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A estratégia do Oceano Azul – o caso do maior vendedor de carros do mundo

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*Ari Lima

Aos trinta e cinco anos de idade Joe Girard, o homem que viria a ser considerado o maior vendedor de carros do mundo durante 12 anos, pelo livro Guinness de Recordes Mundiais, era um verdadeiro fracassado. Havia tentado se estabelecer em diversos negócios sempre com resultados decepcionantes. Em uma tentativa desesperada para conseguir emprego, tentou entrar no negócio de venda de automóveis, e uma sucessão de fatos acabou por mudar sua vida, e também criar uma nova metodologia de vendas,não apenas para o segmento de automóveis, mas também inspirar profissionais de vendas e empresas de diversas outras áreas.

Qual seria a explicação para o sucesso tão formidável de um profissional fracassado, apenas com o ensino fundamental, que em pouco tempo tornou-se o principal vendedor de carros da América e depois foi apontado pelo Guinness book como o maior vendedor de carros do mundo, não tendo competidor a altura durante os anos em que atuou como vendedor de carros?

A história de Joe Girard foi contada no livro autobiográfico “Como Vender Qualquer Coisa a Qualquer Um”, (Editora Record, 1982). Segundo seu relato, Joe Girard vendia em torno de 1500 carros mensais, o que dava uma média superior a 5 carros zero Km por dia. Qualquer vendedor de carros, pode achar esta tarefa praticamente i Joe Girard mpossível, no entanto esta era a realidade de Girard nos últimos anos em que atuou como vendedor até sua aposentadoria. Todo este desempenho tem explicação. Ele utilizava um método de trabalho bastante inovador e baseado em idéias simples e práticas.

Tudo começou quanto Joe Girard, se viu desempregado, e passando enormes necessidades financeiras junto com sua mulher e filhos. Procurou um conhecido que era gerente de uma concessionária de automóveis e lhe pediu emprego. A princípio o conhecido lhe negou o emprego argumentando que já havia muitos vendedores para os poucos clientes que apareciam na loja. Como ele estava desesperado, propôs ao gerente um acordo em que não atenderia aos clientes que viessem à concessionária, mas apenas àqueles que ele captasse por outros meios. Esta decisão obrigou Joe Girard a criar novas maneiras de captar, conquistar e construir relacionamentos com os clientes.

Analisando a trajetória deste formidável vendedor, podemos identificar muitas das ações inovadoras propostas na estratégia do oceano azul. A base desta estratégia, como ressalta os criadores desta metodologia revolucionária, é a empresa ou o profissional criar um ambiente em que torne a concorrência irrelevante. O objetivo é superar o oceano vermelho, em que ocorre uma acirrada concorrência entre empresas ou profissionais, e descobrir um oceano azul, onde possam nadar sozinhos num ambiente sem concorrentes.

Foi justamente isto que Joe Girard conseguiu. Enquanto os outros vendedores ficavam na loja de “braços cruzados”, aguardando os clientes chegarem, ele realizava uma série de ações planejadas para atrair e conquistar continuamente novos clientes, sem concorrer com seus colegas de loja.

Algumas das ações implementadas por Joe Girard, podem ser analisadas no contexto da metodologia criada pelos autores do livro “A estratégia do oceano azul”, Cham Kim e Renee Malbourne. Os autores sugerem que é preciso realizar determinados passos para visualizar o contexto do mercado e assim implantar a estratégia.

Para os autores é preciso parar de olhar apenas para os concorrentes e começar a pensar em oportunidades alternativas. Buscar novas competências, pesquisar empresas e profissionais estratégicos que estão se saindo bem no mercado, inclusive em outras áreas, examinar sua cadeia de clientes, pois seu futuro cliente pode estar atualmente em um mercado complementar ao seu. Examinar novas maneiras de realizar negócios, de atender expectativas e de buscar clientes.

Vamos mostrar algumas das ações, que faziam parte do método de trabalho de Joe Girard, que em geral não são utilizados pela maioria dos vendedores:

  • Planeje seu trabalho e trabalhe seu plano – Esta é uma idéia elementar, que todo vendedor deveria utilizar, mas que poucos põem em prática. A base de todo trabalho bem sucedido é o planejamento.
  • Não faça parte do clube – Joe Girard se referia ao “clube”,como sendo aquela “rodinha” de conversa informal entre vendedores. Enquanto seus concorrentes brincavam e contavam piadas, ele fazia contato com clientes e com parceiros para que lhe enviassem novos clientes.
  • Trabalhe com perdigueiros – Joe Girard chamava de perdigueiros (cães de caça), às pessoas que “caçavam” clientes para ele mediante uma comissão pré-estabelecida.
  • Utilize a Lei Girard dos 250 – Segundo Girard, cada pessoas conhece, ao longo de sua vida, em média, de uma maneira mais próxima, 250 outras pessoas. Se você as tratar bem, elas promoverão seu nome positivamente junto aos seus conhecidos. E se as trata mal, você terá uma propaganda negativa junto a um número infindável de pessoas.
  • O início do relacionamento com os clientes – Nas palavras de Girard “uma coisa que eu faço, e que poucos vendedores fazem, é enviar uma mensagem de agradecimento ao cliente depois de fechada a primeira venda. A maioria dos vendedores acredita que a venda acaba após assinatura do contrato, para mim a venda começa neste momento.”
  • A base de um negócio são as parcerias – Mais da metade dos negócios deste vendedor vinham das parcerias que ele desenvolvia com outros profissionais de áreas correlatas, clientes antigos e fornecedores. Ele criou um sistema de bônus que enviava às pessoas que lhe indicassem clientes, e mantinha contatos freqüentes.O resultado é que recebia um número extraordinário de indicações de clientes.
  • O relacionamento – Cada cliente de Joe Girard recebia mensalmente uma mensagem, sempre em dias diferentes e de forma personalizada. Na mensagem Girard lembrava aos clientes e conhecidos, que ele continuava vendendo automóveis, e que ficaria grato se este amigo voltasse a comprar com ele no futuro ou lhe enviasse um novo cliente, um amigo ou conhecido. E ao final, lembrava sempre da combinação do bônus que a pessoa receberia caso a pessoa enviada comprasse um automóvel.
  • Cartão de visitas Segundo Joe Girard, o cartão de visitas é uma arma pequena mas extremamente poderosa. Ele utilizava o cartão de visita em todas as oportunidades que tinha e em todos os contatos com pessoas. Se ia comprar uma camisa, ao barbeiro, ou quando pagava a conta em um restaurante, sempre deixava junto com o dinheiro o seu cartão de visita. Dessa forma conseguia promover seu negócio em todas as oportunidades profissionais e sociais.

Estas são algumas das ações inovadoras desenvolvidas por Joe Girard. A partir destes exemplos é possível perceber a simplicidade e a praticidade de sua metodologia e tirar algumas lições deste caso: competir em mercados altamente disputados exige um enorme esforço, se obtém poucos resultados e em geral estes resultados são frustrantes. No entanto, competir em mercados inexplorados, ou oceanos azuis como estamos denominando, permitem às empresas ou aos profissionais obter grande crescimento e ótimos resultados financeiros.

O caso Joe Girard pode servir de exemplo para muitos profissionais e empresas, não apenas do setor automobilístico, mas em outras áreas profissionais. Portanto sugerimos a estes profissionais e organizações que, a exemplo de Joe Girard, busquem inovar em sua maneira de atuação e descubram novos mercados ou novas fronteiras para seu antigo mercado, criando uma “inovação de valor” e construindo as bases para seu crescimento presente e futuro, através da estratégia do oceano azul.


REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

ARI LIMA:   Empresário, engenheiro, consultor e especialista em marketing e vendas. Desenvolve treinamento em marketing pessoal para profissionais liberais, empresas, escritórios e estudantes universitários. Ministra cursos, seminários e palestras realçando o lado prático e funcional do marketing. Escreve artigos diariamente para diversos sites. Além de uma sólida formação teórica, possui 25 anos de experiência prática em gerenciamento e treinamento de vendedores e de gerentes de vendas, bem como atendimento a clientes.
Fone: 031 3413 9484 / 9187-7121.   Site: www.arilima.com  

E-Mail:  contato@arilima.com

CONTROLE EXTERNO DO JUDICIÁRIOPara Paulo Lôbo, ‘Espírito de corpo às vezes contamina decisões’

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ENTREVISTA:  *ADVOGADO PAULO LOBO  – O advogado alagoano Paulo Lôbo é voz dissonante no Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Inaugurado em 2005 para fazer o controle externo do Judiciário, até hoje o colegiado puniu apenas um magistrado por corrupção. E ainda adotou uma medida enérgica quanto às centenas de reclamações recebidas contra juízes que, sem motivo aparente, demoram anos para julgar um processo. 

Nos julgamentos, Lôbo tem protestado contra o comportamento dos colegas, que classifica de corporativo. Ele cita como exemplo a decisão do CNJ que validou o último concurso para juiz do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. A maioria dos conselheiros concordou que havia indícios de fraude na seleção, mas preferiu não prejudicar quem já tinha tomado posse.

Para combater o corporativismo, Lôbo sugere que o conselho tenha menos juízes. O CNJ conta com nove magistrados. Os outros seis integrantes são advogados e representantes do Ministério Público.

P- Para o senhor, o CNJ atua corretamente?

R- De maneira geral, as decisões não se deixam contaminar pelo espírito de corpo. Mas às vezes sim. É da natureza humana.

P- Em que situações o corporativismo fica claro?

R- Quando uma decisão envolve não apenas o interesse específico de um magistrado, mas quando ela pode ter repercussão na magistratura como um todo. E aí passa a se perceber o problema de dentro para fora. Isso é o que poderia chamar de espírito de corpo. É involuntário, às vezes inconsciente. Quando as decisões são tomadas com nítida separação entre os magistrados e os não-magistrados, fica claro o conflito de visão entre quem está dentro da instituição e quem está fora.

P- Por que acha que, em geral, fica isolado nas votações?

R- Minha visão é sempre a da sociedade. Eu reflito, em cada conflito, qual o interesse predominante da sociedade. É por isso que às vezes eu fico só nas votações.

P- Como esse corporativismo poderia ser eliminado?

R- Independentemente da sinceridade de propósito dos colegas magistrados, que eu acredito que exista, eu penso que no futuro o CNJ terá que mudar a sua composição.

P- Com menos magistrados?

R- É. Eu entendo que a equação mais indicada seria a paritária, com o mesmo número de magistrados e não-magistrados.

P- Isso ficou claro no julgamento do concurso do Tribunal de Justiça do Rio, em que apenas os não-magistrados defenderam a anulação do concurso?

R- Os votos foram muito bem elaborados por parte dos magistrados, mas não me convenci.

P- Pelo que eles argumentaram, era um fato consumado e, por isso, não poderia ser modificado.

R- Se for assim, nunca poderemos mudar nada de errado que já tenha sido feito.

P- Como o senhor encarou o comportamento do CNJ neste caso?

R- Isso é muito da natureza humana, ninguém está isento desse tipo de comportamento. Acho que a decisão não seria a mesma se a composição do conselho fosse paritária.

P- O novo presidente do CNJ, ministro Gilmar Mendes, acha que o conselho não pode dar prioridade a processos disciplinares contra juízes acusados de corrupção. Não é função do conselho punir esses magistrados?

R- Claro que é. É uma atribuição constitucional do conselho. Até hoje, poucas denúncias contra magistrados resultaram em punição. Recentemente, o ex-presidente do Tribunal de Justiça de Rondônia (Sebastião Teixeira Chaves) recebeu a pena máxima, a aposentadoria compulsória. Antes disso, o conselho havia apenas mantido punições determinadas por outros órgãos. Nunca tinha decidido punir um juiz.

P- O senhor não acha que demorou muito para o CNJ punir um juiz?

R- Acho. Mas o que lamento mais é que o maior número de reclamações que chega ao CNJ é contra o excesso de prazo de juízes. São magistrados que demoram muito com um processo e adiam as decisões. Ainda não houve decisão punitiva contra essa prática. Até porque, quando o conselho notifica o juiz, ele dá um jeito de pôr o caso em julgamento logo. Esperam o CNJ reclamar para agir.

P- O senhor concorda com o ministro Gilmar quando ele defende que o CNJ só atue quando as corregedorias locais falharem na investigação de desvio de conduta de j u í z ?

R- O CNJ não pode abrir mão do que a Constituição estabeleceu como suas prerrogativas. Uma delas é o controle disciplinar.

 


 

FONTE:  OAB-DF, 30 de março de 2008.  (A matéria foi publicada na edição de hoje do jornal O Globo e é de autoria da repórter Carolina Brígido) 

BEM DE FAMÍLIA Impenhorabilidade pode ser alegada até o fim da execução

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DECISÃO:  *TRT-Campinas  –  A 1ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região deu provimento a agravo de petição (AP) interposto contra decisão da 2ª Vara do Trabalho de São José do Rio Preto, que não havia conhecido, por intempestivo, o incidente de impenhorabilidade ajuizado pelo casal autor do AP. No incidente, recebido como embargos à execução pelo juízo de primeira instância, os agravantes pleiteavam a liberação da penhora feita sobre o imóvel onde moram, alegando que se trata do chamado “bem de família”. A reclamação trabalhista é movida contra uma empresa de engenharia, da qual um dos agravantes é sócio.  

O relator do acórdão no TRT, desembargador federal do trabalho Luiz Antonio Lazarim, lembrou que a matéria em questão é disciplinada pela Lei 8.009/1990, que, no artigo 3º, dispõe apenas acerca das hipóteses em que a impenhorabilidade do bem de família pode ser alegada, sem qualquer fixação de prazo. Isso propicia a alegação da impossibilidade de penhora, em incidente à execução, até o final do processo executório, e não apenas em embargos à execução, lecionou o relator. 

Prevaleceu, no julgamento da Câmara, o argumento dos agravantes, de que a impenhorabilidade do bem de família decorre de norma de ordem pública, o que afasta a intempestividade da medida. “A alegação de impenhorabilidade (…) não pode ser considerada intempestiva, porquanto formulada logo após a penhora”, reforçou o desembargador Lazarim. Dessa forma, o colegiado determinou o retorno dos autos à 2ª VT de São José do Rio Preto, para julgamento da matéria argüida no incidente. (Processo 760-1994-044-15-00-9 AP)  

FONTE:  TRT-Campinas, 27 de março de 2008.


ASSISTÊNCIA À INFÂNCIAEstado deverá fornecer leite especial à criança

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DECISÃO:  * TJ-RN  –    Os desembargadores da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte não acataram a Apelação Cível, movida pelo Estado, contra a sentença, dada pela 3ª Vara da Fazenda Pública de Natal, que condenou o réu a fornecer, mensalmente, 12 latas do leite especial “Pregomin” a Cauã Felipe Ribeiro Silva, representado pelo pai Joabe Silva. 

Na decisão de primeira instância, o juiz também determinou que as latas de leite (400g) devem ser entregues em doses, quantidades e períodos exatos, prescritos pelo médico, enquanto subsistir a necessidade do benefício. Determinou, ainda, que deve ser feita nova avaliação médica a cada seis meses, para confirmar a necessidade do produto.  

O Estado, no entanto, argumentou, na Apelação Cível que a decisão deve ser ofertada em “harmonia com o mais recente posicionamento do Supremo Tribunal Federal, com vista à segurança jurídica e a economia processual, alegando, também a inexistência, na Constituição, de garantia de fornecimento de medicamento à população e a impossibilidade do Judiciário impor ao devedor de obrigação genérica, o Estado, prestador de serviços de saúde, quais os tratamentos que disponibilizará à população, ante o disposto no art. 244 do Código Civil”. 

No entanto, para a decisão em 2ª instância, os desembargadores consideraram o artigo 196 da Constituição Federal, onde reza que a “saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.  

Os desembargadores também definiram que o Estado, a União e o Município são responsáveis solidários, com base no artigo 23, II da Carta Magna, contudo, podem figurar no pólo passivo da relação processual tanto em conjunto, quanto separadamente. Assim, pode a parte autora escolher contra quem ajuizará a demanda.


 FONTE:  TJ-RN, 27 de março de 2008.

DANOS MORAISBanco é condenado a pagar indenização por dano moral

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DECISÃO:  *TJ-RN  –  Os desembargadores da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte mantiveram, em parte, a sentença que foi dada, em primeira instância, pela Vara Única da Comarca de Patu, contra o Banco ABN AMRO REAL S/A. Na decisão inicial, a instituição bancária foi condenada a pagar pouco mais de 17 mil reais (algo em torno de 45 salários mínimos), como indenização por danos morais, a Rita de Cássia de Medeiros. 

De acordo com ela, que afirmou ser “uma pessoa humilde, agricultura de parcos recursos”, disse também que jamais celebrou qualquer contrato com o banco e, mesmo assim, teve o nome inscrito em cadastros restritivos de crédito. A instituição bancária também ingressou com uma ação de busca e apreensão contra Rita de Cássia.  

No entanto, o banco ingressou com uma Apelação Cível, junto ao TJRN, argumentando que teria sido cerceado o direito de defesa, já que a citação foi recebida por pessoa que não detinha poderes para tanto e alegou também que não possui qualquer relação comercial com Rita de Cássia, tendo sido vítima de um estelionatário, na formalização do contrato de financiamento de veículo.

Segundo o banco, “no ato da assinatura do contrato, não tinha como levantar suspeita acerca da fraude, já que a documentação exigida encontrava-se completa e em vias originais, atendendo assim, as regras da Resolução 2025 do Banco Central.

Contudo, os desembargadores consideraram que a citação ocorreu de forma regular, por presumir que, ao receber e assinar o aviso de recebimento, o funcionário estava devidamente autorizado a fazê-lo. Daí, não ter como se cogitar da violação do parágrafo único do art. 223 do Código de Processo Civil e rejeitou o argumento de cerceamento do direito de defesa.

