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EXCESSO DE VELOCIDADE JUSTIFICADOTJSC anula multa de ambulância por excesso de velocidade

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DECISÃO:  * TJ-SC – A 3ª Câmara de Direito Público do TJ negou recurso do Estado de Santa Catarina e manteve a anulação do auto de infração de trânsito imposto à ambulância da Unimed de Criciúma – Cooperativa de Trabalho Médico da Região Carbonífera Ltda.

O motorista, ao conduzir duas crianças gravemente feridas para o Hospital Regional de Araranguá na SC 449, foi autuado por excesso de velocidade.

A empresa argumentou estado de necessidade, e urgência do deslocamento, além da prioridade de circulação para pedir a anulação da penalidade – multa de R$ 518,00, considerada gravíssima.

O fato aconteceu em 2001, quando a empresa fornecia atendimento médico durante a "XI Arrancada de Caminhões", em Balneário Arroio do Silva, e duas meninas de cinco anos de idade ficaram gravemente feridas.

“Suficientemente demonstrado o estado de saúde dos pacientes e, via de conseqüência, a necessidade do urgente atendimento especializado, justificada, resulta, a ultrapassagem dos limites de velocidade estipulados para a rodovia, por força do direito fundamental à vida”, explicou a relatora do processo, desembargadora substituta Sônia Maria Schmitz.

O Estado alegou ter ilegitimidade para responder pela causa. A magistrada, entretanto, confirmou a sua participação, pois é ele o credor dos valores arrecadados pelo Departamento de Estradas de Rodagens – DER com as multas de trânsito. Ela lembrou ,ainda, que a ambulância foi conduzida por pessoa habituada a transporte de vítimas de acidentes e estava devidamente sinalizada. Com a decisão, julgada de forma unânime pela Câmara, a sentença da Comarca de Criciúma restou confirmada. (AC n. 2002.028025-4)

 

FONTE:  TJ-SC, 12 de dezembro de 2007.


A NÃO INTERVENÇÃO DO MP ANULA SENTENÇA TJ cassa decisão sobre indenização de “pílula de farinha”

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DECISÃO:  *TJ-GO  –  Por considerar que nas ações que envolvam interesses de menor a intervenção do Ministério Público (MP) é obrigatória, a 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) cassou sentença do juízo da 4ª Vara de Família, Sucessões e Cível de Goiânia que negou pedido de indenização por danos materiais e morais formulado pela dona de casa Eva de Oliveira Alves contra o laboratório Schering do Brasil Química e Farmacêutica Ltda. Ao propor a ação, Eva, representada pelo advogado Edilberto de Castro Dias, alegou que consumia regularmente o anticoncepcional Microvlar, cuja produção, distribuição e comercialização era de responsabilidade do laboratório, mas que em razão da sua negligência foi vítima de uma gravidez não planejada.  

A apelante argumentou ainda que foram distribuídas pela Schering 650 mil cartelas de "pílulas-placebo", causando danos irreparáveis a diversas mulheres em todo o País. No entanto, o juízo singular indeferiu tal pedido sob o argumento de que não houve nexo de causalidade, requisito indispensável para o reconhecimento da responsabilidade civil do laboratório. Citando o artigo 82 do Código de Processo Civil (CPC), João Ubaldo explicou que a intervenção do MP é condição indispensável ao desenvolvimento válido e regular do processo. "A não abertura de vista ao MP para se manifestar antes da prolação de sentença é motivo de sua nulidade, uma vez que se faz necessária a intervenção em todas as fases", esclareceu.  

Ementa  

A ementa recebeu a seguinte redação: "Apelação Cível. Ação de Indenização. Interesse de Incapaz. Intervenção Obrigatória do Ministério Público. Ausência. Nulidade. Nas ações que versem sobre interesses de incapaz, a intervenção do Ministério Público é obrigatória, nos termos do artigo 82, inciso I, do CPC. A ausência de intimação do parquet de primeiro grau no momento oportuno, conforme determina do artigo 246, do Estatuto Processual, inquina de nulidade absoluta o processo, mormente, se o órgão do Ministério Público de segundo grau, a quem competiria sanar a falha, argüi a nulidade do processo. Apelo prejudicado. Sentença cassada". Apelação Cível nº 114312-5/188 (200703100593), de Goiânia.

 


 

 

FONTE:  TJ-GO, 10 de dezembro de 2007.

TDA – TÍTULOS DA DÍVIDA PÚBLICA SEM EXIGIBILIDADETíítulos da dívida pública do início do século XX estão prescritos por inércia dos credores

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DECISÃO:  *TRF-RJ  –   A Terceira Turma Especializada do TRF da 2ª Região decidiu manter sentença da Justiça Federal do Rio que entendeu que apólices da dívida pública, emitidas nos anos de 1902 a 1941, pelo Governo Federal, estão prescritas. As apólices foram emitidas para captar recursos visando à realização de obras públicas, como a estrada de ferro Madeira-Mamoré, que nunca foram concluídas. Nos termos da sentença, a prescrição se deu após a data limite estabelecida pelos decretos-leis 263/67 e 396/68. Por esses decretos-leis, o Governo Federal reconheceu a impossibilidade da conclusão das obras, bem como chamou os credores “para o resgate dos créditos estabelecidos e, conseqüentemente, reputando-se implementada a condição suspensiva do vencimento das apólices”.

A causa começou por conta de a Rufolo Empresa de Serviços Técnicos e Construções Ltda. ter ajuizado ação ordinária na Justiça Federal, pedindo que fosse reconhecido seu suposto direito de compensar os valores a serem resgatados com tributos previdenciários, devidos pela empresa ao INSS. O relator da apelação foi o juiz federal convocado Luiz Mattos.  Processo nº 1999.51.01.017763-7

 

Inteiro teor da decisão



RELATOR

:

JUIZ FEDERAL CONVOCADO LUIZ MATTOS

APELANTE

:

RUFOLO EMPRESA DE SERVICOS TECNICOS E CONSTRUCOES LTDA

ADVOGADO

:

RICARDO XAVIER DE ARAUJO FEIO E OUTROS

APELADO

:

UNIAO FEDERAL/FAZENDA NACIONAL

APELADO

:

INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS

PROCURADOR

:

ALEXANDRA DA SILVA AMARAL PESTANA

ORIGEM

:

DÉCIMA SEGUNDA VARA FEDERAL DO RIO DE JANEIRO (9900177630)

R E L A T Ó R I O 

Trata-se de apelação cível interposta por RUFOLO EMPRESA DE SERVIÇOS TÉCNICOS E CONSTRUÇÕES LTDA. em face da sentença proferida pelo juiz da 12ª Vara Federal/RJ que julgou improcedente o pedido de resgate de Títulos da Dívida Pública para dação em pagamento, compensação tributária ou pagamento por precatório na ação ordinária nº 99007763-0 ajuizada contra a União Federal e o INSS – INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL.

Inconformada, argumentou a apelante, em apertada síntese, que a decisão objurgada é nula, eis que não tratou com escorreito exame e valoração todas as razões expostas na inicial; que as apólices trazidas aos autos por cópia estão autenticadas; que não há nos autos qualquer elemento de prova que permita a sustentação da motivação do magistrado a quo; que os Decretos-Leis nºs 263/67 e 396/68 são inconstitucionais, inocorrendo a prescrição; que o próprio governo reconheceu a validade dos títulos em questão quando da edição da MP 1238/95. Acrescentou, ainda, que há vários precedentes dos tribunais sobre a matéria.

O Instituto Nacional do Seguro Social – INSS apresentou suas contra-razões às fls. 862/865 argumentando que o prazo prescricional para resgate dos mencionados títulos foi fixado pelo Banco Central no DOU de 04.07.68; e que nenhuma razão autoriza o entendimento de que os referidos decretos são inconstitucionais.

