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O problema de eficácia e da efetividade das normas jurídicas internacionais.

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Autores:

José Luiz Messias Sales. Professor Universitário. Mestre em Direito das Relações Internacionais e a Integração. Advogado. Especialista em Direito Empresarial, Direito Processual Civil. Assessor do Instituto Jamil Sales (IJL).  Autor da obra “Segurança Jurídica dos Contratos Comerciais no Mercosul. As Relações entre Brasil e Uruguai” E-mail: messiassales@terra.com.br

Gisele Leite. Professora universitária há três décadas. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. 29 Obras Jurídicas publicadas. Presidente da ABRADE-RJ. Consultora IPAE. Pesquisadora-Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas (INPJ). E-mail: professoragiseleleite@gmail.com

 

Resumo: É sabido que a aplicação de sanções internacionais contam com apoio da ONU e de seu Conselho de Segurança. Em sua de defesa, afirma-se que possibilitam a manutenção da paz e da segurança internacional e, forçam o uso da alternativa diplomática. Porém, é muito questionável tal objetivo seja, verazmente, galgado pois as sanções internacionais, segundo alguns, atingem apenas modestos efeitos e prejudicam a população mais pobre dos países, já que alguns líderes sancionados continuaram no poder, por mais tempo, como foram os casos da Cuba e da Coreia do Norte. Portanto, ainda continua em debate tanto a eficácia como a efetividade das normas internacionais.

Palavras- Chave: Direito Penal Internacional. Sanção Internacional Eficácia das Normas Internacionais. Validade das Normas Internacionais. Direito Internacional Humanitário.

 

É precisar haver maior reflexão doutrinária, principalmente, as relacionadas à contemporaneidade e ao positivismo jurídico atual para introduzir os questionamentos sobre a relação entre política e direito. Enfim, cumpre responder se poderiam juntos, o Direito e a Política prover maior normatividade e eficácia ao Direito Internacional?

E, a partir de contexto teórico busca-se, fixar os parâmetros, para encontrar, possíveis propostas que auxiliem na otimização do funcionamento do Direito Internacional.

Evidentemente, o positivismo jurídico[1] não é a premissa teórica inicial do direito internacional. E, a pretensão científica do positivismo permite a identificação, em suas estruturas teóricas, as bases do vigente direito das gentes. E, qualquer tentativa para se compreender a organização do poder dentro da ordem internacional poderá buscar, nos positivistas, as premissas, que parecem ter se desconectados ao longo da trilha evolutiva.

Apesar de que sobre a natureza jurídica do direito internacional, o debate já esteja superado  e a tônica que sustentava a sua condição política foi muito útil para a devida contextualização de diversos temas contemporâneos que tanto afligem os doutrinadores.

E, ainda que a tradição possa ser entendida como repetitiva e previsível, a leitura de Hans Kelsen e de H.L. Hart tornam-se obrigatórios ao que se propõe. E, revisitar, principalmente, esses dois doutrinadores se mostra indispensável ao entendimento dos contornos do direito das gentes atual.

E, compreender a abordagem positivista do ordenamento normativo internacional serviria, portanto, para facilitar melhor acepção da trajetória da disciplina e do contexto político da conveniência dos Estados na contemporaneidade.

Segundo Jacob Dolinger, a dignidade é o mais antigo valor da humanidade e, também, o mais habitualmente aviltado. Os mitos em torno da declaração universal dos direitos do homem e da Constituição Federal brasileira de 1988. Trabalhar a modernidade sob a ótica positivista para compreender o  momento atual, exige que se verificar as premissas adotadas pelos doutrinadores que buscam superar os esquemas teóricos modernos. E, cabe a ressalva quanto às críticas em relação as paralelos entre a modernidade e o positivismo jurídico[2] e entre a pós-modernidade e pós-positivismo jurídicos.

O pós-positivismo subdividiu-se em duas vertentes, das quais uma buscava na aproximação com a moral a reação filosófica ao legalismo, e a outra centrava-se na realidade do intérprete e na solidificação da norma jurídica como eixos de combate ao positivismo clássico, entretanto o que há de mais comum entre as duas, é a influência da tópica nas suas formulações.

O termo “pós-positivismo” foi introduzindo no Brasil por Paulo Bonavides em 1995, na quinta edição de sua obra intitulada “Curso de Direito Constitucional. E, o pós-positivismo ou não positivismo defende a ideia de que há ou deve haver um relacionamento entre o direito e a justiça (moral). E, sua versão mais ortodoxa é defendida por Alexy e Dworkin, que informam que tal vinculação é necessária, devendo existir, por isso seria a negação do positivismo.

O pós-positivismo é, portanto, e podemos ver no exemplo supracitado, a superação do legalismo, não utilizando de ideias metafísicas como fez o jusnaturalismo, mas admitindo que há valores compartilhados por toda a sociedade e reconhecendo que estes valores devem integrar o sistema jurídico, tanto na sua formulação quanto nas suas decisões.

E, tais paralelos pode produzir um reducionismo imperdoável, mas defende-se, sem restrições, que fogem à mecânica e nos leva para o terreno químico dos líquidos. Nesse sentido, nos socorreremos à Zygmunt Bauman que em sua obra “Modernidade Líquida” nos mostrou o amolecimento da realidade social, política e humana[3].

Existem doutrinadores que argumentam no sentido de que o pós-positivismo, em verdade, seria uma variação do jusnaturalismo. E, Manuel Atienza(2009) é um destes, em seu artigo intitulado “Es el positivismo jurídico una teoría aceptable del derecho” que demonstra uma conexão entre as teses jusnaturalistas e as teorias de Dworkin, Alexy, Carlos Nino e, até Ferrajoli, Luís Prieto Sanchís quando qualificou Dworkin de jusnaturalista.

Lembremos que a concepção do direito de Kelsen conheceu por diferentes fases e, mesmo em sua teoria pura tão famosa, percebe-se que ocorreu amadurecimento entre o original de 194 e sua edição da década de 1960. E, Kelsen é reconhecido como referência da teoria do direito e, também pode ser considerado um internacionalista.

E, não apenas em razão de sua construção monista com a prevalência internacional, mas também, pelos três cursos que ministrou em Haia e, pela nítida  contribuição do direito das gentes à sua teoria geral. Na parte que cuida da ordem internacional, há diferenças notáveis, mas os contornos mais contundentes permanecem.

Em verdade, o positivismo jurídico procura delimitar com nitidez o objeto de estudo de Direito[4] e seus doutrinadores alocam esse estabelecimento de fronteiras no centro de suas estruturações teóricas. E, outras áreas do conhecimento, ainda que sob a perspectiva moderna, não se percebiam como necessariamente isentas das influências externas.

Cabe sublinhar a crítica feita à neutralidade científica tão pretendida principalmente em face da atuação legislativa. Uma teoria pura jurídica não deveria, teoricamente, ocupar-se da formação das normas jurídicas, porque a produção normativa exige, outros elementos valorativos.

Já no pós-positivismo[5] ou neopositivismo, a crítica não se circunscreve à atividade legislativa exercida, ao menos na estrutura interna do poder do Estado, pelo órgão dotado de faculdade legislativa e se estende a órgãos diversos do natural, como o Judiciário, quando exerce sua função concretiva, abandonando a mera extração da normatividade do comando da lei.

Efetivamente, a criação de normas jurídicas guarda elementos valorativos e exige discussão quanto à legitimidade do legislador.

Ao passo que o positivismo buscava fixar requisitos à legitimidade, o pós-positivismo entende ser possível o exercício de concreção revestido de extração de normatividade por meio do reconhecimento de plena normatividade dos princípios[6].

O positivismo jurídico tradicional passa a não ser capaz “de explicar adequadamente a realidade do direito” (FIGUEROA, 2009a, p. 228-229, tradução livre).

Doutrinadores como Robert Alexy (2008b), Ronald Dworkin (2002), Gustavo Zagrebelsky (2007), García Figueroa (2009a) e, entre os nacionais, Paulo Bonavides (2009), Luís Roberto Barroso (2007), André Rufino do Vale (2009), Humberto Ávila (2009)20, entre muitos outros, entendem o direito segundo essa nova perspectiva.

Apesar de não serem linearmente coincidentes seus pensamentos, pode ser identificada uma série de características comuns em suas ideias.

Segundo André Rufino do Vale (2009), há um ponto de convergência entre os autores citados: eles “relativizam a separação ração entre Direito e Moral, admitindo critérios materiais de validade das normas”.

Foi visto que uma das principais críticas ao modelo positivista foi a falta de critérios valorativos para a aplicação da norma, a qual favoreceu, muitas vezes, decisões distantes da justiça ou mesmo absurdas. O pós- -positivismo tenta firmar bases filosóficas para sanar essa problemática, com o escopo de implementar direitos constitucionais a partir da verificação axiológica das normas aplicáveis concretamente.

E, dentro desse contexto interno, a interpretação feita pelo Judiciário plasmada em forma de decisão, em sentença, acórdãos, por exemplo, não se adequa ao plano internacional e ainda cria expectativas de resultados impossíveis a serem fornecidos pelos aplicadores do direito.

Enfim, o direito internacional é fundamentalmente positivista, sendo extremamente dependente da volição dos atores com capacidade legisferante para aperfeiçoar-se. E, as estruturas globais não são mais bem descritas e compreendidas pelo positivismo, mas também, muitas vezes, deste dependem para resistir como jurídicas.

Assim, a pós-modernidade e suas consequências podem ser devastadores para os tribunais internacionais.

Doutrinariamente, segundo Hart, concentra-se na justificação da regra de reconhecimento, Kelsen lançou mão do conceito de sanção e, de forma analítica, descreveu o funcionamento das normas jurídicas.

Em outro sentido, se percebe que a teoria de Hart é mais exemplificativa do que de Kelsen que, em verdade, desde o princípio[7] se circunscreveu aos limites de sua própria teoria. E, não apenas em face dos elementos referidos, mas também da própria estrutura de validade proposta pelos dois doutrinadores, impossível se faz sugerir coesão teórica entre Kelsen e Hart. E, quanto ao direito internacional, essa diferença é explícita na perspectiva que estes têm do voluntarismo na ordem internacional.