A 2ª Câmara Cível, entretanto, analisou que a condenação a título de danos morais no valor de R$ 17.274,60 se encontrava em um patamar mais elevado e fixaram o valor final em 20 salários mínimos.


FONTE:  TJ-RN, 28 de março de 2008.

 

PRESCRIÇÃO CONTRA HERDEIRO MENORPrazo prescricional não atinge herdeiro menor

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DECISÃO:  *TST  –  O prazo prescricional para ajuizamento de ação não corre quando o processo envolve herdeiro menor. Este entendimento, baseado no artigo 198, inciso I do Código Civil, foi adotado pela Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho no julgamento de processo movido pelo espólio de um ex-empregado da Rádio e TV Umbu Ltda., do Rio Grande do Sul. A relatora foi a ministra Dora Maria da Costa.  

Contratado em janeiro de 1980 como operador de controle mestre, o empregado passou a exercer também outras funções, como as de cinegrafista, iluminador, operador de vídeo, editor de comerciais para programação, operador de videotape e operador de artes. Porém não recebeu a respectiva contraprestação salarial por desempenhar essas tarefas. Faleceu em janeiro de 1988.

O espólio do ex-empregado, em nome de sua filha menor, representada pela mãe, interpôs reclamação trabalhista contra a Umbu solicitando o adicional de 40% por acúmulo de função, com base no cargo melhor remunerado, amparado na Lei nº 6.615/1978 – Lei do Radialista. A Vara do Trabalho de Passo Fundo (RS) julgou prescritas as parcelas anteriores a 1986, mas entendeu coerente a reclamação, e condenou a empresa a pagar o adicional, com reajustes legais e integrações nas demais verbas, corrigidos de acordo com a lei.

A Rádio e TV Umbu buscou reverter a decisão de primeiro grau no Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS). O Regional, porém, manteve a sentença e afastou ainda a prescrição, fundamentado nas orientações contidas nos artigos 169, I, do Código Civil de 1916 e 402 e 400 da CLT. O Ministério Público do Trabalho se pronunciou no mesmo sentido. Em seu parecer, afirmou que, “na forma da Lei nº 6.858/80, a representação da sucessão, na esfera trabalhista, se realiza através dos dependentes habilitados perante o órgão previdenciário oficial”.

No recurso ao TST, a empresa sustentou que, de acordo com a CLT, a ausência de prescrição só se aplica ao menor trabalhador, e que a representante legal da sucessão do trabalhador falecido não era a filha, e sim a viúva, que não é menor de idade.

A ministra Dora Costa observou, em seu voto, que os dispositivos indicados como violados pela empresa não tratavam, especificamente, da matéria em debate no processo – a incidência ou não da prescrição da pretensão do direito do herdeiro menor, uma vez que o TRT/RS baseou-se no Código Civil. A empresa também não conseguiu demonstrar a existência de divergência jurisprudencial, e, desta forma, o recurso não poderia ser reconhecido. A relatora lembrou ainda que, de qualquer forma, a Seção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do TST já tem entendimento no mesmo sentido da decisão do TRT/RS.(RR-84013/2003-900-04-00.6).

 

FONTE:  TST, 28 de março de 2008.


Considerações acerca do Agravo de Instrumento como via excpecional de extinção do processo com resolução de mérito

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*Tassus Dinamarco

Ordinariamente a função preponderante do recurso de agravo1 é o ataque das decisões interlocutórias proferidas pelo órgão judicial durante o procedimento i) em primeiro ou segundo grau de jurisdição; ii) nas hipóteses de competência originária das cortes estaduais, federais, e, também; iii) perante os órgãos de superposição, notadamente os tribunais superiores. É o recurso mais utilizado nos foros do país.

Mas há situações em que o recurso de agravo, interposto mediante instrumento, pode, como veremos, acabar por extinguir o processo com resolução de mérito ao esgotar a necessidade de nova decisão judicial2, normalmente esperada com cognição de verdade3 no momento em que o Poder Judiciário profere sua última palavra no feito depois de esgotadas as provas produzidas pelas partes dentro do arco de garantias previstas no due process law como pressuposto de validade nas atividades daquele poder estatal.

Os atos do juiz consistem em sentenças, decisões interlocutórias e despachos4. Sentença é o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269 do CPC5; decisão interlocutória é o ato pelo qual o juiz, no curso do processo, resolve questão incidente6; despachos são todos os demais atos do juiz praticados no processo, de ofício ou a requerimento da parte, a cujo respeito a lei não estabelece outra forma7.

Segundo o art. 522, caput, do CPC, “Das decisões interlocutórias caberá agravo, no prazo de 10 (dez) dias, na forma retida, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, quando será admitida a sua interposição por instrumento”; “O agravo de instrumento será dirigido diretamente ao tribunal competente, através de petição com os seguintes requisitos: I – a exposição do fato e do direito; II – as razões do pedido de reforma da decisão; III – o nome e o endereço completo dos advogados, constantes do processo. A petição de agravo de instrumento será instruída: I – obrigatoriamente, com cópias da decisão agravada, da certidão da respectiva intimação e das procurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado; II – facultativamente, com outras peças que o agravante entender úteis. Acompanhará a petição o comprovante do pagamento das respectivas custas e do porte de retorno, quando devidos, conforme tabela que será publicada pelos tribunais. No prazo do recurso, a petição será protocolada no tribunal, ou postada no correio sob registro com aviso de recebimento, ou, ainda, interposta por outra forma prevista na lei local. O agravante, no prazo de 3 (três) dias, requererá juntada, aos autos do processo de cópia da petição do agravo de instrumento e do comprovante de sua interposição, assim como a relação dos documentos que instruíram o recurso. O não cumprimento do disposto neste artigo, desde que argüido e provado pelo agravado, importa inadmissibilidade do agravo”8.

Esse o apanhado geral do procedimento do recurso de agravo interposto na modalidade por instrumento, deduzido pelo Código de Processo Civil como pressupostos de admissibilidade para sua subida, manutenção e julgamento no tribunal.

Analisemos, a partir daqui, seu procedimento no tribunal, os poderes conferidos ao relator e a desnecessidade de outra decisão de mérito no processo quando o agravo de instrumento comete esta função, extraordinariamente.

Pelo art. 527 do CPC, “Recebido o agravo de instrumento no tribunal, e distribuído incontinenti, o relator: Inegar-lhe-á seguimento, liminarmente, nos casos do art. 557; II – converterá o agravo de instrumento em agravo retido, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, mandando remeter os autos ao juiz da causa; III – poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso (art. 558), ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão; IV – poderá requisitar informações ao juiz da causa, que as prestará no prazo de 10 (dez) dias; V – mandará intimar o agravado, na mesma oportunidade, por ofício dirigido ao seu advogado, sob registro e com aviso de recebimento, para que responda no prazo de 10 (dez) dias (art. 525, § 2o), facultando-lhe juntar a documentação que entender conveniente, sendo que, nas comarcas sede de tribunal e naquelas em que o expediente forense for divulgado no diário oficial, a intimação far-se-á mediante publicação no órgão oficial; VI – ultimadas as providências referidas nos incisos III a V do caput deste artigo, mandará ouvir o Ministério Público, se for o caso, para que se pronuncie no prazo de 10 (dez) dias. Parágrafo único. A decisão liminar, proferida nos casos dos incisos II e III do caput deste artigo, somente é passível de reforma no momento do julgamento do agravo, salvo se o próprio relator a reconsiderar”9.

Pausadamente, é reflexivo que os incisos conferem ao relator o poder de decisão procedimental10, sem resolução de mérito da lide11. Isso ocorre nas hipóteses dos incisos I ao negar seguimento liminarmente12 ao agravo de instrumento por reputá-lo inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior13; no inciso II, primeira parte, ao converter o agravo de instrumento em agravo retido; no inciso III, primeira parte, ao atribuir efeito suspensivo ao recurso14; no inciso IV ao requisitar informações ao juiz da causa; no inciso V ao determinar a intimação do agravado e permitir que o mesmo junte aos autos documentos que entender conveniente; e, por último, no inciso VI ao determinar a remessa dos autos ao Ministério Público para que ele oficie nos casos em for obrigatória sua intervenção como fiscal da lei15.

Pelo que se nota, porém, o inciso III, segunda parte, dá ao relator o poder de deferir, em antecipação de tutela16, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão. A decisão liminar17, proferida sob este fundamento, somente é passível de reforma no momento do julgamento do agravo, salvo se o próprio relator a reconsiderar18, diz o parágrafo único do art. 527 do Código de Processo Civil. Assim, é meridiano o entendimento de que a decisão em tela cuida de ato processual destinado a conceder antecipadamente a tutela de direito material total19 ou parcialmente, cujos efeitos estão ligados ao bem da vida discutido em juízo.

Deste modo, há situações concretas nas quais se o relator defere a tutela à parte, desde que não o faça parcialmente, acaba por esgotar o objeto da lide, sem que haja a necessidade de prosseguimento do procedimento-processo20. Assim, a extinção do mesmo com resolução de mérito é medida que se impõe, após, é claro, a remessa dos autos à Turma ou Câmara que julgaria o mérito recursal, homologando21, destarte, anterior decisão de mérito proferida pelo relator, de direito material, segundo a necessidade demonstrada pela parte na minuta22 de seu agravo de instrumento23.

Em casos tais, a decisão interlocutória inicialmente proferida pelo relator, em função delegada do colegiado ao qual está vinculado, passa a ter força de decisão de mérito após a homologação de seus pares, e, assim, encontra fundamento no § 1.º do art. 162 do CPC por implicar alguma das situações previstas no art. 269 do mesmo Código, especificamente se ocorrer acolhimento do pedido recursal do agravante com fulcro no inciso I do citado art. 26924 do código processual em vigor.

Com o auxílio dos professores Rafael Oliveira e Paula Sarno Braga, citando Teresa Arruda Alvim Wambier25, Fredie Didier Jr. e Leonardo José Carneiro da Cunha afirmam que “A apreciação da matéria impugnada pelo recorrente, bem como da matéria devolvida/trasladada por força de lei, constitui exame de mérito do recurso. Esse exame somente pode ocorrer após o juízo positivo de admissibilidade, cuja análise lhe é preliminar. Daí se concluir que é possível, em razão da profundidade do efeito devolutivo ou simplesmente do efeito translativo, que o tribunal, em sede de agravo, extinga todo o processo principal, desde que o recurso haja sido admitido. Nesse caso, há uma curiosidade: o processo será extinto, mas não terá havido sentença, somente uma decisão interlocutória e um acórdão ou decisão monocrática do relator. Daí se poder dizer que, nesse caso, ‘a sentença’ é o acórdão ou o acórdão tem conteúdo de sentença, produzindo seus efeitos e ostentando sua consequência de pôr termo ao processo (ou à fase de acertamento)”26.

Alegação no sentido de que o recurso de agravo de instrumento deferido com fundamento no inciso III, segunda parte, do CPC, fere o procedimento, extinguindo-se o processo com resolução de mérito e cujo caminho natural seria a decisão proferida pelo Poder Judiciário mediante recurso de apelação (e outros assemelhados27) em que o objetivo do recorrente é a ampla devolutividade28 da matéria, deve receber do intérprete a mesma ponderação sobre a necessidade em prosseguir com um julgamento em que o direito material29 tutelado à parte por essa via excepcional acaba por esgotar a utilidade e adequação deste mesmo procedimento. Por isso tem razão Luiz Guilherme Marinoni ao afirmar que “O direito de ação de base constitucional não pode ser limitado a um ato de provocação da jurisdição, pois deve dar ao cidadão a possibilidade de obter a efetiva proteção do direito material violado ou ameaçado de lesão. Porém, para que o autor possa obter a tutela do direito material, ele deve exercer a ação – ou atuar ou agir em juízo. Nesse sentido, a ação não é meramente proposta, mas sim exercida, desenvolvendo-se com o fim de permitir o julgamento do mérito e, no caso de reconhecimento do direito material, a tutela jurisdicional que seja realmente capaz de protegê-lo”30, sendo que “As condições da ação, no entendimento de Liebman, não resultam da simples alegação do autor, mas da verdadeira situação trazida a julgamento. De acordo com Liebman, as condições da ação não devem ser aferidas apenas em razão da afirmação do autor, cabendo também a sua análise diante das provas, pouco importando a fase processual em que isso possa ocorrer no processo”31.

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Notas de rodapé

1 Na redação da Lei n.º 11.187, de 19 de outubro de 2005, o CPC previu, expressamente, duas modalidades deste recurso: retido e por instrumento (art. 522, caput). Há, ainda, outras modalidades de agravo, como, por exemplo, o agravo regimental previsto pelas leis de organização judiciária local, pelos tribunais superiores em seus regimentos internos bem como em leis especiais.

2 Casuística que não escapou da argúcia do juiz Carlos Fonseca Monnerat, Doutor pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e professor na Universidade Católica de Santos, onde é titular das turmas de pós-graduação em Direito Processual Civil.

3 Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart abordam interessante estudo sobre a cognição judicial em tópico intitulado “O convencimento do juiz”, seguido dos seguintes sub-tópicos: “Verdade e convicção”, “Convicção e participação judicial”, “Limitações à produção da prova”, “A tese sueca sobre o convencimento judicial”, “A acentuação da função da verossimilhança. Överviktsprincip, Überwiegensprinzip e verossimilhança preponderante”, “A teoria de Gerhard Walter”, “Objeções à teoria da verossimilhança preponderante”, e “O convencimento judicial e a regra do ônus da prova”, in Curso de Processo Civil, v. 2, Processo de Conhecimento, 6ª edição revista, atualizada e ampliada da obra Manual do Processo de Conhecimento, RT, SP, 2007, pp. 456/464.

4 Art. 162, caput, do Código de Processo Civil.

5 Art. 162, § 1.º, do Código de Processo Civil na redação determinada pela Lei n.º 11.232, de 22 de dezembro de 2005.

6 Art. 162, § 2.º, do Código de Processo Civil.

7 Art. 162, § 3.º, do Código de Processo Civil.

8 Arts. 524/526 na redação de leis especiais emendadas ao Código de Processo Civil.

9 O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo tem entendido que o despacho que indefere ou concede liminar em agravo de instrumento é irrecorrível, não sendo admitido, portanto, agravo regimental para a respectiva Câmara, que poderá, entretanto, reformar a decisão do relator quando do julgamento do mérito do recurso: 10ª Câmara de Direito Privado, v.u., relator Des. Octavio Helene, AgReg n.º 529.240-4/9-01, j. em 23 de outubro de 2007. No mesmo sentido, ou seja, negando recorribilidade contra a decisão liminar do relator, se posicionou a 21ª Câmara de Direito Privado do mesmo tribunal ao não conhecer agravo regimental por reputar ser ato discricionário do relator a atribuição ou não de efeito suspensivo ao agravo de instrumento, bem como convertê-lo em agravo retido: v.u., relator Des. Souza Lopes, AgsRegs n.º 7.176.440-8/01 e 7.176.440-8, j. em 17 de outubro de 2007.

10 Ou instrumental em sentido estrito.

11 Vide o art. 267 do CPC na redação da Lei n.º 11.232, de 22 de dezembro de 2005.

12 Significando que o relator, de plano, identifica não ser admissível o agravo de instrumento interposto, indeferindo-o sem que seja concedido qualquer prazo para que o recorrente emende o recurso, não se permitindo, igualmente, analogia com a petição inicial quando é indeferida pelo magistrado se não for emendada nos termos do art. 284, caput, do CPC. O vício constatado na petição do recorrente é insanável, e, assim, não se tolera emenda pelo recorrente, sendo inaplicável, por isso, o art. 284 citado.

13 Vide o art. 557, caput, do CPC.

14 Vide o art. 558 do CPC.

15 Exemplificativamente, vide o art. 82 e seguintes do CPC; v., ainda, a Lei Complementar n.º 75, de 20 de maio de 1993, a Lei n.º 8.625, de 12 de fevereiro de 1993 e a Lei Complementar Estadual n.º 734, de 26 de novembro de 1993, que instituiu a Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo.

16 Vide o art. 273 do Código de Processo Civil.

17 Expressão que pode indicar decisão judicial sem audiência de justificação do requerente e sem a oitiva da parte contrária anteriormente à concessão da medida urgente sob o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, principalmente.

18 Juízo de retratação expressamente previsto pela Lei n.º 11.187, de 19 de outubro de 2005. Admitindo a retratação do recurso mesmo antes da Lei n.º 11.187 já decidiu o extinto 1.º Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo: RP 9/345.

19 Para nós, contudo, a extinção do processo com resolução de mérito (art. 269 do CPC) através de julgamento antecipado operado pelo recurso de agravo de instrumento, só pode ser aquele em que o relator defere a tutela de forma ampla ou total quanto ao requerimento do agravante, pois o deferimento parcial da tutela antecipatória determinada pelo relator não é capaz de extinguir o feito.

20 Atendendo-se, principalmente, ao princípio da celeridade processual previsto no art. 5.º, LXXVIII, da Constituição Federal na redação da emenda n.º 45/2004.

21 Sem a intervenção dos demais juízes componentes do colegiado haveria supressão ao princípio do juiz natural na melhor interpretação do art. 5.º, LIII, da Constituição Federal.

22 Onde o recorrente expõe as razões de fato e de direito ao tribunal competente para apreciar o recurso.

23 Recurso interposto para atacar decisão interlocutória (incidental) proferida durante o procedimento de acordo com os arts. 522, caput, e 524 e ss. do CPC.