Em contra-razões às fls. 869/874, alegou a União Federal que os decretos em voga mantiveram-se nos estritos lindes que lhe foram traçados pelo legislador; que o Banco Central publicou Resolução versando sobre os atos de execução necessários ao cumprimento dos comandos legais insculpidos na norma jurídica primária; que não ocorreu a prescrição como entende a apelante. Aduziu, ainda, que é impossível a compensação de créditos civis com créditos tributários por ausência de amparo legal.

O Ministério Público Federal opinou pelo improvimento do recurso às fls. 883/885.

É o relatório.

Rio de Janeiro, 15 de outubro de 2007. 

LUIZ NORTON BAPTISTA DE MATTOS

Juiz Federal Convocado

V O T O 

EMENTA: TRIBUTÁRIO. APÓLICES DE DÍVIDA PÚBLICA EMITIDAS NO INÍCIO DO SÉCULO XX (1902/1941). RESGATE. DECRETOS-LEIS NºS 263/67 E 396/68. PRAZO PRESCRICIONAL. ARTIGO 5º, XXXVI, CF/88.

1. Rejeitada a alegada nulidade da sentença, eis que a decisão analisou todas as questões trazidas  à baila.

2. Os títulos da dívida pública emitidos no começo do século XX visando à captação de recursos para a execução de obras públicas que não foram concluídas encontram-se prescritos em razão da inação dos credores, que não exerceram o resgate no prazo estipulado nos Decretos-Leis nº 263/67 e 396/68.

3. O Decreto-Lei nº 263/67 foi editado pelo Presidente da República sob a invocação expressa da atribuição a ele conferida pelo art. 9o, do Ato Institucional nº 4, de 7 de dezembro de 1966, ou seja, de acordo com o sistema jurídico em vigor na época que previa que este podia, mediante decretos-leis, dispor sobre matéria financeira de forma ampla, sendo perfeitamente possível disciplinar também o prazo prescricional para o resgate dos títulos, de forma acessória.

4. Inexistência de ilegitimidade na delegação da fixação das condições e prazos de resgate ao Conselho Monetário Nacional e ao Banco Central do Brasil (art. 12, do Decreto-Lei nº 163/67), eis que esta se limitou à expedição de atos executórios.

5. Quanto ao Decreto-Lei nº 396/68, este apenas alterou o dies ad quem do prazo prescricional fixado pelo Decreto-Lei nº 263/67, aumentando o prazo de resgate dos títulos da dívida pública para doze meses.

6. Tais decretos não contrariam direitos adquiridos (artigo 5º, XXXVI, CF/88) e atos jurídicos perfeitos, na medida em que  inexiste óbice à alteração de prazos prescricionais por lei (ou ato normativo equivalente), desde que mantida a relação jurídica originária, como ocorreu no caso.

7. Recurso improvido. 

Conforme relatado, trata-se de apelação cível interposta por RUFOLO EMPRESA DE SERVIÇOS TÉCNICOS E CONSTRUÇÕES LTDA. em face da sentença proferida pelo juiz da 12ª Vara Federal/RJ que julgou improcedente o pedido de resgate de Títulos da Dívida Pública para dação em pagamento, compensação tributária ou pagamento por precatório na ação ordinária nº 99007763-0 ajuizada contra a União Federal e o INSS – INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL.

Inconformada, argumentou a apelante, em apertada síntese, que a decisão objurgada é nula, eis que não tratou com escorreito exame e valoração todas as razões expostas na inicial; que as apólices trazidas aos autos por cópia estão autenticadas; que não há nos autos qualquer elemento de prova que permita a sustentação da motivação do magistrado a quo; que os Decretos-Leis nºs 263/67 e 396/68 são inconstitucionais, inocorrendo a prescrição; que o próprio governo reconheceu a validade dos títulos em questão quando da edição da MP 1238/95. Acrescentou, ainda, que há vários precedentes dos tribunais sobre a matéria.

Inicialmente, há de se rejeitar a alegada nulidade da sentença, eis que a decisão exarada pelo magistrado a quo analisou todas as questões trazidas à baila.

No que diz respeito ao mérito, no começo do século XX, o Governo Federal emitiu apólices da dívida pública visando à captação de recursos para a execução de obras públicas como a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, cujo prazo para a amortização somente se iniciaria com o término das obras.

Todavia, tais obras não foram concluídas, o que fez com que o Poder Executivo editasse o Decreto-Lei nº 263, de 28/02/1967, através do qual a União Federal reconheceu a impossibilidade de cumprir o que foi inicialmente proposto, com o chamamento dos credores para o resgate dos créditos estabelecidos e, conseqüentemente, reputando-se implementada a condição suspensiva do vencimento das apólices.

O referido ato normativo foi editado pelo Presidente da República sob a invocação expressa da atribuição a ele conferida pelo art. 9o, do Ato Institucional nº 4, de 7 de dezembro de 1966, ou seja, de acordo com o sistema jurídico em vigor na época.

Segundo tal diploma legal, podia o Chefe do Executivo, mediante decretos-leis, dispor sobre matéria financeira de forma ampla, sendo perfeitamente possível disciplinar também o prazo prescricional para o resgate dos títulos, de forma acessória.

Quanto à delegação da fixação das condições e prazos de resgate ao Conselho Monetário Nacional e ao Banco Central do Brasil (art. 12, do Decreto-Lei nº 163/67), entendo que esta se afigura legítima, tendo em vista que se limitou à expedição de atos executórios.

No tocante ao Decreto-Lei nº 396/68, este apenas alterou o dies ad quem do prazo prescricional fixado pelo Decreto-Lei nº 263/67, aumentando o prazo de resgate dos títulos da dívida pública para doze meses.

Tais decretos não contrariam direitos adquiridos e atos jurídicos perfeitos, na medida em que  inexiste óbice à alteração de prazos prescricionais por lei (ou ato normativo equivalente), desde que mantida a relação jurídica originária, como ocorreu no caso.

Assim, tendo o Banco Central do Brasil publicado edital, na forma prevista no Decreto-Lei nº 263/67, no sentido de que o dies a quo da exigibilidade dos títulos em comento ocorreu no dia 04 de julho de 1968, há muito se encontra exaurido o prazo prescricional para exigir judicialmente tais créditos.

A jurisprudência encontra-se pacificada no sentido do transcurso do prazo prescricional dos títulos da dívida pública, emitidos entre 1902 e 1941, em razão da inação de seus detentores, que não exerceram o resgate no tempo oportuno autorizado pelos Decretos-Leis nº 263/67 e 396/68, verbis:

“TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. TÍTULOS DA DÍVIDA PÚBLICA. RECUSA PELO EXEQÜENTE. VIABILIDADE. RESGATE. PRESCRIÇAO. DECRETO-LEI Nº 263/67. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. ART. 138, DO CTN. PARCELAMENTO DE DÉBITO TRIBUTÁRIO. MULTA MORATÓRIA. PRECEDENTES.

É legítima a recusa pelo exeqüente da nomeação à penhora de título da dívida pública de difícil e duvidosa liquidez, sem cotação em bolsa de valores.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pacificou-se no sentido de que prescreveram e tornaram-se inexigíveis os títulos da dívida pública emitidos no início do século XX que, em decorrência da inércia dos credores, não foram resgatados no tempo autorizado pelo Decreto-Lei nº 263/67.

omissis.

omissis. (STJ, RESP 499982/RS, 2a T., Rel. Min. João Otávio de Noronha, D.J. 14/08/2006)”

“ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ORDINÁRIA. APÓLICES DA DÍVIDA PÚBLICA EMITIDAS NO INÍCIO DO SÉCULO XX (1902 A 1941). RESGATE. DECRETOS-LEIS NºS 263/67 E 396/68. PRAZO PRESCRICIONAL.