O filósofo inglês Herbert Lionel Adolphus Hart (1907-1994), filho de um alfaiate polonês de ascendência alemã, não inova o que já fora escrito a respeito do Direito, apenas reforma outras teorias positivistas de uma forma mais ampliada e sofisticada.

Afirmou que o Direito só pode ser uma prática social que é baseada nos costumes e crenças comuns e deve se estruturar sob este pressuposto, e como tal, oportunizará a todas as pessoas participarem dele, já que todas as pessoas praticam estes costumes e crenças comuns.

Na sua explicação ele aduziu que o direito é constituído por uma família de regras de comportamento. Tais regras são divididas entre dois tipos de regras:

  1. a) Regras primárias que impõe diversos deveres, sempre exigem que os indivíduos daquela sociedade façam ou deixem de fazer algo. Estas regras, diz Hart, existem sem a necessidade de normas ou leis, desde as sociedades primitivas, logo, são bastante frágeis em diversos aspectos. Sozinhas são incertas, estáticas e ineficazes.
  2. b) Além dessas regras primárias, existem as secundárias, que são atributivas de poderes, sejam estes poderes públicos ou privados. E foram criadas para solucionar as fragilidades das regras primárias, são “remédios”. Porém, sem as regras primárias, não haveria o porquê de existir regras secundárias, explica Hart.

A relação das regras secundárias, para Hart, se dá pela seguinte maneira:

Regra de Reconhecimento[8]: É atributiva de validade jurídica, define as competências e acaba com a incerteza das regras primárias. Hoje, a Constituição Federal é um exemplo.

Regra de Alteração / Modificação: Poder investido aos indivíduos para alterar, acabar ou então criar novas regras primárias para aquela sociedade. Acaba com a fraqueza estática das regras primárias. O poder legislativo, de hoje, é o exemplo desta regra de alteração.

Regra de Julgamento: É o poder investido aos seres humanos com competência para decidir, identificando o crime cometido, o indivíduo a ser julgado e o processo a ser seguido. Acaba com a ineficácia das regras primárias. Atualmente, no Brasil, é de responsabilidade do poder judiciário.

Kelsen também entende que as normas se dividem em primárias e secundárias, mas para ele elas possuem conteúdos diferentes.

As primárias prescrevem condutas (nesta prescrição de condutas se inclui as regras secundárias de Hart, que para Kelsen são abrangidas pelas primárias) e as secundárias prescrevem sanções[9] caso se descumpram estas condutas.

Assim como Hans Kelsen, Herbert Hart é um positivista no tocante ao conceito de Direito. Ou seja, entendem que Direito e Moral são estudos distintos. Dessa forma, ele também entende que a lei deve ser verdade na forma e não somente no hábito social.

Apesar de Hart afirmar que a lei não deve naturalizar preconceitos de origem moral, ele reconhece o fato de que a moral orienta decisões em diversos casos, e que Direito e Moral não são totalmente desligados em si e entende que o fundamento da separação não se dá no âmbito jurídico, mas sim, no âmbito social, Hans Kelsen já é mais fechado quanto a este aspecto, para ele o Direito é puro em si mesmo, um sistema de normas.

Se tomarmos como exemplo a homossexualidade, poderemos perceber que o fato dela ser crime em diversos países é resultante dessa carga de preconceitos morais da sociedade que afeta o Direito.

Hart entra em sintonia em gênero, número e grau com Kelsen, quando afirma que a lei se trata de uma regra social, porém, mais que isso, é uma regra jurídica, e como tal apenas a autoridade política-jurídica é capaz de aplicar uma coerção através de uma sanção.

E, o reconhecimento se legitima não pelo medo da sanção, mas pelo respeito às leis, porque entendemos que a lei existe para regular nossa forma de viver, o Direito não impõe uma necessidade, retira esta necessidade da vida social.

As sanções internacionais são ações usadas como forma de expressar desaprovação e punir governos ou organizações estrangeiras, a fim de atingir um objetivo político ou comercial.

Assim, as sanções são impostas como forma de aplicar pressões e, dessa forma, incentivar determinado país a mudar sua postura em relação a alguma ação vista por outros países como um problema, ou consentir com as demandas do sancionador.

As sanções internacionais podem ser de diversos tipos, a saber: sanções diplomáticas que ocorrem quando a ação tomada para expressar a desaprovação com determinada ação de um país é feita não por medidas contra as relações econômicas ou militares, mas através de meios políticos e diplomáticos.

Exemplos são a redução ou remoção de laços diplomáticos, cancelamento ou limitação de visitas governamentais, fechamento de embaixadas, ou ainda, a retirada ou expulsão de missões ou pessoal diplomático.

Sanções militares que são ações que podem ser feitas de forma mais agressiva como um embargo para cortar fornecimento de armamento  a determinado país, ou ações mais agressivas, como a intervenção ou ataques militares.

Sanções desportivas, que busca afetar o país através de ação que prejudique a moral da população da nação afetada. Por exemplo, quando as equipes desportivas de um país são proibidas de participar de eventos esportivos internacionais.

Sanções econômicas que restringem relações comerciais de outras nações com o país punido. Este tipo de sanção pode ser ocorrer na forma de embargo econômico[10], que consiste em restrições de comércio e comercialização dirigidas ou não a setores específicos da atividade econômica.

Exemplos: de sanções econômicas são: a proibição de importação ou exportação de determinadas mercadorias, tais como alimentos e medicamentos; proibição de investimentos no país punido; proibição de prestação de determinados serviços; congelamento de contas bancárias ou outros instrumentos financeiros, como títulos e empréstimos.

Sobre a coerção social, está aí mais uma diferença de Hart com relação à Kelsen, para Hart há a possibilidade de existir norma sem sanção externa e organizada, o que é impossível para Kelsen.

Ora, não se trata de sanção a nulidade de um ato qualquer inerente ao não cumprimento de uma das normas secundária que atribuem poder para tanto. Para Kelsen se não existir sanção na norma pode ser tudo, menos norma jurídica.

Enquanto Kelsen vê a obrigatoriedade da sanção como pressuposto de se conferir validade à norma jurídica, Hart entende que a sanção é extremamente necessária, mas não para conferir validade à norma, e sim para se conferir eficácia a ela.

Afinal, o ceticismo britânico em relação à autoimpositividade das obrigações internacionais, decorrência direta de expressão da vontade e seu foco no reconhecimento, portanto, eminentemente interno, faz o contraponto importante à centralidade da pacta sunt servanda e da sanção na teoria pura do direito.

Enquanto Hart fundamenta a validade da norma em sua obrigatoriedade e transfere ao reconhecimento sua força normativa, regra de reconhecimento, Kelsen vincula o sistema jurídico à sanção, à força da norma sancionadora. Portanto, esse é o esquema básico de validade adotado pelos dois doutrinadores.

Questiona-se se ambas as teorias poderiam ser plenamente aplicáveis à fundamentação do direito internacional. E, teria que se analisar o papel da vontade em cada uma das teorias e à forma como o elemento volitivo afeta as construções teóricas propostas. E, a distinção a ser feita, nesse sentido, refere-se à diferença entre a vinculatividade do direito internacional e a aplicabilidade de suas normas jurídicas.

Segundo Hart, a falta de aplicabilidade das normas jurídicas retiraria o caráter jurídico do direito das gentes. E, segundo esse doutrinador, na década de sessenta, e apesar de toda a institucionalização da ordem global que estava em andamento, o direito internacional seria uma estrutura primitiva, ainda estaria em formação. A adesão dos Estados seria essencial para que se tornasse autenticamente funcional.

Hart fundou sua visão sobre o voluntarismo enquanto Kelsen funda a participação dos Estados no Direito Internacional seria automáticas. Kelsen condicionou a validade da norma à sanção e apontou a guerra e a represália como suficientes ao cumprimento desse requisito teórico pelo Direito Internacional.

Com tal argumento, defende-se o jus cogens que contém elementos de voluntarismo. E, o próprio texto da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados fez expressa referência à norma sendo aceita e reconhecida pela comunidade internacional e, ainda, conjunta seu caráter imperativo à ampla aderência ao menos tácita aos seus desígnios. (Vide: Artigo 53 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, Decreto 7.030 de 14 de dezembro de 2009).

A aceitação de regras como obrigatórias a toda comunidade internacional por costume pressupõe, portanto, também a plena aceitação desse comando por aqueles que concentram o poder na ordem internacional.

A teoria do jus cogens, pode bem escamotear determinado desequilíbrio de poder com elementos valorativos capazes de justificar prevalência de visão de mundo ou interesse particular específico como oponível a todos os membros da comunidade internacional.

Dentre os doutrinadores pesquisados, como parâmetro da fundamentação acima, estão: Michel Foucault, Microfísica do Poder. São Paulo: Graal, 2009; “A verdade e as formas jurídicas”. 3ª edição. Rio de Janeiro: Nau, 2002 e Vigiar e Punir[11], 33ª edição. Petrópolis: Vozes, 2007 e, também René Descartes. Discurso sobre o método. Porto Alegre: L&PM, 2009.

Frise-se que dois elementos devem ser observados com atenção, a partir de tal afirmação. Pois, o primeiro refere-se ao costume como direito internacional geral ou de primeiro escalão, do direito internacional apontado por Kelsen.

A pacta sunt servanda, mais que paradigma vinculante a todo participante da dinâmica de poder na ordem internacional, possui caráter costumeiro impositivo em face de seu aspecto formal que traz maior segurança e previsibilidade às relações existentes entre os sujeitos do Direito Internacional.

Quando certos aspectos relacionados com os direitos humanos são reconhecidos como vinculantes globalmente, questões como a do Tribunal[12] Penal Internacional e aos crimes específicos, tem-se a imposição de certa visão de mundo. Essa imposição, oculta por dados culturais dos aplicadores do direito que não conseguem conceber a existência de visão de mundo diversa.

O reconhecimento de jus cogens material deve ser feito com sinceridade que se defende a assunção de que a construção jurídica que o sustenta e baseia-se em fatores políticos de ampla adesão mundial. A negativa desse fato seria ou ingenuidade ou mera má-fé.

Portanto, qualquer justificação para o jus cogens que se afaste da adesão aproxima os princípios e regras[13] caracterizados como cogentes ao direito natural. E, tal conceito de inerência, por sua vez, vai contra às prospecções positivistas de direito, mesmo sob protestos famosos, segue ainda prevalente na atualidade.

