

8. STOCCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 4ª Edição. 1999, p. 76.

9. GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 29.

10. GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 29.

11. PEREIRA, Cáio Mário da Silva. op. cit., p. 29/31.

12. KELSEN, Hans. O Problema da Justiça. São Paulo: Martins Fontes. 2003. p. 67.

13. REALE, Miguel. Os Direitos da Personalidade. Artigos. 2004. Disponível em: . Acesso em: 29/mai/2006. 14:34.

14. Ibid.

15. GOMES, Orlando. Introdução ao Código Civil. Rio de Janeiro: editora Forense. 1996. p. 130.

16. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio – Século XXI. São Paulo: Editora Nova Fronteira. 6ª edição. 2005.

17. PEREIRA, Cáio Mário da Silva. op. cit., p. 92.

18. GABRIEL, Sérgio. Dano moral e indenização. Jus Navigandi, Teresina, a. 6, n. 56, abr. 2002. Disponível em: . Acesso em: 19/mai/2006.

19. CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 5.ed. São Paulo: Malheiros, 2004. 559 p.

20. ITÁLIA. Codice di Diritto Canônico. Vaticano. 1983. Disponível em: . Acesso em: 30/abr/2006. 12:46.

21. AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado de. Prefácio. In: FREITAS, Augusto Teixeira de. Consolidação das Leis Civis. Brasília: Senado Federal, 2003, v. 1, p. 17.

22. GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Editora Saraiva. 2003. p.. 62.

23. CARMIGNANI, Maria Cristina da Silva. A Evolução Histórica do Dano Moral. Artigo. 2005. Disponível em: http://72.14.209.104/search?q=cache:j3x3nn76ad4J:150.162.138.14/arquivos/A_evolucao_historica_do_dano_moral.htm+%22esponsal%C3%ADcios%22+arras&hl=pt-BR&gl=br&ct=clnk&cd=4&lr=lang_pt Acesso em: 05/mai/2006. 14:34.

24. OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA. Página eletrônica de website. 2006. Disponível em: . Acesso em: 29/mai/2006. 16:40.

25. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. op. cit.

26. BRASIL. FIRJAN. Nota Técnica nº. 25/2005, de 1º de dezembro de 2005. Disponível em: . Acesso em: 20/mai/2006. 00:48.

NOTAS EXPLICATIVAS

CARACTERES CUNEIFORMES – conhecidos como a escrita mais antiga, criada pelos sumérios (primeira civilização humana, que ocupou o sul da Mesopotâmia – atual Iraque) por volta de 3500 a.C., utlizava uma cunha para serem talhados em tabuletas de barro e pedra. FONTE: http://pt.wikipedia.org/wiki/Escrita_cuneiforme

MINA – medida de peso, da época – XXI a.C., equivalente a aproximadamente 500 gramas.

SÂNSCRITO – Língua oficial da Índia antiga, foi desenvolvida inicialmente cerca de 1500 a.C., sendo às vezes descrito o idioma como um equivalente asiático do Latim. FONTE: http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A2nscrito

“INDÚSTRIA DO DANO MORAL” – Expressão que ganhou notoriedade no meio forense brasileiro, na última década. Da qual, este escritor não concorda, pois se quando um instituto é perseguido amplamente pela sociedade ou por outro ente qualquer, a ponto de ganhar notabilidade na sociedade, ganhando tal reconhecimento de “fabricação” então igualmente deve ganhar espectro, a indústria das multas aplicadas pelo Governo (como um todo), a indústria dos tributos, e até se pode dizer, a indústria dos decretos do Poder Executivo.

Hamurabi – sexto rei da primeira dinastia babilônica (2.067 – 2.025 a.C.).

Manu – pai da humanidade, segundo a mitologia hindu (1.300 – 800 a.C.).

site(s) – sítio virtual; página eletrônica na internet.

 


 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

MÁRCIO ARCHANJO FERREIRA DUARTE, Estudante de Direito da Universidade Estácio de Sá – Campus Penha. Rio de Janeiro-RJ,  Estagiário da Advocacia, inscrito na OAB-RJ, 2006.

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Artigo 166 do Código Tributário Nacional: Transferência de Encargo

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* Edson Teixeira de Melo – 

        O presente artigo analisa a questão da repetição do indébito nos casos dos tributos ditos indiretos, à luz da Constituição Federal, do Código Tributário Nacional e das Súmulas nºs. 71 e 546 do Supremo Tribunal Federal que tratam da matéria. 

A Lei

 O artigo 166 do Código Tributário Nacional dispõe:

 “A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la.” 

A Doutrina

 Doutrinariamente há diversas formas de classificação dos tributos, mas para o nosso estudo interessa a classificação em diretos e indiretos, e mais precisamente os impostos.

José Eduardo Soares de Melo [1], reafirmando que os impostos têm sido objeto de diversas classificações, destaca os impostos diretos, quando o valor econômico é suportado exclusivamente pelo contribuinte, como é o caso do IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – artigo 155, IV da Constituição Federal). O proprietário do automóvel arca com o ônus do tributo, cujo valor não é repassado ao terceiro.

Contrário senso, impostos indiretos seriam aqueles em que a carga financeira tem condição de ser transferida a terceiro, como é o caso do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados – artigo 153, III da Constituição Federal). O contribuinte do tributo é o industrial, que fica obrigado a recolher o seu respectivo valor, mas pode vir a ser ressarcido financeiramente por ocasião do pagamento do preço por parte do adquirente.

Hugo de Brito Machado [2], repetindo idêntica definição sobre impostos diretos e indiretos, faz contundente crítica à referida classificação ao afirmar:

“A classificação dos tributos em diretos e indiretos não tem, pelo menos do ponto de vista jurídico, nenhum valor científico. É que não existe critério capaz de determinar quando um tributo tem o ônus transferido a terceiro, e quando é o mesmo suportado pelo próprio contribuinte. O imposto de renda, por exemplo, é classificado como imposto direto; entretanto, sabe que nem sempre o seu ônus é suportado pelo contribuinte. O mesmo acontece com o IPTU, que em se tratando de imóvel alugado é quase sempre transferido para o inquilino.”

 O autor assevera que atribuindo, o Código Tributário Nacional, certa relevância para a tal classificação, dispôs no artigo 166 “que a restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la”.

E continua o referido autor: 

“A nosso ver, tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro são somente aqueles tributos em relação aos quais a própria lei estabeleça dita transferência. Somente em casos assim aplica-se a regra do art. 166 do Código Tributário Nacional, pois a natureza a que se reporta tal dispositivo só pode ser a natureza jurídica, que é determinada pela lei correspondente, e não por meras circunstâncias econômicas que podem estar, ou não, presentes, sem que se disponha de um critério seguro para saber quando se deu, e quando não se deu, tal transferência.”

 Conclui assim, que contrário senso ter-se-á que se entender inconstitucional o artigo 166 do Código Tributário Nacional, por ser este um óbice intransponível ao exercício do direito à restituição do indébito.

José Eduardo Soares de Melo [3] enxerga constitucionalidade no mencionado artigo, identificando o IPI e o ICMS como típicos tributos que atendem aos pressupostos implicadores da translação da carga financeira a terceiros, esclarecendo que “tanto o fabricante quanto o comerciante, ao realizarem operações jurídicas, em regra, são obrigados a lançar os referidos impostos, em sua notas fiscais”.

Aliomar Baleeiro [4], em obra de grande relevo para o mundo jurídico, ao enfrentar a classificação dos tributos em diretos e indiretos, ministra que a impossibilidade jurídica da repetição de tributos indiretos, tese que tem amparo na Súmula nº 71 do Supremo Tribunal Federal, não pode ser generalizada, devendo ser apreciada em cada caso concreto, porque, de começo, do ponto de vista científico, os financistas ainda não conseguiram, depois de 200 anos de discussão, desde os fisiocratas do século XVIII, um critério seguro para distinguir o imposto direto do indireto.

E prossegue: 

“À falta de um conceito legal, que seria obrigatório ainda que posto à evidência da realidade dos fatos, o Supremo Tribunal Federal inclina-se a conceitos econômico-financeiros baseados no fenômeno da incidência e da repercussão dos tributos indiretos, no pressuposto errôneo, data vênia, de que sempre, eles comportam transferência do ônus do contribuinte de iure para o contribuinte de facto.”

 Mizabel Derzi [5], atualizadora da obra acima citada, em nota específica destaca a limitada aplicação do artigo 166 do Código Tributário Nacional:

Juridicamente, somente existem dois impostos “indiretos” por presunção: o Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI –, de competência da União, e o Imposto sobre Operações de Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS –, de competência dos Estados. O caráter “indireto” dos demais tributos, como que Aliomar Baleeiro, é apenas uma especulação econômica, pois são muitas as variáveis (condições de mercado, competitividade, de estrutura e incidência da exação, natureza do produto etc.) que podem desencadear ou não a translação.