Ação ordinária objetivando o reconhecimento da validade e o resgate de títulos públicos federais, emitidos em 1902 pela União, bem como a condenação da Ré ao pagamento de seu valor integralmente atualizado, acrescido dos demais consectários legais.

A jurisprudência desta Corte assentou a ocorrência da prescrição e, a fortiori, a inexigibilidade dos títulos da dívida pública, emitidos no início do Século XX (entre 1902 a 1941), decorrente da inação dos credores que não exerceram o resgate em tempo oportuno, autorizado pelos Decretos-Leis nºs 263/67 e 396/68.

Precedente Jurisprudencial desta Corte: RESP 678.110/SC, Relator Ministro José Delgado, publicado no DJ de 02/12/2004.

Recurso especial improvido. (STJ, RESP nº 655.512-PR, 1a T., Rel. Min. Luiz Fux, D.J. 01/08/2005).”

Ressalte-se, ainda, que a matéria já foi objeto de vários julgados desta Egrégia Turma dentre os quais  é exemplo o acórdão proferido na sessão do dia 13.02.2007:

TRIBUTÁRIO. APÓLICES DE DÍVIDA PÚBLICA EMITIDAS NO INÍCIO DO SÉCULO XX (1902/1941). RESGATE. DECRETOS-LEIS NºS 263/67 E 396/68. PRAZO PRESCRICIONAL.

1. Os títulos da dívida pública emitidos no começo do século XX visando à captação de recursos para a execução de obras públicas que não foram concluídas encontram-se prescritos em razão da inação dos credores, que não exerceram o resgate no prazo estipulado nos Decretos-Leis nº 263/67 e 396/68.

2. O Decreto-Lei nº 263/67 foi editado pelo Presidente da República sob a invocação expressa da atribuição a ele conferida pelo art. 9o, do Ato Institucional nº 4, de 7 de dezembro de 1966, ou seja, de acordo com o sistema jurídico em vigor na época que previa que este podia, mediante decretos-leis, dispor sobre matéria financeira de forma ampla, sendo perfeitamente possível disciplinar também o prazo prescricional para o resgate dos títulos, de forma acessória.

3. Inexistência de ilegitimidade na delegação da fixação das condições e prazos de resgate ao Conselho Monetário Nacional e ao Banco Central do Brasil (art. 12, do Decreto-Lei nº 163/67), eis que esta se limitou à expedição de atos executórios.

4. Quanto ao Decreto-Lei nº 396/68, este apenas alterou o dies ad quem do prazo prescricional fixado pelo Decreto-Lei nº 263/67, aumentando o prazo de resgate dos títulos da dívida pública para doze meses.

5. Tais decretos não contrariam direitos adquiridos e atos jurídicos perfeitos, na medida em que a inexiste óbice à alteração de prazos prescricionais por lei (ou ato normativo equivalente), desde que mantida a relação jurídica originária, como ocorreu no caso.

6. Recurso improvido.”

Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, nos termos da fundamentação supra.

É como voto.

Rio de Janeiro,    de             de 2007.

LUIZ NORTON BAPTISTA DE MATTOS

Juiz Federal Convocado 

E M E N T A 

TRIBUTÁRIO. APÓLICES DE DÍVIDA PÚBLICA EMITIDAS NO INÍCIO DO SÉCULO XX (1902/1941). RESGATE. DECRETOS-LEIS NºS 263/67 E 396/68. PRAZO PRESCRICIONAL. ARTIGO 5º, XXXVI, CF/88.

1.         Rejeitada a alegada nulidade da sentença, eis que a decisão analisou todas as questões trazidas  à baila.

2.         Os títulos da dívida pública emitidos no começo do século XX visando à captação de recursos para a execução de obras públicas que não foram concluídas encontram-se prescritos em razão da inação dos credores, que não exerceram o resgate no prazo estipulado nos Decretos-Leis nº 263/67 e 396/68.

3.         O Decreto-Lei nº 263/67 foi editado pelo Presidente da República sob a invocação expressa da atribuição a ele conferida pelo art. 9o, do Ato Institucional nº 4, de 7 de dezembro de 1966, ou seja, de acordo com o sistema jurídico em vigor na época que previa que este podia, mediante decretos-leis, dispor sobre matéria financeira de forma ampla, sendo perfeitamente possível disciplinar também o prazo prescricional para o resgate dos títulos, de forma acessória.

4.         Inexistência de ilegitimidade na delegação da fixação das condições e prazos de resgate ao Conselho Monetário Nacional e ao Banco Central do Brasil (art. 12, do Decreto-Lei nº 163/67), eis que esta se limitou à expedição de atos executórios.

5.         Quanto ao Decreto-Lei nº 396/68, este apenas alterou o dies ad quem do prazo prescricional fixado pelo Decreto-Lei nº 263/67, aumentando o prazo de resgate dos títulos da dívida pública para doze meses.

6.         Tais decretos não contrariam direitos adquiridos (artigo 5º, XXXVI, CF/88) e atos jurídicos perfeitos, na medida em que  inexiste óbice à alteração de prazos prescricionais por lei (ou ato normativo equivalente), desde que mantida a relação jurídica originária, como ocorreu no caso.

7.         Recurso improvido.

A C Ó R D Ã O 

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas:

Decide a Egrégia Terceira Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2a Região, à unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 23 de outubro de 2007(data do julgamento).

LUIZ NORTON BAPTISTA DE MATTOS

Juiz Federal Convocado


FONTE:  TRF-RJ (2ª Região), 10 dedezembro de 2007.

 

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PENSÃOConcessionária deve indenizar pais de menina morta com descarga de alta tensão

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DECISÃO:  *TJ-RS – Por unanimidade, a 6ª Câmara Cível do TJRS confirmou condenação da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE) pela morte de menina, com sete anos, devido à descarga de alta tensão em estação da concessionária. Os pais da vítima devem receber indenização por danos morais e pensão. O Colegiado reconheceu a omissão da CEEE quanto à segurança adequada no cercamento da subestação.

O fato ocorreu em 22/2/82, em São Lourenço do Sul. A ação foi ajuizada em 25/10/01.

A Justiça de 1º Grau determinou a reparação, por dano moral, ao equivalente a 150 salários mínimos na data da sentença, a cada genitor. Também condenou a ré ao pagamento de pensão no valor de um salário mínimo, a cada autor, desde a data da morte até quando a vítima fizesse 25 anos. Os autores da ação apelaram pedindo majoração da indenização e a CEEE, solicitando a reforma da sentença ou redução dos valores.

Fixação dos valores

A Câmara negou provimento ao recurso dos demandantes, fixando a reparação por danos morais em R$ 90 mil, referente aos 300 salários mínimos na data da sentença. Ao valor serão acrescidos correção monetária pelo IGP-M e juros de 12% ao ano. Deu parcial provimento ao apelo da CEEE, para reduzir a pensão a dois terços do salário mínimo, desde a data em que a criança faria 14 anos. De 25 anos até quando a vítima completasse 65 anos, o pensionamento será reduzido para a metade.

Conforme o relator das apelações das partes, Desembargador Odone Sanguiné, a prova dos autos é suficiente para demonstrar a falha na prestação do serviço, “consistente na falta de cuidados para isolamento da estação de alta tensão. Segundo testemunhas, havia considerável espaço entre a cerca e o pequeno muro, possibilitando o ingresso de uma pessoa por baixo do arame farpado. “Tudo a atestar a insuficiência de cerca para impedir eventual acidente, que acabou ocorrendo.”