A postura jusnaturalista ainda que fundada em racionalidade e, conseguinte, afastada de premissas metafísicas e que constitui atualmente autêntico exercício de fé e, seus adeptos compõem grupo admirável que parece conseguir racionalmente acreditar na natureza humana.

Sublinhe-se, também, a contundente crítica feita por Martti Koskenniemi, na obra “The politics of international law”. The european journal of international lex.  Esse artigo específico foi objeto de releitura em Koskenniemi vinte anos depois.

A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, em seu artigo 64, indica a possibilidade de superveniência de comando imperativo e ainda reforça a adesão tácita que fora fixada no artigo 53.

São muitos os detratores da possibilidade de entender o direito internacional apenas sob o prisma formalista do positivismo. E, as críticas ao juspositivismo apontam, suas dificuldade em incorporar preceitos valorativos, e se prende à difícil relação entre o Direito Internacional e a política.

A negação do político no jurídica não se sustenta no plano internacional bem como no direito interno. E, a atenção que deve ter o aplicador de direito cinge-se a implementação do comando jurídico e o excessivo poder nas mãos dos principais atores que concentram a concreção e a efetivação de normas, são apenas exemplos de entraves vistos à negação referida.

Portanto, a política deve ser admitida na análise jurídica da ordem jurídica. O embate de forças na aplicação de regras de direito pode exigir o afastamento de elementos valorativos e sua sobreposição por comandos de forma e de procedimento.

E, o apego excessivo ao procedimento, aproxima o direito internacional de abordagens menos valorativas, as quais se mostram incompatíveis com um sistema de limitada coercibilidade.

Para haver efetivação de sistema de valores esse deve ser dotado de capacidade de coerção que é desafio ainda ser superado e, mesmo o constitucionalismo como o do nosso país e de outros da América Latina ainda enfrentam.

A construção do direito internacional de modo axiológico sem levar em consideração esses elementos, seria transformá-lo em mero exercício de fé.

Sobre o elemento coercitivo que prejudica a construção do direito internacional como um conjunto de normas valorativas, percebe-se que, apesar de avanços e do surgimento de incentivos ao cumprimento das normas, ainda não se aperfeiçoaram completamente mecanismos que se concentrem em reputação e em sanções não violentas.

O desenho da eficácia da norma internacional ainda concentra, portanto, nos estados seus traços mais marcantes. Diferentemente do modelo estatal interno, a vontade do sujeito de direito das gentes é fundamental, portanto, para a produção normativa e para seu cumprimento; daí a maior facilidade que o positivismo tem para administrar a teoria jurídica internacional.

Nesse sentido, é de se perceber que as críticas de Hart ao voluntarismo não excluem determinadas premissas voluntaristas em sua construção teórica.

No que diz respeito aos sujeitos capazes de expressar essa vontade construtora e garantidora do cumprimento das normas, a centralidade cabe ao Estado. Exclusivamente ao Estado, ousa-se afirmar. Por mais que se defenda o compartilhamento do poder entre estados e organizações internacionais, os primeiros ainda preservam protagonismo e prevalecem, em última ratio, em relação às segundas.

A escolha política concretista, não deve ser confundida com mera exegese normativa. E, a extração da normatividade deve ser feita

com fulcro em certos parâmetros para que não haja deslocamento da função legislativa dos que a possuem para órgãos que devem apenas aplicar o direito ou decidir o melhor direito.

E, esse abandono de certas premissas, repercutiu de forma bem contundente, e até mesmo caricata, na proteção do ser humano.

Após a Guerra Fria[14], a ordem internacional passou por período de redemocratização geral, e no plano interno o direito se afastou do positivismo jurídico que sustentavam a fundamentação das regras exclusivamente no plano jurídico, e, apesar de não excluírem definitivamente, afastavam os esquemas de validade da moral.

Nota-se que a aproximação da moralidade ao direito abriu caminho para que a concreção fosse realizada de forma alternativa ao previsto no ordenamento. O poder de concretizar a vontade foi revestido de revelação do melhor direito sob parâmetros axiológicos. O aplicador do direito pôde, então, relativizar o formalmente posto em nome de suposta razão prática que não se reconhecia como decisionismo.

Internamente, a Constituição Brasileira de 1988 foi recebida com entusiasmo e tudo passou a ser possível com fulcro nos princípios[15] centrais de seu texto e, o saldo inicial foi muito positivo e, o entusiasmo foi sedimentado em doutrina e, construído em jurisprudência.

Os órgãos dotados de função de extração de normatividade passaram a exercer concreção quase ilimitada, abusando da textura aberta de grande parte dos direitos fundamentais.

As conquistas foram expressivas, particularmente, no preenchimento de lacunas legislativas e, logo, o órgão com capacidade de julgar passou a exercer a função política aberta e de forma recorrente. E, festejaram-se os julgamentos sobre as pesquisas científicas com embriões humanos e, a igualdade entre a parceria civil.

Julgados recentes que tratam do acesso da Receita Federal aos dados bancários sem autorização judicial e da relativização da presunção de inocência colocaram o sistema constitucional na berlinda.

O decisionismo[16] que exerce a escolha política e concretiza o direito revestindo-se de todo o instrumental teórico “pós-tudista” está, no momento, sob holofotes e pode ser convidado a regressar ao status extrator de normatividade anterior. Trata-se de um momento interessante, sem dúvida.

A ordem internacional se relaciona com a estrutura constitucional interna. E, a descrição dos dilemas constitucionais bem aponta as questões enfrentadas no plano interno, quando disciplinada a proteção do ser humano. E, ainda lança luz sobre o contexto mais complexo e mais adverso que é a imprevisibilidade da política internacional.

O Direito internacional sua eficácia e sua efetividade dependem muito do contexto política e sua influência na positivação das normas internacionais e, na aplicação de sanções internacionais.

Para se admitir o estabelecimento de padrões normativos universais conforma a escolha política e, significa fazer uma faxina nas dinâmicas de poder e, ainda, exige o resgate do formalismo positivista que regulamenta a validade daquilo que se produz a partir dos acordos celebrados.

Quanto aos direitos humanos apesar de regiamente defendidos, é indispensável que tal defesa seja honesta e que implemente validade aos acordos internacionais celebrados.  A aproximação da moral ao direito em contexto global deve ter como base alguma legitimidade voluntarista.

Não se pode olvidar o pós-modernismo, escolhido para ser considerado inerente ou  definitivo e, quando o direito recorrer a positivismo tradicional, e aos esquemas de concreção não permitem a ampla produção normativo através dos instrumentos jurisdicionais.

De toda sorte, não se deve acreditar que as teses valorativas trazem a moralidade ao direito, e não se aplicariam ao direito internacional definitivamente. O que se afirma, é que tais teses exigem maior coesão sobre seus conteúdos de moralidade a ser considerado.

Já no contexto interno, existe em regra, a coesão social capaz de admitir tal abordagem valorativa do direito. Porém, no ordenamento internacional não.

Afinal, coesão moral requer consensos políticos e ainda não são possíveis dentro da dinâmica do poder internacional.

O sistema regional europeu, por exemplo, teve muito sucesso na harmonização dos máximos locais com os mínimos atingidos no consenso regional. Porém, claramente, se vê que apesar de se reconhecer o papel do órgão jurisdicional regional na construção da integração da Europa, os mínimos morais verificados baseiam-se em tratados estruturados como compromissos muito positivistas que vinculam suas partes aderentes.

Os referenciais teóricos de Kelsen[17] e Hart mostram-se absolutamente habilitados e mostram-se capazes de sustentar formulações relacionadas à fundamentação do direito internacional. E, em síntese, sob a perspectiva do participante da ordem global, principalmente do Estado como sujeito por excelência.

Assim, Hart apresentou construção centrada na vontade e vinculada à adesão, ou s seja, à expressão do desejo político de fazer parte, enquanto Kelsen, ao menos no que se refere às bases formais, percebe o sujeito automaticamente submetido à dinâmica política e, ipso facto, ao direito internacional.

E, participar não implica, na teoria de Kelsen, a submissão absoluta e o perfeito funcionamento do sistema. A validade da regra impositiva depende do direito internacional igualmente de sanção, como em sua proposta para o direito em geral, e, na ausência de instituições centrais capazes de coibir os descumprimentos e, da identificação da coerção na guerra e nas represálias.

A dependência que a eficácia – e, também, a efetividade – tem do voluntarismo estatal conduz seu enquadramento teórico com maior facilidade ao positivismo jurídico. O sujeito de direitos não apenas se submete ao conjunto normativo, ele também é responsável pela criação, aplicação, manutenção e cumprimento das regras.

Nas palavras de Hans Kelsen, a “eficácia do Direito significa que os homens realmente se conduzem como, segundo as normas jurídicas, devem se conduzir,  significa que as normas são efetivamente aplicadas e obedecidas”.

Podemos diferenciar também os conceitos de eficácia social e eficácia jurídica. A eficácia jurídica é um conceito formal, segundo o qual uma norma emanada de acordo com o ordenamento jurídico se torna eficaz juridicamente, podendo ser exigida e tornar-se obrigatória. Já a eficácia social existirá quando as  pessoas sujeitas àquela norma de fato a aceitam e obedecem.

Assim, uma norma pode ter eficácia jurídica, mas não eficácia social  como ocorre com diversas e famosas “leis que não pegam” no país.

Nas palavras de Michel Temer na obra “Elementos de Direito Constitucional” eficácia social se verifica na hipótese de a norma vigente, isto é, com  potencialidade para regular determinadas relações, ser efetivamente aplicada a casos concretos.

Eficácia jurídica, por sua vez, significa que a norma está apta a produzir efeitos na ocorrência de relações concretas; mas já produz efeitos jurídicos na medida em que a sua simples edição resulta na revogação de todas as normas anteriores que com ela conflitam.

Kelsen diferencia eficácia e validade: a segunda se refere à obrigatoriedade da norma, ou seja, a uma característica que torna a norma jurídica algo que deve ser obedecido; a primeira refere-se ao fato de que a norma jurídica efetivamente é obedecida.

Numa palavra, “a validade é uma qualidade do Direito; a chamada eficácia é uma qualidade da conduta efetiva dos homens e não, como o uso linguístico parece sugerir, do Direito em si”.