Dissertando sobre o artigo 166 do Código Tributário Nacional, esclarece que tributos que comportem por sua natureza, e natureza jurídica apenas, a transferência do respectivo encargo financeiro são o IPI e o ICMS: 

“…

E somente existem dois tributos que, de acordo com sua peculiar natureza jurídica, desencadeiam a transferência do respectivo encargo financeiro, ou seja, o ICMS e o IPI.

A rigor, a ilação é extraída diretamente da Constituição Federal, porque, em relação a eles, a Carta adota dois princípios – o da seletividade e o da não-cumulatividade – que somente podem ser explicados ou compreendidos pelo fenômeno da translação, uma vez que a redução do imposto a recolher, entre outros objetivos – em um ou outro princípio – se destina a beneficiar o consumidor, por meio da repercussão no mecanismo dos preços. Ademais tais impostos têm ainda a função de serem neutros nem deformando a competitividade, a formação de preços ou a livre concorrência. Para isso não podem onerar o agente econômico que atua sujeito às leis de mercado, ou seja, o contribuinte, (o comerciante), mas são suportados pelo consumidor. E não apenas há uma aceitação jurídico-constitucional da repercussão do encargo financeiro, mas ainda um comando de autorização e até de determinação da transferência.”

 

E a autora em tópico seguinte culmina por afirmar que a restrição do artigo 166 do Código Tributário Nacional só se dá em relação aos créditos decorrentes do pagamento indevido, pois na compensação não prevalece a dicção do referido artigo.

Marcelo Fortes de Cerqueira [6], ao enfrentar o tema da repetição do indébito nos denominados “tributos indiretos”, após ressaltar os vários posicionamentos doutrinários a respeito do tema, ministra: 

“A problemática da repetição do indébito nos tributos em tela está fortemente imbricada com o próprio fundamento último da repetição do indébito e com toda a teoria da devolução expendida neste estudo. Assim, concretizado no plano concreto o evento do pagamento indevido, não há como impedir ou limitar àquele que realizou o fato do pagamento indevido o direito à devolução. Cobrado o tributo em desconformidade com a ordem tributária, o mesmo há de ser devolvido ao contribuinte, sem que nenhuma regra do sistema possa restringir o seu direito subjetivo, que, como demonstrado, tem sede constitucional.”

 Eduardo Domingos Botallo (in Restituição de Impostos Indiretos, São Paulo, Revista de Direito Tributário nº 2, p. 320), citado pelo autor acima assevera: “Somente o contribuinte chamado de jure é parte da relação jurídica tributária; conseqüentemente, somente a ele é atribuível o título jurídico; somente a ele cabe o direito de repetição do tributo indevido e nenhuma condição adicional se lhe pode ser imposta para o exercício desse direito”.

 E conclui Marcelo Fortes de Cerqueira que o artigo 166 do Código Tributário Nacional, embora contido no corpo de um típico veículo introdutório de norma tributária, veiculou, neste particular, norma específica de direito privado, choca-se com a Constituição Federal, e por isso não foi pela mesma recepcionado. 

A Jurisprudência

 O Supremo Tribunal Federal tem dado diversa interpretação à repetição do indébito no caso dos denominados impostos indiretos, com interpretação literal do artigo 166 do Código Tributário Nacional. 

Súmula 71.

Embora pago indevidamente, não cabe restituição de tributo indireto.

 No recurso extraordinário nº 46.450, de 10 de janeiro de 1961, o Ministro A. Villas Boas assim se pronunciou: 

“A regra é que é o solvens quem pode agir em repetição do indébito.

Mas, no caso, não foi possível deferir-lhe o pedido, porque ficou apurado que, se sofreu a percussão do tributo inconstitucional obteve imediata reparação, fazendo-o repercutir sobre os compradores das mercadorias.” 

Súmula 546.

Cabe restituição do tributo pago indevidamente, quando reconhecido por decisão, que o contribuinte “de jure” não recuperou do contribuinte “de facto” o “quantum” respectivo.

 Posteriormente, abrandando a Súmula 71, num dos precedentes que deram origem à Súmula 546, o Supremo Tribunal Federal, nos autos do recurso extraordinário nº 58.660, de 10 de abril de 1969, assim decidiu: 

“Ementa: – Restituição de tributo indireto (Súmula n. 71). Se ficou provado que o contribuinte não incluiu no preço dos seus produtos a parcela do tributo que indevidamente pagou, tem direito à restituição. Inaplicação do enunciado da Sumula. Divergência com o acórdão no RE 45.977. Embargos conhecidos e providos.”

 Recentemente o Superior Tribunal de Justiça assim se pronunciou nos autos do Recurso Especial nº 629.356 – PR: 

“Tributário. Recurso Especial. ISS. Sociedade Uniprofissional. Art. 9º § 3º, do Decreto-Lei nº 406/68. Violação do Art. 535 do CPC. Não-ocorrência. Transferência do encargo financeiro. Comprovação desnecessária.

2. “Ante a falta de vinculação entre o tributo e os serviços prestados, descabido falar-se em prova da não-transferência do encargo financeiro pelas sociedades de advogados, inaplicável a regra encartada no art. 166 do CTN.”

 

Conclusão

 Após estas considerações sobre a lei, a doutrina e a jurisprudência, passo a enfrentar a questão proposta, sobre a aplicação do artigo 166 do Código Tributário Nacional ao ISS, ICMS e IPI, e sobre a existência ou não da transferência de encargo para o consumidor.

Entendo que o artigo 166 do Código Tributário Nacional afronta a Constituição Federal e, neste particular, não foi por ela recepcionado.

A repetição do indébito encontra o seu pressuposto de validade imediato no artigo 165 do Código Tributário Nacional e, de forma remota, na Constituição Federal. Dentre os vários princípios indiretamente relacionados com a repetição do indébito, mister destacar o da estrita legalidade. Ora, somente em virtude de lei deve o contribuinte sujeitar-se ao pagamento de tributos.

Assim, todo o valor que for pago em desconformidade com o Sistema Constitucional Tributário Brasileiro deve ser repetido.

Por outro lado, como dissemos, o consumidor não mantém, com o Fisco ou com o contribuinte, relação jurídica tributária, mas sim de natureza privada. O contribuinte suporta a exação, o consumidor paga o preço da mercadoria, produto ou serviço. Este deve ser o critério jurídico da análise fática.

Logo, não há que se falar em impossibilidade de repetição do indébito tributário por parte do contribuinte, quer dos chamados tributos indiretos ou diretos.

No entanto, temos as Súmulas 71 e 546 do Supremo Tribunal Federal, que caminham em diversa direção.

Analisando a questão, a partir das Súmulas do Supremo Tribunal Federal, ainda assim, diferentemente dos casos de ICMS e IPI, únicos com natureza jurídica a permitir a transferência de encargo para o consumidor, na análise de Misabel Derzi, no caso do ISS não há a transferência do encargo, não se lhe aplicando a regra do artigo 166 do Código Tributário Nacional. Ressalta-se, neste particular, a forma de cálculo “por dentro” do ICMS.

Entendo, como Misabel Derzi, que somente existem dois tributos que, de acordo com sua peculiar natureza jurídica, poderiam, segundo critérios jurídicos e não econômico-financeiros, desencadear a transferência do respectivo encargo financeiro, ou seja, o ICMS e o IPI. 

NOTAS

 [1] MELO, José Eduardo de. Curso de Direito Tributário. 6. ed. revista e atualizada. São Paulo: Dialética, 2005.

 [2] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 28. ed. revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Malheiros, 2007.

 [3] MELO, José Soares de. Obra citada, p. 311.

 [4] BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 885.

 [5] DERZI, Mizabel Abreu Machado. Notas à obra citada acima, p. 886.

 [6] CERQUEIRA, Marcelo Fortes de. Curso de Especialização em Direito Tributário, coordenado por Eurico Marcos Diniz de Santi. 1. ed., 3. tiragem. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 390.

 


REFERÊNCIA BIOGRÁFICA  

 

* Edson Teixeira de Melo é sócio do escritório Ferreira e Melo Advogados Associados, professor universitário, mestrando em Direitos Difusos e Coletivos e pós-graduado em Direito do Terceiro Setor. E-mail: contato@ferreiraemelo.com.br.

Terceiro Setor e Recursos Públicos: Um olhar sobre as Organizações Sociais e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público

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*  Leonardo Freire Pereira

 

Introdução. 1. Antecedentes: a passagem do Estado Liberal para o Estado Social. 1.1. A falência dos modelos e o surgimento de um Estado Subsidiário. 1.2. A privatização das atividades sociais do Estado. 2. A atuação do terceiro setor: generalidades. 2.1. Organizações Sociais (OS) e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP). 2.2. Destinação de recursos públicos para o setor privado e a necessidade de Licitação. Conclusões finais: a recente experiência brasileira. Referências bibliográficas.