24 Na redação determinada pela Lei n.º 11.232, de 22 de dezembro de 2005.

25 Diz Tereza Arruda Alvim Wambier que “o tribunal, desde que se trate de conhecer de matéria de ordem pública cuja constatação possa ser feito icto oculi, pode extinguir o processo com base no art. 267, em julgando um agravo, em que a matéria não tenha sido ventilada”, in Os agravos no CPC brasileiro, 4.ª ed., RT, SP, 2006, n. 18, pp. 97-101, apud Didier Jr. e Carneiro da Cunha in Curso de Direito Processual Civil, Meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais, v. 3, JusPODIVM, Salvador-BA, 2007, p. 149.

26 Curso de Direito Processual Civil, Meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais, v. 3, JusPODIVM, Salvador-BA, 2007, pp. 149/150.

27 Recursos ordinário, especial e extraordinário, verbi gratia.

28 Vide o § 1.º do art. 515 do Código de Processo Civil.

29 Interessante a discussão acerca da possibilidade do recorrido ajuizar ação rescisória visando se ressarcir do prejuízo causado pela irreparabilidade da antecipação da tutela deferida pelo relator e homologada pelo tribunal no feito onde o recurso de agravo excepcionalmente resolveu o mérito da lide (inciso I do art. 269 do CPC). A alegação de que não se pode tolher lesão ou ameaça a direito por força do inciso XXXV do art. 5.º da Constituição Federal, restando, outrossim, manejável pelo prejudicado aquela via (des) constitutiva apta a questionar a decisão coberta pela coisa julgada material é forte (arts. 467 e 485 do CPC).

30 Curso de Processo Civil, v. 1, Teoria Geral do Processo, RT, SP, 2006, p. 180.

31 Idem, ibidem

 


 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

TASSUS DINAMARCO: Advogado, Pós-Graduando em Direito Processual Civil pela Universidade Católica de Santos, SP.

Execução provisória contra a Fazenda Pública

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*Edmara de Abreu Leão

RESUMO:  Trata-se no presente trabalho de natureza acadêmico-científica da execução provisória contra a Fazenda Pública, tendo como problema qual o posicionamento da doutrina e da jurisprudência quanto à execução provisória fundada em título executivo judicial contra entes públicos, após o advento da Emenda Constitucional n° 30/2000. O trabalho tem por objetivo explicar o que vem ser execução definitiva e provisória, execução fundada em título executivo judicial e extrajudicial, a natureza da execução após o cabimento de recurso sem efeito suspensivo e a posição doutrinária e jurisprudencial acerca do problema. Afirma-se que não cabe execução provisória fundada em título executivo judicial contra entes públicos, após o advento da Emenda Constitucional n° 30/2000. Divide-se o trabalho em 3(três) tópicos: Execução Provisória, Execução Provisória contra a Fazenda Pública e Definitividade da Execução contra a Fazenda Pública mesmo com a oposição de Embargos. O trabalho é realizado através de pesquisa explicativa, quanto aos fins e bibliográfica quanto aos meios. Afinal, conclui-se pela impossibilidade de execução provisória fundada em título executivo judicial contra a Fazenda Pública, com o advento da Emenda Constitucional n° 30/2000 e pela definitividade da execução, ante a oposição de embargos.

PALAVRAS-CHAVE: execução provisória; Fazenda Pública, definitividade da execução.

 

INTRODUÇÃO

O presente estudo será destinado à análise da execução provisória contra a Fazenda Pública, sobretudo em face da nova Lei nº 11.232/2006 que introduziu o artigo 475-O no Código de Processo Civil.

Em linhas gerais, contextualizar-se-á execução provisória contra a Fazenda Pública, explicando que a execução é atividade jurisdicional do Estado, de índole essencialmente coercitiva, desenvolvida por órgão competente, de oficio ou mediante iniciativa do interessado, com o objetivo de compelir o devedor ao cumprimento da obrigação contida na sentença condenatória transitada em julgado ou em título extrajudicial, previsto em lei.

O problema em destaque no presente estudo é: "Como vem se posicionando a doutrina e a jurisprudência quanto à execução provisória contra a Fazenda Pública, seja ela fundada em título judicial ou extrajudicial?".

A partir deste ponto, será explicada a incompatibilidade do instituto da execução provisória quando o devedor for ente público, pois este trabalha para a sociedade e almeja alcançar os interesses públicos, prevalecendo o princípio orçamentário e o da isonomia face aos detentores de créditos de natureza definitiva.

O estudo será realizado procurando explicar a execução provisória e a sua diferença ante a execução definitiva, bem como a natureza definitiva que adere a execução, mesmo sendo esta objeto de embargos.

Na pesquisa, quanto aos fins, será utilizado o método explicativo, verificando, conforme o entendimento doutrinário e jurisprudencial arrolado, a análise da execução provisória contra a Fazenda Pública.

Da mesma forma, a pesquisa, quanto aos meios, será bibliográfica, eis que se recorrerá ao uso de materiais acessíveis ao público em geral, como livros, artigos e revistas publicados, acórdãos e decisões judiciais, visando à fundamentação teórico-metodológica do trabalho.

A vista do explicado e procurando o desenvolvimento do problema proposto, o presente trabalho foi dividido em 3 (três) tópicos.

Assim, no tópico primeiro, será acentuada a diferença entre a execução definitiva e a execução provisória, procurando explicar o que vem a ser esta última, bem como as suas características específicas e procedimentos adotados. Também será ressaltada a inovação trazida pela Lei nº 11.232/2006.

No segundo tópico, abordar-se-á sobre o posicionamento da doutrina e da jurisprudência quanto à execução provisória contra a Fazenda Pública à luz da modificação introduzida pela Emenda Constitucional nº 30/200, explicando a fundamentação teórica e jurisprudencial sobre o assunto, sem se esquecer de correlacionar as opiniões em sentido contrário.

No terceiro e último tópico, será defendida e explicada a tese de que a execução, seja fundada em titulo judicial, seja fundada em extrajudicial, não perde o seu caráter definitivo mesmo com a oposição de embargos à execução, mesmo havendo entendimento doutrinário em sentido oposto.

Por fim, concluir-se-á o presente estudo ratificando as questões trazidas e a posição defendida de impossibilidade de execução provisória contra entes públicos.

1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.1 EXECUÇÃO PROVISÓRIA

Atua o Estado, na execução, como substituto, promovendo uma atividade que competia ao devedor exercer, qual seja, a satisfação da prestação a que tem direito o credor. Somente quando o obrigado não cumpre voluntariamente a obrigação é que ocorre a intervenção do órgão judicial executivo. Daí a denominação de "execução forçada", adotada pelo Código de Processo Civil, no artigo 566, qual se contrapõe à idéia de "execução voluntária" ou "cumprimento" da prestação, que vem a ser o adimplemento.

Enquanto no processo de conhecimento o juiz examina a lide para "descobrir e formular a regra jurídica concreta que deve regular o caso", no processo de execução providencia "as operações práticas necessárias para efetivar o conteúdo daquela regra, para modificar os fatos da realidade, de modo a que se realize a coincidência entre as regras e os fatos" (Teodoro Júnior, 2004, p. 285).

No processo executivo, o Estado busca sempre a realização da sanção, seja entregando ao credor o bem devido, seja reparando-lhe o prejuízo decorrente da impossibilidade de realizar a prestação in natura.

Nesse sentido, a execução forçada rege-se pelas seguintes disposições informativas, de acordo com o que a doutrina costuma apontar:

a) Toda execução é real;

b) Toda execução tende apenas à satisfação do direito do credor;

c) Toda execução deve ser útil ao credor;

d) Toda execução deve ser econômica;

e) A execução deve ser específica;

f) A execução deve ocorrer a expensas do devedor;

g) A execução deve respeitar a dignidade humana do devedor; e

h) O credor tem a livre disponibilidade da execução.

A execução pode ser classificada em execução definitiva e execução provisória. A execução definitiva é aquela fundada em título executivo extrajudicial ou em título executivo judicial que já transitou em julgado; provisória é a execução fundada em decisão judicial impugnada mediante recurso sem efeito suspensivo. É a definição que se abstrai do artigo 475-O, introduzido ao Código de Processo Civil pela Lei n˚ 11.232/2006.

Na execução provisória, a decisão judicial está pendente de recurso que, entretanto, não tem feito suspensivo (Ex: apelação nas hipóteses do artigo 520; recurso especial; recurso extraordinário; agravo contra denegação de recurso especial ou extraordinário e etc.). Então, uma vez que os efeitos da decisão não estão suspensos, pode ser dado início ao processo executivo. Mas, nessa hipótese, a execução se funda em título que é provisório, pois ainda pode ser alterado ou mesmo deixar de existir; se o recurso for provido, desaparecerá o título (e, conseqüentemente, a execução não poderá prosseguir e terá de ser desfeita).

A execução provisória apresenta peculiaridades em relação à definitiva. Nela, o credor terá que ressarcir os danos que o devedor sofreu, caso posteriormente o título executivo provisório seja reformado ou cassado. O credor, portanto, assume o risco de executar título que ainda não é definitivo. Os prejuízos do executado serão liquidados no mesmo processo por arbitramento (artigo 475-O, incisos I e II).

Assim, no caso de eventual recurso vir a ser provido, desfaz-se o título executivo e a execução provisória fica sem efeito. As coisas retornam ao estado em que se encontravam antes do início da execução provisória. Se houver apenas a reforma ou cassação parcial da decisão que servia de título executivo, apenas nessa parte ficará sem efeito a execução (artigo 475-O, parágrafo 1°). Se o devedor vier a sofrer danos por causa da execução, o credor terá que repará-los. A responsabilidade do credor é objetiva, ou seja, arcará com a indenização mesmo sem ter agido com culpa ou má-fé quando pleiteou a execução provisória.

Ainda, na execução provisória, poderão ocorrer atos que impliquem a expropriação de bens do devedor desde que o credor preste caução idônea, nos próprios autos da execução (artigo 475-O, inciso III). O credor também terá o ônus de prestar caução idônea quando pretender proceder ao levantamento de dinheiro. Nesse caso, a penhora recai diretamente sobre dinheiro, não tendo havido anterior caução, de modo que, para levantar o dinheiro no momento oportuno, o credor terá de prestar a caução. Ademais, o código prevê a prestação de caução em qualquer outra hipótese em que, no curso da execução provisória, surja o risco de grave dano ao executado (artigo 475-O, inciso III). Em todos esses casos, ficará dispensado da caução o exeqüente de crédito de natureza alimentar ou decorrente de ato ilícito, no valor de ato 60 (sessenta) vezes o salário mínimo, que se encontrar em estado de necessidade (artigo 457-O, parágrafo 2°, inciso I).

De acordo com Wambier (2006, p.141), "a Lei n˚ 11.232/2006 instituiu uma nova hipótese de dispensa de caução: quando o título executivo judicial "provisório" for objeto apenas de agravo de instrumento perante o Superior Tribunal de Justiça ou o Supremo Tribunal Federal, excetuados os casos em que a dispensa possa manifestamente resultar risco de grave dano, de difícil ou incerta reparação (artigo 457-O, parágrafo 2°, inciso I)".

Quando a execução do título é definitiva, ela se faz, em regra, nos próprios autos em que se proferiu a condenação a ser executada. Todavia, na hipótese de execução provisória, os autos geralmente estarão no tribunal, em virtude do recurso.

Com a Lei n° 11.232/2006, foi atribuído ao próprio requerente da execução provisória o ônus de fazer o seu requerimento acompanhar-se de cópia das peças relevantes para tanto, não mais sendo necessário que a execução se faça em autos suplementares ou em carta de sentença.

A execução provisória, embora assim denominada, não se destina a ser substituída por outra, definitiva. Trata-se mais propriamente de execução imediata, de adiantamento da execução ou de antecipação da eficácia executiva. Provisório é o título; não a execução nele fundada. Há, pois, títulos executivos provisórios, afastando a idéia de que todo título executivo haveria de se fundar em cognição definitiva.

1.2. EXECUÇÃO PROVISÓRIA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA

Conforme o explicado no tópico anterior, o Código de Processo Civil, no artigo 475-O, inserido pela Lei nº 11.232/2006, prevê a possibilidade da execução provisória, prescrevendo algumas regras para sua efetivação.

"Artigo 475-O. A execução provisória da sentença far-se-á, no que couber, do mesmo modo que a definitiva, observadas as seguintes normas:

I – corre por iniciativa, conta e responsabilidade do exeqüente, que se obriga, se a sentença for reformada, a reparar os danos que o executado haja sofrido;

II – fica sem efeito, sobrevindo acórdão que modifique ou anule a sentença objeto da execução, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidados eventuais prejuízos nos mesmos autos, por arbitramento;

III – o levantamento de depósito em dinheiro e a prática de atos que importem alienação de propriedade ou dos quais possa resultar grave dano ao executado dependem de caução suficiente e idônea, arbitrada de plano pelo juiz e prestada nos próprios autos.

1o No caso do inciso II do caput deste artigo, se a sentença provisória for modificada ou anulada apenas em parte, somente nesta ficará sem efeito a execução.

2o A caução a que se refere o inciso III do caput deste artigo poderá ser dispensada:

I – quando, nos casos de crédito de natureza alimentar ou decorrente de ato ilícito, até o limite de sessenta vezes o valor do salário-mínimo, o exeqüente demonstrar situação de necessidade;

II – nos casos de execução provisória em que penda agravo de instrumento junto ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça (artigo 544), salvo quando da dispensa possa manifestamente resultar risco de grave dano, de difícil ou incerta reparação.

3o Ao requerer a execução provisória, o exeqüente instruirá a petição com cópias autenticadas das seguintes peças do processo, podendo o advogado valer-se do disposto na parte final do artigo 544, § 1o:

I – sentença ou acórdão exeqüendo;

II – certidão de interposição do recurso não dotado de efeito suspensivo;

III – procurações outorgadas pelas partes;

IV – decisão de habilitação, se for o caso;

V – facultativamente, outras peças processuais que o exeqüente considere necessárias".

A execução provisória é uma exceção à regra e tem por finalidade a penhora de bens, de modo a garantir o cumprimento da obrigação estabelecida na sentença pendente de recurso ou, segundo as palavras do Theodoro Júnior (2004, p.285):

"A lei, no entanto, abre certas exceções, porque leva em conta a distinção que se pode fazer entre eficácia e imutabilidade da sentença. Assim, em circunstâncias especiais, confere eficácia a determinadas decisões, mesmo antes de se tornarem imutáveis. É o que se passa quando o recurso interposto é recebido apenas no efeito devolutivo, já que, em certas ocasiões, seria mais prejudicial o retardamento da execução do que o risco de se alterar o conteúdo da sentença com o reflexo sobre a situação de fato decorrente dos atos executivos".

Em regra, o título executivo nessa modalidade de execução é o judicial, ou seja, sentença condenatória transitada em julgado. Aliás, o artigo 100 da Constituição Federal expressamente menciona "os pagamentos devidos pela Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, em virtude de sentença judiciária". Isso se verifica, pois na execução contra a Fazenda, não há risco de não ser alcançada a tutela jurisdicional após o trânsito em julgado, vez que o ente público é essencialmente solvente e o pagamento de suas dívidas judiciais se dá por meio de precatório, não podendo haver penhora de seus bens.

Constata-se que a execução provisória não tem qualquer finalidade contra a Fazenda Pública, sendo-lhe inclusive prejudicial, eis que a inclusão do precatório (derivado de decisão judicial pendente de recurso, sem efeito suspensivo) na ordem cronológica, e posteriormente em orçamento, impedirá que o valor requisitado seja utilizado para as finalidades intrínsecas do Estado, tais como educação, segurança, saúde e etc.

A definitividade não só da sentença de conhecimento, mas especialmente do valor requisitado decorre de princípio orçamentário segundo o qual o poder público não deve ser instado ao desembolso de quantias ou créditos provisórios, que poderiam ser destinados a outras finalidades. Além disso, permitir que seja expedido um precatório em sede de execução provisória é, indiretamente, um meio de burlar a ordem de preferência, "guardando lugar na fila" para favorecer aqueles que têm expectativa de direito, em detrimento dos que já obtiveram um título definitivo.

Assim, a expedição de precatório em execução provisória provoca o paradoxo de que depósitos venham a ser efetuados nesses autos antes do pagamento de débitos fixados por sentença que transitou em julgado, portanto, imutável, não havendo qualquer dispositivo legal que admite a execução provisória contra a Fazenda Pública. Como exceção à regra que é não pode ser aplicada extensivamente.

Cabe lembrar também que a exigência do trânsito em julgado, para fins de execução de sentença judicial que condenar pessoa jurídica de direito público ao pagamento de obrigação pecuniária, só ingressou no nosso ordenamento jurídico através da Emenda Constitucional nº 30, de 13.09.2000, uma vez que no texto original da Constituição promulgada em 1988 tal exigência não existia e a modificação nela introduzida pela EC nº 20/98 só se referia ao termo "sentença judicial transitada em julgado" para os pagamentos desse tipo de obrigação definidas em lei como de pequeno valor.

Com o advento da Emenda Constitucional nº 30, e a conseqüente redação do parágrafo 1o do artigo 100 da CF/88 trazida pela mesma, passou a ser exigido o trânsito em julgado da lide, não mais sendo admissível a execução (provisória) de sentença que condenasse entidades de direito público à prestação de natureza pecuniária, quando tal decisão ainda não estivesse transitado em julgado.

Destarte, já não é o bastante a simples confirmação, pelo tribunal ad quem, da sentença proferida pelo juízo de primeiro grau para ter início tal espécie de execução. Agora, para a execução das obrigações da natureza pecuniária oriundas de sentenças condenatórias contra entes de direito público, é indispensável que tenham sido julgados, pelo Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, os eventuais recursos especial e extraordinário eventualmente interpostos contra acórdãos proferidos por tribunais de segundo grau. Em suma, é indispensável o trânsito em julgado para se iniciar a execução fundada em título executivo judicial contra a Fazenda Pública.