Entretanto, há uma relação entre esses dois conceitos.  Para Kelsen, “uma norma é considerada válida apenas com a condição de pertencer a um sistema de normas, a uma ordem que, no todo, é eficaz”.

Ou seja,  para que uma norma seja válida, ela deve pertencer a um ordenamento jurídico aceito e obedecido pela sociedade (eficaz). A partir do momento em que o  Direito deixa de ser eficaz, a norma também deixa de ser válida.

Robert Alexy entende de maneira similar, ao afirmar que a validade jurídica de um sistema normativo dependerá da eficácia social deste sistema, em termos globais.

Ou seja, para o autor, as normas integrantes de um sistema normativo deixam de ser socialmente eficazes, e assim, juridicamente válidas, “quando já não são observadas ou quando sua não observância deixa de ser punida em termos globais”.

Alexy converge com Kelsen também neste ponto. Para ele, as normas individualmente consideradas não precisam ser infalivelmente aceitas e obedecidas para ter validade jurídica, desde que estejam integradas em um sistema jurídico socialmente eficaz em termos globais.

Porém, poderá ocorrer o fenômeno denominado  “dessuetudo” (sic), “que consiste na perda da validade jurídica de uma norma em razão da redução de sua eficácia abaixo daquele mínimo [de eficácia social ou  de possibilidade de eficácia]”, sendo que esse mínimo de eficácia não é possível de ser fixado de maneira universalmente exata.

  1. L. A. Hart[18] teve um posicionamento oposto a Kelsen e Alexy. Para Hart, não há conexão necessária entre eficácia e validade do direito, “a menos que a norma de reconhecimento do sistema inclua, entre seus critérios (como ocorre com algumas), a condição (às vezes denominada norma de dessuetude) de que nenhuma norma seja considerada como pertencente ao sistema se houver deixado de ser eficaz há muito tempo”.

Hart ponderou, no entanto, que uma desconsideração generalizada pelas normas do sistema (ineficácia do sistema jurídico) torna uma afirmação a respeito da  validade deste sistema uma afirmação sem sentido, por estar fora da realidade daquela sociedade.

Assim sendo, “pode-se dizer que alguém que emite um enunciado interno sobre a validade de uma norma especial de um sistema pressupõe que seja verdadeiro o enunciado factual externo de que, de modo geral, o sistema é eficaz”.

Porém, nem sempre esta regra se aplica, pois “pode ter sentido e nem sempre é inútil” cogitar-se a respeito da validade de uma norma dentro de um sistema ineficaz.

Ele dá como exemplo desta afirmação o modo de ensinar o direito romano como se este sistema ainda fosse eficaz ou estivesse em vigor.

Lembrando que a submissão automática ao sistema, não significa adesão tácita ao conteúdo material do conjunto normativo. O Estado tido como sujeito internacional de direitos e de obrigações por excelência, ainda responde fundamentalmente pela eficácia do direito internacional.

 

Referências

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[1] O direito muitas vezes foi responsável por sacrificar um de seus grandes objetivos como a justiça em nome da segurança jurídica. E, a justificativa se encontra na transição da Idade Média para a Moderna, em meados do século XVIII, ao início do século XIX, quando a sociedade reclamava limites ao poder concentrado e ilimitado nas mãos do soberano. Afinal, desejava-se construir barreira aos arbítrios dos reis absolutistas. Lembremos que os movimentos constitucionais modernas que tem origem na Constituição francesa de 1791 e dos Estados Unidos de 1797, trouxe também um mito do sistema jurídico: a lei. Sendo que era o instrumento conformador da liberdade do cidadão e passava a ser considerado o único meio a legitimar a limitação de seus direitos. Apenas a lei válida poderia impor obrigações aos cidadãos. Desta forma, a lei e o primado da soberania popular ganharam tamanha relevância que foram erigidos ao patamar de dogma. O positivismo clássico condensou o pensamento da época, situando a lei no patamar de um comando estratificado, abstrato e absolutamente coercitivo, o que atendia ao repúdio aos desmandos e extravagâncias produzidos pelo absolutismo. A lei tornou-se a expressão suprema de soberania popular, que é considerado o fundamento principal para a criação dos Estados modernos. E, o povo não poderia ser apenas o autor da Constituição, mas tinha de ser o soberano. Assim, a soberania popular ganhou espaço e semântica.

[2] O positivismo, nas palavras de Dworkin (2002), pode ser resumido em três preceitos-chave: (a) acreditar o direito como um conjunto de regras especiais utilizado direta ou indiretamente pela comunidade com o propósito de determinar qual o comportamento será punido ou coagido pelo poder público”, regras essas que são aferidas quanto a sua validade (pedigree); (b) caso não se encontre uma solução dentro do direito (conjunto de regras) para uma determinado fato, o aplicador da norma deve ir além do direito na busca de algum outro tipo de padrão que o oriente na confecção de nova regra jurídica ou na complementação de uma regra jurídica já existente; e (c) dizer que “alguém tem uma ‘obrigação jurídica’ é dizer que seu caso se enquadra em uma regra jurídica válida que exige que ele faça ou se abstenha de fazer alguma coisa. (…) Na ausência de tal regra jurídica válida não existe obrigação jurídica”.

[3] Em “Cegueira Moral: a perda da sensibilidade na modernidade líquida” (2014), Zygmunt Bauman, o maior pensador social contemporâneo, junto com o filósofo e professor de ciência política da Lituânia, Leonidas Donskis, fazem uma análise brilhante desse novo mal que assola nossa época e nos anestesia perante o sofrimento alheio. Uma leitura fundamental e de grande interesse para todos aqueles que se preocupam com as mudanças mais profundas que, silenciosamente, moldam a vida dos homens na modernidade líquida, uma modernidade que retrata tanto fenômenos compostos de aparência, quanto desprovidos de referências. Salve-se quem puder” é o lema atual, cuja vida política se desloca para os bastidores e os nossos líderes são fantoches desrespeitosos e incrédulos por uma multidão que se veste de indiferença para sobreviver à violência da qual não apenas faz parte, como contribui para sua existência. Impedido de assumir uma postura ética diante dos devaneios atuais, distante de suas premissas mais básicas do viver, o cidadão atual nada mais é do que uma ilha isolada defendendo seus interesses, tão pouco apropriados pelo próprio sujeito que o defende, visto que ele nada mais é do que um representante inócuo de uma massa produzida e manipulada pelos meios de comunicação.

[4]  O positivismo jurídico é então entendido como ciência da legislação positiva, que “pressupõe uma situação histórica concreta: a concretização da produção jurídica em uma só instância constitucional, a instância legislativa” (ZAGREBESLKY, 2007, p. 33, tradução livre). Seu significado supõe uma redução de tudo o que pertence ao mundo jurídico, à lei, incluindo os direitos e a justiça, simplificação que concebe o trabalho dos juristas como mero serviço da lei, com a busca pura e simples da vontade do legislador.

[5] Com o crescimento do pós-positivismo um novo pensamento jusfilosófico entra em cena para impor limites valorativos ao aplicador do direito com uma pretensão de correção do sistema. Esses limites se traduziram absurdamente necessários após as barbáries do Nazismo e do Fascismo justificadas em nome da lei, daí passou-se a ter a concepção que era de imensa necessidade a elaboração de um novo direito constitucional capaz de abranger valores humanitários para resguardar vidas e princípios de amplo interesse social, pois o positivismo jurídico não era mais capaz de explicar adequadamente a realidade do direito, e o pós positivismo iniciou sua trajetória guardando uma referência relativa ao ordenamento positivo, mas nele reintroduzindo as ideias de justiça e de legitimidade.

[6] O princípio da razoabilidade (proporcionalidade) permite invalidar atos quando não haja adequação entre o fim perseguido e o meio empregado, a medida não seja exigível ou necessária havendo caminho para chegar ao mesmo resultado com menor ônus a um direito individual e quando não há proporcionalidade em sentido estrito. Já o princípio da dignidade da pessoa humana, apesar de se exteriorizar mais subjetivamente que os outros, trata-se de um conjunto humanitário de percepções da realidade alheia que tende a tentativa de políticas e decisões para preservação ou chances na busca pelo “mínimo existencial”, tal expressão é razoavelmente dita tendo dentro dela elementos como: renda mínima, saúde básica e educação fundamental, além do acesso à justiça.

[7] Os princípios não são mais fontes secundárias, como previa o art. 4º da LICC, porém fontes primárias capazes de regular condutas. Em outras palavras, o pós-positivismo pode ser encarado como a concepção teórica do neoconstitucionalismo,  pois permite repensar alguns alicerces jurídicos, como a teoria da norma, a teoria das fontes, a teoria da interpretação, etc. A teoria da interpretação alcança novo status ao receber influência da filosofia do direito: “a tópica (e a retomada em se pensar o estudo dos casos a partir de problemas neles suscitados), a hermenêutica (e todos os métodos de interpretação conhecidos e incrementados  pela metodologia constitucional contemporânea) e a argumentação jurídica (no tocante à justificação do intérprete)” (MOREIRA, 2009, p. 218).

[8] A regra de reconhecimento é responsável pela identificação de quais regras de obrigação serão unificadas de modo a não evitar dúvidas sobre sua aplicabilidade. Ela é um fato, e não uma presunção, como em Kelsen. É uma regra secundária que informa como os juízes reconhecem a norma válida. Há ainda as regras de alteração que permitem a inserção de novas regras primárias no sistema e as regras de julgamento identificam que indivíduos devem julgar e qual as regras processuais para tanto.

[9] Os Estados Unidos e o Reino Unido também divulgaram mais medidas contra a Rússia, já que os líderes de ambas as nações condenaram as ações do presidente russo, Vladimir Putin. A Rússia já está, de certa forma, pagando o preço por sua agressão, com as ações e a moeda do país despencando nesta semana após a decisão anterior de Putin de ordenar tropas para o leste da Ucrânia. Desde 24.02.2022, o principal índice MOEX da Rússia fechou em queda de 33%, enquanto o rublo caiu para uma baixa recorde, em queda de 7% em relação ao dólar americano. Ele se recuperou na sexta-feira, sendo negociado a 84,7 em relação ao dólar americano. A Ucrânia também está pedindo ao Ocidente que proíba a Rússia da SWIFT, a rede de alta segurança que facilita pagamentos entre 11.000 instituições  financeiras em 200 países. E, no início da semana, a Alemanha interrompeu a certificação do gasoduto Nord Stream 2 após as ações de Moscou.