  

Introdução

 O estudo do Terceiro Setor[1], atualmente, é tema efervescente não só nas escolas de Direito, em razão do amplo espectro que envolve seu funcionamento, que vai desde a descentralização das atividades típicas do Estado, em todos os níveis federativos, até o desenvolvimento de uma consciência de responsabilidade social das empresas privadas.

Nesse sentido:

O campo de estudos do terceiro setor é uma das áreas mais novas e verdadeiramente multidisciplinares das Ciências Sociais, unindo pesquisadores de disciplinas como Economia, Sociologia, Ciência Política e áreas acadêmicas aplicadas como Serviço Social, Saúde Pública e Administração. O estudo do terceiro setor é uma área de conhecimento nova tanto no Brasil quanto no resto do mundo. No Brasil, as escolas de Administração começaram a debruçar-se recentemente sobre o tema. Neste país, o terceiro setor não é um tema extensivamente pesquisado, existindo ainda poucos estudos empíricos abrangentes, e um número insignificante, até recentemente, com enfoque organizacional. Nos Estados Unidos, com a tradição de um nonprofit sector firmemente enraizada, os primeiros estudos remontam apenas à década de sessenta, e pouco foi escrito sobre o tema antes do início da década de oitenta, sendo que a maior parte da produção existente provém dos anos noventa, um piscar de olhos em termos de história da ciência. Mesmo assim, o terceiro setor já mereceu a atenção de estudiosos do mainstream da Administração, como Philip Kotler e mesmo de Peter Drucker, um dos reconhecidos "pais" da Administração moderna. Michael O’Neill relata que, em 1977, Columbia University estabeleceu o primeiro instituto e programa acadêmico em nonprofit management, seguido por outras ao longo dos anos oitenta e noventa, chegando, em 1997, a 49 programas nos Estados Unidos, um no Canadá, um na Inglaterra e um na Austrália e 433 disciplinas oferecidas em mais de 100 universidades.[2]

 Entende-se por Terceiro Setor, o conjunto de Organizações Não Governamentais, ou seja, de entidades da sociedade civil de fins públicos e não lucrativos. Dentre as chamadas ONGs, temos as Organizações Sociais (OS) e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), sobre as quais discorreremos mais adiante.

 Como é cediço, compete à Administração Pública a salvaguarda do bem-estar social e, como essa função não vem sendo desempenhada diretamente de maneira satisfatória, surge espaço para o fomento do Terceiro Setor, no desenvolvimento daquelas atividades de interesse público, cuja realização não é exclusiva do Estado, mas pode ser exercida em colaboração com o mesmo. Daí a plausível justificativa para a transferência de recursos públicos para entidades privadas, como forma de incentivo.

A capacidade de mobilização social do Terceiro Setor, com a arregimentação de grupos sociais heterogêneos, numa atmosfera de democratização, é apontada como um dos motivos da expansão do modelo.

Para Andres Pablo FALCONER, “mais do que um conceito rigoroso ou um modelo solidamente fundamentado em teoria – organizacional política ou sociológica – terceiro setor, no Brasil, é uma idéia-força, um espaço mobilizador de reflexão, de recursos e, sobretudo, de ação”[3].

 

1.     Antecedentes: a passagem do Estado Liberal para o Estado Social 

Com a degradação do liberalismo e o agravamento da desigualdade social, surge a repulsa àquele Estado mínimo, não-intervencionista e a necessidade de se criar um novo modelo capaz de assegurar os chamados direitos sociais e econômicos.

 Essa tendência, como se sabe, surge a partir do século XIX, com a Constituição Mexicana (1917), a Revolução Soviética (1918) e, finalmente, a Constituição de Weimar, o marco fundamental, em 1919.

 A partir dessa tendência intervencionista surge, também, o que Maria Sylvia Zanella DI PIETRO chama de “burocratização do mundo”[4]. E essa burocratização surge porque o Estado tem um crescimento desmedido, a medida que, diferente do modelo anterior, passa a se fazer presente no dia-a-dia dos indivíduos. Essa tendência, ainda de acordo com DI PIETRO, fortaleceu por demais o Poder Executivo, ferindo o princípio da separação de poderes e tornando a prestação estatal ineficiente e o Estado dispendioso.

 Especificamente em relação ao modelo brasileiro de gestão dos direitos econômicos e sociais, DI PIETRO afirma:

O fracasso do chamado Estado Social de Direito é evidente. No Brasil, a exemplo do que ocorre em muitos outros países, não houve a mínima possibilidade de que milhões de brasileiros tivessem garantidos direitos sociais dos mais elementares, como saúde, educação, previdência social, moradia. Grande parte da população não tem assegurado o direito a uma existência digna.[5]

 No mesmo sentido, anota Paulo MODESTO:[6]

É sabido que o Estado atualmente não tem condições de monopolizar a prestação direta, executiva, do todos os serviços sociais de interesse coletivo. Estes podem ser executados por outros sujeitos, como associações de usuários, fundações ou organizações não governamentais sem fins lucrativos, sob acompanhamento e financiamento do Estado. Não prover diretamente o serviço não quer dizer tornar-se irresponsável perante essas necessidades sociais básicas. Não se trata de reduzir o Estado a mero ente regulador. O Estado apenas regulador é o Estado Mínimo, utopia conservadora insustentável ante as desigualdades das sociedades atuais. Não é este o Estado que se espera resulte das reformas em curso em todo mundo. O Estado deve ser regulador e promotor dos serviços sociais básicos e econômicos estratégicos. Precisa garantir a prestação de serviços de saúde de forma universal, mas não deter o domínio de todos os hospitais necessários; precisa assegurar o oferecimento de ensino de qualidade aos cidadãos, mas não estatizar todo o ensino. Os serviços sociais devem ser fortemente financiados pelo Estado, assegurados de forma imparcial pelo Estado, mas não necessariamente realizados pelo aparato do Estado. 

                        Apresenta-se, portanto, a idéia de subsidiariedade, sustentada pelo chamado Terceiro Setor. 

1.1.  A falência dos modelos anteriores e o surgimento  de um Estado Subsidiário 

Assim, com as desigualdades criadas pelo Estado Liberal e o inchamento ineficiente criado pelo Estado Social, surgiria a necessidade de um modelo alternativo, que pudesse, ao mesmo tempo, enxugar a máquina pública e prover os serviços sociais.

 Surge, assim, o chamado Estado Subsidiário, abrindo as portas para a atuação do chamado Terceiro Setor, numa tênue linha que divide o Estado (primeiro setor) e o Mercado (segundo setor), já que se constitui de entidades com personalidade essencialmente privada, mas exerce atividades essencialmente públicas.[7]

 A partir da década de 90, o Terceiro Setor apresenta uma matriz humanista, com viés voluntarista e filantrópico, tudo com o objetivo de diminuir as injustiças sociais.[8]  

1.2.   A privatização das atividades sociais do Estado

 O Estado Subsidiário têm por finalidade garantir a execução de políticas públicas, fomentando, para tanto, a iniciativa privada de interesse público, ou seja, que atenda a necessidades coletivas que não possam ser atendidas pelo Estado.

 E, se por um lado a máquina pública reclama reformas, por outro, a sociedade reclama a prestação dos serviços essenciais, como sistematiza Maria Sylvia Zanella DI PIETRO[9]:

Devem ficar a cargo do Estado as atividades que lhe são próprias como ente soberano, consideradas indelegáveis ao particular (segurança, defesa, justiça, relações exteriores, legislação, polícia); e devem ser regidas pelo princípio da subsidiariedade as atividades sociais (educação, saúde, pesquisa, cultura, assistência) e econômicas (industriais, comerciais, financeiras) as quais o Estado só deve exercer em caráter supletivo da iniciativa privada, quando ela for deficiente.

                       Na mesma esteira, a doutrina de Maria João ESTORNINHO[10] enumera motivos capazes de justificar a atuação do Terceiro Setor:

·         agilidade na criação e gestão de atividades administrativas instrumentais;

·         descentralização do poder de gestão e administração da coisa pública;

·         limites da responsabilidade próprios e autônomos;

·         menor ingerência política;

·         legalidade, porém com flexibilização das regras públicas de organização dos instrumentos de ação;

·         processos decisórios ágeis e desburocratizados;

·         economia de mercado (competição);

·         fatores econômicos, como rentabilidade, controle de despesas (economia), diversificação sistemática de funções (bens e serviços);

·         simplificação dos recursos humanos aplicados à prestação contratual (não de servidor público);

·         fatores financeiros, como financiamentos privados, redução dos custos administrativos, vantagens fiscais;

·         cooperação com outros entes organizacionais (públicos e privados), que é o fenômeno típico do terceiro setor, principalmente pelo maior acesso (e apelo participativo) da sociedade civil; e

·         cooperação internacional (especialmente nos setores de pesquisa e intercâmbio cultural).