Hoje a questão está pacificada na jurisprudência, ante o artigo 100, parágrafo 1º, da Constituição Federal, com a redação da Emenda Constitucional n. 30/2000, que exige o trânsito em julgado da sentença que declara valores contra a Fazenda Pública.

Nesse sentido, o julgamento do Recurso Especial nº 464332, em que a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou possibilidade de execução provisória contra a Fazenda Pública, a decisão foi da relatora, ministra Eliana Calmon. Na primeira instância, o juiz entendeu ser possível a execução provisória. Ao julgar recurso do Estado, o Tribunal de São Paulo manteve a decisão de primeiro grau. Tendo sido rejeitado recurso de embargos de declaração, o Estado de São Paulo recorreu ao Superior Tribunal de Justiça, onde sustentou, entre outros pontos, violação de artigos do Código de Processo Civil. O acórdão registrou que apenas se faz definitiva a execução após o trânsito em julgado, porque só é possível a inclusão no orçamento de débitos oriundos de sentença transitada em julgado. "Assim, antes do trânsito em julgado da sentença, não se pode falar em requisitório", esclareceu a ministra. Concluiu que "é bem verdade que a questão é constitucional, mas também é verdade que a Constituição tem aplicação imediata, de tal sorte que há de prevalecer o entendimento dado pelos paradigmas na interpretação aos artigos 730 e 731 do CPC, ou seja, não há execução provisória contra a Fazenda Pública".

Conjugam também desse entendimento os seguintes arestos:

"Ao tempo do cálculo ainda não havia trânsito em julgado da sentença, sem razão da interposição de recurso de agravo contra o indeferimento do processamento do recurso especial. A expedição de precatório pressupõe a existência de sentença condenatória passada em julgado, descabendo execução provisória contra a Fazenda Pública" (TJESP, 9ª Câmara, Apelação Cível n. 248.602-2/4, j. 22.9.94, rel. Celso Bonilha).

"Vistos. Maria Lúcia Marcondes Mauri, pela petição de fls. 707, requer a expedição de carta de sentença, obviamente com o objetivo de proceder à liquidação do julgado, a fim de ser expedido o precatório. Ocorre, porém, que o precatório somente pode ser expedido após o trânsito em julgado da r. decisão, por força do que dispõe o artigo 100 da Constituição Federal. Aliás, se o precatório é expedido para que o valor nele consignado seja pago no ano seguinte, observada a ordem cronológica, possível não é, no caso, pendente recurso, esta inclusão até porque não será possível prever a época do julgamento. Assim, correto o v. acórdão trazido à colação pela Fazenda do Estado, razão por que indefiro a execução da carta de sentença" (TJESP, Recurso Especial n. 225.061.2/9-01, j. 20.4.95, 4º Vice Presidente do TJ – Sérgio Augusto Nigro Conceição).

"Em primeiro lugar, o recurso especial manifestado pela Fazenda do Estado de São Paulo foi admitido (fls. 224). Ao depois, é evidente que a execução provisória, no caso, mediante a expedição do precatório implica, desde logo, a indisponibilidade de recursos orçamentários, que poderiam ser direcionados pelo Estado, a empreendimentos de interesse público. Acaso fosse provido o especial, o erário seria onerado pela União no orçamento do Estado da quantia que não lhe era exigível, impedindo-o de dispendê-la em outras atividades essenciais. Defiro, pois, a liminar, para atribuir ao especial já admitido, efeito suspensivo, na forma do pedido" (Superior Tribunal de Justiça, Medida Cautelar n. 491/SP (96.0025936-4) j. 20.5.96, Min. Demócrito Reinaldo).

"1 – A execução contra as Fazendas Públicas é sempre definitiva. 2 – Não há execução provisória contra as Fazendas Públicas. 3 – As execuções contra as Fazendas Públicas têm rito próprio previsto nos artigos 730 e 731 do CPC, que guardam conformidade com a norma constitucional do artigo 117 da CF/69 e artigo 100 da CF/88. 4 – A norma constitucional exige para a execução contra a Fazenda Pública sentença judicial transitada em julgado. 5 – Agravo provido" (TRF-1ª Região, 4ª T., AI n. 89.01.23596-0/MG, rel. Juiz Gomes da Silva, Boletim AASP n. 2.035, de 29.12 a 4.1.98).

Cumpre salientar, todavia, que há entendimento doutrinário e jurisprudencial em sentido diverso, autorizando a propositura de execução provisória contra a Fazenda Pública, em face da interposição de recurso desprovido de efeito suspensivo, mencionando-se a obra de Cássio Escarpinella Bueno nesse sentido, "Execução Provisória contra a Fazenda Pública (Revista de Processo 81:240-245. São Paulo: RT, 1996) e a orientação do Superior Tribunal de Justiça, proferida no Resp 56.239-2/PR, relator-ministro Humberto Gomes de Barros, DJ 24/4/1995, p. 10.38897. Assim, defendem: "O artigo 730 do Código de Processo Civil não impede a execução provisória de sentença contra a Fazenda Pública".

Nesse sentido, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, analisando o caso ajuizado por Ubirajara Keutenedjian e outros, em razão de desapossamento administrativo decorrente da criação do Parque Estadual da Serra do Mar, entendeu ser viável a execução provisória contra a Fazenda Pública, mesmo sem trânsito em julgado, nas ações ajuizadas antes de Emenda nº 30/2000. O relator, ministro Teori Albino Zavascki, afirmou que "no caso examinado, a execução provisória teve início antes da Emenda Constitucional n. 30⁄2000, quando não havia, na Constituição, a exigência do trânsito em julgado como condição para a expedição de precatório". Para o ministro, "a Emenda 30 é um significativo divisor de águas", já que inseriu, após o termo "débitos", o acréscimo: "oriundos de sentenças transitadas em julgado". Revelou que "a jurisprudência do STF, anterior à citada Emenda, admitia a execução provisória" – entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, tanto na 1ª quanto na 2ª Turma.

Conclui-se, por todos os ângulos que se analise a questão, a par da antiga doutrina e jurisprudência em contrário, ser inviável a execução provisória fundada em título executivo judicial quando o devedor for a Fazenda Pública, em razão ao advento da Emenda Constitucional n° 30/2000, que deu nova redação ao artigo 100 da CF/88.

1.3. DEFINITIVIDADE DA EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA MESMO COM A OPOSIÇÃO DE EMBARGOS

De início, relembre-se que, em caso de sentença condenando entes de direito público à obrigação de pagar, somente é possível dar início à sua execução após o trânsito em julgado da decisão; de sorte que não mais subsiste a modalidade provisória de execução.

Pois bem, partindo desse pressuposto, chega-se à inevitável conclusão de que a Fazenda Pública, em casos de obrigação de pagar, somente embargará execuções de natureza definitiva, já que não mais existe a modalidade provisória para tais casos.

A determinação contida no parágrafo 1o do artigo 100 da CF/88, bem como no artigo 475-O do Código de Processo Civil, exige, na verdade, é o trânsito em julgado da sentença condenatória proferida em anterior processo cognitivo, posto ser ela a sentença a ser executada. Exigir-se o trânsito em julgado da sentença que rejeita os embargos, seria verdadeiramente tolher a eficácia do artigo 520, inciso V do Código de Processo Civil, uma vez que ele determina que a apelação interposta de sentença que rejeitar liminarmente embargos à execução ou julgá-los improcedentes será recebida somente no efeito devolutivo, do que decorre que tal decisão estará apta a produzir todos os efeitos que lhes são inerentes independentemente de ulterior confirmação pelo órgão ad quem.

 

Assim, não existe lógica em se fazer interpretação no sentido de que a Emenda Constitucional nº 30/2000 obstaculizou a execução definitiva já iniciada, pois causa alguma transmuda a natureza definitiva da execução fundada em decisão transitada em julgado; nem mesmo a superveniência de interposição de embargos do devedor, muito menos eventual interposição de recurso apelatório contra sentença de indeferimento liminar, extintiva ou definitiva de improcedência dos embargos no primeiro grau de jurisdição.

O que a interposição dos embargos provoca é simplesmente a suspensão do curso da execução, suspensão esta que, em face do artigo 520, inciso V do Código de Processo Civil só perdura até a prolação da sentença de indeferimento liminar, extintiva ou de improcedência dos embargos.

Outra questão que merece ser analisada é a possibilidade de execução contra a Fazenda Pública fundada em título extrajudicial, havendo inúmeros julgados admitindo tal execução, sob o fundamento de que os títulos executivos extrajudiciais se equiparam à sentença condenatória transitada em julgado, não sendo óbice a obrigatoriedade do reexame necessário. Argumenta-se que não parece justo obrigar o credor, que já tem título executivo extrajudicial, a ajuizar ação de conhecimento, para obter aquilo que já tem: título executivo. Nessa linha, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 279, admitindo execução fundada em título extrajudicial contra a Fazenda. Pública.

Nesse caso, qual seria a natureza da execução fundada em título extrajudicial, uma vez interposto recurso, sem efeito suspensivo, da decisão que rejeita liminarmente ou julga improcedentes embargos do devedor (artigo 520, inciso V do Código de Processo Civil)?

Lanes (2004, p.78) afirma que execução que nasce definitiva permanece definitiva. Não se transmuda em provisória.

Esse entendimento também é compartilhado por sólida doutrina, sintetizada em Comentários ao Código de Processo Civil, precisamente ao seu artigo 587:

"Execução definitiva. Quando iniciada a execução, por título judicial transitado em julgado ou por título extrajudicial, é sempre definitiva. Iniciada definitiva, não se transmuda em provisória, nem pela oposição de embargos do devedor, nem pela interposição de recurso contra sentença que julgar improcedentes os embargos ou rejeitá-los liminarmente (CPC 520, V). É que a sentença transitada em julgado e o título extrajudicial têm plena eficácia executiva e gozam de presunção de certeza, liquidez e exigibilidade. Com a rejeição liminar ou a improcedência dos embargos, essa presunção resta reforçada e confirmada, de sorte que a execução deve prosseguir sem a suspensividade operada pela oposição dos embargos e/ou pela interposição de recurso recebido apenas no efeito devolutivo. Provido o recurso, resolve-se em perdas e danos em favor do devedor" (NERY JÚNIOR e NERY, 2003, p. 982.)

Como quer que seja, a 3a Turma do Superior Tribunal de Justiça (Resp. 38.687-0/GO, Relator Min. Waldemar Zveiter, DJU 28.03.94) assentou que, julgados improcedentes os embargos, a execução prosseguirá em caráter definitivo, se e quando fundada em título extrajudicial, equiparada esta, inclusive, àquela com suporte em sentença trânsito em julgado.

Ademais, a mesma turma já sedimentou o entendimento de que, julgados improcedentes os embargos, deve a execução proceder na modalidade definitiva ainda que contra ela pese recurso de apelação recebido apenas no efeito devolutivo, regra que, por inexistir expressa exceção a respeito, também é aplicável à Fazenda Pública, como se nota a seguir:

"PROCESSUAL CIVIL – EXECUÇÃO FUNDADA EM TITULO EXTRAJUDICIAL – EMBARGOS A EXECUÇÃO. 1. Assentado na doutrina e na jurisprudência o entendimento no sentido de que, julgados improcedentes os embargos, a execução prosseguirá em caráter definitivo, se ou quando fundada em título extrajudicial, equiparada esta, inclusive, àquela com suporte em sentença transitada em julgado. 2. Recurso conhecido e provido"(SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, REsp 38687/GO, Rel. Min WALDEMAR ZVEITER, 3a Turma, DJU 28.03.1994, p. 6317).

Em sentido contrário, Marques (2000, p. 64) entende que "a execução baseada em titulo extrajudicial que iniciou definitiva, torna-se provisória, o que ocorre, no entanto, não em razão do título executivo, mas em razão dos embargos que foram opostos".

Mas é provisória a execução dos ônus da sucumbência decorrente de rejeição liminar ou improcedência dos embargos à execução, porque fundada, não em título extrajudicial, mas em decisão judicial que não transitou em julgado.

Destarte, conclui-se que, havendo o trânsito em julgado de uma sentença condenatória de obrigação de pagar proferida contra a Fazenda Pública ou havendo título extrajudicial contra esta, inicia-se sua execução definitiva, não se transformando por qualquer motivo em execução provisória.

CONCLUSÃO

Percebeu-se a diferença de procedimentos entre a execução definitiva e a execução provisória, possuindo cada uma delas características específicas, como a necessidade de caução na execução provisória, salvo se crédito de natureza alimentar ou decorrente de ato ilícito, no valor de ato 60 (sessenta) vezes o salário mínimo, quando credor se encontrar em estado de necessidade.

Verificou-se também, as inovações trazidas pela Lei n° 11.232/2006, ao incluir o artigo 475-O no Código de Processo Civil, não sendo mais necessário que a execução provisória se faça em autos suplementares ou em carta de sentença.

Conclui-se ainda, pela impossibilidade de execução provisória contra a Fazenda Pública, devendo a execução ser sempre definitiva, seja ela fundada em título executivo judicial ou extrajudicial, eis que a definitividade não só da sentença de conhecimento, mas especialmente do valor requisitado faz-se necessária para que o poder público exerça o seu papel de garantidor do interesse público, haja vista que o desembolso de quantias ou créditos provisórios poderia ser destinado a outras finalidades sociais, além de provocar a burlar da ordem de preferência, "guardando lugar na fila" para favorecer aqueles que têm expectativa de direito, em detrimento dos que já obtiveram um título definitivo.

Observou-se também que, com o advento da EC n° 30/2000, passou a ser exigido o trânsito em julgado da sentença que condena a Fazenda Pública à obrigação de pagar; não mais sendo admissível a execução (provisória) de sentença que condene entidades de direito público à prestação de natureza pecuniária.

O que se exigiu foi o trânsito em julgado da sentença condenatória proferida em anterior processo cognitivo, posto ser ela a sentença a ser executada. Exigir-se o trânsito em julgado da sentença que rejeita os embargos, seria verdadeiramente tolher a eficácia do artigo 520, inciso V do Código de Processo Civil, eis que ele determina que a apelação interposta de sentença que rejeitar liminarmente embargos à execução ou julgá-los improcedentes será recebida somente no efeito devolutivo, estando apta a produzir todos os efeitos que lhes são inerentes independentemente de ulterior confirmação pelo órgão ad quem.

Também, constatou-se que a sentença que rejeita os embargos à execução de título judicial, oposto pela Fazenda Pública, não está sujeita ao reexame necessário, entendimento este compatível com a regra do Código de Processo Civil (artigo 520, inciso V), que impõe o recebimento da apelação apenas no efeito devolutivo. Assim, a execução definitiva, uma vez iniciada e, posteriormente, suspensa pela interposição de embargos, voltará a ter seu curso natural após o advento de sentença que julgar improcedente tais embargos, pois esta não está sujeita ao duplo grau obrigatório e a eventual apelação contra a mesma interposta somente pode ser recebida no efeito devolutivo. Da mesma forma, percebeu-se quanto à execução contra a Fazenda Pública fundada em título executivo extrajudicial.

Assim, conclui-se que uma vez interpostos embargos à execução contra a Fazenda Pública, seja fundada em título judicial ou em extrajudicial (equiparada esta, inclusive, àquela com suporte em sentença transitada em julgado), a execução prosseguirá em caráter definitivo, pois a execução que nasce definitiva não se transforma em provisória, mesmo com a suspensão provocada pela oposição dos embargos.

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REFERÊNCIAS

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GIL, Antônio Carlos. Como Elaborar Projetos de Pesquisa. São Paulo: Atlas, 1996.

LANES, Júlio César Goulart. A execução provisória e a antecipação da tutela dos deveres de pagar quantia: soluções para a efetividade processual. In: AMARAL, Guilherme Rizzo & CARPENA, Márcio Louzada (coord.). Visões críticas do processo civil brasileiro. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2005. 78 p.

LAVILLE, Chhristian; Dione, Jean. A Construção do Saber. Tradução: Lana Mara Siman. Porto Alegre: UFMG, 1999.

LOPES, João Batista. Tutela Antecipada no Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2001. 88 p.

LUCON, Paulo Henrique dos Santos. Eficácia das decisões e execução provisória. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. 275 p.

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MARQUES, José Frederico. Instituições de direito processual civil. Campinas: Millennium, 2000, v. 5. 64 p.

MEZZAROBA, Orides; MONTEIRO, Claudia Servilha. Manual de Metodologia da Pesquisa em Direito. Florianópolis: Saraiva, 2003. 310 p.

NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Processual Civil Extravagante. 7ª ed. rev. e amp. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. 982 p.

RICHARDSON, Roberto Jarry. Pesquisa Social: Métodos e Técnicas. São Paulo: Atlas, 1999. 333 p.

TEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 36ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, v. 2. 285 p.

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ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela. São Paulo: Saraiva, 1997. 96 p.

 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

Edmara de Abreu Leão: Procuradora do Município de Manaus (AM)

Elaborado em 02.2007.

 

 


 


A gênese das idealizações ocidentais da lei e do legislador.

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* Bruno J.R. Boaventura.

The Genesis of western idealization of the law and the legislator

Sumário: I.     introdução. II. A lei na antiga mesopotâmia: a coerção no medo do castigo divino. III. Atenas como Grécia: a lei como algo racionalmente humano. III.I O código de Dracón: leis escritas com o sangue do povo. III.II O código de Sólon: as leis deixam de ser raios divinos, e viram sementes humanas. III.III a teorização das razões da lei escrita na Grécia Antiga. IV. Apontamentos conclusivos. V Referências bibliográficas. 

Resumo: Uma visão crítica do desenvolvimento da idealização teórica do significado da Lei e do legislador ao longo das figuras reais da antiga Mesopotâmia e seus códigos, e dois principais códigos antigos gregos: o de Dracón e o de Sólon.

Palavras chaves: lei; legislador, cuneiforme; direito antigo. 