[10] O caso mais conhecido de sanção internacional é o imposto pelos EUA à Cuba. O conflito entre os dois países começou em 1959, quando o movimento revolucionário cubano depôs o Presidente Fulgêncio Batista, aliado do governo estadunidense, e mais tarde, em 1961, impôs o sistema socialista em Cuba. O embargo econômico a Cuba começou em 1962, quando EUA proibiram que qualquer país mantivesse relações comerciais, financeiras ou econômicas com a ilha. O objetivo era fazer que a privação de acesso aos bens de consumo, forçassem a queda de Fidel Castro. Em 2013, Cuba e os EUA começaram uma reaproximação, apesar de que o embargo econômico continuava vigorando e, não havia previsão de mudança. Já que o fim do embargo depende de aprovação do Congresso norte-americano.

[11] “Vigiar e Punir” foi publicado por Michel Foucault em 1975. Esta é uma das obras mais famosas do filósofo francês e trata profundamente da questão da disciplina e do poder no mundo moderno. Também se debruça com cuidado sobre a importante mudança de estratégia que abandonou a punição em troca da vigilância constante e reguladora. A pergunta que atravessa todo o Vigiar e Punir é: por que a prisão?  Por que a sociedade capitalista fez as instituições penais desempenharem o papel de encarcerar? Quais são suas causas e seus efeitos? Esta série trata minuciosamente de cada capítulo do livro. Foucault analisa as técnicas de disciplina e vigilância que se espalharam de maneira gradual e imperceptível pela sociedade ao longo do séc. XVIII e XIX.

[12] Em relação às leis de Nuremberg, em nome da lei o direito foi utilizado para a realização de barbáries e atrocidades. O mundo não mais aceitava o império de uma lei tirânica. Alguns parâmetros morais de justiça precisavam ingressar no direito, visto que somente os critérios formais de validade não eram suficientes. Com isso, surge o movimento de aproximação do Direito com a moral, o pós-positivismo.

[13] Há, na teoria dworkiana, uma distinção crucial entre regras e princípios, dado que os princípios, ao contrário das regras, não indicam as consequências jurídicas que se seguem à realização das condições que estão previstas, mas exercem um peso na decisão judicial, que não se dá a partir de uma relação all or nothing. As regras, pois, hão de encontrar sustentação nos princípios, expressam-nos.

[14] A Guerra Fria (1947-1989) foi o confronto ideológico, político,  econômico e militar entre os dois blocos internacionais formados  no fim da Segunda Guerra Mundial: o capitalista – liderado pelos  Estados Unidos e o socialista encabeçado pela URSS. Foram anos de tensão que duraram até a queda do Muro de Berlim, em 1989, momento que simbolizou também o enfraquecimento do bloco socialista. A URSS foi oficialmente dissolvida em 26 de dezembro de 1991.

[15]  No positivismo, os princípios têm uma natureza supletiva ou interpretativa, diferentemente da fase jusnaturalista anterior, em que eles poderiam regular a conduta das pessoas. Nas palavras de Mamari Filho (2005, p. 17), a natureza dos princípios gerais é eminentemente supletiva, integradora, na

medida em que se admite que o sistema de leis (positivas) é incapaz de regular todas as situações havidas na vida cotidiana”.

[16] Em Filosofia, é a teoria elaborada pelo filósofo e jurista alemão Carl Schmitt (1888-1985), um dos teóricos do nazismo, segundo a qual em épocas de crise a desordem só se transforma em ordem por meio da decisão absoluta, que tem primazia sobre a ordem. Nas palavras de Schmitt: “Para o jurista de tipo decisionista a fonte de todo o ‘direito’,  isto é de todas as normas e os ordenamentos sucessivos, não é o comando enquanto comando,  mas a autoridade ou soberania de uma decisão final, que vem tomada junto com o comando”.

[17] Para Kelsen, o Direito só é útil porque o Estado tem o monopólio da violência, o monopólio do poder de coerção por parte deste Estado. Poder de fazer valer a própria vontade. Toda norma imputa uma coerção, mesmo que tacitamente. Após a análise das duas teorias, a teoria de Herbert Hart parece ser mais lógica do que a de Hans Kelsen, pois municia o Direito de outros fatores como a Moral, e não acha que a Teoria do Direito não tem como ser observada em sua “pureza metodológica” como preconiza o Kelsen. Para Hart, o Direito é uma prática social e a razão da existência dele se deve por nossos costumes e crenças comuns. Logo é mais próxima da sociedade, e é construída a partir do que já é comum na sociedade. Fora o fato de que Hart, ao contrário de Kelsen, imagina que o Direito é histórico, ou seja, acompanha os fatos sócias, evolui historicamente, real.

[18] Para Hart, se o agente não for punido, não há uma falha na obrigatoriedade de se cumprir a norma, há uma falha na eficácia desta norma enquanto determinadora de condutas sócias. Enquanto, conforme dito anteriormente, para Kelsen esta falha na coerção representa uma norma inválida, já que não se aplica. Logo, para Hart, a coerção da norma é um elemento exterior a ela, desvinculado à norma, que é importantíssimo, mas que, se não existente, não retirará a obrigatoriedade de se adequar a conduta individual a norma jurídica, por parte dos indivíduos. Por esta visão, Hart entende que Moral pode fazer parte do Direito, já Kelsen entende que não há juízo de valor, que para o indivíduo atender as ordens jurídicas, não é cientificamente responsabilidade do estudo do Direito, é talvez, estudo da Moral. Para Kelsen precisa-se haver um fato concreto para se ter como base a obrigatoriedade. E para Hart, a norma é cumprida porque é obrigatória moralmente. O respeito à norma vem porque ela é considerada válida, já que está de acordo com as crenças cotidianas.

 

STJ: Definição de regime de bens em união estável por escritura pública não retroage; especialistas comentam

1

Por maioria de votos, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ concluiu que a definição de regime de bens em união estável por escritura pública não retroage. O entendimento é de que a escolha do regime de comunhão de bens em uma união estável por contrato escrito produz efeitos ex nunc, e cláusulas que estabeleçam a retroatividade desses efeitos são inválidas.

A Corte deu provimento a um recurso especial para reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Mato Grosso – TJMT. Em segundo grau, o entendimento havia sido pela retroatividade da escolha do regime de comunhão de bens feita pelo casal.

No caso dos autos, os companheiros oficializaram a união estável em janeiro de 2008, com definição do regime de separação total de bens. O documento incluiu cláusula segundo a qual seus efeitos retroagiriam desde a data em que passaram a morar juntos, em maio de 2000.

Após a separação, um deles pediu a partilha igualitária dos bens e ajuizou ação para anular a parte do contrato de união estável que previa a retroatividade do regime nele estabelecido. A demanda foi julgada improcedente pelas instâncias ordinárias.

Para a Quarta Turma do STJ, a definição de um novo regime durante o curso da união estável altera a situação de comunhão parcial de bens – motivo pelo qual não pode retroagir. Segundo o ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do caso, “no período anterior à celebração do contrato, deve vigorar o regime legal da comunhão parcial de bens”.

A posição do relator foi acompanhada pelos ministros Luís Felipe Salomão, Marco Buzzi e Maria Isabel Gallotti. A ministra acrescentou em voto-vista que a alteração do regime de bens durante a união estável depende de autorização judicial, nos moldes do que prevê o § 2º do artigo 1.639 do Código Civil.

Para o ministro Raul Araújo, que teve voto vencido, se a união estável se iniciou e perdurou até o momento em que, pela primeira vez, o casal decide adotar um regime de comunhão de bens, então não se trata de alteração do mesmo. Logo, é possível conferir efeitos retroativos a essa posição.

AREsp 1.631.112

“Decisão vai contra os desejos e a boa-fé da maioria”, diz especialista

A tabeliã de notas Priscila Agapito, diretora nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, lembra que o entendimento já vinha sendo aplicado há algum tempo nos  tabelionatos brasileiros, e avalia a decisão com reservas. “Ao levar em conta a minha experiência de mais de 20 anos na lida diária com esses casais (que celebram este tipo de pacto no cartório), sinto que a decisão vai contra os desejos e a boa-fé da maioria deles.”

“A união estável é situação de fato. A lei sempre previu a informalidade e é assim que a maioria dos casais vive. Ao perceberem que há a necessidade de formalizarem a relação por um contrato, por qualquer motivo que seja (uma inclusão no plano de saúde, no clube, ou em uma previdência) são surpreendidos ao dizermos pra eles que só podem pactuar daqui para frente, que o regime livremente escolhido (maioria das vezes o da separação total de bens) só poderá valer doravante”, explica a especialista.

Priscila destaca que a lei não exige contrato escrito, mas exige advogado para a dissolução. “Na cabeça do povo leigo, é um contrassenso. Eles sempre se assustam quando dizemos isso. Pois, atualmente, não há muita diferença palpável entre a união estável e o casamento.”

“Essas novidades do CPC de 2015 não foram ainda bem assimiladas pela população. Posso garantir que em 90% dos casos não existe nenhuma má-fé do casal ao querer definir o regime retroativamente. É apenas por uma questão de segurança jurídica que desejam isso. Contudo, não podemos mais vender isso no tabelionato”, detalha a tabeliã.

Liberdade efetiva de escolha

Segundo a especialista, a saída encontrada por muitos casais é fazer um instrumento particular com data retroativa, “perfazendo uma indesejável fraude”. “Não seria muito mais lógico que houvesse liberdade efetiva de escolha? Com consequências práticas de ineficácia apenas em casos comprovados de fraude a terceiros?”, questiona.

Ela acrescenta: “Penso que está na hora de voltarmos um pouco ao tempo em que havia liberdade real de escolha. Neste aspecto, creio que a jurisprudência evoluiu mal, pois despeja na união estável uma série de formalidades que só caberiam no casamento”.

Priscila Agapito prevê um esvaziamento cada vez maior do instituto devido ao excesso de regulação estatal, e um aumento do número de instrumentos particulares, quando existentes, pelos motivos já expostos. “As regras não estão claras no jogo. Como não há um prazo preestabelecido para a configuração da união estável, não há como se dizer, com certeza, quando ela começou.”