 De fato, com as reformas administrativas implementadas a partir de 1995, essa onda privatista teve início, inaugurando uma nova fase de prestação de serviços públicos, a qual só teria efetividade com a conformação de novas instituições jurídicas, podendo ser fomentadas pelo Poder Público, mas desvinculadas da Administração, mesmo da Indireta. 

                         É um modelo que garante a realização dos serviços públicos, através de parcerias entre os entes públicos e a iniciativa privada, o que garante um considerável elemento de mobilização social.

           É o que diz Adriana MAURANO[11]:

O processo de desestatização se caracterizou pelo incremento da prestação indireta, pois aumentaram as delegações destes serviços. A forma indireta se caracteriza, basicamente, por quatro diferentes modalidades, a saber: concessão, permissão, autorização e terceirização. Nestas formas, as empresas atuam como uma "longa manus" do poder estatal, atuando em setores de responsabilidade do Estado. Sobre todas as formas paira uma mais abrangente, que diz respeito a todas, chamada de desregulamentação – que visava a desburocratização, mas que acabou por gerar novas regulamentações. Em resumo, nesta nova fase, o Estado não é mais o único provedor de serviços públicos, pois com a quebra do monopólio estatal, estes foram delegados à iniciativa privada.

 Carlos Vasconcelos DOMINGUES[12], ao citar Claus Offe, discorre sobre as mais diversas formas de identificação das entidades do Terceiro Setor, o que corrobora com entendimentos enumerados acima:

Com o surgimento de novas formas de prestação de serviços públicos – sendo identificadas por alguns autores 36 alternativas – verifica-se a superação da tradicional dicotomia entre o setor público e o privado. Assiste-se assim, à superação do modelo monístico que se sustentava, de forma mutuamente excludente, ora sobre o estado, ora sobre o mercado, ora sobre a comunidade, como garantidor da ordem e da coesão social. O modelo monístico cede lugar à emergência de novos arranjos institucionais que conjugam aqueles três elementos básicos da ordem social. Segundo este modelo híbrido, no qual os papéis do estado, do mercado e da comunidade se delimitam e se definem a partir do debate político e da participação social, não é possível excluir-se um desses elementos da construção da ordem social, o que se contrapõe aos princípios neoliberais de prevalência do mercado.

Deste modo, no capitalismo contemporâneo, além das formas tradicionais de propriedade – a estatal e a privada –, surge a propriedade pública não-estatal, constituída pelas organizações sem fins lucrativos, cuja ação está orientada para o atendimento do interesse público.

 

2.      A atuação do Terceiro Setor: generalidades 

Entre as entidades do Terceiro Setor podem ser mencionadas as de utilidade pública, as entidades filantrópicas, os serviços sociais autônomos, as Organizações Sociais (OS) e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP).

 Apesar de cada uma ter suas especificidades, as entidades do Terceiro Setor, basicamente, têm as seguintes características:[13]

·         são pessoas jurídicas de direito privado;

·         criadas pela iniciativa privada;

·         desempenham atividade de interesse público, atuando paralelamente ao Estado na área dos serviços sociais (como saúde, cultura, assistência etc.);

·         atuam sem fins lucrativos;

·         muitas vezes têm vínculo jurídico com o Estado, que exerce em relação a elas a atividade de fomento;

·         sujeitam-se a controle estatal quando recebem algum tipo de incentivo ou ajuda financeira.

 Como fatores de insegurança jurídica que atrapalham o avanço desse Estado Subsidiário, temos a ineficiência e lentidão do Poder Legislativo na Reforma do Estado, o fortalecimento da figura dos chefes do Executivo e a deficiência do Judiciário, extremamente moroso e finalista.[14] 

Outros riscos decorreriam do surgimento de entidades paraestatais aparelhadas pelo Estado e “livres das amarras do direito administrativo, especialmente licitação e concurso público”[15], sujeitando-se apenas a um controle exercido pela própria sociedade, e esse controle de resultados nem sempre ocorre de maneira satisfatória. 

Não obstante a existência desses obstáculos, verificamos um crescente incentivo na transferência das atividades de interesse público para ambientes não estatais, com uma sociedade mais bem organizada e otimizada, tomando parte na consecução de objetivos coletivos. 

2.1.   Organizações Sociais (OS) e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP)

 Num cenário de reforma administrativa, surgem as Organizações Sociais e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, inseridas no Terceiro Setor, mas com características próprias, já que não possuem natureza eminentemente privada, nem tampouco pública. Essas organizações foram introduzidas no Terceiro Setor muito recentemente, através da edição das Leis 9.637/98 e 9.790/99, respectivamente.

 Robério Nunes dos ANJOS FILHO[16], ao tratar do modelo das organizações sociais brasileiras, faz uma analogia aos modelos estrangeiros:

As organizações sociais, ao que tudo indica, foram inspiradas em instituições estrangeiras análogas, especialmente nas quangos – quasi non-governmental organizations, entidades autônomas desenvolvidas principalmente após a Segunda Guerra Mundial (embora a presença de alguns órgãos semi-independentes seja verificada há séculos no governo britânico), nas quais se transformaram as universidades e hospitais públicos do Reino Unido. Outros países europeus adotaram este tipo de instituição, que terminou por se espalhar pelo mundo, alcançando também, por exemplo, a Austrália e a Nova Zelândia. Tais entidades são voltadas para áreas sociais, recebem recursos públicos, firmam relação contratual com o Estado e submetem-se a exigências relativas à composição do seus órgãos de deliberação.

 O autor menciona, ainda, a dificuldade doutrinária na identificação das quangos, mas aponta três características fundamentais presentes nas mesmas: “o recebimento de dinheiro público; a atuação em atividades de interesse público; e não se tratar de órgão cuja direção seja entregue a um gestor diretamente eleito”[17].

 MODESTO[18], ao traçar características dessas organizações sociais, estabelece similitudes e divergências entre os dois modelos tratados nesse capítulo:

Os traços comuns são os seguintes: 1. a iniciativa privada voluntária na sua criação e na sua constituição; 2. a existência de limites gerais à livre constituição e funcionamento dos órgãos de direção ou gerência como requisito para o exercício de ato posterior de reconhecimento ou qualificação; 3. a afetação a uma finalidade de interesse público ou socialmente relevante; 4. o recebimento de favores especiais, subsídios isenções e contribuições do Estado; 5. a submissão a uma vigilância especial e a limitações de ordem administrativa que vão alem do simples poder de polícia exercido sobre as demais pessoas privadas; 6. sujeição do controle do Tribunal de Contas e à fiscalização do Ministério Público; 7. a necessidade de reconhecimento formal por parte do Estado, segundo um procedimento especial regulado por lei; 8. a destinação legal do patrimônio social a outra entidade de mesma natureza, em caso de extinção da entidade, não sendo permitido seja o patrimônio repartido entre os membros da instituição; e 9. a submissão ao regime jurídico das pessoas de direito privado, com derrogações de direito público.

Os traços diferenciais básicos são os seguintes: 1.os estatutos das organizações sociais devem prever e adotar determinado modelo de composição para os seus órgãos de deliberação superior, inclusive prevendo a participação necessária de representantes do Estado, como requisito para permitir o ato posterior de qualificação pelo Poder Público; 2. o trespasse de bens e recursos públicos nas organizações sociais está condicionado à assinatura de contratos de gestão com os órgãos competentes da administração pública federal; 3. o estatuto da organização social deve prever, também como um requisito da qualificação, sujeição da entidade à publicação anual no Diário Oficial da União do relatório de execução do acordo ou contrato de gestão (relatório gerencial das atividades desenvolvidas, apoiadas pelo Poder Público, e não apenas do relatório formal da contabilidade da entidade); 4. o estatuto deve prever, como requisito de qualificação, regras rígidas de reforma das finalidade sociais, bem como normas para a definição impessoal das regras a serem adotadas para a remuneração do pessoal da entidade e para o sistema de compras; 5. o estatuto ainda deve prever que a entidade estará sujeita a controle externo de resultados, periódico e a posteriori, realizado por comissão de avaliação composta por especialistas de notória qualificação, especialmente destinado à verificação do cumprimento do contrato ou acordo de gestão firmado com o Poder Público; 6. as entidades qualificadas como organizações sociais poderão utilizar bens materiais e recursos humanos de entidades extintas do Estado, desde que a extinção tenha sido realizada por lei específica; 7. as entidades qualificadas poderão também absorver atividades e contratos de entidades extintas, também quando autorizados por lei, bem como os seus símbolos designativos, desde que estes sejam seguidos obrigatoriamente do símbolo OS.