Reduziu o valor inicial da pensão de um para dois terços do salário mínimo, considerando que houve negligência dos pais ao deixar a menina ir sozinha até a estação, apanhar um ninho de passarinho. “Fica evidente, em primeiro lugar, a conduta negligente da CEEE em não adotar dispositivos capazes de evitar danos”, acrescentou.

Em relação à concorrência de culpas, reforçou que a conduta da demandada foi muito mais determinante e grave para a ocorrência da morte da criança do que a de seus pais, ao permitir andasse sozinha até a estação. “Ora, qualquer pessoa poderia ter sofrido semelhante acidente.”

Votaram de acordo com relator, em regime de exceção da 6ª Câmara Cível, os Desembargadores Otávio Augusto de Freitas Barcellos e Angelo Maraninchi Giannakos. Proc. 70014826259


FONTE:  TJ-RS, 11 de dezembro de 2007.

COBRANÇA DE TAXA DE DIPLOMA É ILEGAL UNICOC não pode cobrar taxa para expedição de diploma

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DECISÃO:   *TRF-3-SP –   Em decisão liminar (tutela antecipada), proferida no dia 29/11 na 2ª Vara Federal de Ribeirão Preto/SP, a União de Cursos Superiores COC – UNICOC está proibida de cobrar qualquer espécie de “taxa” para expedição e/ou registro da 1ª via de diploma de graduação e pós-graduação de seus alunos. A decisão é válida para os alunos que ainda não colaram grau e para aqueles que já colaram grau mas não obtiveram, não retiraram ou não conseguiram registrar os respectivos diplomas em razão do não pagamento da taxa.

Com base na denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal, o juiz federal substituto Alexandre Alberto Berno entendeu que os alunos e a Instituição de Ensino Superior estão vinculados contratualmente, o que figura relação de consumo. “A Instituição de Ensino, enquanto fornecedora de serviços, somente pode cobrar do aluno, então consumidor, as importâncias e taxas previstas contratualmente no ato da matrícula ou sua renovação para cada período letivo. Tendo em vista que a contratação objetiva a graduação mediante o pagamento das mensalidades, surge evidente que a remuneração compreende as aulas e atividades correlatas, alcançando, ao final, a graduação materializada no diploma, devidamente registrado no órgão oficial competente, viabilizando a habilitação profissional”. 

Segundo o juiz, a autonomia referida às universidades pelo artigo 207 da Constituição Federal não a exime do cumprimento das normas gerais da Educação Nacional. “Neste sentido, o encargo cobrado do corpo discente não encontra abrigo na Lei nº 9.364/96, Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que recebeu as Resoluções 01/83 e 03/89, afastando o repasse do curso do diploma aos alunos, devendo ser arcados exclusivamente pelas Instituições de Ensino Superior’.

Alexandre Berno entende que a Lei Estadual 12.248/06, que autoriza a cobrança da taxa para expedição e registro de diploma de graduação e pós-graduação no Estado de São Paulo, é inconstitucional. “A referida norma invadiu competência constitucional da União para legislar sobre diretrizes e base da educação e não poderia contrariar a norma federal que recepcionou as resoluções do Conselho Federal de Educação”.

Observou, ainda, que é “falaciosa” a alegação de que a ausência de cobrança da taxa possa favorecer a falsificação dos diplomas. “Isto porque o autor (MPF) não questiona a cobrança para a confecção de diploma em outros materiais, como pele de carneiro ou pergaminho. Os alunos ainda permanecem com esta opção e tanto este modelo como o modelo padrão oficial continuam a existir no plano fático, apenas se impedindo a prática ilegal da cobrança pela expedição e registro da 1ª via no modelo padrão oficial”.

Por fim, o juiz considera a cobrança indevida e ilegal, “porquanto onera injustificadamente o aluno, especialmente o concluinte do curso de graduação, tendo já suportado o ônus das mensalidades escolares que servem para financiar os serviços acessórios ora em exame”. Foi estipulada multa diária de R$ 1 mil por aluno em caso de descumprimento da decisão.

 


 

 FONTE:  TRF3-SP, 06 de dezembro de 2007

LEI MARIA DA PENHATJ-GO nega hc a acusado que agrediu companheira

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DECISÃO: * TJ-GO  –  Aplicando pela primeira vez a Lei Maria da Penha (11.340/06), a 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) acompanhou voto do desembargador Aluízio Ataídes de Sousa (foto), e negou habeas-corpus a Gustavo Martins de Araújo, acusado de agredir sua companheira. Ao impetrar o hc, Gustavo pretendia revogar o recebimento da denúncia oferecida em seu desfavor perante o Juizado da Mulher de Goiânia , sob o argumento de que a Lei 9.099/95 não foi totalmente afastada com a Lei Maria da Penha e que era necessária representação da vítima. No entanto, Aluízio ponderou que desde a edição da lei a lesão corporal culposa e dolosa simples contra a mulher em ambiente doméstico, familiar ou íntimo passou a ser de ação penal pública incondicionada (quando somente o representante do Estado, o Ministério Público, pode intentar a ação penal independente da manifestação de vontade de quem quer que seja, bastando para tanto haver indícios suficientes de autoria e prova da materialidade do(s) crime(s). "Nesse caso é totalmente descabido que o magistrado, antes do recebimento da denúncia, intime a vítima para manifestar-se sobre eventual desejo de processar seu agressor", asseverou.  

Aluízio lembrou que antes da edição da lei as vítimas, fragilizadas pela violência e dependentes de seus agressores – econômica ou emocionalmente -, por não encontrarem o apoio no Judiciário e até mesmo, sentindo-se culpadas, acabavam por acatar a "sedução judicial" para desistir dos processos, sem receber qualquer orientação sobre seus direitos básicos. Explicou ainda que a lei afastou, por completo, a aplicabilidade da Lei 9.099/95, incluindo a exigência de representação prevista no artigo 88, aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher. "O objetivo desse dispositivo foi fazer com que a vítima não se sentisse mais pressionada a abrir mão do direito de processar o seu agressor, como ocorria no âmbito dos juizados especiais", esclareceu.

Ementa

A ementa recebeu a seguinte redação: "Habeas Corpus. Lei 11.340/06. Lesão Corporal Leve. Ausência de Representação da Vítima Antes do Recebimento da Denúncia. Nulidade. Inocorrência. Crime de Ação Penal Pública Incondicionada. A Lei 11.340/06 afastou, por completo, a aplicabilidade da Lei 9.099/95 aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, incluindo a exigência de representação assinalada no art. 88, para que a vítima não mais sinta-se pressionada a abrir mão do direito de processar o seu agressor. A lesão corporal culposa e dolosa simples contra mulher em ambiência doméstica, familiar ou íntima, passou a ser, desde a edição da Lei Maria da Penha, de ação penal pública incondicionada, sendo, por isso, de todo descabido, que o magistrado, antes do recebimento da denúncia, intime a vítima para manifestar-se sobre eventual desejo de processar o seu agressor. Ordem denegada". Habeas-Corpus nº 30.479-1/217 (200704548318), de Goiânia.

 


 

FONTE:  TJ-GO, 07 de dezembro de 2007. 

MORTE POR TABAGISMO GERA DANOS MORAIS Souza Cruz condenada a indenizar família de fumante

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DECISÃO:  * TJ-RS  –   Por 5 votos a 3, o 3º Grupo  Cível do TJRS desproveu  nesta tarde (7/12) recurso da Souza Cruz S.A. mantendo a condenação imposta pela 5ª Câmara Cível para que indenize a família de fumante como forma de reparação de danos morais pelo seu falecimento, causado por doenças decorrentes do uso de cigarros da empresa.