“É um requisito subjetivo e empírico. Então, a partir de qual momento se daria a alteração de regime de bens? Toda união estável começa então a ser regida pela comunhão parcial e precisa de alteração judicial para transmutar o regime? Se não é possível frisar qual o primeiro dia de uma união estável e nesse mesmo dia estabelecer o regime desejado, como resolver a questão? Infelizmente, judicializando-a”, avalia a tabeliã.

Para a especialista, “seria muito mais inteligente permitir que o casal, de boa-fé, estabelecesse os parâmetros reais, diante de um tabelião de notas, com a fé pública e os cuidados e seguranças que uma escritura inspira, e, qualquer coisa diferente disso que fosse alegada, posteriormente, seria interpretada como utilização da própria torpeza”.

Tendência que não é nova

Na opinião do juiz Rafael Calmon, membro do IBDFAM, a decisão segue uma tendência que não é nova. “Há muitos anos a Corte já vem decidindo dessa mesma forma, mostrando que o seu entendimento se mostra íntegro, coerente e estável a esse respeito.”

“Ao contrário do que acontece no casamento, na união estável há uma informalidade muito grande. E para que a coisa não descambe para um ‘vale tudo’, deve ter algum regramento”, observa o magistrado.

O juiz ressalta que a lei exige que seja um contrato escrito, mas não exige que seja feito com escritura pública ou que haja um processo. “Não exige nada mais nada menos do que seja um documento escrito, o que quer dizer que pode ser feito por instrumento particular e mesmo no curso de um relacionamento já existente”.

FONTE:  IBDFAM, 10 de março de 2022.

STJ: Definição de regime de bens em união estável por escritura pública não retroage; especialistas comentam

Por maioria de votos, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ concluiu que a definição de regime de bens em união estável por escritura pública não retroage. O entendimento é de que a escolha do regime de comunhão de bens em uma união estável por contrato escrito produz efeitos ex nunc, e cláusulas que estabeleçam a retroatividade desses efeitos são inválidas.

A Corte deu provimento a um recurso especial para reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Mato Grosso – TJMT. Em segundo grau, o entendimento havia sido pela retroatividade da escolha do regime de comunhão de bens feita pelo casal.

No caso dos autos, os companheiros oficializaram a união estável em janeiro de 2008, com definição do regime de separação total de bens. O documento incluiu cláusula segundo a qual seus efeitos retroagiriam desde a data em que passaram a morar juntos, em maio de 2000.

Após a separação, um deles pediu a partilha igualitária dos bens e ajuizou ação para anular a parte do contrato de união estável que previa a retroatividade do regime nele estabelecido. A demanda foi julgada improcedente pelas instâncias ordinárias.

Para a Quarta Turma do STJ, a definição de um novo regime durante o curso da união estável altera a situação de comunhão parcial de bens – motivo pelo qual não pode retroagir. Segundo o ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do caso, “no período anterior à celebração do contrato, deve vigorar o regime legal da comunhão parcial de bens”.

A posição do relator foi acompanhada pelos ministros Luís Felipe Salomão, Marco Buzzi e Maria Isabel Gallotti. A ministra acrescentou em voto-vista que a alteração do regime de bens durante a união estável depende de autorização judicial, nos moldes do que prevê o § 2º do artigo 1.639 do Código Civil.

Para o ministro Raul Araújo, que teve voto vencido, se a união estável se iniciou e perdurou até o momento em que, pela primeira vez, o casal decide adotar um regime de comunhão de bens, então não se trata de alteração do mesmo. Logo, é possível conferir efeitos retroativos a essa posição.

AREsp 1.631.112

“Decisão vai contra os desejos e a boa-fé da maioria”, diz especialista

A tabeliã de notas Priscila Agapito, diretora nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, lembra que o entendimento já vinha sendo aplicado há algum tempo nos  tabelionatos brasileiros, e avalia a decisão com reservas. “Ao levar em conta a minha experiência de mais de 20 anos na lida diária com esses casais (que celebram este tipo de pacto no cartório), sinto que a decisão vai contra os desejos e a boa-fé da maioria deles.”

“A união estável é situação de fato. A lei sempre previu a informalidade e é assim que a maioria dos casais vive. Ao perceberem que há a necessidade de formalizarem a relação por um contrato, por qualquer motivo que seja (uma inclusão no plano de saúde, no clube, ou em uma previdência) são surpreendidos ao dizermos pra eles que só podem pactuar daqui para frente, que o regime livremente escolhido (maioria das vezes o da separação total de bens) só poderá valer doravante”, explica a especialista.

Priscila destaca que a lei não exige contrato escrito, mas exige advogado para a dissolução. “Na cabeça do povo leigo, é um contrassenso. Eles sempre se assustam quando dizemos isso. Pois, atualmente, não há muita diferença palpável entre a união estável e o casamento.”

“Essas novidades do CPC de 2015 não foram ainda bem assimiladas pela população. Posso garantir que em 90% dos casos não existe nenhuma má-fé do casal ao querer definir o regime retroativamente. É apenas por uma questão de segurança jurídica que desejam isso. Contudo, não podemos mais vender isso no tabelionato”, detalha a tabeliã.

Liberdade efetiva de escolha

Segundo a especialista, a saída encontrada por muitos casais é fazer um instrumento particular com data retroativa, “perfazendo uma indesejável fraude”. “Não seria muito mais lógico que houvesse liberdade efetiva de escolha? Com consequências práticas de ineficácia apenas em casos comprovados de fraude a terceiros?”, questiona.

Ela acrescenta: “Penso que está na hora de voltarmos um pouco ao tempo em que havia liberdade real de escolha. Neste aspecto, creio que a jurisprudência evoluiu mal, pois despeja na união estável uma série de formalidades que só caberiam no casamento”.

Priscila Agapito prevê um esvaziamento cada vez maior do instituto devido ao excesso de regulação estatal, e um aumento do número de instrumentos particulares, quando existentes, pelos motivos já expostos. “As regras não estão claras no jogo. Como não há um prazo preestabelecido para a configuração da união estável, não há como se dizer, com certeza, quando ela começou.”

“É um requisito subjetivo e empírico. Então, a partir de qual momento se daria a alteração de regime de bens? Toda união estável começa então a ser regida pela comunhão parcial e precisa de alteração judicial para transmutar o regime? Se não é possível frisar qual o primeiro dia de uma união estável e nesse mesmo dia estabelecer o regime desejado, como resolver a questão? Infelizmente, judicializando-a”, avalia a tabeliã.

Para a especialista, “seria muito mais inteligente permitir que o casal, de boa-fé, estabelecesse os parâmetros reais, diante de um tabelião de notas, com a fé pública e os cuidados e seguranças que uma escritura inspira, e, qualquer coisa diferente disso que fosse alegada, posteriormente, seria interpretada como utilização da própria torpeza”.

Tendência que não é nova

Na opinião do juiz Rafael Calmon, membro do IBDFAM, a decisão segue uma tendência que não é nova. “Há muitos anos a Corte já vem decidindo dessa mesma forma, mostrando que o seu entendimento se mostra íntegro, coerente e estável a esse respeito.”

“Ao contrário do que acontece no casamento, na união estável há uma informalidade muito grande. E para que a coisa não descambe para um ‘vale tudo’, deve ter algum regramento”, observa o magistrado.

O juiz ressalta que a lei exige que seja um contrato escrito, mas não exige que seja feito com escritura pública ou que haja um processo. “Não exige nada mais nada menos do que seja um documento escrito, o que quer dizer que pode ser feito por instrumento particular e mesmo no curso de um relacionamento já existente”.

FONTE:  IBDFAM, 10 de março de 2022.

Bem de família de fiador pode ser penhorado para quitar dívida de aluguel comercial, decide STF

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Prevaleceu o entendimento de que deve ser respeitada a livre iniciativa do locatário e a autonomia de vontade do fiador, que, de forma livre e espontânea, garantiu o contrato.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contratos de locação residenciais e comerciais. A decisão foi tomada na sessão virtual concluída nesta quarta-feira (8/3), no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1307334, com repercussão geral (Tema 1.127).

O recurso foi interposto por um fiador contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) que confirmou a penhora de seu único imóvel, dado como garantia de um contrato de locação comercial. No STF, ele defendia que o direito constitucional à moradia deve se sobrepor à execução da dívida de aluguel comercial. Também sustentava que a tese fixada pelo STF no julgamento do RE 612360, com repercussão geral (Tema 295), no sentido da constitucionalidade da penhora de bem de família do fiador de contrato de locação, deve ser aplicada apenas aos contratos de locação residencial.

Livre iniciativa

Prevaleceu, no julgamento, o voto do relator, ministro Alexandre de Moraes, pelo desprovimento do recurso. Para o ministro, o direito à moradia, inserido na Constituição Federal entre os direitos sociais, não é absoluto. Ele deve ser sopesado com a livre iniciativa do locatário em estabelecer seu empreendimento, direito fundamental também previsto na Constituição Federal (artigos 1º, inciso IV e 170, caput), e com a autonomia de vontade do fiador, que, de forma livre e espontânea, garantiu o contrato.

Para o relator, a impenhorabilidade do bem de família do fiador de locação comercial causaria grave impacto na liberdade de empreender do locatário, já que, entre as modalidades de garantia que podem ser exigidas, como caução e seguro-fiança, a fiança é a mais usual, menos onerosa e mais aceita pelos locadores. Além disso, deve ser garantido ao indivíduo o direito de escolher se manterá a impenhorabilidade de seu bem de família, conforme a regra geral da Lei 8.009/1990, que dispõe sobre a matéria, ou se será fiador, consentindo expressamente com a constrição de seu bem no caso de inadimplemento do locatário. “A livre iniciativa não deve encontrar limite no direito à moradia quando o próprio detentor desse direito, por sua própria vontade, assume obrigação capaz de limitar seu direito à moradia”, afirmou.

Ele destacou, ainda, que, nos aluguéis comerciais, muitas vezes o fiador é o próprio sócio da pessoa jurídica afiançada, especialmente em se tratando de micro e pequena empresa. Assim, o empreendedor pode liberar seu capital financeiro para investi-lo no próprio negócio, enquanto o fiador, também sócio, escolhe seu direito de empreender, ciente de que seu próprio bem de família poderá responderá pela dívida. “Trata-se de decisão sua, em livre exercício de sua autonomia privada”, apontou.