 Em trabalho abordando as Organizações Sociais, Jayme BALEEIRO NETO[19] apresenta um quadro comparativo entre as OS e as OSCIP:

 

OS

OSCIP

Definição legal

Lei n.º 9.637/98

Lei n.º 9.790/99

Tipo de instrumento previsto para recebimento de recursos públicos

Contrato de Gestão (art. 5º)

Termo de Parceria (art. 9)

Ato de Qualificação

Discricionário – emitido pelo poder executivo

Vinculado – emitido pelo Ministério da Justiça (Certificado arts. 5º e 6º)

Finalidades

Escopo restrito: ensino, pesquisa científica, desenvolvimento  tecnológico, meio ambiente, cultura e saúde (art. 1º)

Escopo de ação amplo, incluindo as finalidades das OS, mais: assistência social, Segurança alimentar e nutricional, voluntariado, desenvolvimento econômico e social, direitos civis e outros valores universais (art. 3º),

Vínculo com a Administração Pública

Mais estreito, normalmente nascem da publicização de serviços prestados pelo poder público (art. 20). Há membros do poder público no Conselho de Administração (art.2º, I, ‘c’) Recebem créditos orçamentários específicos e bens e servidores públicos cedidos (art.12 a 14). O próprio Contrato de Gestão estreita esse vínculo

Não há vínculo (arts. 1º e 2º) com o poder Público até a celebração do Termo de Parceria. O vínculo é de interesse público, se extinta, seu patrimônio deve ser transferido para outra OSCIP ( art. 4º, IV)

Licitações

Regulamento próprio – (art. 17 da lei 9.637/98) obedecendo a princípios da Administração Pública (art. 7 da Lei 9.637/98)

Regulamento próprio – (art. 14 da lei 9.790/99) obedecendo a princípios da Administração Pública (art. 4, inciso I, da Lei 9.970/99)

Prestação de Contas

Prestam contas também diretamente ao TCU – IN 12/96, alterada pela Decisão n.º 592/98,

Prestam contas ao poder Público anualmente, na vigência do Termo de Parceria (art. 4º, VII, art. 10, §2º,V); em princípio essa prestação de contas deverá ser feita diretamente aos órgãos repassadores dos recursos, à semelhança do procedimentos adotados para os convênios

Controle Social (conselhos, publicações de relatórios, etc.)

Órgão repassador dos recursos (supervisor), prestação anual de contas, comitês de avaliação, TCU (em caso de irregularidades) – art. 2º, I, ‘d’, ‘f’, art. 8º, art. 9º, da Lei 9.637/98. Conselho de Política Pública, art. 10, § 1º

Art. 4º, VII, ‘b’, ‘d’, art. 10, § 2º, art. 12, da Lei 9.790/99.

Auditorias, art. 4º, VII, ‘c’.

                     

                       Ao tratar do tema, Celso Antônio BANDEIRA DE MELLO, critica frontalmente alguns aspectos do modelo criado para as OS, como a discricionariedade para concessão do título de organização social e a possibilidade dessas entidades receberem “bens públicos, dotações orçamentárias e servidores públicos, a custa do erário, sem processo regular em que se assegure igualdade a quaisquer interessados em obter tais benesses”[20], o que representaria inconstitucionalidade patente.

                       A corroborar com a inconstitucionalidade da Lei 9.637/98, Jayme BALEEIRO NETO[21] indica a propositura de duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade, pelo Partido dos Trabalhadores[22] e pela Ordem dos Advogados do Brasil[23]. Apesar das ações terem sido distribuídas no final do ano de 1998, ambas ainda não foram decididas, sequer, liminarmente.

                        As inconstitucionalidades apontadas por BANDEIRA DE MELLO[24], no que tange a atribuição do qualificativo, não são verificadas no formato jurídico das OSCIP, especificamente no que tange a concessão do título, uma vez que se trata de ato vinculado.

 Para finalizar esse tema, recorremos, novamente, às lições de Paulo MODESTO[25], que afirma que o título de organização social é conseqüência da atuação de determinada entidade e não um requisito para sua existência:

O título de organização social, conferido pelo poder público, faz incidir sobre as instituições reconhecidas um plexo de disposições jurídicas especiais, que asseguram vantagens e sujeições incomuns para as tradicionais pessoas jurídicas qualificadas pelo título de utilidade pública. Em qualquer dos dois títulos referidos, porém, dá-se um plus à personalidade jurídica das entidades privadas, que passam a gozar de benefícios especiais não extensíveis às demais pessoas jurídicas privadas (benefícios tributários e vantagens administrativas diversas).

A todo rigor, portanto, nenhuma entidade é constituída como organização social. Ser organização social não se pode traduzir em uma qualidade adquirida, resultado de um ato formal de reconhecimento do Poder Público, facultativo e eventual, semelhante em muitos aspectos à qualificação deferida às instituições privadas sem fins lucrativos quando recebem o título de utilidade pública.

 

2.2.  Destinação de recursos públicos para o setor  privado e a necessidade da licitação

                        Para garantir o controle das entidades do Terceiro Setor, o Poder Público deve se utilizar de instrumentos que se configurem capazes de estipular os recursos humanos e materiais com os quais a entidade deve dispor, para alcançar seus objetivos.[26]  

                         A fiscalização da execução dos contratos é feita pela ponderação da atuação das entidades, em consonância com os insumos disponibilizados para tanto. Nesse contexto, a não obtenção dos resultados previstos no contrato de gestão gera o bloqueio do repasse das verbas públicas.[27] 

                           É o contrato de gestão que vincula o Terceiro Setor aos programas governamentais, como bem anota Glauco Martins GUERRA[28]:

O contrato de gestão estabelece a ligação entre o núcleo estratégico do Estado (que define os objetivos ou metas a serem cumpridos e os fiscaliza) e os demais setores da sociedade civil, deixando de regrar a atividade social não exclusiva do Estado por lei (em que há relação de mando e subordinação), em troca de uma disciplina normativa elaborada mediante instrumento contratual (típico do Direito Civil), em que há relação de coordenação e cooperação. É a substituição do sistema de controle baseado no princípio da legalidade e na supremacia do interesse público sobre o privado, pelo controle baseado no princípio da consensualidade, nas quais as metas são negociadas e preestabelecidas pelas partes.

 O que ocorre, nos contratos de gestão, é a transferência de recursos públicos para a iniciativa privada, de forma que “é necessário demonstrar que todo valor repassado foi utilizado na consecução daquele resultado”[29], pois os insumos destinados ao Terceiro Setor têm característica de dinheiro público.

 No que tange os contratos administrativos com as entidades do Terceiro Setor, Odete MEDAUAR[30] expõe a necessidade de procedimento licitatório para sua formalização:

(…) se a administração resolver realizar convênio para resultado e finalidade que poderão ser alcançados por muitos, deverá ser realizada licitação ou se abrir a possibilidade de conveniar sem limitação, atendidas as condições fixadas genericamente; se assim não for, haverá ensejo para burla, acobertada pela acepção muito ampla que se queira dar aos convênios. Alguns casos ocorrem na prática, nos quais, a título de convênio, obras são contratadas sem licitação e pessoas são investidas em funções e empregos públicos sem concurso ou seleção. 

E nem poderia ser diferente, pois, diferentemente dos particulares que possuem a liberdade de contratar com quem e nas condições que desejarem, o Poder Público deve se submeter a um rigoroso processo de escolha das melhores condições para contratar, visando precipuamente ao interesse público, buscando, sempre, dois objetivos distintos, quais sejam, proporcionar às entidades públicas a possibilidade da realização do negócio mais vantajoso para a coletividade, e assegurar aos administrados a oportunidade de participar nos negócios das referidas entidades.[31]

 Convém salientar que dentre esses negócios se incluem os convênios, sendo, portanto, indiscutível a exigência da realização de licitação na escolha da entidade a ser conveniada.

 O contrato de gestão possui características próprias dos contratos administrativos, todavia, em razão das entidades do Terceiro Setor não possuírem fins lucrativos, inexiste o equilíbrio econômico-financeiro. Assim, a natureza do contrato de gestão se aproxima muito da dos convênios.

E dessa maneira, os contratos de gestão podem ser distratados pela sua própria expiração ou, ainda, por ato unilateral da Administração, com larga margem de discricionariedade do agente público.

                  Conclusões finais: a recente experiência brasileira

 Em trabalho apresentado no final de 2002 [n. 28], Glauco Martins GUERRA[32] apontou o crescimento do Terceiro Setor, verificando que havia “250 mil organizações não-governamentais inscritas e cadastradas, atuando no território nacional”. Apontou, ainda, que “essas entidades, nas mais diversas áreas de atuação e especialidade, tinham movimentação de R$ 12 bilhões anuais, o que representa 1,5% do PIB brasileiro”, o que o levou a concluir que o Terceiro Setor no Brasil passa por um processo de profissionalização.