Abstract: A critical view of the development of theoretical idealization of the meaning of the law and the legislator over the actual figures of ancient Mesopotamia and their codes, and two main codes ancient Greeks: that of Dracón and the Sólon. 

Key words: law; legislator, cuneiform law; ancient law.

Resumen: Una visión crítica de la elaboración teórica de la idealización del significado de la ley y el legislador sobre las cifras reales de la antigua Mesopotamia y sus códigos, y dos códigos antiguos griegos: la de Dracón y la Sólon. 

Palabras clave: ley; legislador, la ley cuneiforme; ley antigua. 

 

I.         INTRODUÇÃO 

A cultura suméria, assíria e helênica, em geral, o povo da antiga Mesopotâmia, conforme E.A.Speiser, deixou um legado imemoriável para a vida moderna, pois se temos, ainda, esperança em normas criadas de forma despersonalizadas devemos muito à este povo, pois influenciaram o Mundo Clássico, e assim a própria civilização ocidental como um todo[1]. 

Na Mesopotâmia originaram-se os primeiros textos referentes as normas escritas de conduta da sociedade humana, alguns dirão que eram Leis, outros tantos dirão que não passaram de propagandas e que acabara servindo de registro para a prosperidade, porém todos concordam que a forja da origem do que viria a ser o conceito de Lei no ocidente foi esculpida na terra entre os grandes rios Eufrates  e Tigre. 

Objetivamente, os textos em linguagem criptográfica esculpida em estelas estabelecem um registro da teorização da legitimação do poder real nas civilizações antigas da Mesopotâmia, e um exemplo prático deste direito primitivo. 

Na Grécia o contexto se modifica, as Leis perdem, mesmo que momentaneamente[2], o caráter de sacro mistério. Deixa de ser algo que somente os sacerdotes escreviam e apenas os homens das famílias religiosas podiam conhecer. A linguagem legal se torna acessível, todos podem ler e falar[3]. 

É Atenas nosso exemplo da reviravolta grega quanto ao conceito da Lei e do direito. Conforme as palavras de Fustel de Coulanges, sabemos que foram redigidos dois códigos de leis em Atenas, no intervalo de trinta anos; o primeiro por Drácon, e o segundo por Sólon. O de Drácon foi escrito no calor da luta entre as duas classes e quando os eupátridas ainda não estavam vencidos. Sólon redigiu o seu no exato momento em que a classe inferior o conquistou. Por isso, as diferenças entre os dois códigos são tão profundas[4].

 II.   A LEI NA ANTIGA MESOPOTÂMIA: A COERÇÃO NO MEDO DO CASTIGO DIVINO. 

Em 2350 a.c., reconhecidos por muitos, como o primeiro registro histórico de codificação de normas, e também a primeira reforma social temos o Código de Urukagina ou Uruinimgina. Auto-denominado de Rei de Lagash ou  Sumer, cidade da antiga Mesopotâmia.  

Historiadores renomados, como o mais experiente em história e linguagem sumérica, Samuel Noah Kramer, apontam o texto de Urukagina como um dos mais precisos documentos de combate à tirania e a opressão do poder da história humana, em todos os possíveis sentidos, e também, como o primeiro registro da concepção da idéia de liberdade, pela palavra amargi, epistemologicamente definida como o “retorno para a mãe”[5]. 

Este Código tem uma importância histórica relevante, sobretudo por representar um mecanismo legal de limitação dos poderes dos sacerdotes, dos altos funcionários públicos, estabelecendo meios concretos de justiça social, pela garantia, dentre outros, de direitos aos cegos, pobres, viúvas e outros. No prólogo do Código está escrito: “El poderoso no oprimirá al huérfano y a la viuda: pues tal pacto ha establecido Urukagina con Ningirsu.”[6]

 É um importante legado para o mundo ocidental, pois iniciou a idéia tradicional de conceber uma base legal a justiça como justificativa de possibilitar uma vida com mais dignidade aos cidadãos, conforme aponta Enrique Nardoni[7]. É o próprio nascedouro da idéia moderna do liberalismo: a legitimidade da ordem política no direito, ou seja, para os cidadãos serem dignos de um Estado e o Estado ser digno de seus cidadãos, o direito deve dar as condutas necessárias para a concreção desta dupla dignidade.

 Trezentos anos depois, em 2050 a.c., já no período da Renascença do período Neo-sumério, Ur-Nammu, com a morte de seu irmão, o rei UtuKhegal, proclamou a independência de Ur do reino de Uruk. Auto-declarou-se rei da cidade de Ur, fundando assim a terceira dinastia de Ur, que perdurou de 2112 à 2004 a.c.. Ur-Nammu reinou por 18 (dezoito) anos, e seus descendentes governariam por mais de 90 (noventa) anos consecutivos.

 Diferente dos outros reinos, o de Ur-Nammur foi construído utilizando-se de uma estratégia pacifista, a da reconstrução dos templos destruídos das cidades vizinhas a Ur, os chamados zigurates, e como demonstração de agradecimento dos cidadãos que se davam como salvos, era aclamado rei.

 O Código de Ur-Nammu, uma compilação dos costumes antigos acumulados culturalmente, foi escrito, na verdade, como dito por especialistas, por seu filho Shulgi. No prólogo aclamou o Rei como o estabilizador da equidade, e aquele que baniu a maledicência e a violência[8]. O Código teve como principal tema a reversão das penas ditas talianas em sanções pecuniárias, dando assim a origem do instituto da indenização, e a escrita em forma de sentença condicional, o que importa em dizer que se alguém fizer “isto” será penalizado com “aquilo”[9].

 O Código de Eshnunna, de 1930 a.c., traz uma referência ao nome da cidade e não ao nome de um legislador específico. A cidade de Eshnunna com a queda da terceira dinastia de UR passa a ter significância econômica, sobretudo pela posição geopolítica na antiga Mesopotâmia, e se fortaleceu com os reinados bem sucedidos e sucessivos de Naram-Sin, Dadusha e Ibelpiel II.

 As compilações estão em duas estelas, encontradas na cidade que atualmente se chama Tell Armar. Os cripotologos ainda não chegaram a um consenso, mas a maioria define que uma das estelas fora esculpida no reinado de Dadusha, conforme informações de Reuven Yaron[10].

 O Código traz cerca de 60 artigos sobre variadas temáticas, incluindo um sistema de cortes de julgamento, funcionamento do reino e do palácio, escravidão, casamento e divórcio, interferência do poder real no domínio econômico para coibir altas dos preços de alimentos[11], e serviu de base para a elaboração do Código de Hammurabi.

 Aproximadamente em 1.870 a.c. temos o Código de Lipit-Ishtar de Isin[12], que não fora escrito em Estela mas sim em sun-baked clay tablet, o seu  prólogo é um exemplo de como as normas eram manifestações de auto-promoção real[13].

 Estava então registrada na historia do homem a serviniência da Lei à imagem de seu legislador, o que na contemporaneidade volta a ser fenômeno freqüente, com políticos instados a criarem Leis para mero deleite de seus eleitores, mesmo que não sejam aplicadas concretamente. Revoluções legais são anunciadas com aprovações nas Casas Legislativas, mesmo que a evidência seja que a Lei não será sequer sancionada.

 Após, temos Hammurabi, que sucedeu no trono da Babilônia com a morte de seu pai, reinou absoluto por 43 (quarenta e três) anos, e foi elo forte de uma dinastia que perdurou por mais de 300 (trezentos) anos. Teve inegavelmente como principal legado o Código que perdurou por anos como sendo o primeiro a ser elaborado na história, mas jamais perecerá quanto ao ser o mais estudado e assim o mais importante de todos os primitivos.

 A descentralização da administração prevista no Código pode ser exemplificada na distribuição de cópias do próprio código ao longo do reino. Dos que restaram, o exemplar mais magnífico é a estela de diorito negro, com quase 2 metros e 30 centímetros de altura, que atualmente está no museu do Louvre. Esta relíquia foi encontrada por J. De Morgan, arqueóloga francesa, no final do ano de 1901.

 As exaltações ao poder do Rei encontradas nos epílogos dos Códigos de Lipit-Ishtar e Hammurabi assemelham-se de tal maneira que alguns acreditam, como A.S Diamond, que sejam na verdade um só texto, somente com a diferença do de Hammurabi estar escrito em accadian.  

 Já as diferenças dos corpos legais dos Códigos demonstram um avanço inegável da técnica legislativa em Hammurabi: temos a melhor distribuição das matérias tratadas em um grande número de dispositivos (282) em tópicos temáticos que formulam uma nova e melhor sistemática do que até então existia, e ainda, uma linguagem que  alcança a perfeição, como ponderou A.S. Diamond[14].  

 O ano de 1760 a.c. é dito pela maioria como o de elaboração do Código. O primeiro aspecto é sobre a importância, ressaltar ingenuamente que a lei do talião (olho por olho e dente por dente) é a instituição da barbárie é desconsiderar que em tempos remotos somente a descrição de penas já retiraria das mãos do Rei a possibilidade de exercer o poder de forma totalmente arbitrária.

 A leitura do Código traz algumas possibilidades de entendimento das características organizativas da civilização, como o indicio da preocupação em relação as fraudes de processos judiciais, a responsabilidade ao extremo pela instituição da pena capital; a descentralização da administração pela organização em circunscrição; a legitimação da escravidão; possibilidade de venda de mulher e filhos; um sistema de contratos parecido com o atual, sobretudo o de depósito inclusive com responsabilidade patrimonial; a figura mística do rio presente como demonstrador da verdade. Enfim, as normas tinham efeito concreto (a razão da quantidade), parecendo mais sentenças do que Leis, o que alguns denominam de estilo casuístico.

 Este estilo casuístico que perdura em todos os códigos primitivos seria uma conjunção das duas grandes famílias dos sistemas do direito contemporâneo, a common law e a civil law, pois a abstratividade é baseada em um precedente. Não existindo ainda a  abstratividade normativa em sua plenitude, mas a descrição das normas em estelas, algo constante e material, acarretaria uma modificação no modo de pensar as Leis e sua relação com os afetados.

 As normas não mais estariam totalmente no abstrato, já não seriam mais ditadas na eminência do acontecimento. Resultaria daí um grande avanço na segurança jurídica pela possibilidade, inexistente até então, de uma previsibilidade aplicativa das normas, mesmo que em alguns casos fosse mínima.

 A poder de coerção destas normas resultava no medo imbuída a população não de ser punido pelo Estado, mas pelos Deuses da cidade. Assim os Reis, que exerciam a função de sacerdotes receptores das Leis divinas, impuseram a ordem e a obediência cultuando o medo da vingança das divindades e conseguiam serem obedecidos religiosamente, como bem aponta Antonio Carlos Wolkmer[15].

 O principal efeito desta prévia existência despersonalizada das normas tanto a quem ordena como à quem seriam ordenadas é de que a origem dos textos legais é marcada pela simultaneidade da origem do conceito que eles deveriam ser impessoais, ou seja, desde o direito cuneiforme a Lei para ser Lei deve ser impessoal.

 Ao comparar o direito cuneiforme com outros de diferentes épocas, John Sassoon, já concluíra que as normas das sociedades do ocidente não evoluíram numa linha paralela ao desenvolvimento da complexidade social. Assim o Código de Eshununna seria comparável em termos de reconhecimento dos direito humanos à situação legal da Inglaterra de 1.150 d.c., assim como Código de Hammurabi representaria a Inglaterra de 1.250 d.c.[16].

 A criticidade a respeito da natureza das inscrições presentes nas estelas é feita pelo professor Emanuel Bouzon que esclarece que tais normas representariam a ideologia do rei, num caráter auto-promocional, e significariam a intervenção do rei na sociedade e na economia, com fim propagandístico da imagem real como um garantidor da justiça, como se denota nos prólogos[17].

 A existência destes códigos seria a ocasionada pela necessidade de transmissão com maior facilidade às futuras gerações dos costumes de conduta, e algumas estelas denotam ser na verdade não lei propriamente dita, mas registro histórico realizado por escribas num exercício meramente acadêmico.

 Bouzon ainda ressalta que a assirióloga S.Lanfont no Colóquio de Strasbourg introduziu a idéia de que os Códigos seriam utilizados de forma subsidiária, com um caráter complementar  as prescrições locais (costumes). É bom lembrar que a polêmica acadêmica sobre a natureza destes textos ainda perdurará assim como a certeza de que os mesmos exerceram influência no modo ocidental atual de pensar a Lei.

 III. ATENAS COMO GRÉCIA: A LEI COMO ALGO RACIONALMENTE HUMANO 

Na Grécia antiga acontece uma revolução sobre o ideal da legitimação das Leis, este novo contexto político geraria a idéia base da democracia. A legitimação da Lei deixa de ser o mito burocrático dos Deuses que ordenariam do céu as normas que os homens devem seguir na terra. È neste preciso momento histórico que os homens passam a se auto-ordenar e constroem a legitimação da Lei não pela interferência dos Deuses ou de outros homens que se concebiam como enviados do céu, mas sim pela decisão de todos, ou pelo menos da maioria concebida a votar.  

A democracia penetra na legitimação das Leis, e de lá, nunca mais saíra. O conceito de legislador se renova como a vontade popular, e não mas como tradição religiosa, conforme as entusiásticas palavras de Fustel de Coulanges[18] 

O mito do governo dos Deuses e de todos os demais apaixonados por este modo organizacional sucumbem ao nascer do governo das Leis, e este será para sempre a essência teórica político-jurídico ocidental da democracia. 

III.I     O Código de Dracón: leis escritas com o sangue do povo. 

O primeiro legislador grego a ser comentado é Dracón, um eupátrida, que tinha todos os sentimentos da sua casta, e recebeu instrução no direito religioso. A primeira Lei constante em seu código, escrito em 621 a.c., profetizava: “Devemos honrar os deuses e os heróis do país e oferecer-lhes sacrifícios anuais, sem nos afastarmos dos ritos seguidos pelos antepassados.”  

A contextualização feita por Coulanges remete, e isto é perfeitamente possível, que Dracón foi uma personagem de transição, representando o novo por ser o primeiro legislador, mas não rompendo ainda com a tradição do caráter religioso das penalidades normativas.  

A importância história de Dracon é a originalidade de sua posição política na estrutura do Governo, o legislador, separando a autoria das Leis daquele que detinha o poder. 

A crueldade das Leis draconianas reside na concepção de que a Lei ofendida era um atentado as divindades constituindo um crime irremissível. Em razão disso é explicável a penalidade da morte aquele que ofende a propriedade alheia, pois é do culto grego antigo a origem do conceito de que alguns bens matérias pertencentes à família deveriam ser resguardados como uma propriedade religiosa[19]. As leis com a pena capital resultam também na tentativa de acabar com os constantes assinados entre os membros da aristocracia na disputa por terras.  

Aristóteles afirmou que Dracón não fez uma nova legislação, mas sim uma consolidação do código oral de costumes. Esta foi uma das tarefas dada pelo povo de Atenas: fazer as leis antes confusas se tornassem claras para os cidadãos, evitando assim o abuso de interpretação daqueles que estivessem no poder, como bem colocou Richard A. Katula[20]. 

Apesar da facilitação de conhecimento das Leis por todos os cidadãos como efeito da existência do Código de Dracón em uma linguagem permanente, não houve nenhuma intenção clara de redução da tensão vivida entre os ricos e pobres, que acabou gerando a necessidade de re-elaboração das Leis por Sólon, como bem considera A. Andrewes[21]. 

Podemos assim afirmar que o povo de Atenas não desejava uma simples consolidação. O motivo político – popular da origem do Código de Dracon, colocado como por Adriaan Lanni, foi tentar dar uma resposta a crise de violência que aflorou em Atenas, após a tentativa da aristocracia fazer desta Cidade-Estado uma tirania[22]. A condição externa de Atenas, em constante disputa com Megara, acredita J. Antonio Clúa Serena, também influência na insurgência do desejo popular da re-configuração do modo de governo em Atenas[23]. 

As normas do Código de Dracón eram autotuteláveis, assim a aristocracia, com o seu poder econômico e político, era a única capaz de submeter facilmente à conciliação aqueles que foram prejudicados por seus atos, e de punir aqueles que as prejudicara, criando assim uma instabilidade social das leis se tornarem injustas e anti-democráticas.  

Diante desta circunstância, a necessidade de reformulação das Leis de Atenas torna-se inevitável, pois o povo ateniense acreditava na necessidade da elaboração de um novo código de leis mais acessível ao homem comum não só pela linguagem, mas também pela praticidade, como bem leciona Edwin Caravan[24] 

III.II    O Código de Sólon: as leis deixam de ser raios divinos, e viram sementes humanas.  

Após 30 anos das leis de Dracón que acabou agravando os conflitos entres as classes sociais, Sólon foi imbuído, primeiramente não da competência de legislador, mas sim de mediador. Uma posição de poder considerável na sociedade ateniense, esta referência é presente na biografia escrita por Plutarco trazida por James F. McGlew[25], e ratificada por Aristóteles, que ainda afirma que o consenso pelo nome de Sólon foi devido a ele ser um homem influente, e da classe média que poderia balancear os interesses antagônicos em jogo[26] 

Primeiramente a analise do texto e do contexto do Código, temos que ter em mente algumas polêmicas. A primeira é da real existência ou não de Sólon, pois segundo alguns estudiosos não passaria ele de um personagem fictício poeticamente criado para dar sustentação ao discurso de obediência a Lei. A segunda que suas leis não foram todas concebidas por ele, pois algumas de fato foram adições ou alterações feitas no texto original, conforme categoricamente afirma Geoffrey  Ernest Maurice[27]. 