Lei do Inquilinato

Outro ponto observado pelo relator é que a Lei do Inquilinato (Lei 8.245/1991) não faz distinção entre fiadores de locações residenciais e comerciais em relação à possibilidade da penhora do bem de família. Em seu entendimento, criar distinção onde a lei não distinguiu violaria o princípio da isonomia, pois o fiador de locação comercial manteria incólume seu bem de família, enquanto o de locação residencial poderia ter seu imóvel penhorado.

O voto do relator foi acompanhado pelos ministros Roberto Barroso, Nunes Marques, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, André Mendonça e Luiz Fux (presidente).

Prevalência

Ficaram vencidos os ministros Edson Fachin e Ricardo Lewandowski e as ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia, que votaram pelo provimento do recurso. Para essa corrente, o bem de família do fiador de contrato de locação não residencial é impenhorável. Na avaliação do ministro Fachin, primeiro a divergir, o direito constitucional à moradia deve prevalecer sobre os princípios da livre iniciativa e da autonomia contratual, que podem ser resguardados de outras formas.

Tese

A tese de repercussão geral proposta pelo relator é a seguinte: “É constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, seja residencial, seja comercial”.  AD, AR//CF

FONTE:  STF, 09 de março de 2022.

Pesquisa Pronta destaca indenização por erro médico e registro de veículos de conselhos profissionais

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​A página da Pesquisa Pronta divulgou sete entendimentos do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Produzida pela Secretaria de Jurisprudência, a nova edição aborda, entre outros assuntos, o prazo prescricional da ação de indenização por erro médico e o registro de veículos de conselhos de fiscalização profissional como oficiais.

O serviço tem o objetivo de divulgar as teses jurídicas do STJ mediante consulta, em tempo real, sobre determinados temas, organizados de acordo com o ramo do direito ou em categorias predefinidas (assuntos recentes, casos notórios e teses de recursos repetitivos).

Direito processual penal – Recursos

Admissibilidade recursal. Interposição simultânea do recurso cabível e de habeas corpus.

“A Terceira Seção desta corte tem entendido admissível o manejo concomitante de habeas corpus e de apelação criminal perante os tribunais de segundo grau, desde que o pedido formulado no writ seja diverso do objeto do recurso próprio e reflita mediatamente na liberdade do paciente. Precedentes: AgRg no HC 548.976/RJ, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 02/06/2020, DJe 15/06/2020; HC 482.549/SP, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 11/03/2020, DJe 03/04/2020.” Rcl 42.455/DF, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, julgado em 23/02/2022, DJe 25/02/2022.

Direito do consumidor – Prescrição

Prescrição. Ação de indenização por erro médico.

“[..] a ação proposta para cobrança de indenização por erro médico está submetida ao prazo prescricional de cinco anos, conforme estabelecido no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor. Nesse sentido, os seguintes julgados: AgRg no AREsp n. 626.816/SP, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 07/06/2016, DJe 10/06/2016; AgRg no AREsp n. 792.009/DF, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 1º/03/2016, DJe 7/3/2016.”

AgInt no AREsp 1.381.799/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 06/06/2019, DJe 14/06/2019.

Direito civil – Posse

Ação de reintegração de posse por inadimplemento em contrato de arrendamento residencial.

“É cabível o ajuizamento de ação de reintegração de posse pela instituição financeira quando houver o inadimplemento de parcelas previstas em contrato de arrendamento residencial, nos termos da Lei n. 10.188/2001. […] O inadimplemento de parcelas em contrato de arrendamento residencial previsto na Lei n. 10.188/2001 autoriza a instituição financeira arrendante a ingressar com ação de reintegração de posse.”

AgInt no AREsp 1.325.132/RJ, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 24/08/2020, DJe 31/08/2020.

Direito administrativo – Anistia política

Anistiado político. Notificação genérica da revisão da anistia.

“Se a notificação endereçada ao anistiado não especificou, conforme legalmente exigido (art. 26, § 1º, VI, da Lei n. 9.784/1999), os fatos e fundamentos de que deveria se defender, ante a possibilidade de perder a condição de anistiado político, daí resultando inequívoco vício de forma, ocasionador da nulidade do processo administrativo.”

AgInt no MS 26.315/DF, Rel. Ministro Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 09/02/2022, DJe 16/02/2022.

Direito tributário – Contribuição previdenciária

Contribuição previdenciária patronal. Base de cálculo. Valores retidos a título de imposto de renda e de contribuição previdenciária do empregado.

“O Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp 1.902.565/PR, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 07/04/2021, fixou que o montante retido a título de contribuição previdenciária compõe a remuneração do empregado, de modo que deve integrar a base de cálculo da contribuição previdenciária patronal, da contribuição ao SAT/RAT (art. 22, II, da Lei n. 8.212/1991) e das contribuições sociais devidas a terceiros.”

AgInt no REsp 1.948.777/RS, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 14/02/2022, DJe 16/02/2022.

Direito civil – Família

União estável. Regime de bens segundo a idade dos companheiros.

“Firmou o STJ o entendimento de que, ‘por força do art. 258, § único, inciso II, do Código Civil de 1916 (equivalente, em parte, ao art. 1.641, inciso II, do Código Civil de 2002), ao casamento de sexagenário, se homem, ou cinquentenária, se mulher, é imposto o regime de separação obrigatória de bens. Por esse motivo, às uniões estáveis é aplicável a mesma regra, impondo-se seja observado o regime de separação obrigatória, sendo o homem maior de sessenta anos ou mulher maior de cinquenta’ (REsp 646.259/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 22/06/2010, DJe 24/08/2010). […] A Segunda Seção do STJ, em releitura da antiga Súmula n. 377/STF, decidiu que, ‘no regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento, desde que comprovado o esforço comum para sua aquisição’ EREsp 1.623.858/MG, Rel. Ministro Lázaro Guimarães (Desembargador convocado do TRF 5ª região), Segunda Seção, julgado em 23/05/2018, DJe 30/05/2018), ratificando anterior entendimento da Seção com relação à união estável (EREsp 1.171.820/PR, Rel. Ministro Raul Araújo, Segunda Seção, julgado em 26/08/2015, DJe 21/09/2015)”

REsp 1.922.347/PR, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 07/12/2021, DJe 01/02/2022.

Direito administrativo – Atividades profissionais

Conselhos de fiscalização profissional. Registro de veículos de sua propriedade como oficiais.

“Não há autorização legal para registrar como oficiais os veículos de conselhos de fiscalização profissional, que possuem natureza autárquica e compõem a administração pública indireta.”

AgInt no REsp 1.920.228/RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 04/10/2021, DJe 06/10/2021.

FONTE:  STJ,  10 de março de 2022.

Credor de dívida garantida por alienação fiduciária de imóvel pode optar por execução judicial ou extrajudicial

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​Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o credor de dívida garantida por alienação fiduciária de imóvel não está obrigado a promover a execução extrajudicial do seu crédito, podendo optar pela execução judicial integral, desde que o título que dá lastro à execução seja dotado de liquidez, certeza e exigibilidade.

O entendimento foi firmado pelo colegiado, por unanimidade, ao confirmar acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que negou o pedido de uma empresa para extinguir ação de execução, sem julgamento de mérito, sob o argumento de excessiva onerosidade da via eleita pelo credor.

O TJSP entendeu que, embora haja previsão de procedimento específico de execução extrajudicial no caso de dívida garantida por alienação fiduciária, nos termos da Lei 9.514/1997, o exequente tem a opção de escolher o meio que lhe parecer mais adequado na busca pela satisfação do crédito.

No recurso especial apresentado ao STJ, a empresa devedora alegou que o credor optou pelo meio de execução mais gravoso, contrariando a legislação, pois, havendo mecanismo célere e eficaz para a satisfação extrajudicial do crédito, nada justificaria o procedimento judicial.

Dívida lastreada em título executivo extrajudicial

O relator, ministro Villas Bôas Cueva, afirmou que o caso diz respeito a execução lastreada em Cédula de Crédito Bancário (CCB). De acordo com o magistrado, a CCB – desde que satisfeitas as exigências do artigo 28, parágrafo 2º, I e II, da Lei 10.931/2004, de modo a lhe conferir liquidez e exequibilidade, e desde que preenchidos os requisitos do artigo 29 da mesma lei – é título executivo extrajudicial.

No entanto, acrescentou, o credor tem o direito de optar por executar o seu crédito de maneira diversa do estabelecido na Lei 9.514/1997, e isso não é alterado pela constituição de garantia fiduciária relacionada ao financiamento instrumentalizado por meio de CCB.

“Só o fato de estar a dívida lastreada em título executivo extrajudicial e não haver controvérsia quanto à sua liquidez, certeza e exigibilidade, ao menos no bojo da exceção de pré-executividade, é o quanto basta para a propositura da execução, seja ela fundada no artigo 580 do Código de Processo Civil de 1973, seja no artigo 786 do Código de Processo Civil de 2015“, afirmou.

Credor pode exigir saldo remanescente

Ao negar provimento ao recurso especial, o relator observou que, na hipótese de alienação extrajudicial do bem dado em garantia, o credor fiduciário não está impedido de exigir o saldo remanescente se o produto obtido com a venda não for suficiente para a quitação integral do seu crédito.

“O remanescente da dívida apenas não estará mais garantido ante o desaparecimento da propriedade fiduciária, o mesmo ocorrendo na hipótese de não haver interessados em arrematar o bem no segundo leilão”, declarou.

Villas Bôas Cueva destacou que tem prevalecido no âmbito do STJ a interpretação de que a extinção da dívida acontece apenas em relação à parcela garantida pela propriedade fiduciária, tendo o credor a possibilidade de cobrar do devedor o valor remanescente.

“A despeito das controvérsias doutrinárias e jurisprudenciais a respeito da possibilidade de cobrança do saldo remanescente da dívida após a execução extrajudicial, ao credor fiduciário é dada a faculdade de executar a integralidade de seu crédito judicialmente, desde que o título que dá lastro à execução seja dotado de todos os atributos necessários – liquidez, certeza e exigibilidade”, concluiu o ministro. REsp 1.965.973.