 Como exemplo dessa profissionalização, o autor aponta a entidade Viva Rio[33], que surgiu, em 1993, com o objetivo de atuar com projetos sociais capazes de diminuir as causas da crescente onda de violência vivenciada pela população da cidade do Rio de Janeiro.

 Por conta de sua atuação social, a entidade conseguiu uma forte mobilização da sociedade fluminense, a partir do que, ganhou uma grande exposição na mídia nacional, atuando com projetos nas áreas de direitos humanos, segurança pública, desenvolvimento comunitário, educação, esportes e meio ambiente. 

Com objetivos semelhantes aos da Viva Rio, foi fundado em 1997, após a realização do seminário São Paulo sem Medo, o Instituto São Paulo Contra a Violência, uma entidade não governamental e sem fins lucrativos, com ações voltadas para “quatro áreas estratégicas: a) melhoria dos serviços de segurança pública; b) melhoria dos serviços de justiça criminal; c) melhoria do sistema penitenciário; e d) desenvolvimento de políticas sociais e urbanas de prevenção”[34].

 A penetração social dessa entidade também é bastante significativa, a ponto do Governo do Estado de São Paulo fomentar, através dessa ONG, o chamado Disque-Denúncia, um serviço essencial que conta com alto grau de credibilidade, junto à opinião pública, registrando números significativos em sua atuação.

Com 545.520 denúncias e 26.839 ligações que deram em sucesso até março de 2007, os resultados são surpreendentes: a) 25.025 prisões flagrantes; b) 91 seqüestros solucionados; c) 3.116 fugitivos recapturados; d) 4.689 armas e munições apreendidas; e) 1.647 veículos recuperados; f) 1.511 casos de furtos de energia resolvidos; g) 1.481 postos flagrados com combustíveis adulterados; h) 237 empresas flagradas em sonegação fiscal; i) 232 cargas recuperadas.[35]

 Na concepção de Estado Subsidiário, todavia, esse tipo de atividade não caberia, em hipótese alguma, ao Terceiro Setor. Aliás, nem mesmo num Estado Mínimo, as atividades relacionadas com a segurança pública poderiam ser delegadas a entidades particulares.[36]

 O fato é que a disseminação das entidades do Terceiro Setor irradia seus efeitos e faz surgir uma série de atividades paralelas, responsáveis pelo assessoramento – jurídico e político – dessas ONGs. Levando-se em conta que, não raramente, essas assessorias representam fins ilegítimos, bem como nem sempre se utilizam de meios ortodoxos para obtenção de seus objetivos, o Terceiro Setor começa a sofrer uma certa crise de confiabilidade. 

                          Nesse contexto, foi apresentado requerimento e instaurada, no Senado Federal, a chamada CPI das ONGs, com o objetivo de

Apurar, no prazo de cento e vinte dias, a liberação, pelo Governo Federal, de recursos públicos para organizações não governamentais – ONGs – e para organizações da sociedade civil de interesse público – OSCIPs, bem como a utilização, por essas entidades, desses recursos e de outros por elas recebidos do exterior, a partir do ano de 1999 até o ano de 2006.[37]

 Essa comissão, que teve sua composição definida no último dia 5 de junho, conta com onze parlamentares que, nos próximos dias, devem eleger os membros da Mesa – presidente, vice-presidente e relator –, para que se iniciem os trabalhos de investigação. 

Referências bibliográficas

 ANJOS FILHO, Robério Nunes dos. A Prestação dos serviços não-exclusivos na reforma administrativa. Dissertação de Mestrado. Salvador: UFBA, 2001.

BALEEIRO NETO, Jayme. As Organizações Sociais e o Controle dos Tribunais de Contas. Dissertação de Mestrado. Salvador: UFBA, 2002.

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo, 14 ed. São Paulo: Malheiros, 2002.

CITADINI, Antônio Roque. Comentários e Jurisprudência sobre a Lei de Licitações Públicas, 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 1997.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública. São Paulo: Atlas, 3. ed. 1999.

______. “O cidadão e sua defesa. A ‘Res Publica’ e sua defesa” In: Seminário Internacional Sociedade e a Reforma do Estado. São Paulo, 1998. Disponível em: <http://www.mp.gov.br/arquivos_down/seges/publicacoes/reforma/seminario/pietro.pdf.> Acesso em: 3.abr.2007.

______. As Organizações Sociais e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Publico. Palestra, São Paulo. Disponível em: <http://www.mp.sp.gov.br/pls/portal/url/item/2225ec202fbaa08ce040a8c02c01601f.> Acesso em: 17.abr.2007.

DOMINGUES, Carlos Vasconcelos. O controle externo e os novos modelos de gestão de serviços públicos: As organizações sociais. Salvador: TCE, 2000.

ESTORNINHO, Maria João. A fuga para o Direito Privado – Contributo para o estudo da actividade de direito privado da Administração Pública. Coimbra: Almedina, 1999.

FALCONER, Andres Pablo, A promessa do Terceiro Setor: um Estudo sobre a Construção do Papel das Organizações Sem Fins Lucrativos e do seu Campo de Gestão, 1999. Disponível em: <http://www.lasociedadcivil.org/uploads/ciberteca/andres_falconer.pdf.> Acesso em: 5.jun.2007.

GUERRA, Glauco Martins. Apontamentos sobre o Terceiro Setor no Brasil: Breve Análise Jurídica. Monografia. São Paulo: 2002, p. 42. Disponível em: <http://www.trt15.gov.br/escola_da_magistratura/Rev21Art17.pdf.> Acesso em: 12.jun.2007.

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MUKAI, Toshio. Direito Administrativo Sistematizado, 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2000.

 

 

[1] De acordo com Cíntia LIESENBERG, “Em nome do Terceiro Setor”, In: Líbero, ano VI, n. 12, São Paulo: Casper Líbero, 2003, p. 87: “a expressão ‘terceiro setor’ foi importada para o vocabulário brasileiro para designar atividades que falam em nome do interesse público, sem fins lucrativos e desenvolvidas pela sociedade civil. Traduzida do inglês – third sector, tem utilização recente, foi aplicada pela primeira vez por pesquisadores nos Estados Unidos na década de 70 e, na Europa, nos anos 80”. Disponível em: <http://www.facasper.com.br/pos/libero/libero12/Em%20nome%20do%20terceiro%20setor%2086-95.pdf.> Acesso em: 10.jun.2007.

[2] Michael O’NEILL, Nonprofit Management Education: History, Current Issues and the Future. In: Michael O’NEILL & Kathleen FLETCHER (eds.), Nonprofit Management Education: U.S. and World Perspectives. Westport: Praeger, 1998, apud Andres Pablo FALCONER, A promessa do Terceiro Setor: um Estudo sobre a Construção do Papel das Organizações Sem Fins Lucrativos e do seu Campo de Gestão, p. 3, 1999. Disponível em: <http://www.lasociedadcivil.org/uploads/ciberteca/andres_falconer.pdf.> Acesso em: 5.jun.2007.

[3] Op. cit., p. 4.

[4] “O cidadão e sua defesa. A ‘Res Publica’ e sua defesa”. In: Seminário Internacional Sociedade e a Reforma do Estado. São Paulo, 1998, p. 2. Disponível em: <http://www.mp.gov.br/arquivos_down/seges/publicacoes/reforma/seminario/pietro.pdf.> Acesso em: 3.abr.2007.

[5] Idem.

[6] “Reforma do Marco Legal do Terceiro Setor no Brasil”. In: Revista de Direito Administrativo, n. 214, Rio: Renovar, 1998, p. 59.

[7] cf. FALCONER, op. cit., p. 3: “A emergência do terceiro setor representa, em tese, uma mudança de orientação profunda e inédita no Brasil no que diz respeito ao papel do Estado e do Mercado e, em particular, à forma de participação do cidadão na esfera pública. Isto tem levado à aceitação crescente da ampliação do conceito de público como não exclusivamente sinônimo de estatal: ‘público não-estatal’.”

[8] Nesse período, o Terceiro Setor passa a ser visto de maneira diferente, mas seu núcleo concepcional já ecoava, há muito, com obras sociais realizadas por particulares, como por exemplo, as Santas Casas de Misericórdia.

[9] Parcerias na Administração Pública, 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005, pp. 37-38.

[10] A fuga para o Direito Privado – Contributo para o estudo da actividade de direito privado da Administração Pública. Coimbra: Almedina, 1999, pp. 47-48.