Serão beneficiadas a esposa e cinco filhos de Vitorino Mattiazzi, cada um em R$ 70 mil, e dois netos, com a quantia de R$ 35 mil cada. Os valores devidos a partir da sessão de julgamento da 5ª Câmara Cível, em 27/6/2007, deverão ser corrigidos aplicando-se juros legais a contar da morte, ocorrida em 24/12/2001, na ordem de 6% ao ano, até a entrada em vigor do novo Código Civil, em 11/1/2003, passando a incidir o percentual de 1% ao mês.

O Colegiado entendeu, por maioria, que a venda de cigarros é lícita. Mas “a mera licitude formal da atividade comercial não exonera a demandada de reparar prejuízos gerados por si comercializados e distribuídos”.

1º Grau

Vitorino Mattiazzi nasceu em 26/6/1940 e começou a fumar na adolescência. Chegou a consumir dois maços de cigarros por dia. Em 1998, foi diagnosticado ser portador de câncer no pulmão, falecendo em 24/12/2001, com a causa mortis “Adenocarcinoma Pulmão”. A família sustentou que o único fator de risco de Vitorino foi o tabagismo.

A empresa defendeu-se afirmando que exerce atividade lícita e cumpre as regras impostas pelo Governo Federal. Alegou que inexistiu a propaganda enganosa do cigarro ou do nexo de causalidade entre a publicidade e a decisão de Vitorino começar a fumar.

A sentença julgou os pedidos improcedentes. A família recorreu da decisão ao Tribunal de Justiça.

Câmara

Por voto de 2 a 1, a 5ª Câmara Cível do TJRS proveu o recurso da família de Vitorino. Para o relator, Desembargador Paulo Sergio Scarparo, “não há falar em liberalidade ou voluntariedade do usuário do tabaco”.  Considerou que a vontade do indivíduo “estava maculada, quer pela ausência de informações a respeito dos malefícios do produto, seja pela dependência química causada por diversos componentes, especialmente, pela nicotina”.

Já o Desembargador Pedro Luiz Rodrigues Bossle divergiu do relator. “No meu modo de ver, ainda que possam ser superados alguns pontos da tese defensiva da ré, o livre arbítrio inerente ao hábito de fumar acaba por direcionar o julgamento”. E continua: “Há muito tempo a sociedade conhece os malefícios do cigarro e obviamente que a propaganda associa o hábito de fumar com atividades prazerosas, o que não poderia ser diferente”. Ao concluir, afirmou: “Basta força de vontade para parar de fumar”.

O Desembargador Umberto Guaspari Sudbrack votou com o relator.

O Acórdão de 35 laudas pode ser lido na íntegra na Internet.

Grupo: voto majoritário

Houve a interposição de Embargos Infringentes pela empresa contra a decisão da Câmara, julgado nesta tarde. O Grupo é formado pelos integrantes da 5ª e da 6ª Câmaras Cíveis do TJRS.

Para o Desembargador Ubirajara Mach de Oliveira, relator no julgamento ocorrido hoje, a demanda da família tem que ser analisada dentro das relações de consumo. Entendeu que o ônus da prova cabe à empresa e não aos autores da ação. Observou que a relação havida entre Vitorino Mattiazzi e os produtos da empresa foi de “longa duração, constituída há mais de 40 anos”, como informou o depoimento da viúva.

Registrou o magistrado que “beira as raias da má-fé a alegação de que o óbito teria decorrido de culpa exclusiva do fumante, na medida em que a própria embargante reconhece que o tabagismo é, pelo menos, um fator de risco para as doenças que vitimaram o autor”.

“O depoimento pessoal da viúva”, diz o Desembargador Mach de Oliveira, “demonstra, justamente, a dificuldade do falecido em se livrar do vício, pois tentou parar várias vezes antes da doença (inclusive com uso de spray e balas)”.

Os Desembargadores Jorge Luiz Lopes do Canto, Paulo Sérgio Scarparo e Umberto Guaspari Sudbrack acompanharam as conclusões do voto do relator.

Grupo: voto minoritário

Já para o Desembargador Osvaldo Stefanello, que presidiu o julgamento, o suporte para a configuração do dever de reparação a título de dano moral é a caracterização de ato ilícito que seria praticado pela empresa. Mas, no caso, não há o ilícito.

A atuação da demandada na produção ou venda de cigarros, assim como na veiculação de publicidade atinente às suas marcas, encontra-se dentro das normas constitucionais e legais brasileiras, considerou.

“A propaganda das marcas de cigarro, até por não obrigar ninguém, não teria, por si só, o condão de levar o falecido marido, pai e avô dos autores ao fumo e assim mantê-lo a ponto de lhe causar a doença apontada, câncer de pulmão”, afirmou o Desembargador Stefanello. “Não vejo nos autos prova alguma a estabelecer entre a causa mortis de Vitorino Mattiazzi e o fato de ser ele fumante”, relatou.

“Do que se extrai dos autos é que o falecido passou a fumar desde cedo e continuou fumando por sua livre e espontânea vontade ou por seu livre arbítrio, não por ser induzido a tanto, em razão da publicidade das marcas de cigarros produzidos e comercializados pela empresa”,  concluiu.

Acompanharam as conclusões do voto do Desembargador Stefanello, os Desembargadores Leo Lima e Antônio Corrêa  Palmeiro da Fontoura.   Proc. 70022057582

 


 

FONTE:  TJ-RS, 07 de dezembro de 2007.

Limites objetivos e subjetivos da coisa julgada

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* Carlos Alberto Ferreira Pinto 

Sumário: 1. Introdução – 2. Sentença – 3. Coisa julgada e natureza jurídica  – 3.1 coisa julgada formal e material – 4. Limites objetivos da coisa julgada – 5. Limites subjetivos da coisa julgada – 6. Conclusão.


   

1. INTRODUÇÃO

De início, é de boa monta, a revisão de alguns conceitos que estão intimamente ligados ao desenvolvimento do presente artigo. Destacando-se para tanto os conceitos referentes à Sentença e a Coisa Julgada, para então desenvolver os limites objetivos e posteriormente os limites subjetivos da coisa julgada. 

2. SENTENÇA

O Código de Processo Civil[1] prevê em seu art. 162, §1º que "Sentença é o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269 desta Lei."A nova redação, dada ao artigo pela Lei 11.232/05, vem pacificar controvérsia doutrinaria que residia na redação anterior, dando a equivocada interpretação de que com a sentença ocorria a extinção do processo.

O mestre Alexandre Câmara cita da melhor doutrina pátria José Frederico Marques[2], o qual entende que "sentença é o ato processual que põe termo, julgando ou não o mérito, ao processo de conhecimento de primeira instância". Pois a sentença não põe fim ao processo, e sim ao procedimento de cognição em primeiro grau de jurisdição. Isto, porque, da sentença prolatada pelo magistrado, pode-se recorrer, a partir da interposição de recursos para a instância superior.

Muito embora não esteja expresso no texto da lei, a doutrina classifica a sentença em duas categorias, as sentenças terminativas e as definitivas.

Nesse sentido, leciona Alexandre Câmara[3] que "são sentenças terminativas aquelas proferidas por alguma das razões previstas no art. 267 do Código de Processo Civil, e são sentenças definitivas aquelas proferidas por alguma das razões previstas no art. 269 do CPC".

Entenda-se aí que sendo o processo cognitivo destinado a uma definição de direitos, o seu objetivo será alcançado apenas com a prolação de uma sentença definitiva, ou seja, uma sentença que defina o mérito da causa.

A sentença prolatada pelo magistrado tem que possuir os requisitos previstos no art. 458 do Código de Processo Civil, que são: o relatório, a fundamentação e o dispositivo. Todos devem estar, obrigatoriamente, na sentença, sendo que a ausência de qualquer um deles viciará a decisão.