No período anterior a reforma de Sólon, o contexto político era totalmente dominado pela aristocracia, o poder executivo e judicial estavam em suas mãos. Esta classe era integrante do Conselho e revezava entre seus membros a magistratura. Acaso houvesse alguma assembléia do povo, era somente um formalismo para confirmar os candidatos eleitos pela aristocracia. Neste momento, Cilón vendo as outras cidades – estados erguendo tiranias, intenta Atenas ao seu mando, porém é rechaçado pelo povo e consegue escapar da execução sumária que atinge seus correligionários, ensina Isidoro Muñoz Valle[28].

Aristóteles ressalta três pontos principais da obra de Sólon: a proibição de empréstimo tendo como garantia a pessoa do devedor (a liberdade da pessoa e da família); o direito de qualquer pessoa prestar queixa, inclusive em nome de terceiro, para corrigir uma injustiça que estava sendo feita, e terceiro, a instituição da apelação na corte do júri. Enaltece também a instituição do poder do voto como linha mestra da democracia e da constituição, porém ficou a desejar, para a massa do povo, a completa redistribuição de todas as propriedades, e, para a classe alta, a restauração das posições em seu formato original[29].

Além destas passagens importantes, historiadores, como Isidoro Muñoz Valle, afirmam que Sólon também promoveu o resgate dos atenienenses escravizados que se encontravam no exterior garantindo-lhes a imunidade contra a escravidão. Afinal deu ao povo ateniense a liberdade social, com a extinção da possibilidade da escravidão em razão de dívidas[30].

Fora as questões pragmáticas momentâneas, como as que Aristóteles cita como os três pontos principais, a obra de Sólon enquadra um dilema que todos os legisladores subseqüentes viveriam: o de que quando existe a necessidade de uma solução de uma demanda historicamente criada e enraizada na sociedade a ser disputada por posições radicalmente antagônicas não há Lei que será aceita como justo equilíbrio, ou seja, a posição do meio ou imparcial será sempre a que descontentará o maior número de pessoas.

Acabada a instituição das reformas, Sólon, teria se retirado de Atenas, com o pretexto de viajar e conhecer terras distantes, mas sabemos que a real função desta jornada conhecida como apodemia era a necessidade do legislador esquivar-se das pressões para introdução de mundanças nas Leis, como bem dita Delfim Leão[31].

O que ficou para nós pela poesia e pelas leis de Solón é existência por parte dele da recusa da tirania, a qual para ele está associada a violência e se equivale a escravidão, porém não existe uma entrega total a democracia. J. Antonio Clúa Serena melhor dizendo, afirma que Sólon organizou o governo desarticulando o privilégio do nascimento (aristocracia), mas estabelecendo em seu lugar o privilégio da fortuna, o que se denomina timocracia, uma ponte entre a aristocracia e a democracia[32].

A importância na compreensão da Lei dada por Sólon, é que comparando com os antigos reis da Mesopotâmia, como Hammurabi, ele fez a separação das funções do legislador e do julgador. Não tomou para si a posição de julgador inquestionável, como Lipit-Ishtar o fez e como comumente era feito, agiu como imparcialidade na descrição da justiça em suas normas, distribui as competências de forma a re-equilibrar as forças políticas entre as classes sociais,  conclui sua obra afirmando que se fizesse um grupo obter uma vitória injusta poderia acarretar a ruína de Atenas, como pondera Edward Monroe Harris[33].

A separação do legislador da figura do chefe do governo, já vista em Dracón, ganha um ar de independência com a legitimação pelo povo e não mais pela escolha direta do Poder. A separação da figura do legislador re-afirma esta independência, Sólon originalmente visto como mediador, faz de suas leis não sentenças que determinam de qual lado é a vitória, mas estabelece o ideal da Lei ocidental, esculpindo os valores ponderativos para o equilíbrio das forças antagônicas da tensão dialética do poder.

III.III  A teorização das razões da Lei escrita na Grécia Antiga. 

Estudiosos ao longo do tempo vem se defrontando com questões teóricas sobre as razões que levaram a Grécia Antiga estabelecerem as Leis de forma escrita. 

Kyle Lakin, do departamento de estudos clássicos de Stanford, revitaliza a discussão acadêmica sobre as duas teorias que tentam explicitar os motivos da configuração das normas de conduta da sociedade da Grécia antiga em Leis escritas[34]. 

A teoria  do controle da sociedade pelas Leis escritas (social control theory) argumenta que a origem deste tipo de Lei foi a necessidade social de finalizar com as disputas políticas, como aponta Gargarian. Está seria uma das estratégias, o desenvolvimento das leis, nas cidades-estados gregas para tentar pacificar as disputas internas  através de medidas que pudessem garantir uma melhor justiça social. 

Uma outra vertente desta mesma teoria, lidera por Walter Eder, leciona que a Lei escrita foi originalmente concebida para conservar os poderes da elite, embalsamá-los em leis, e assim poderia barrar a crescente criticidade da população pobre quanto a legitimidade da política imposta pela aristocracia. Era na verdade mais um meio para legitimar a estrutura do poder, do que uma negociação concedida entre as classes sociais. 

Os três motivos trazidos por Elder desta teoria para a origem da Lei escrita na Grécia Antiga são: para o acabar com o desenvolvimento da lei dos costumes, principalmente pela razão de pressão que este sistema estava assimilando em desfavor dos que detinham o poder; a necessidade de um texto definido e politicamente conhecido do textos das leis; e uma base legal para os negócios praticados com a propriedade, para acabar com o cancelamento de débitos e re-distribuição de terras. 

A teoria do controle do processo político pela Lei (process control theory), explicada por Karl Holkeskamp,  coloca de forma diferente o efeito das leis se tornarem escrita, mas quanto a causa, capacidade do uso das Leis para acabar com a discórdia política existente, não há discordância. 

Esta teoria acredita que a Lei escrita foi concebida em uma situação de estabilidade política, e que a Lei foi escrita para refinar a prática política, e para responder as situações que não eram devidamente atendidas pelas regras dos costumes.

 Acreditam também na construção filosófica e histórica dos personagens dos legisladores. A Lei foi originalmente concebida como expressão do controle dos cidadãos da estrutura do Estado.

 Ambas as teorias adotam a tese que o desenvolvimento da Lei fez parte do desenvolvimento do Estado Grego, e de que as leis sendo feitas receberam o apoio dos cidadãos.

 Esta é uma polêmica que representa muito mais a tensão em relação ao que atualmente temos como Lei, do que propriamente o objeto das disputas políticas na Grécia Antiga.

 IV.   APONTAMENTOS CONCLUSIVOS 

Urukagina, Ur-Nammu, Lipit-Ishtar e Hammurabi foram sábios reis mas não justos, desfizeram um possível descontentamento popular demonstrando que tinham os Deuses como co-legisladores de suas Leis. A ordem era conseguida pelo medo das penalidades divinas, e estes reinos progrediram além de suas fronteiras, com a população influenciada pela propaganda de que seu Rei era o próprio mandamento divino personificado, e em razão disso as ordens mesmo sendo injustas deveriam ser obedecidas.  

O mito dos Deuses Gregos deveriam, para ser acreditados, serem sólidos, inquestionáveis. Os costumes, e as regras divinas não possuem proporcionalmente uma necessária volatilidade quanto as demandas sociais que foram surgindo com aprofundamento do conhecimento da razão das coisas, e as complexidades que surgiram com o desenvolvimento econômico.

 O povo então aplaude Dracón com a  estruturação em Leis escritas dos costumes, porém as rechaça quando não houve a solução pretendida da pacificação social. A legitimação do legislador é concebida, e Sólon como um consenso comunitário assume a incumbência de criar as Leis necessárias.

 O mundo era feito de regras divinas, e a criatividade dos Deuses não conseguiu acompanhar a pujança do desenvolvimento econômico e social, e a racionalização da vida. O Poder então se viu entre em separar as Leis dos Deuses, ou serem engolidas por elas. Escolheram a formulação da figura do legislador, aproveitando a força do mito da personalidade divina, e a legitimação da vontade popular que surgira com a nova religião: a razão humana. 

 A codificação soloneniana, imbuída pela legitimação popular, para o equilíbrio das posições antagônicas da aristocracia e da plebe ateniense é a representação histórica da evolução legal da despersonalização normativa (impessoalidade e generalidade), com conteúdo altamente valorativo (abstratividade), e com a finalidade teórica de dar a cada um aquilo o que lhe pertence (justiça), para evitar a ruína de Atenas (interesse público). È o corte histórico ocidental da idealização do significado da Lei e do legislador.

 Ao mesmo tempo em que a desmistificação divina da Lei foi desconstruída, a mitificação da racionalidade da Lei foi construída. A história demonstra que a justiça e a sabedoria caminham de mãos dadas, mas ora é a sabedoria do poder que as guia, e ora é a justiça social que conduz.

 As Leis e as figuras dos legisladores, ao longo dos milênios que separam as suas gêneses e o mundo contemporâneo, foram sempre utilizadas para formulações teóricas da legitimação e da necessidade da existência de um grupo de pessoas dominantes, ou seja, do Poder.

 Estas teorizações sofreram interferências no tempo, e muito delas foram do questionamento de que sendo elas divinas ou racionalmente justas onde estava a justiça na miséria de uns em favor da fortuna de outros.

 È desta dialética reflexiva constante que os significados de existência das leis e do legislador se renovam no direito: o poder sendo sabiamente mantenedor do poder, e o povo tentando ser justo com o povo.

 Então o que resta ao jurista contemporâneo ? É ser mais sábio e tentar interferir internamente para que o Poder considere a justiça. E quanto ao País no contexto do mundo ocidental ? Não tendo nem o reconhecimento do poder da sabedoria e nem um Poder sabidamente comandado, temos a aclamar com todas nossas forças por justiça, já que boa parcela da fortuna mundial é fruto da nossa miséria.

 V.     REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

ANDREWES, A.. In: The growth of the Athenian State. Boederman, John (org.). The Cambridge Ancient History. Cambridge: Cambridge University Press, 2002.

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YARON, Reuven. The Laws of Eshnunna. Londres: Brill Academic Publishers. 1988.

 


 

NOTAS

[1] “Civilizations, like individuals, are known by their works. (…) Our culture debt to that remote civilization is far more substantial and varied than is generally recognized. When we rockon today our years by the sun and our weeks by the mon, and call the days of the week after the planets; when we look at our time-pieces to tell the hours and the minutes ad the seconds in conformance with sexagesimal system of numeration; when we approach the “babel” of tongues with the tooles of linguistic analysis; when we write our official records, our scholarly treatises, our literary creations, or our provate letters; when we reaffirm our faith in laws impersonally conceived and in government that shuns autocracy – when we do these and many other things, we are utilizing, whether we know it or not, the results os an immemorial experiment in living in wich ancient Mesopotamia played a leading part. (…) Mesopotamian law in its domestic operation. Its strength derived from the premise that law on earth derived from premise that law on earth must be in harmony with cosmic law and a order. It remans now to examine the dynamic capacbilities of the Mesopotamian system as evidenced by its effect on Babylonia´s neighbors, other societies of the ancient Near East, and finally the Classical word and hence ultimately also Western civilization.” SPEISER, E.A. Cuneiform Law and the History of Civilization. American Philosophical Society Proceedings. v. 107, n  6, p..536 – 538, 1963.

[2] Posteriormente o mito da linguagem legal é novamente construído pelas figuras de Hermes, Moises-Aarão, Maomé-Abdula, que voltam a ter exclusivamente para si a tarefa transformadora da hermenêutica normativa como propulsora da evolução do sistema jurídico

[3] COULANGES, Fustel de. Cidade Antiga. Tradução de Jean Melville. São Paulo: Ed. Martin Claret.  2005. p.338.

[4] COULANGES, Fustel de. Cidade Antiga. Tradução de Jean Melville. São Paulo: Ed. Martin Claret.  2005. p.338.

[5] “From about 2350 B.C., during the reign of Urukagina of Lagash, we have one of the most precious and revealing documents in the history of man and his perennial and unrelenting struggle for freedom from tyranny and oppression. This document records a sweeping reform of a whole series of prevalent abuses, most of which could be traced to a ubiquitous and obnoxious bureaucracy consisting of the ruler and his palace coterie; at the same time it provides a grim and ominous picture of man’s cruelty toward man on all levels–social, economic, political, and psychological. Reading between its lines, we also get a glimpse of a bitter struggle for power between the temple and the palace–the "church"and the "state"–with the citizens of Lagash taking the side of the temple. Finally, it is in this document that we find the word "freedom" used for the first time in man’s recorded history; the word is amargi, which, as has recently been pointed by Adam Falkenstein, means literally "return to the mother."  KRAMER, Samuel Noah. The Sumerians: Their History, Culture, and Character. Chicago: University of Chicago Press, 1971. p.79

[6] G. Fatás. Sumer. Dios y Reys. Disponível em: http://155.210.60.15/hant/POA/sumerdioses.pdf. Acessado em 25 de maio de 2.007.

[7] “He substantiated his declarations with deeds promoting prosperity, order and peace. In the same way, he showed religious and social sensitivity by giving primacy to his divine mission of legally protecting the oppressed and forsaken. (…)Urukagina’s reform was brief; it lasted just seven years, and ended with his death. But his reforming reign was not simply a shooting star. It demonstrates, rather, the traditional tendency to create and reform legal structures so that citizens can easily fulfill their purpose in life, which was to serve the divine world. Urukagina’s reform was fleeting, but it made a permanent contribution to the culture of the ancient Near East: it reinforced the tradition to give justice a legal base, so that all citizens might have a healthy and prosperous life. NARDONI, Enrique. Rise Up, O Judge: A Study of Justice in the Biblical World , tradução de Seán Charles Martin. Peabody: Hendrickson Publishers, 2004. p. 3 – 4”

[8] “Then did Ur-Nammu, the mighty warrior, king of Ur, king of Sumer and Akkad, by the might of Nanna, lord of the city (of Ur), and in accordance with the true word of Utu, establish equity in the land (and) he banished malediction, violence and strife… The orphan was not delivered up to the rich man; the widow was not delivered up to the mighty man; the man of one shekel was not delivered up to the man of one mina.”

[9] Exemplos: “If the wife of a man, by employing her charms, followed after another man and he slept with her, they (i.e. the authorities) shall slay that woman, but the male (i.e. the other man) shall be set free.; If a man divorces his primary wife, he must pay (her) one mina of silver.; If a man accused the wife of a man of fornication, and the river (-ordeal) proved her innocent, then the man who had accused her must pay one-third of a mina of silver.; If a man, in the course of a scuffle, smashed the limb of another man with a club, he shall pay one mina of silver.; If a man’s slave-woman, comparing herself to her mistress, speaks insolently to her (or: him), her mouth shall be scoured with 1 quart of salt.; If a man appeared as a witness (in a lawsuit), and was shown to be a perjurer, he must pay fifteen shekels of silver.; If a man flooded the field of a(nother) man with water, he shall measure out (for him) three kōr of barley per ikū of field.”

[10] YARON, Reuven. The Laws of Eshnunna. Londres: Brill Academic Publishers. 1988. p.19-20.

[11] Exemplos das normas do Código de Eshunna: “1 kor of barley is (priced) as 1 shekel of silver; 3 qa of “best oil” are (priced) at 1 shekel silver…; The hire for a wagon together with its oxen and its driver is 1 pan (and) 4 seah of barley.; If it is (paid in) silver, the hire is one third of a shekel. He shall drive it the whole day.; The wages of a harvester are 2 seah of barley; if they are (paid in) silver, his wages are 12 grain.; If a man takes a(nother) man’s daughter without asking the permission of her father and her mother and concludes no formal marriage contract with her father and her mother, even though she may live in his house for a year, she is not a housewife.;  If a man bites the nose of a(nother) man and severs it, he shall pay 1 mina of silver. (For) an eye (he shall pay) 1 mina of silver; (for) a tooth ½ mina; (for) an ear ½ mina; (for) a slap in the face 10 shekels of silver.; If an ox gores an(other) ox and causes (its) death, both ox owners shall divide (among themselves) the price of the live ox and also the meat of the dead ox.; If an ox is known to gore habitually and the authorities have brought the fact to the knowledge of its owner, but he does not have his ox dehorned, it gores a man a man and causes (his) death, then the owner of the ox shall pay two-thirds of a mina of silver.; If a wall is threatening to fall and the authorities have brought the fact to the knowledge of its owner (if nevertheless) he does not strengthen his wall, the wall collapses and causes a free man’s death, then it is a capital offence; jurisdiction of the king.; If a man divorces his wife after having made her bear children and takes [ano]ther wife, he shall be driven from his house and from whatever he owns and may go after him who will accept him.”

[12] Exemplos de normas do Código de Lipit-Ishtar: “If a man entered the orchard of (another) man (and) was seized there for stealing, he shall pay ten shekels of silver.; If a man cut down a tree in the garden of (another) man, he shall pay one-half mina of silver.;  If a man married a wife (and) she bore him children and those children are living, and a slave also bore children for her master (but) the father granted freedom to the slave and her children, the children of the slave shall not divide the estate with the children of their (former) master.; If a man rented an ox (and) broke its horn, he shall pay one fourth of (its) price.” 