[11] A redefinição do papel do Estado e a introdução de novas figuras jurídicas no Direito brasileiro. Jus Navigandi: Teresina, ano 9, n. 531, 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6073.> Acesso em: 10.jun. 2007.

[12] O controle externo e os novos modelos de gestão de serviços públicos: As organizações sociais. Salvador: TCE, 2000, p. 141.

[13] DI PIETRO. As Organizações Sociais e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Publico. Palestra, São Paulo. Disponível em: <http://www.mp.sp.gov.br/pls/portal/url/item/2225ec202fbaa08ce040a8c02c01601f.> Acesso em: 17.abr.2007.

[14] cf. DI PIETRO, O cidadão e sua defesa. A “Res Publica” e sua defesa, p. 3.

[15] Idem.

[16] A Prestação dos serviços não-exclusivos na reforma administrativa. Dissertação de Mestrado. Salvador: UFBA, 2001, pp. 152-153.

[17] Idem.

[18] Op. cit., pp. 61-62.

[19] As Organizações Sociais e o Controle dos Tribunais de Contas. Dissertação de Mestrado. Salvador: UFBA, 2002, p. 36

[20] Curso de Direito Administrativo. 14 ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 217.

[21] Op. cit., p. 43.

[22] ADI-1923, promovida em dezembro de 1998. Rel. Min. Ilmar Galvão. Fundamentação Constitucional: art. 5º, XVII e XVIII; art. 22, XXVII; art. 23, I, II, III, IV, VI, VII; art. 37, II, XXI; art. 40, I, III, “a” a “d” e § 4º; art. 049, X; art. 70; art. 71, II, III; art. 74, I, II, III, IV, §§ 1º e 2º; art. 129, I, II, III; art. 169, § 1º, I, II; art. 175, caput; art. 194, caput e parágrafo único; art. 196; art. 197; art. 199, § 1º; art. 205; art. 206, III, IV, VI; art. 208, I a VII, §§ 1º e 2º; art. 211, § 1º; art. 213, I, II; art. 215, caput; art. 216, I a V e § 1º; art. 218, §§ 1º, 2º, 3º e 5º; art. 225, § 1º, I, II, V e VII; e art. 209. Disponível em: <www.stf.gov.br/jurisprudencia>. Acesso em: 7.jun.2007.

[23] ADI-1943, promovida em dezembro de 1998. Rel. Min. Ilmar Galvão. Fundamentação Constitucional: art. 1º; art. 5º, caput e inc. I; art. 37, caput e incisos; art. 39; art. 84, II; art. 100; art. 167, IV; art. 175, caput; art. 196; art. 205; art. 215; art. 216, §§ 1º e 2º; art. 218, § 5º; e art. 218, § 1º <Disponível em: www.stf.gov.br/jurisprudencia.> Acesso em: 7.jun.2007.

[24] Ao distinguir as OS e as OSCIP, o autor (op. cit., p. 218) indica pontos que considera relevantes: “a) atribuição do qualificativo não é, como naquelas, discricionária, mas vinculada e aberta a qualquer sujeito que preencha os requisitos indicados; não prevê o trespasse de servidores públicos para nelas prestar serviço; b) não celebram ‘contratos de gestão’ com o poder Público, mas ‘termos de parceria’, conquanto, tal como neles, seja especificado um programa a cumprir, com metas e prazos fiscalizados, além da obrigação de um relatório final, o que os faz mais distintos, entre si, pelo nome do que pelo regime; c) os vínculos em questão não são condicionantes para a qualificação da entidade como tal, ao contrário do que ocorre com as ‘organizações sociais’; d) o Poder Público não participa de seus quadros diretivos, ao contrário do que ocorre naquelas, e e) o objeto da atividade delas é muito mais amplo, compreendendo, inclusive, finalidades de benemerência social, ao passo que as ‘organizações sociais’ prosseguem apenas atividades de ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente, cultura e saúde”.

[25] Op. cit., p. 60.

[26] No mesmo sentido, Hely Lopes MEIRELLES, Direito Administrativo Brasileiro, 28. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 386: “acordos firmados por entidades públicas de qualquer espécie, ou entre estas e organizações particulares, para realização de objetivo comum dos partícipes.”

[27] Verificada a malversação dos recursos públicos, além do bloqueio do repasse, os responsáveis pela execução do contrato respondem por eventual ato de improbidade.

[28] Apontamentos sobre o Terceiro Setor no Brasil: Breve Análise Jurídica. Monografia, São Paulo: USP, 2002, p. 38. Disponível em:

 <http://www.trt15.gov.br/escola_da_magistratura/Rev21Art17.pdf.> Acesso em: 12.jun.2007.

[29] Toshio MUKAI, Direito Administrativo Sistematizado, 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 402.

[30] Direito Administrativo Moderno, 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 273.

No mesmo sentido, Antônio Roque CITADINI, Comentários e Jurisprudência sobre a Lei de Licitações Públicas, 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 1997, p. 467.

[31] cf. BANDEIRA DE MELLO, op. cit., pp. 466-468.

[32] Op. cit., p. 42.

[33] Disponível em: <www.vivario.org.br.> Acesso em: 10.jun.2007.

[34] Disponível em: <http://www.spcv.org.br/content/view/2/3/.> Acesso em: 10.jun.2007.

[35] Disponível em: <http://www.spcv.org.br/content/view/7/1/.> Acesso em: 10.jun.2007.

[36] cf. DI PIETRO, Parcerias na Administração Pública, p. 38: “No caso dos serviços públicos típicos do Estado, prevalecem os procedimentos e princípios próprios do redime jurídico administrativo ou de direito público.”

[37] Disponível em: <http://www.senado.gov.br/sf/atividade/Comissoes/consComCPI.asp?com=1382.> Acesso em 9.jun.2007.

 


 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

LEONARDO FREIRE PEREIRA:  Advogado. Especialista em Direitos da Cidadania. Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, na condição de bolsista da CAPES/MEC. Doutorando em Direito do Estado na Faculdade de Direito da USP. Professor de Direito Constitucional e Direito do Consumidor nos cursos de Graduação da Universidade Cruzeiro do Sul (UNICSUL) e Universidade Guarulhos (UNG). Ministrou aulas nos cursos de Pós-Graduação lato sensu do Centro Universitário de Araraquara (UNIARA), Instituto Nacional de Pós-Graduação (INPG), Instituto de Educação e Cidadania (IEC) e União Educacional do Norte (UNINORTE). Membro da Associação Brasileira dos Constitucionalistas. Presidente da Comissão de Ensino Jurídico da OAB-Guarulhos. Diretor do Procon de Guarulhos. Coordenador dos Procons Municipais da Macro Região Metropolitana de São Paulo. E-mail: lfreirepereira@usp.br.

 


 

Semelhança de dois vestidos de gala vira ação judicial que chega até o STJ

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DECISÃO – A empresa Sérgio Pacheco Alta Moda e o próprio estilista Sérgio Pacheco (como pessoa física) definitivamente não estão obrigados a reparar financeiramente a jovem Luisa Costa Ribeiro que alegou que aqueles teriam descumprido contrato de exclusividade ao confeccionar dois vestidos “iguais”, para baile de debutantes. A recente e definitiva decisão é do STJ,  onde a questão chegou, via agravo de instrumento, contra a negativa de seguimento de recurso especial.

A quizila judicial consumiu, desde o ajuizamento da ação, até agora, dois anos e dois meses. Nos próximos dias será a vez de as advogadas Mônica Guazzelli Estrougo e Renata Salle Russowsky – que atuaram na defesa da empresa e do estilista – executarem seus honorários (modestos) de R$ 917.

Confirmando sentença do juiz Giovanni Conti, da 15ª Vara Cível de Porto Alegre, a 9ª Câmara Cível do TJRS, em 24 de maio de 2006, julgou improcedente a ação movida pela jovem, representada por sua mãe. O colegiado considerou que "é natural que as debutantes se pareçam, pois, em regra e por força da própria tradição que rege o próprio evento, os vestidos escolhidos são brancos, longos, bordados e com volume na parte inferior". Conforme a desembargadora Iris Helena Medeiros Nogueira, "exclusividade nesse sentido seria impossível dentro de critérios razoáveis de convivência social".
 
A família da debutante fez um pagamento à vista no valor de R$ 4,6 mil, com a garantia de que ela receberia uma peça exclusiva em todo o país. A jovem foi ao baile de debutantes de sua cidade (Uruguaiana, setembro de 2004) e, duas semanas depois, participou de semelhante evento social na Associação Leopoldina Juvenil, em Porto Alegre. No clube da capital constatou
"uma debutante com um modelo idêntico ao seu". Ao ser informada de que havia sido confeccionado pelo mesmo estilista, “sentiu-se enganada quanto à exclusividade”. 