O relatório é a parte da sentença em que o magistrado expõe todo o histórico do processo, desde a propositura da ação até aquele momento em que a sentença está sendo proferida.

A fundamentação é a parte da sentença em que o magistrado apresentará as suas razões de decidir, ou seja, os motivos que o levaram a proferir a decisão. Essa exigência de motivação tem cunho de princípio geral do Direito Processual, sendo garantia constitucional, prevista no art. 93, IX, da Constituição Federal de 1988[4] com redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004:

Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:

(…) IX. todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.

Por derradeiro, o dispositivo é a parte da sentença que tem conteúdo decisório. É no dispositivo que se encontra o comando contido na sentença, nele o magistrado irá apreciar ou não o mérito da causa.

A falta de qualquer dos requisitos implicará em vício da sentença. A doutrina aponta que, no caso da falta de relatório ou de motivação, acarretará em nulidade absoluta da sentença. E a falta de dispositivo implicará na inexistência jurídica da sentença.

3. COISA JULGADA E NATUREZA JURÍDICA

Nosso ordenamento jurídico prevê em seu art. 467, do Código de Processo Civil[5], que "Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário."

O termo coisa julgada vem do latim res judicata, significando que uma decisão judicial transita em julgado no momento em que se torna irrecorrível, ou seja, após esgotados todos os recursos admissíveis surge o instituto da coisa julgada.

Na doutrina pátria encontramos diversas definições para coisa julgada, sendo que a posição mais aceita é a de Enrico Tullio Liebman[6] entendendo que coisa julgada "é a imutabilidade do comando emergente de uma sentença", na visão de Liebman a coisa julgada consiste na imutabilidade da sentença em sua existência formal, e ainda dos efeitos dela provenientes.

Segundo esta teoria dominante, a coisa julgada tornaria imutável a sentença, fazendo com que aquele ato processual se tornasse insuscetível de alteração em sua forma, e ainda seriam imutáveis os seus efeitos, quais sejam, declaratórios, constitutivos e condenatórios.

Embora a teoria de Liebman seja a dominante, como já dissemos, alguns outros doutrinadores a ela se opõem como é o caso do professor Alexandre Câmara[7] que defende ser a coisa julgada "a situação jurídica consistente na imutabilidade e na indiscutibilidade da sentença e de seu conteúdo, quando tal provimento jurisdicional não está mais sujeito a qualquer recurso". Como outras tantas, a posição do mestre é minoritária na doutrina.

Definido o instituto da coisa julgada, há que se demarcar a sua natureza jurídica, sendo que encontramos na doutrina, diversas posições, sendo relevantes as duas mais conhecidas. Para a primeira corrente a coisa julgada é uma qualidade da sentença, já a segunda corrente entende que a coisa julgada é um efeito da sentença.

No contexto da primeira corrente, declara Liebman[8] que a natureza da coisa julgada é uma "qualidade da sentença", entendimento mais aceito na doutrina processualista, e que se contrapõe a visão romântica de que a coisa julgada é um efeito da sentença, na acepção de outros doutrinadores.

A sentença produz seus efeitos no momento da publicação, e não do trânsito em julgado. Sentença é autoridade da coisa julgada e a sua imutabilidade um dogma constitucional previsto no art. 5º, XXXVI da Constituição Federal vigente, verdadeira segurança jurídica, assecuratória da soberania da res judicata.

3.1 COISA JULGADA FORMAL E MATERIAL

Não estando mais sujeita a recurso, a sentença transita em julgado, tornando-se irrecorrível. Como visto o art. 467 do CPC limita-se a definir a coisa julgada material, quando na verdade, a coisa julgada deve ser considerada em dois aspectos: o formal e o material.

Ocorre a coisa julgada formal quando não é mais possível a impugnação da sentença no processo em que foi prolatada, ou seja, está ligada a idéia de término do processo, consistindo na impossibilidade de interposição de recursos pelo instituto da preclusão, seja pelo decurso de prazo, seja porque não são cabíveis, seja pelo próprio desinteresse da parte vencida, o que faz com que a sentença se torne imutável naquele processo em que foi prolata. Não é outro o entendimento do doutrinador Alexandre Câmara[9] que entende "a coisa julgada formal, porém, só é capaz de pôr termo ao processo, impedindo que se reabra a discussão acerca do objeto do processo no mesmo feito".

Dessa forma, todas as sentenças, sejam terminativas ou definitivas fazem coisa julgada formal, esta pode incidir sem que ocorra a coisa julgada material, por isso não tem ela o condão de impedir que se discuta a mesma lide em outro processo, é, portanto interna, ou seja, seus efeitos são endoprocessuais. Opera-se nas sentenças que extinguem o processo sem a análise do mérito.

Por esse motivo acima exposto, as sentenças definitivas, as quais contêm resolução de mérito, devem alcançar a coisa julgada material, auctoritas rei iudicatae. Esta consiste na impossibilidade de alteração do comando da sentença prolatada, nos próprios autos, a partir do momento em que não caiba qualquer recurso. A coisa julgada material possui dois efeitos, o endoprocessual e o exoprocessual, impedindo que outra demanda seja instaurada para se rediscutir a mesma lide.

Dá-se a coisa julgada material nas sentenças terminativas, definitivas ou nas decisões interlocutórias.

Não se pode olvidar que a coisa julgada se trata de uma garantia constitucional, como antes mencionada, de modo que nem a lei nova pode violá-la. Contudo, há relações jurídicas que, em função de sua natureza, impõem a possibilidade de revisão, sendo que as sentenças, nesses casos, são dadas rebus sic standibus (segundo as condições da situação fática em que são prolatadas), como é o caso, v.g., das ações de alimentos.

4. LIMITES OBJETIVOS DA COISA JULGADA

O tema, limites objetivos da coisa julgada, gerou divergência doutrinaria, mas acabou por pacificado pelo vigente Código de Processo Civil. Consiste na determinação do alcance da imutabilidade e indiscutibilidade da sentença transitada em julgado. O que se persegue é a distinção do que transitou em julgado.

Prevê o art. 468 do CPC que "A sentença, que julgar total ou parcialmente a lide, tem força de lei nos limites da lide e das questões decididas". A expressão lide, no nosso sistema, designa o objeto do processo (Streitgegenstand)[10], isto é, a pretensão ali deduzida: o mérito.

Nestes termos a sentença faz coisa julgada nos limites do objeto do processo, ou seja, nos limites do pedido.

 A imutabilidade apenas atinge a parte dispositiva da sentença, sendo que a verdade dos fatos e os fundamentos jurídicos não são protegidos pela coisa julgada, nos termos do art. 469 do CPC que se transcreve:

“Art. 469. Não fazem coisa julgada:

I – os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença;

II – a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença;

III – a apreciação da questão prejudicial, decidida incidentemente no processo."

No mesmo contexto o art. 474 do CPC determina que "Passada em julgado a sentença de mérito, reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido.", ou seja, se trata da eficácia preclusiva da coisa julgada.

Entende-se por eficácia preclusiva que, uma vez alcançada a sentença definitiva pela autoridade de coisa julgada, se tornam irrelevantes todas as alegações que poderiam ter sido deduzidas em juízo e não o foram, isto porque os motivos e fundamentos não transitam em julgado.

A preclusão é a perda de uma faculdade processual e se divide em três espécies, quais sejam, a temporal, a lógica e a consumativa. Ocorre a preclusão temporal quando a perda da faculdade processual se dá pelo decurso de prazo dentro do qual o ato deveria ter sido praticado. Já a preclusão lógica ocorre pela pratica de um ato incompatível com a faculdade que se perde. E por último a preclusão consumativa ocorre quando a faculdade desaparece por já ter sido exercida.