[13] “(…)when Anu (and) Enlil called Lipit-Ishtar—Lipit-Ishtar, the wise shepherd…to the princeship of the land in order to establish justice in the land, to banish complaints, to turn back enmity and rebellion by the force of arms, (and) to bring well-being to the Sumerians and Akkadians, then I, Lipit-Ishtar, the humble shepherd of Nippur, the stalwart farmer of Ur… Verily…I made the father support his children (and) I made the children [support their] father; I made the father sta[nd by hi]s children (and) I made the children stand by their father; in the father’s house (and) [in the brother’s] house…”

[14] “Its prologue and epilogue are of familiar form and content, and indeed the closing sentences of the epilogue are but a version in Accadian of the corresponding portion of the epilogue of  Lipit-Ishtar. Of the substance of Hammurabi´s legislative provisions ( numbering 282 clauses) some are of the same general character as earlier provisions, and the topics treated, the language and the content are sometimes closely similar, but there is no doubt that here is a palpable advance an all earlier law and legislators that are known or can be surmised. The central power of the state and its organization are stronger, the number of the provisions of the code is greater, its sanctions are founded largely upon a new, telionic, principle, the arrangement of the topics is new and systematic, and the language reaches perfection.” DIAMOND, A.S.. Primitive Law, Past And Present.  Routledge  Library Editions: Londres, 2004. p.15

[15] “O receio da vingança dos deuses, pelo desrespeito aos seus ditames, fazia com que o direito fosse respeitado religiosamente. Daí que, em sua maioria, os legisladores antigos (reis sacerdotes) anunciaram ter recebido as suas leis do deus da cidade. De qualquer forma, o ilícito se confundia com a quebra da tradição e com a infração ao que a divindade havia proclamado.” WOLKMER, Antonio Carlos. Fundamentos de História do Direito. 1ª ed. BH:Del Rey, 2000. p.15.

[16] “The development of law in the Code of Hammurabi by roughly 1750bc is compared approximately with that in Athens over one thousand years later: “In athesn, Draco´s legislations of thereabouts seems to have represented the close of our primitive period…; while in his article ‘An eye for an eye in Iraq he compared the laws of Hammurabi with those of England in the Middle Ages: “The L.E (Laws o Eshnunna), and the laws of Ur-Nammu, as far as they go represent the legal situation in England in ad1150. The C.H. (Code of Hammurabi) represents England in 1250. So the word ‘primitive’ as used by A.S Diamon describe a stage of development regardless or whether it is ancient, recent or current.” SASSOON, John. Ancient Laws And Modern Problems: The Balance Between Justice and a Legal System. Intellect Books. 2005. p.168.

[17] “Em inscrições reais, listas de datas, cartas e documentos jurídicos do período babilônico antigo encontram-se mencionados atos reais, cuja finalidade era, sem dúvida, restaurar a ordem e a justiça na sociedade babilônica. Tais atos descrevem, sempre, uma intervenção do rei na sociedade e na economia do reino e significam uma suspensão temporária do direito vigente e de direitos adquiridos. (..) A estela é uma inscrição real e está, naturalmente, a serviço da ideologia do rei. Nesta estela as prescrições foram emolduradas por um prólogo e um epílogo e a finalidade desta obra é, sem dúvida, celebrar o rei como o garante da justiça do país. BOUZON, Emanuel.Origem e Natureza das Coleções do Direito Cuneiforme. Revista Justiça e História. v.2. n. 3. 2002. p. 22 -38.

[18] “Alguma coisa mais grave ainda se manifesta nos códigos. A natureza da lei e seu fundamento já não são os mesmos que no período precedente. Antes, a lei era decreto da religião, era tida como revelação feita pelos deuses aos antepassados, ao divino fundador, aos reis sagrados e aos magistrados sacerdotes. Nos novos códigos, pelo contrário, não é mais em nome dos deuses que o legislador fala; os ecênviros de Roma receberam o seu poder do povo e também foi o povo quem investiu Sólon do direito de fazer as leis. O legislador não representa mais a tradição religiosa, mas a vontade popular. A lei, doravante, tem por princípio o interesse dos homens, e por fundamento o assentimento da maioria.” COULANGES, Fustel de. Cidade Antiga. Tradução de Jean Melville. São Paulo: Ed. Martin Claret.  2005.

[19] COULANGES, Fustel de. Cidade Antiga. Tradução de Jean Melville. São Paulo: Ed. Martin Claret.  2005. p.338.

[20] “His task was to transform the oral code of customs and traditions into a body of written laws (nomos). By writing down the laws, Dracon gave them a new permanence in language, making them accessible to all citizens and less subject to interpretation and abuse by those in power.” KATULA, Richard A.. The Origins of Rhetoric: Literacy and Democracy in Ancient Greece. Londres: Lawrence Erlbaum Associates, 2003. p.7

[21]Athens and Dracon may have the credit of having reduced at least a large part of the law to writing at a relatively early date. But the code evidently did nothing to reduce the tension between rich and poor wich erupted in Solon’s time…” ANDREWES, A..The growth of the Athenian State. Boederman, John (org.). The Cambridge Ancient History. Cambridge: Cambridge University Press, 2002. p.371.

[22] “Athens´legal history might be said to begin with Draco´s lawcode of 621/ob.c.e., evidently a response to the violence that erupted after an aristocrat´s attempt to make himself tyrant at Atenas. Only fragments of the law on homicide survive, preserved verbatim on stone inscribed in the late fith century. This law appears to make the first step in the in emphasis from self-help to legal sanctions.” LANNI, Adriaan. Law and Justice in the Courts of Classical. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. p.15.

[23] SERENA, J. Antonio Clúa. Sólon o la historicidad de la comunicación elegíaca: La elegia a lãs musas y otros fragmentos: problemas actuales. Norba – Revista de História, v.18, 2005. p.119-135.

[24]“Draco constructed his code upon an ancient foundation of self-help and private settlement: against the thief, the adulterer, or the killer, let the injured parties exact retribution for themselves and they may slay the offender with impunity. These conventions gave a decided advantage to the most powerful families who could easily reconcile those whom they injured and forcibly punish those who injured them. Bothered by inequities, some Athenians of Aristotle´s era began to regard Draco´s laws as unjust and undemocratic. And the ingrained character of sanctioned violence is probably what Demades meant when he spoke against “the laws written in blood’. Bur there is a meaning to these words that Demades himself may not have fully appreciated. For at their inception Draco´s laws signaled the end of heroic remedies meted out by gods and mighty lords, and marked the beginning of way justice more accessible to ordinary man.” CARAVAN, Edwin. Rhetoric and the Law of Draco. Oxford: Oxford University Press, 1998. p.2.

[25] “Plutarch asserts, and his own poetry seems to confirm, that Solon was not originally commissioned to revise Athenian law or to design a new political structure but to act in the capacity of a mediator – a position of considerably greater power and one that links him closely with some archaic tyrants.” MCGLEW, James F..Tyranny and Political Culture in Ancient  Greece. Cornell:Cornell University Press, 1993. p.94.

 [26]“The strife was keen, and for a long time the two parties were ranged in hostile camps against one another, till at last, by common consent, they appointed Solon to be mediator and Archon, and committed the whole constitution to his hands.(…) By birth and reputation Solon was one of the foremost men of the day, but in wealth and position he was of the middle class, as is generally agreed, and is, indeed, established by his own evidence in these poems, where he exhorts the wealthy not to be grasping.ARISTÓTELES. Athenians Constitution. Disponível em: http://classics.mit.edu/Aristotle/athenian_const.1.1.html. Acessado em: 11 d ejulho de 2.006.

[27] MAURICE, Geoffrey  Ernest. Athenian Democratic Origins: And Other Essays. Oxford: Oxford University Press, 2004. p.78

[28] VALLE, Isidoro Muñoz. La reforma social de Sólon en la antigua Atenas. Revista de Estúdios Políticos. n.º 277. p.7. setembro – outubro, 1977.

[29] ARISTÓTELES.Athenian Constitute. Disponível em: http://classics.mit.edu/Aristotle/athenian_const.1.1.html. Acessado em 15 de agosto de 2.007.

[30] VALLE, Isidoro Muñoz. La reforma social de Sólon en la antigua Atenas. Revista de Estúdios Políticos. n.º 277. p.7. setembro – outubro, 1977.

[31] LEÃO, Delfim.Nomos Argias. Revista de Retórica y Teoria de la Comunicación, Ano I, n. 1, p.103, Enero 2001.

[32] SERENA, J. Antonio Clúa. Sólon o la historicidad de la comunicación elegíaca: La elegia a lãs musas y otros fragmentos: problemas actuales. Norba – Revista de História, v.18, p.119-135, 2005.

[33] HARRIS, Edward Monroe.Democracy and the Rule of Law in Classical. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. p.77

 [34]LAKIN, Kyle. Legal Pluralism in Archaic Greece. Stanford Department of Classics & Stanford Law School. Disponível em:http://www.princeton.edu/~pswpc/pdfs/lakin/120516.pdf. Acessado em 18 de setembro de 2.007.

 


 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

Bruno J.R. Boaventura: Advogado militante em Cuiabá em direito público, sócio-gerente da Boaventura Advogados Associados S/C. Especialista em Direito do Estado, com ênfase em Constitucional, pela Escola Superior de Direito de Mato Grosso.

 

 


Erro médico e radiologia

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*Neri Tadeu Camara Souza 

A figura jurídica do erro médico encontra-se cada vez com mais freqüência em avaliação, em termos de responsabilidade civil, nos tribunais brasileiros. Isto ocorre também no terreno da radiologia. Pode-se dizer, numa visão mais ampla, no campo da imaginologia, aqui podendo ser entendido como  DIAGNÓSTICO POR IMAGEM, que no site http://pt.wikipedia.org tem o seguinte conceito:  Diagnóstico por imagem é uma especialidade médica que se ocupa do uso das tecnologias de imagem para realização de diagnósticos. No Brasil  o Conselho Federal de Medicina reconhece a especialidade pelo nome de "Radiologia e Diagnóstico por imagem". (capturado na Internet: http://pt.wikipedia.org/wiki/Diagn%C3%B3stico_por_imagem, em 05.02.2008). Portanto, a especialidade médica RADIOLOGIA E DIAGNÓSTICO POR IMAGEM faz parte da listagem oficial da RESOLUÇÃO CFM – Conselho Federal de Medicina, nº1785/2006, que “Dispõe sobre a nova redação do Anexo II da Resolução CFM nº 1.763/05, que celebra o convênio de reconhecimento de especialidades médicas firmado entre o Conselho Federal de Medicina (CFM), a Associação Médica Brasileira (AMB) e a Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM)”.

Cabe, pois, uma abordagem de quais conceitos jurídicos, e comportamentais que podem até vir a ter implicações legais, são passíveis de virem a ser  aplicados na avaliação pelos tribunais brasileiros, em termos de ressarcimento dos danos que porventura venham a sofrer os pacientes como decorrência dos procedimentos radiológicos aos quais venham a ser submetidos.

Os métodos utilizados em imaginologia podem ser agrupados, conforme se lê no site www.abcdi.com.br (ABCDI – Associação Brasileira das Clínicas de Diagnóstico por Imagem), nos seguintes tipos de procedimentos: radiodiagnóstico convencional e especializado, radioterapia, medicina nuclear, ultra-sonografia, tomografia computadorizada, ressonância magnética, radiologia vascular e intervencionista, radiologia pediátrica, mamografia, densitometria óssea, neurorradiologia, doppler esplâncnico e periférico e outros que venham a ser definidos pelo Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem – CBR” (capturado na Internet: http://www.abcdi.com.br/regulamento.php, em 05.02.2008). Cabe transcrever o que ensina Milton Mizsputen, no site http://webrun.uol.com.br: “Antigamente conhecida apenas por Radiologia, hoje a especialidade é chamada de Diagnóstico por Imagem, porque nas últimas décadas surgiram métodos de exames bastante diferentes da radiologia convencional. Foram inventados os aparelhos/métodos de ultra-sonografia (US), tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética (RM). E todos esses métodos fazem parte do aprendizado, especialização e trabalho do radiologista contemporâneo.” (capturado na Internet: http://webrun.uol.com.br/home/index.php?destinocomum=noticia_mostra&id_noticias=6999&id_eventos= (RX), em 05.02.2008).  

Pode-se entender quando ocorrem os erros em imaginologia, radiologia, no escólio de Sandro Fenelon: “Quaisquer métodos de imagem podem estar envolvidos, mas os mais prevalentes são a mamografia e a radiografia de tórax. As condições mais freqüentemente envolvidas em processos judiciais são fraturas, câncer de mama, pulmão e cólon, e complicações de procedimentos.” (ASPECTOS ÉTICO-LEGAIS EM IMAGINOLOGIA. In: Radiologia Brasileira, São Paulo, vol. 36, nº 1, III-IV, Jan-Fev, 2003, capturado no site www.scielo.br da Internet: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-39842003000100001, em 03.02.2008)

No site da FENAESS – Federação Nacional dos Estabelecimentos de Serviços de Saúde é lecionado que: “A medicina não é uma ciência exata e acidentes podem acontecer, principalmente quando se trata de cirurgias e processos invasivos, porém algumas especialidades trazem consigo o apelo por um resultado positivo e quando não ocorre a Justiça é acionada imediatamente. Este é o caso da cirurgia plástica, anestesiologia e radiologia.” (capturado na Internet: http://www.fenaess.org.br/clipping/clip_16032006.htm, em 03.02.2008).

O site da FEBRASGO – Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, no “Manual de Orientação – Defesa Profissional”, 2002 (em sua página 31), preleciona: “Porém, importante que se diga que existe a figura da culpa presumida. Trata-se de questão doutrinária bastante utilizada pelo judiciário nos processos de responsabilidade civil médica. Consiste no fato de se considerar, em certos casos, principalmente nas especialidades às quais se imputa obrigação de resultado – como é o caso da cirurgia plástica, radiologia, anestesiologia e até mesmo a odontologia – em que o ônus da prova passa à pessoa do médico. Em última análise, há o entendimento de que nas especialidades nas quais se considere haver obrigação de resultado, presume-se a culpa do profissional médico, cabendo a este provar a sua inexistência.” (capturado na Internet: http://www.gosites.com.br/sggo/pdf.asp?path=302553jh%7Cggeyny7zmls2rjl4&arq=rcq%7Chp678682vml, em 03.02.2008).

Mas, mesmo que presumida, a culpa deve estar presente na conduta do médico radiologista que causar dano, prejuízo, a um paciente, para que ocorra a sua responsabilização, já que ocorre ser esta, culpa, um dos quatro pressupostos da responsabilidade civil, dita subjetiva (também chamada Teoria da Culpa). Isto posto, nos termos da Teoria Subjetiva da Responsabilidade (Teoria da Culpa) sobre a qual nos ensina Victor Emanuel Christofari: “Para a teoria subjetiva, a culpa é o elemento essencial para a caracterização do ilícito; sem culpa não há ilícito, não há quem responsabilizar.” (INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO. 4.ed., Canoas – RS: Editora da ULBRA – Universidade Luterana do Brasil, 1998, p.284). Os quatro pressupostos – elementos – da responsabilidade subjetiva, gize-se, devem estar presentes, e provada a sua existência nos autos do processo, para que possa vir a ser responsabilizado o profissional responsável por dano a um paciente. Estes quatro pressupostos da responsabilidade subjetiva são: 1. ATO LESIVO – é o procedimento, comissivo ou omissivo, prejudicial, lesivo, ao paciente, 2. DANO – é a lesão, o prejuízo, sofrido pelo paciente, 3. NEXO CAUSAL – é a relação de causalidade, relação de causa e efeito, entre o ato lesivo e o dano sofrido pelo paciente, e 4. CULPA – geralmente, em casos de eventual erro médico, é um agir, um atuar, do causador do dano no paciente tendo presente na sua conduta a negligência,a imprudência ou a imperícia.

Cabe aqui destacar a outra teoria da responsabilidade encontrada em nosso ordenamento jurídico, a denominada responsabilidade objetiva (Teoria do Risco), e para isso nos valemos do ensinamento de Arnaldo Rizzardo: “Quanto à responsabilidade objetiva, unicamente um dos pressupostos acima retira-se, que é o da culpa, não apenas pela dificuldade de ser conseguida em certas situações especiais, mas porque a atividade ou o trabalho importa em indenizar se desencadear algum dano. (…) Os demais elementos – ação ou omissão, relação de causalidade e dano – devem estar presentes.” (RESPONSABILIDADE CIVIL – Lei nº10.406, de 10.01.2002. 2.ed., Rio de Janeiro: Forense, 2006, p.37).

Em casos de erro médico a culpa costuma estar presente, sem se excluir a possibilidade do dolo – comportamento doloso, como culpa em sentido estrito – comportamento culposo. Ambos, comportamento doloso e culposo (em sentido estrito), definidos no artigo 18, do Código Penal brasileiro: “Diz-se o crime:

Crime doloso

I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo“;

Crime culposo

II – culposo, quando o agente deu causa ao resultado por negligência, imprudência ou imperícia”.  

A necessidade da presença de, pelo menos, uma destas modalidades de culpa (nunca se excluindo a possibilidade da presença da culpa sob a forma de dolo), negligência, imprudência ou imperícia – estas três mesmo que sob a forma presumida – no agir do causador de um dano a outrem vem expressa no texto dos artigos 186 (“Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.“) e 951 (“O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.“), de nosso Código Civil. Esta é a regra geral em nosso ordenamento jurídico. No microssistema legal do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº8.048/1990), que como lei especial via de regra se sobrepõe ao nosso Código Civil, o que vige é a responsabilidade objetiva, exceção feita aos profissionais liberais, em nosso caso os médicos. Nestes deve ser perquirida pelos tribunais a presença da culpa no seu atuar – conduta – profissional.  