A petição inicial refere que a situação causou abalo na vida social da jovem, pois se sentiu envergonhada e acabou evitando contato com as colegas durante a festa. Em função do transtorno ocorrido, ajuizou ação. Os pedidos foram dois: indenização consistente na devolução do valor do vestido e reparação de R$ 12 mil pelo dano moral. 

O estilista Sérgio Pacheco e sua empresa sustentaram que "os vestidos não são iguais". Ressaltaram as diferenças de modelagem, corte, bordado e movimento. Rebateram o dever de ter que reparar financeiramente por danos morais, uma vez que a autora colocou uma fotografia sua no “Orkut”, usando o vestido questionado. Concluíram que "a utilização deve ter sido motivo de orgulho e não de vergonha, uma vez que colocou a foto na Internet". 

Analisando as fotografias dos vestidos questionados, os desembargadores da 9ª Câmara concluíram – numa tirada de alta-costura – que
"ambos são brancos, longos, com bordado predominante na parte superior em sentido diagonal e volume na parte inferior, não fugindo do conceito de um vestido de debutante".

A relatora também constatou  que
“as semelhanças param por aí e a diferença mais evide

nte é conferida na parte das costas, que possui corte reto horizontal, além de ter uma espécie de fita solta ao final da alça, no lado direito, enquanto o outro é todo aberto, e o corte é em formato de V”.  (Proc. n° 70014406177).


 

FONTE:  STJ – redação do Jornal da Ordem, 14 de junho de 2007.

Decisão autoriza penhora de conta-salário de servidor público para pagamento de dívida

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DECISÃO  * Garantia da impenhorabilidade não pode servir de impedimento para cumprir responsabilidades assumidas e não pagas

A 4ª Turma Cível do TJDFT manteve hoje decisão de 1ª instância que autorizou a penhora de 30% dos proventos de aposentadoria de um militar reformado. Não valeu a insurgência do devedor em afirmar que a verba de natureza alimentar não poderia ser penhorada. Para a maioria dos Desembargadores, a garantia da impenhorabilidade não pode servir de impedimento para cumprir responsabilidades assumidas e não pagas. A dívida objeto da controvérsia data de 2004. Nunca houve pagamento.

De acordo com a Turma, a penhora de apenas uma porcentagem da verba de natureza alimentar não fere o espírito do artigo 649 do Código de Processo Civil. O objetivo da proteção legislativa, no entendimento dos julgadores, é evitar que o pagamento de determinada dívida torne inviável a subsistência do devedor.

Pelas conclusões do julgamento, o artigo que veda a penhora sobre os salários, soldos e proventos deve ser interpretado levando-se em conta as outras regras processuais civis. Assim, devem ser respeitados os princípios da própria execução. Um deles, dos mais importantes, afirma que os bens do devedor serão revertidos em favor do credor, a fim de pagar os débitos assumidos.

Para a maioria dos Desembargadores da 4ª Turma, até mesmo as verbas de natureza alimentar são livremente negociáveis, disponíveis. Um dos exemplos apresentados durante as discussões do caso foi a consignação em folha de pagamento, prática cada vez mais comum entre servidores públicos, em que se destina previamente parte do salário para o pagamento de determinadas dívidas.

O bloqueio incidirá sobre 30% das verbas recebidas mensalmente, até ser alcançado o valor total do débito. A sentença é de novembro de 2004 e já transitou em julgado, ou seja, não há mais possibilidade de recurso quanto à condenação.

A origem desse recurso é uma ação de cobrança. Segundo informações dos autos, o devedor celebrou contrato com a credora para a produção de leitões. Não cumpriu suas obrigações no pacto sucessivas vezes, causando um prejuízo material à outra parte que ultrapassa os R$ 63 mil.  (Nº do processo:20070020045140)


FONTE: TJ-DF, 14 de junho de 2007

A missão do Conselho Nacional de Justiça

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  * Luiz Guilherme Marques –

(Dedico este artigo a REYNALDO XIMENES CARNEIRO, Desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, pelo seu amor à Magistratura e amizade que dedica a todos seus colegas de todas as instâncias e entrâncias)

O Consultor Jurídico (www.conjur.com.br) divulgou, em 15/06/2007, um artigo de MARIA FERNANDA ERDELYI intitulado Achando o caminho com o subtítulo Ellen reconhece que CNJ se perdeu em casos isolados: 

A ministra Ellen Gracie reconheceu, nesta sexta-feira (15/6), que o Conselho Nacional de Justiça, sufocado em demandas, ficou preso na análise de casos isolados. Mas que eles também serviram para análises amplas. “Interesses individuais foram trazidos ao conhecimento do Conselho. Isso pode ser um pequeno desvio, mas mesmo estes casos serviram para adotarmos medidas mais amplas”, disse.

Ela lembrou dos principais resultados conquistados, durante cerimônia de posse dos novos conselheiros no CNJ. Ellen Gracie mencionou o veto ao nepotismo no Poder Judiciário, as regras fixadas para aplicação do teto remuneratório e o estabelecimento dos critérios para composição dos órgãos especiais nos tribunais.

A presidente do STF e do CNJ ressaltou, ainda, que o Conselho deve buscar sua missão maior: a modernização do Poder Judiciário como órgão de planejamento estratégico. “O grande trabalho do Conselho é o de planejamento estratégico da instituição. É pensar qual é o Judiciário que o país quer ter nos próximos 20 anos. Precisamos vencer a crise do passado para a qual não estávamos preparados e preparar o Poder do futuro”.

Outras iniciativas do Conselho foram pontuadas pela ministra, como o apoio na criação de varas especializadas de combate ao crime organizado e também à violência doméstica. Destacou, ainda, o esforço empreendido para estimular a conciliação no projeto "Conciliar é Legal", marcando o ponto de partida de uma alteração de mentalidade em relação à solução de conflitos.[…].

Duas coisas eu gostaria de comentar quanto às constatações da respeitável Presidente do CNJ.

1) É verdade que o CNJ perdeu um tempo enorme julgando requerimentos de interesse pessoal, sem nenhuma utilidade para o Judiciário como instituição.

2) A missão principal do CNJ, de traçar planos a nível nacional para aperfeiçoamento da instituição, ficou apenas no começo.

Tenho uma explicação pessoal para o ítem 1: muitos dos que peticionaram ao CNJ estavam se sentindo injustiçados pelos Tribunais aos quais estavam subordinados. Isso acontecia, algumas vezes, porque eles eram a última instância administrativa. Havia, da parte de alguns superiores (felizmente, em pequeno número), um tratamento muito "de cima para baixo" em relação a juízes e serventuários, o que só se atenuou com a atuação do CNJ.

Quanto ao ítem 2, a atitude de confronto de alguns Tribunais frente ao CNJ dificultou a concretização de planos a nível nacional.

Faço um parêntese para dizer que, de minha parte, na qualidade de cidadão, procurei apresentar sugestões de interesse geral, encaminhando ao CNJ alguns Pedidos de Providências versando sobre: 1) multiplicação do número de Varas de Infância e Juventude, Família, Execuções Criminais e congêneres nas Comarcas mais importantes; 2) inclusão, nos concursos públicos para ingresso na Magistratura, da prova de Cultura Geral, que poderia englobar, por exemplo, as seguintes disciplinas: História do Brasil, Geografia do Brasil, Informática, Psicologia, Mercosul, um idioma estrangeiro e Literatura brasileira; 3) criação de Setores de Conciliação nos Tribunais (inclusive Superiores) em que o instituto da conciliação seja admissível; e 4) criação de departamentos de conciliação, em prazo razoável, para funcionamento permanente.

Empossada a nova equipe de Conselheiros, na certa, deverá ter mais condições de cumprir sua missão de realizar o planejamento estratégico da instituição, mesmo sem deixar de lado os requerimentos justos de pessoas que lhe baterem às portas.

Peço licença aos prezados Leitores para mais um comentário sobre o assunto em estudo.

Os juízes do interior vivem e trabalham sob a vigilância das Corregedoria de Justiça dos seus respectivos Tribunais. Não estranharam a presença de mais um órgão fiscalizador, no caso, o CNJ.

Normalmente as Corregedorias são imparciais e justas com os juízes e com as pessoas que representam contra eles. Vez por outra, no entanto, aparecem Corregedores e/ou seus auxiliares que são verdadeiros inquisidores, gerando inquietação e insegurança…

Quanto aos membros dos Tribunais não estavam afeitos a esse tipo de pressão e estranharam a vigilância do CNJ. Não aceitaram a situação nova…

Agora, só resta esperar que o CNJ não seja tão duro com os Tribunais como alguns poucos dos nossos superiores hierárquicos foram conosco algumas vezes…

 


 

DADOS BIOGRÁFICOS

Luiz Guilherme Marques: Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG).
Site: www.artnet.com.br/~lgm