Feitas essas considerações, infere-se que a coisa julgada deverá atingir aquilo que está na essência do processo, restringindo-se o objeto da coisa julgada ao objeto da lide, em atendimento ao princípio da congruência ou co-relação.

Neste aspecto, as questões decidas pelo magistrado com a finalidade de se chegar ao dispositivo, apesar de importantes, não fazem coisa julgada. Logo, todo o conteúdo da sentença que não integra a parte dispositiva poderá ser reapreciado pelo judiciário.

O mesmo ocorre com as questões prejudiciais, que são aquelas que podem por si só constituir objeto de processo autônomo, surgem em outro processo, como antecedente lógico da questão principal, devendo ser decididas antes. Estas não são atingidas pela autoridade da coisa julgada, que só atinge o mérito. No entanto, "a decisão sobre questão prejudicial opera coisa julgada, se a parte requerer, o juiz for competente para conhecer a matéria e constituir pressuposto necessário para o julgamento da lide", na forma do art. 470 do CPC.

5. LIMITES SUBJETIVOS DA COISA JULGADA

Da mesma forma que a coisa julgada tem limites objetivos também possui seus limites subjetivos. Estes são tratados no art. 472 do CPC, o qual define, quais são as pessoas atingidas pela coisa julgada:

"A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros. Nas causas relativas ao estado de pessoa, se houverem sido citados no processo, em litisconsórcio necessário, todos os interessados, a sentença produz coisa julgada em relação a terceiros." 

Em outros termos, fixar os limites subjetivos da coisa julgada significa saber quem é atingido pela autoridade da coisa julgada material. Desse modo é que os terceiros não podem ser atingidos pela imutabilidade da sentença, mas podem ser atingidos indiretamente pelos seus efeitos.

É de boa monta a lição do Ministro Luiz Fux[11]:

A situação de conflito submetida ao Judiciário tem os seus protagonistas, e a decisão, a fortiori, seus destinatários. Outrossim, a sentença não vive isolada no mundo jurídico, ressoando possível que uma decisão reste por atingir a esfera jurídica de pessoas que não participaram do processo.

 Essa limitação da coisa julgada às partes, muito difundida no processo moderno, obedece a razões técnicas ligadas à própria estrutura do ordenamento jurídico, em que a coisa julgada tem o mero escopo de evitar a incompatibilidade prática entre os comandos e não o de evitar decisões incompatíveis. O principal fundamento para a restrição da coisa julgada às partes é de índole política, quer dizer, quem não foi sujeito do contraditório, não tendo a possibilidade de produzir suas provas e razões, e dessa forma influir sobre o convencimento do magistrado, não poderá ser prejudicado pela coisa julgada alcançada "inter alíos".

Entretanto, somente os terceiros que tenham um interesse jurídico, que seja conflitante com a decisão prolatada, e que em razão dela sofram um prejuízo também jurídico, é que podem a ela se opor. O terceiro juridicamente prejudicado é aquela pessoa que, sem ter sido parte no processo, for titular de alguma relação jurídica material afetada pela decisão. Não basta um interesse e respectivo prejuízo econômicos, para legitimar o terceiro a opor-se à decisão proferida, posto que nesses casos não há incompatibilidade entre o seu direito e aquele contemplado na sentença.

Neste ponto é importante considerar os limites subjetivos da coisa julgada em algumas hipóteses. Vejamos o caso da substituição processual, naqueles casos em que a parte era um legitimado extraordinário, atuando em nome próprio, na defesa de interesse alheio. A doutrina é unânime no entendimento de que a coisa julgada também se forma para o substituído, uma vez que é ele o titular do interesse levado a juízo.

Situação contrária é a da sucessão, seja entre vivos ou causa mortis, no processo em que se formou a coisa julgada. Não há dúvidas de que a coisa julgada impede nova discussão sobre o que já foi decido também para o sucessor. Isto porque com a sucessão, passa o sucessor a ocupar todas as posições jurídicas que eram anteriormente do sucedido, ficando sujeito, portanto as mesmas faculdades, ônus, sujeições, obrigações e direitos, sendo que a imutabilidade e indiscutibilidade da sentença agora o alcançam.

Outra situação a ser analisada é a coisa julgada nas ações de estado. O tema foi previsto no art. 472, in fine, do CPC. Nesse caso assevera o doutrinador Humberto Theodoro Júnior[12]:

Atendidos os pressupostos de legitimidade ad causam entre as partes da ação de estado (anulação de casamento, investigação de paternidade, etc.), o estranho não terá direito de discutir a matéria decidida, em outros processos, ainda que possa sobrer prejuízo em decorrência da decisão. 

A leitura do artigo traduz-se na conclusão de que nas questões de estado atribui-se eficácia erga omnes à coisa julgada, não tendo, os estranhos à questão, o direito de discutir a matéria decida, em outros processos, mesmo que sofram prejuízos decorrentes da decisão prolatada. 

6. CONCLUSÃO

O presente trabalho teve por escopo o estudo dos Limites Objetivos e Subjetivos da Coisa Julgada. Nesse sentido entendemos que os limites objetivos da coisa julgada estão ligados ao conteúdo da sentença, ou seja, a sua parte dispositiva. Já os limites subjetivos da coisa julgada estão ligados às partes, como regra geral, envolvidas na lide.

Hodiernamente a limitação subjetiva da coisa julgada às partes encontra-se ampliada, haja vista que, nas ações coletivas ajuizadas em defesa de interesses meta individuais, seja em relação ao meio ambiente ou em relação ao consumidor, na coisa julgada erga omnes da Ação Popular, na Lei da Ação Civil Pública, ou ainda no Código de Defesa do Consumidor, vieram a ampliar tais limites, estruturando-os de acordo com o resultado do processo, ou seja, secundum eventum litis.

No contexto do caso concreto, a autoridade da sentença poderá alcançar a todos, seja para beneficiá-los ou para prejudicá-los, ou ser apenas usada para favorecer membros da classe, sem que se prejudiquem suas pretensões individuais.

O artigo desenvolvido não tem o condão de esgotar a disciplina, mas tão somente, dar um apanhado geral sobre o tema.

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NOTAS

[1] BRASIL, Código de Processo Civil. Organizador Yussef Said Cahali. 9. ed. Ver., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007, p. 608.

[2] MARQUES, José Frederico apud CÂMARA. op. cit., p. 369.

[3] CÂMARA, Alexandre Freitas, Lições de Direito Processual Civil, v. I. 6ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002, p.370.

[4] BRASIL, Constituição Federal. Organizador Yussef Said Cahali. 9. ed. Ver., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007, p. 77.

[5] BRASIL, Código de Processo Civil.op. cit., p. 651.

[6] LIEBMAN apud CÂMARA, op. cit., p.395.

[7] CÂMARA, Alexandre Freitas, op. cit., p. 400.

[8] LIEBMAN apud CÂMARA, op. cit., p.399.

[9] CÂMARA, Alexandre Freitas, op. cit., p. 400.

[10] CÂMARA, Alexandre Freitas, op. cit., p. 403.

[11] FUX, Luiz. Curso de Direito Processual Civil: processo de conhecimento, processo de execução, processo cautelar. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p.1859.

[12] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. v. I. 38ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 492.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL, Código de Processo Civil. Organizador Yussef Said Cahali. 9. ed. Ver., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007.

BRASIL, Constituição Federal. Organizador Yussef Said Cahali. 9. ed. Ver., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007.

CÂMARA, Alexandre Freitas, Lições de Direito Processual Civil, v. I. 6ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002.