Sobre as formas de culpa leciona Sérgio Cavalieri Filho: “Chegamos, desta forma, à noção de culpa, que tem, aqui, sentido amplo (lato sensu), abrangente de toda espécie de comportamento contrário ao Direito, seja intencional, como no caso do dolo, ou não, como na culpa.” (PROGRAMA DE RESPONSABILIDADE CIVIL. 7.ed., São Paulo: Editora Atlas, 2007, p.29), Complemente-se o entendimento do que seja culpa em sentido estrito (comportamento culposo) com o ensinamento de Hans Kelsen: “O momento a que chamamos “culpa” é uma parte integrante específica do ato ilícito: consiste numa determinada relação positiva entre o comportamento (atitude) íntimo, anímico, do delinqüente e o evento produzido ou não impedido através da sua conduta externa; consiste na sua previsão ou na sua intenção, àquele evento dirigida.” (TEORIA PURA DO DIREITO. 6.ed., São Paulo: Editora Martins Fontes, 1999, p.134). O que Hans Kelsen ensina sobre negligência complementa o entendimento da culpa em sentido estrito: “Sob o conceito de responsabilidade pela culpa costuma também abranger-se a hipótese da chamada negligência. Esta surge quando a produção ou o não-impedimento de um evento (resultado), indesejável segundo a ordem jurídica, é proibido, mesmo que não tenha sido efetivamente previsto ou intencionalmente visado pelo indivíduo através de cuja conduta ele foi produzido ou não foi evitado, já que normalmente teria podido e devido prevê-lo e, portanto, teria podido e devido não o provocar ou evitá-lo.(op. cit.). Sobre as modalidades de culpa em sentido estrito preleciona Sérgio Cavalieri Filho: “A imprudência é falta de cautela ou cuidado por conduta comissiva, positiva, por ação. (…) Negligência é a mesma falta de cuidado por conduta omissiva. (…) a imperícia, por sua vez, decorre da falta de habilidade no exercício da atividade técnica (…) O erro médico grosseiro também exemplifica a imperícia.” (op. cit., p.37). Conclui Arnaldo Rizzardo: “A ação humana eivada de máculas, isto é, de culpa no sentido estrito ou lato, denomina-se ‘ato ilícito’, porque afronta a ordem jurídica, ou desrespeita o que está implantado pela lei. E a responsabilidade consiste na obrigação de sanar ou recompor, ou ressarcir os males e prejuízos que decorrem de mencionadas ações.” (op.cit, p.28).

A relação que se estabelece, entre o médico e o paciente, em um atendimento médico, é contratual. Isto já é aceito maciçamente pela doutrina nacional e internacional, e no que se refere aos atendimentos em radiologia não ocorre diferente. Cabe aqui mencionar, que esta relação contratual entre o paciente e o executor de um serviço de radiologia que seja realizado neste paciente é submetida ao que determina o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº8.048/1990), já que o prestador de um serviço de radiologia, pessoa física ou jurídica, apresenta-se como fornecedor de serviços de exames médicos, assim caracterizando-se uma relação de consumo. O Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 3º, no caput, define fornecedor: “Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de (…) prestação de serviços”. O mesmo Código de Defesa do Consumidor exclui como prestação de serviço, dentro de uma relação de consumo regida por este código, aquelas atividades exercidas como decorrência de uma relação de caráter trabalhista. A lei consumerista, em seu artigo 2º, nos apresenta também a definição de consumidor: “Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. O paciente que é submetido a um exame radiológico é, pois, um consumidor deste serviço, ou seja, nada mais é que o destinatário final, portanto consumidor do serviço utilizado para fazer um diagnóstico, ou até tratamento, do seu eventual problema de saúde.

Os tribunais brasileiros, nos seus julgados, têm decidido no sentido de ser responsabilidade objetiva a das empresas prestadoras de serviços em radiologia, por eventuais danos causados aos pacientes. Mas, mesmo avaliando a prestação de um serviço de radiologia, por pessoa física ou jurídica, nos termos do Código de Defesa do Consumidor, e o caput, do artigo 14 deste código determinar: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”, este mesmo artigo em seu parágrafo 4º (“A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa”) expressa que o caput deste artigo não se aplica aos profissionais liberais, no caso os médicos. Nesta direção vai Regina Beatriz Tavares da Silva ao analisar o teor de um acórdão: “Como esclareceu o acórdão, o alegado dano não ficou provado, sendo que não se aplica o Código de Defesa do Consumidor, em responsabilidade civil dos profissionais liberais, por determinação legal expressa do artigo 14, §4º, desse diploma legal.” (Responsabilidade Civil na Odontologia. In: Silva, Regina Beatriz Tavares da, RESPONSABILIDADE CIVIL NA ÁREA DA SAÚDE.  Série GVlaw, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 212). Assim quando se analisar a responsabilidade civil de uma empresa prestadora de serviços de saúde em radiologia (imaginologia), antes de considerar objetiva a responsabilidade desta há que se averiguar, em juízo, se houve responsabilidade, aqui em termos de responsabilidade subjetiva (presença de culpa na atuação do profissional), do médico – profissional liberal – que porventura tenha causado dano a um paciente. Só, então, comprovado que o dano eventual a um paciente resultou do agir culposo do médico, poderá vir a ser responsabilizado objetivamente, nos tribunais, o serviço de radiologia onde este exerce as suas atividades.

Sublinha Oscar Ivan Prux ser uma obrigação de resultado aquela pela qual se obriga o médico radiologista: “Trazendo para a prática, podem ser listados, exemplificativamente, alguns casos de obrigações de resultado que são contratadas pelos diversos tipos de profissionais liberais. (…) o “radiologista” que contrata a feitura ou análise de uma ultrassonografia ou tomografia computadorizada” (A RESPONSABILIDADE CIVIL DO PROFISSIONAL LIBERAL NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 1998, p.193).

Sobre obrigações de meios e obrigações de resultado alude Regina Beatriz Tavares da Silva: “Em forma esquemática, é retomado o estudo na natureza das obrigações de meio e de resultado:

  • Obrigações de resultado: o devedor se obriga a alcançar um objetivo

         o fim é contratado

         obrigação de agir com lisura, correção empenho, dedicação, técnica e prazo (obligatio ad diligentiam) + resultado (meta optata)

         presume-se a culpa do devedor, que se obrigou a alcançar um certo objetivo

         presume-se a culpa do causador do dano, ao qual cabe provar que não agiu com negligência, imperícia ou imprudência.

  • Obrigações de meio: o devedor se obriga a empregar todos os meios a seu alcance para a consecução de um objetivo

         a atividade é contratada

         obrigação de agir com lisura, correção, empenho, dedicação, técnica e prazo (obligatio ad diligentiam)

         cabe ao credor provar a culpa do devedor, que se obrigou a empregar todos os meios e esforços para a consecução de um objetivo e não a alcançá-lo

       vítima deve provar que o causador do dano agiu com negligência, imperícia ou imprudência.

Alguns critérios auxiliam na identificação da natureza da obrigação, se de meio ou de resultado.

Um desses critérios é a verificação da complexidade do procedimento, com a mensuração das respectivas dificuldades. Quanto menores as dificuldades mais fácil será a identificação de uma obrigação de resultado; quanto mais complexo for o procedimento, a identificação se voltará a uma obrigação de meio.” (Responsabilidade Civil de outros profissionais na área da saúde. In: Silva, Regina Beatriz da – Coordenadora – e outros, RESPONSABILIDADE CIVIL NA ÁREA DA SAÚDE. São Paulo: Saraiva, 2007, p.228). Mas, ressalte-se, a complexidade de um determinado caso médico não eximirá, via de regra, o fornecedor de serviço de saúde, aqui um serviço de radiologia, de executar corretamente a sua atividade. 

Nos ensina Genival Veloso de França: “Ainda: o médico, nas relações de consumo com seus clientes, não está obrigado a um resultado, pois entre eles existe um contrato de meios e não de fins. Seu compromisso é utilizar todos os meios e esgotar as diligências ordinariamente exercidas. Em suma: usar de prudência e diligenciar normalmente a prestação do serviço. Haverá inadimplência se a atividade for exercida de forma irregular, atípica ou imprudente, e se na prestação do serviço venha ocorrer um acidente de consumo, o médico terá sua responsabilidade civil apurada dentro dos limites da má prática. Discute-se tal conceito, no que se refere aos contratos de meios ou de resultados, na anestesiologia, na cirurgia plástica, na radiologia e na patologia clínica.” (O CÓDIGO DO CONSUMIDOR E O EXERCÍCIO DA MEDICINA. Capturado no site  www.erromedico,org na Internet: http://www.erromedico.org/genival_codigo.htm, em 16.02.2008).

Os serviços de radiologia, como regra geral, respondem pelos danos causados por erros dos radiologistas, e outros profissionais, que exercem atividades nestas empresas de saúde. Isto se dá em termos de responsabilidade in eligendo e in vigilando. Sobre a responsabilidade in eligendo nos diz Rui Stoco: “Culpa in eligendo é a oriunda da má escolha do representante, ou preposto.” (RESPONSABILIDADE CIVIL E SUA INTERPRETAÇÃO JURISPRUDENCIAL. 4.ed., 1999, p.67). Sobre a mesma responsabilidade in eligendo, nos ensina Caio Mário da Silva Pereira: ”culpa in eligendo, quando há má escolha de uma pessoa a quem é confiada uma certa tarefa” (RESPONSABILIDADE CIVIL – De acordo com a constituição de 1988. 9.ed., Rio de Janeiro: Forense, 1999, p.72). O mesmo Caio Mário leciona sobre a responsabilidade in vigilando: “culpa in vigilando, quando uma pessoa falta ao dever de zelar, ou comete uma desatenção quando tinha o dever de observar“. (op. cit., p.71). Isto tudo, presente em nosso ordenamento jurídico, nos termos do artigo 932, inciso III, do Código Civil brasileiro, verbis: “São também responsáveis pela reparação civil: (…)

III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais ou prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir ou em razão dele”, que dá um caráter de responsabilidade objetiva àquela do empregador ou comitente pelos atos lesivos pelos quais sejam responsabilizados, em juízo, os seus empregados, serviçais ou prepostos. No mesmo sentido, mesmo sem mencionar que a responsabilidade seja objetiva e, sim, presumindo a culpa no agir do patrão ou comitente – preponentes – foi o enunciado da Súmula 341, do STF – Supremo Tribunal Federal: “É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto”.

Os serviços de radiologia podem, portanto, serem responsabilizados, nos tribunais, pelos prejuízos que venham a sofrer pacientes em decorrência dos procedimentos aos quais são submetidos. Esta responsabilização poderá ocorrer mesmo quando causados danos aos pacientes por seus agentes ou prepostos. No que se refere aos médicos, e aí se incluem não só radiologistas como também médicos de outras especialidades, que não possuam vínculo trabalhista com estas empresas, os serviços de radiologia poderão não conseguir se eximir, em juízo,  da responsabilidade de ressarcir os pacientes que sofrerem dano em virtude das características das atividades profissionais destes nestas empresas de saúde. Isto porque, o preposto, médico radiologista ou não, estará sempre executando atividades com um objetivo específico: realizar exames médicos especializados na área da radiologia oferecidos por  estas entidades.

E, não só por seus prepostos, responde o serviço de radiologia mas também está sujeito aos preceitos legais da responsabilidade civil pelo fato da coisa, já que os medicamentos que causarem danos aos pacientes podem responsabilizar pelos prejuízos aquele que os utilizou, numa interpretação extensiva, nos termos do artigo 938, do Código Civil brasileiro (“Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde, pelo dano proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar indevido.”). E, sublinhe-se, as substâncias utilizadas como contrastes radiológicos, bem como seus similares, são consideradas medicamentos à luz do nosso direito positivo no Decreto federal nº 79.094/77, em seu artigo 3º, inciso II: “Medicamento é o produto farmacêutico, tecnicamente obtido ou elaborado, com finalidade profilática, curativa, paliativa ou para fins de diagnóstico”.

Os serviços de radiologia estão comprometidos com a necessidade de comunicar os pacientes sobre os riscos dos procedimentos, e aqui cabe a elaboração de um adequado “consentimento informado” (informed consent) para ser assinado pelo paciente, ou seu responsável, dentro do dever maior de informação, e educação, do consumidor que cabe aos fornecedores de serviços, inclusive na área da saúde. Como sublinha Antonio Carlos Matteis de Arruda Júnior: “O direito básico à informação (art.6.°, inciso III, da Lei 8.078/1990) decorre do princípio da informação, previsto no art. 4.°, IV, da Lei 8078/1990, sendo que este último implica educação do consumidor e da mesma decorre. Guarda, ainda, relação direta com o princípio da transparência e boa-fé, previstos no art. 4.°, caput, da Lei 8.078/1990

Ocorre que, ao declinar a informação como um direito, a lei consumerista, no art. 6.°, inciso III, especifica de que forma deve ser prestada a informação ao consumidor de forma clara, precisa, esmiuçada e sem omissões, de modo que não restem dúvidas ao consumidor.” (RESPONSABILIDADE CIVIL PELA VENDA DE MEDICAMENTOS SUJEITOS À PRESCRIÇÃO MÉDICA. São Paulo: Editora Método, 2004, p.59).

Diz o artigo 6º, inciso III, do CDC – Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990): “São direitos básicos do consumidor: (…)

III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”. Diz o artigo 4º, da mesma lei, em seu caput, e no inciso IV: “A Política das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (…)

IV – educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo”.

No mesmo sentido vai Luciana Mendes Pereira Roberto: “Cabe ao profissional de saúde a obtenção do consentimento informado de seu paciente, anteriormente a qualquer procedimento. As explicações e esclarecimentos que serão dados ao paciente deverão ser de forma clara e no seu nível de compreensão, devendo o profissional de saúde evitar o uso de expressões técnicas.” (RESPONSABILIDADE CIVIL DO PROFISSIONAL DE SAÚDE & CONSENTIMENTO INFORMADO. Curitiba: Juruá, 1.ed. – ano 2005 -, 2ª tiragem, 2006, p.136). Isto exposto sobre o consentimento informado, em tudo e por tudo, se aplica ao serviços radiológicos prestados aos pacientes. Ninguém é livre – autônomo – para decidir, se não estiver adequadamente informado, instruído, sobre o que vai decidir. Esta autonomia do paciente, um dos três princípios éticos pelos quais deve se pautar a atividade médica, impõe-se ser resguardada em respeito ao princípio geral da  dignidade humana. Sobre este principio geral nos transmite Edmilson de Almeida Barros Júnior: “Dignidade deriva do latim dignus – aquele que merece estima e honra, aquele que é importante. A dignidade humana, como fundamento constitucional, é valor-guia dos Direitos fundamentais e de toda ordem constitucional, razão por que é caracterizado como o princípio constitucional de maior hierarquia axiológico-valorativa.” (A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO – Uma Abordagem Constitucional. São Paulo: Atlas, 2007, p.77).

A par disto, devem os serviços de radiologia zelar pela incolumidade dos pacientes, prestando um serviço que não os exponha a riscos desnecessários. Sempre deve ser considerada a relação risco-benefício dos procedimentos favorável ao paciente, em respeito a outro dos três princípios básicos da ética médica, ou seja, o princípio da beneficência / não-maleficência – o terceiro seria o da justiça. Sobre a beneficência nos lecionam Délio José Kipper e Joaquim Clotet: “O princípio da beneficência tem como regra norteadora da prática médica, odontológica, psicológica e da enfermagem, entre outras, o bem do paciente, o seu bem estar e os seus interesses, de acordo com os critérios do bem fornecidos pela medicina, odontologia, psicologia e enfermagem.” (Princípios da Beneficência e Não-maleficência. In: INICIAÇÃO À BIOÉTICA. Brasília: Conselho Federal de Medicina, 1998, p.44). No que tange ao princípio da justiça encontramos no site www.crmmg.org.br – Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais, o que nos assevera Luís Gonzaga do Amaral: “Princípio da Justiça – é o princípio que garante os benefícios dos serviços de saúde, assegurados na Constituição, que tem efeitos para todos (erga omnes).” (capturado na Internet: http://www.crmmg.org.br/Noticias/Entrevistas/28_12_2006-entrevista_01, em 05.02.2008).

A responsabilidade civil em radiologia, e por extensão em imaginologia, caracteriza-se por ser regida pela responsabilidade subjetiva quando nos reportarmos a danos causados pelos serviços de radiologia propriamente ditos, ou seja, atos médicos, radiológicos ou não, mas há casos em que essa responsabilidade poderá ser avaliada, em termos da responsabilidade objetiva (Teoria do Risco), prescindindo-se pois da presença da culpa no agir do causador do ato lesante. Como acontece no que tange à responsabilidade civil dos hospitais, serviços de saúde em geral, a responsabilidade civil dos serviços de radiologia (imaginologia) quando se referir a atos lesivos que não sejam causados pelos serviços médicos (regidos estes pela responsabilidade subjetiva), poderá ser avaliada pelos tribunais brasileiros sob o prisma da responsabilidade objetiva. Exemplifique-se os serviços que podem ser regidos pela responsabilidade objetiva, caso venham a causar danos aos pacientes, citando os serviços de transporte, recepção, limpeza, dentre outros.

No que tange ao tipo de obrigação contratual pela qual o prestador do serviço radiológico se compromete com o paciente ao executar o seu serviço em saúde, há possibilidade de que esta seja encarada, pelos tribunais brasileiros, como uma obrigação de resultado. Mas não se exclui que procedimentos radiológicos sejam encarados, em juízo, como uma obrigação de meios, mormente aqueles mais complexos. A doutrina até já admite que se mencione a possível presença, em determinadas situações, de uma obrigação mista, ou seja, com algumas características de obrigação de resultado mas apresentando aspectos das obrigações de meios, ou vice-versa. É conveniente, pois, que, sempre, na avaliação judicial de um dano causado a um paciente por um procedimento radiológico, sejam avaliadas as circunstâncias do caso concreto já que em vez de uma obrigação de resultado, podemos estar frente a uma obrigação de meios ou mesmo mista. Estes conceitos aqui expostos se aplicam integralmente, sem sombra de dúvida, aos procedimentos executados em todo o campo de atividade da especialidade médica da RADIOLOGIA E DIAGNÓSTICO POR IMAGEM (“imaginologia”).

 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

NERI TADEU CAMARA SOUZA:  advogado e médico. Autor do livro Responsabilidade Civil e Penal do médico, 2ª edição, 2006 e do E-book  "Erro Médico e Direito Civil", 2006 – LZN Editora, Campinas (SP).

Contato:  resp@via-rs.net