FUX, Luiz. Curso de Direito Processual Civil: processo de conhecimento, processo de execução, processo cautelar. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

MARQUES, José Frederico apud CÂMARA, Alexandre Freitas, Lições de Direito Processual Civil, v. I. 6ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. V. I. 38ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

 


 

 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

CARLOS ALBERTO FERREIRA PINTO: Bacharel em Direito pela Universidade Estácio de Sá. Pós-graduando em Direito Civil, Direito Processual Civil e Direito Empresarial pela FESUDEPERJ (Fundação Escola Superior da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro).

 


 

 

Ideologia da repressão

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* João Baptista Herkenhoff

O país redemocratizou-se há vinte anos atrás. Uma Constituição foi votada com intensa participação popular, como nunca havia acontecido no transcurso de nossa História. A Assembléia Constituinte que votou a Constituição de 1988 abriu-se à escuta dos anseios da cidadania. Dessa escuta resultaram emendas populares assinadas por cerca de quinze milhões de eleitores. As vozes da rua pleitearam Justiça Social, Educação, Democracia, Direitos Humanos. Não houve emendas populares pedindo o retrocesso institucional, o endurecimento da repressão, a supressão de garantias. Chegava-se ao fim do túnel e a comunidade nacional queria respirar Liberdade.

Entretanto, em contraste com a esperança de um novo ciclo histórico, bolsões de pensamento e comportamento ditatorial permaneceram em muitas instituições e espaços sociais, inclusive na Justiça, na Polícia, em órgãos de Governo, na Universidade, nos meios de comunicação.

É esse substrato cultural autoritário que está atrás de atos de violência praticados por autoridades públicas contra o cidadão. É esse substrato cultural que faz com que a Polícia, e até mesmo a Justiça, presuma a culpa e determine que a inocência seja provada.  É esse substrato que admite que, na persecução do crime, vidas de inocentes possam ser sacrificadas.

Faço estas reflexões a propósito da morte do advogado Geraldo Gomes de Paula, nas dependências de uma Delegacia de Polícia de Vitória. Esse digníssimo advogado foi vítima da brutalidade quando se encontrava no estrito cumprimento do dever. Seu falecimento é chorado, não apenas por sua família, mas também por milhares de pessoas que testemunharam sua retidão moral e dignidade de espírito.

À luz da ideologia da repressão não se entende o papel do advogado criminal, que é visto como “inimigo público”. Não se compreende que o advogado é indispensável à Justiça e que sem respeito ao advogado a Democracia naufraga. O advogado não defende o crime, mas sim o acusado de um crime ou até mesmo o culpado. Julgamento criminal que se faça sem a presença independente e atuante do advogado não é julgamento, mas arremedo de julgamento, farsa.

A violência urbana que, com razão, amedronta o povo, encoraja a ideologia da repressão. Segundo essa ideologia, tropas especializadas, com atiradores de elite, estão autorizadas a matar, uma vez que se encontram no desempenho de papel estratégico para preservar a segurança pública. O resultado disso é uma ilusória segurança, como estamos vendo todo dia.

Sem prejuízo da honesta, transparente e integral apuração dos fatos que causaram a morte do advogado Geraldo Gomes de Paula, o trágico episódio deve ser motivo para uma discussão ampla sobre o papel da Polícia numa sociedade democrática, debate esse que deve ser travado na sociedade e dentro da corporação policial.

 


 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA 

João Baptista Herkenhoff:  é Livre-Docente da Universidade Federal do Espírito Santo – professor do Mestrado em Direito, magistrado aposentado e escritor. E-mail: jbherkenhoff@uol.com.br

O crime culposo: desafio do terceiro milênio

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* Lélio Braga Calhau 

O recente incêndio em uma discoteca na cidade de Buenos Aires (pelo menos 175 vítimas fatais), a tragédia similar ocorrida em agosto de 2004 no Paraguai num centro comercial (pelo menos 296 mortos), acidentes de trabalho fatais e elevado número de mortes no trânsito no Brasil, inclusive em Minas Gerais, provocam uma breve reflexão sobre os caminhos que devemos adotar para reprimir os crimes culposos.

O crime culposo, em resumo, é o praticado com imprudência, negligência ou imperícia. Ele difere do crime doloso, porque nesse o agente quer o resultado (dolo direto) ou assume o risco de sua ocorrência (dolo eventual). Para que haja dolo eventual essa assunção do risco deve prever e aceitar o resultado, pois senão o crime é considerado culposo por falta grave. No crime culposo o causador deveria tomar as medidas preventivas para que o resultado não ocorresse e não o faz. Ele geralmente age com desídia ou desprezo com a situação de risco gerada para terceiros, mas não quer efetivamente a morte de ninguém.

Em regra geral, o final de um processo criminal por crime culposo (com uma, duas ou dez vítimas fatais) será o de condenação ao cumprimento de uma pena restritiva de direito, sendo que na maioria das vezes, é escolhida a prestação de serviço á comunidade. Já que a resposta final do Poder Público para o crime culposo é bastante desproporcional á dor causada ás vítimas e suas famílias, deveria haver um maior esforço de todos os Poderes no impedimento das situações de riscos.

A forma mais presente de crime culposo hoje em nossas vidas é a de trânsito. O trânsito brasileiro é muito violento. Quando o Código Brasileiro de Trânsito (CTB) foi sancionado em 1997 diversos setores se insurgiram contra o mesmo dizendo que era excessivo e injusto. Pois bem, o CTB só previu 11 crimes de trânsito. Apenas a título de comparação a Lei dos Crimes Ambientais de 1998 possui quase 60 crimes. A maioria das infrações de trânsito são administrativas e procuram evitar, em grande parte, o surgimento das situações de risco no trânsito. Os poucos crimes que foram adotados pelo CTB foram sendo esvaziados por posteriores entendimentos jurisprudenciais técnicos, mas profundamente destoados da realidade social do Brasil, como o julgado do Supremo Tribunal Federal de 2001 que passou a exigir o perigo concreto no crime de dirigir veículo automotor sem habilitação.

Ainda não existe um julgamento do Supremo Tribunal Federal sobre a inconstitucionalidade ou não do uso do bafômetro, mas, em sendo confirmada a sua proibição ou o não surgimento de uma presunção (passível de contra-prova) em desfavor do motorista embriagado, a impunidade vai estar sacramentada de vez no Brasil, nessa área. Os bafômetros mais modernos emitem um comprovante impresso dos dados que foram analisados. Tudo pode depois ser avaliado e não há prejuízo para a defesa. O paradoxo é que o próprio Poder Judiciário que não aceita o bafômetro, depois entende que a prova testemunhal não é suficiente para comprovar que uma pessoa estava ou não embriagada quando praticou um  crime de trânsito. As vítimas acabam ficando no prejuízo pois, ou ocorrerá uma condenação branda, ou em muitos casos o acusado será absolvido, pois a prova não vai ser admitida como válida pelo Poder Judiciário.

Enfim, o desafio da sociedade nesse terceiro milênio é encontrar um ponto de  equilíbrio nas medidas que devem ser adotadas para restringir as situações de risco que levam á ocorrência de crimes culposos, sem que isso descambe para uma excessiva intervenção do Poder Público em nossas vidas. Mas algo há de ser feito efetivamente, pois todos os Poderes (sem exceção) têm sua quota na responsabilidade de minimizar esse grave problema social. 

 

 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

Lélio Braga Calhau:  Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de Minas Gerais. Pós-Graduado em Direito Penal pela Universidade de Salamanca (Espanha). Mestre em Direito do Estado e Cidadania pela Universidade Gama Filho (RJ). Professor de Direito Penal da Universidade Vale do Rio Doce (UNIVALE). Presidente da seção mineira da Sociedade Brasileira de Vitimologia

* Artigo publicado no Jornal Hoje em Dia, Belo Horizonte, Minas Gerais, 07.01.05, página 02.