FONTE: STJ, 10 de março de 2022.

Federação partidária, e agora?

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Autor: Regis Rocha

 

A primeira impressão que fica sobre a Lei nº 14.208, de 28 de setembro de 2021 que autoriza a reunião de dois ou mais partidos em federação como se fossem uma única agremiação partidária, é que não há como fugir da pergunta clássica, e agora, será que a lei vai pegar? Depois de um bate rebate no Supremo, os partidos terão até o dia 31 de maio para o devido registro no TSE, claro, cumpridas todas as exigências da Lei, que não são poucas.

Toda Lei possui seu ônus, a exemplo, os partidos se reunidos em federação deverão permanecer filiados por, no mínimo 04 (quatro) anos, ao passo que no sistema de coligação conhecido, passado o pleito tudo poderá voltar como estava antes, o que torna o ponto crucial de uma norma rígida que também impõe ao detentor de cargo eletivo diante de eventual desfiliação, sem justa causa, de partido que integra a Federação, a perda do seu mandato.

O lado bom, é que se aplica à federação de partidos todas as normas que regem as atividades dos partidos políticos no que diz respeito ao período eleitoral, com a escolha e o registro de candidatos para as eleições majoritárias e proporcionais, arrecadação e aplicação de recursos em campanhas eleitorais, obtenção das cadeiras. O caráter permanente de no mínimo quatro anos de filiação assusta um pouco, é como se houvesse um casamento e hipoteticamente não fosse possível uma dissolução antes do tempo necessário em caso de uma frustrada e prematura relação conjugal.

Por isso, a afinidade programática passou ser um requisito essencial e categórico na busca e definição de uma federação. Esperamos que a mudança seja positiva pois a medida diminui o risco por exemplo do eleitor eleger um candidato com perfil ideológico diversos, como ocorria muitas vezes nas coligações em eleições proporcionais.

As leis brasileiras, são sempre uma emoção extrema, os dirigentes partidários certamente estão esquentando seus neurônios antes mesmo do período pré-eleitoral, mesmo os mais experientes, isso é certo, o resto fica por conta da nossa imaginação infinita no campo da política partidária, tudo pode acontecer.

Como dizem no jargão popular, “se correr o bicho pega, se ficar o bicho come”, brincadeiras à parte, a verdade é que haverá muito trabalho para o jurídico dos partidos políticos.

 

Regis Rocha – advogado Pós-Graduado, Especialista em Direito Eleitoral

Parecer Jurídico de Direito Educacional

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Autores:

Gisele Leite Professora universitária há três décadas. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Pesquisadora – Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Presidente da Seccional Rio de Janeiro, ABRADE – Associação Brasileira de Direito Educacional. Vinte e nove obras jurídicas publicadas. Articulistas dos sites JURID, Lex Magister. Portal Investidura, Letras Jurídicas. Membro do ABDPC – Associação Brasileira do Direito Processual Civil. Pedagoga. Conselheira das Revistas de Direito Civil e Processual Civil, Trabalhista e Previdenciária, da Paixão Editores – POA -RS.

Ramiro Luiz Pereira da Cruz. Advogado, Pós-Graduado em Direito Processual Civil. Articulista de várias revistas e sites jurídicas renomados. Vice-Presidente da Seccional Rio de Janeiro da ABRADE – Associação Brasileira de Direito Educacional.

 

Questão propostas quais são as diretrizes essenciais para o retorno das aulas presenciais durante a pandemia de Covid-19?

O governo federal brasileiro apresentou orientações genéricas para o retorno seguro às aulas presenciais ainda tempos de pandemia de Covid-19, constante na Portaria Interministerial que aborda diretrizes para o retorno de atividades de ensino e aprendizagem da Educação Básica.

Entre as condutas recomendadas estão a higienização de mãos por álcool gel, a manutenção de distanciamento entre mesas e cadeiras, o uso de máscaras faciais e, ainda, a capacitação dos profissionais de saúde. Reforçou ainda o atual Ministro da Saúde que a vacinação é a saúde primordial para o fim da crise pandêmica.

E, ressaltou a penalização das crianças e, mesmo com o advento das Tecnologias de Informação e Comunicação que permitiram as aulas remotas, não é possível, no seu entendimento, a substituição do presencial ensino.

Frisou, ainda, que o retorno às aulas presenciais não pode mais ser adiado.

Já o atual Ministro da Educação esclareceu que as orientações para seguro retorno entre as medidas situa-se a utilização constante de máscaras[1] por estudantes, profissionais da educação bem como demais pessoas que eventualmente acessem a escola ou a instituição de ensino, além de uso de protetores faciais pelos profissionais da educação.

Recomenda-se também o distanciamento social demarcado visivelmente no chão de pelo menos um metro entre os alunos seja dentro e fora da sala de aula.

A fim de garantir a aquisição de materiais e insumos indispensáveis à prevenção da disseminação do coronavírus, o Ministério da Saúde já destinou cerca de quatrocentos e cinquenta e quatro milhões aos municípios. E, tal recurso está disponível par as escolas do Ensino Básico da rede pública de todo o Brasil.

Eis um rol meramente exemplificativo das orientações e protocolos para a volta às aulas presenciais, a saber:

Deve ser mantida quantidade suficiente de máscaras para as trocas durante o período de permanência na escola, considerando o período máximo de uso de 3 (três) horas para máscara de tecido e 4 horas para máscara cirúrgica, ou trocas sempre que estiverem úmidas ou sujas;

Evitar o uso de áreas comuns, como bibliotecas, parquinhos, pátios e quadras. No caso da prática de atividade física, optar sempre que possível por atividades individuais e ao ar livre;

Evitar ao máximo uso de materiais coletivos e o compartilhamento de materiais;

Fazer uso de máscaras[2], inclusive durante a atividade física;

Evitar atividades em grupo, programas após a escola e grandes eventos;

Realizar as refeições nas salas de aula em vez de utilizar o refeitório;

Suspender o uso de armários compartilhados;

Evitar a entrada de voluntários, convidados externos e pais/responsáveis na escola;

Orientar que os estudantes levem suas garrafas de água, evitando a utilização de bebedouros coletivos e o compartilhamento de garrafas;

Intensificar a frequência de limpeza e desinfecção para minimizar o potencial de exposição a gotículas respiratórias;

As orientações mais detalhadas para a retomada segura de atividades presenciais nas escolas de Educação Básica no contexto da pandemia da Covid-19, está disponível em:

https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/governo-federal-apresenta-orientacoes-para-volta-segura-as-aulas-presenciais/ORIENTAESPARARETOMADASEGURADASATIVIDADESPRESENCIAISNASESCOLASDEEDUCAO.pdf

Quanto a ocorrência de casos de Covid-19, quando se identificar discente apresentando sinais e sintomas de síndrome gripal, a escola deverá acionar pais ou responsáveis, orientando que esse discente compareça a Unidade Básica de Saúde (UBS) e, realize teste.

Cabem aos país ou responsáveis dos discentes e aos profissionais da educação igualmente comunicar à escola do aparecimento desses sintomas, bem como se teve ou tem contato próximo com caso positivo confirmado ou suspeito de Covid-19.

Havendo a confirmação de infectado por Covid-19, deverá ser providenciada a limpeza e higienização com desinfecção total e imediata do ambiente escolar. E, os profissionais e a comunidade escolar, igualmente, deverão ser informados, e as atividades escolares deverão ser reavaliadas. Podendo, inclusive, optar-se pelo retorno às aulas remotas.

Segundo o Ministério da Saúde, que sofreu recente “apagão” de dados por hackers, já enviou doses suficientes para a vacinação contra a Covid-19 para imunizar, com pelos menos a primeira dose, cem por cento dos trabalhadores da educação do Ensino Básico e Ensino Superior e dos Estados e do Distrito Federal.

A vigência da Medida Provisória nº 934/2020, com a dispensa da obrigatoriedade do cumprimento do mínimo de dias letivos no ano de 2020 na Educação Básica e na Educação Superior, amplamente aceita pela comunidade educacional, e diante da urgência da necessária reorganização das atividades escolares e acadêmicas em decorrência da suspensão das aulas presenciais ocorridas em março de 2020, este Conselho Nacional de Educação (CNE), visando a orientar a integração curricular e a prática das ações educacionais em nível nacional, na condição de órgão normativo e de atividade permanente na estrutura da educação nacional, previsto no § 1º do artigo 9º da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que “estabelece as diretrizes e bases da educação nacional” (LDB), emitiu três documentos pertinentes:

– Parecer CNE/CP nº 5, de 28 abril de 2020, que tratou da “reorganização do Calendário Escolar e da possibilidade de cômputo de atividades não presenciais para fins de cumprimento da carga horária mínima anual, em razão da Pandemia da COVID-19”;

– Parecer CNE/CP nº 9, de 8 de junho de 2020, que retomou essa temática, com o reexame do Parecer CNE/CP nº 5/2020; e

– Parecer CNE/CP nº 11, de 7 de julho de 2020, que definiu “Orientações Educacionais para a Realização de Aulas e Atividades Pedagógicas Presenciais e Não Presenciais no contexto da Pandemia”.

Em 18 de agosto de 2020, foi sancionada a Lei nº 14.040/2020, que estabeleceu normas educacionais excepcionais que deveriam ser adotadas durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6/2020.

Ressalta-se que esta Lei, no parágrafo único do artigo 1º, definia com clareza que “o Conselho Nacional de Educação (CNE) editará diretrizes nacionais com vistas à implementação do disposto nesta Lei”. Em função dessa determinação legal, o Conselho Nacional de Educação aprovou o Parecer CNE/CP nº 19/2020, o qual, uma vez homologado, deu origem à Resolução CNE/CP nº 02/2020, regulamentando dispositivos da Lei nº14.040/2020[3].

Divulgado em janeiro de 2021, projeta que os alunos dos anos finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano) podem ter regredido, em média, até quatro anos em leitura e Língua Portuguesa, tendo em vista o desempenho no Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB). A estimativa indica redução também na nota média de matemática − nesse caso, com perda equivalente a até três anos de escolaridade.

As estimativas foram feitas pelo Centro de Aprendizagem em Avaliação e Resultados para o Brasil e a África Lusófona (FGV EESP Clear), vinculado à Fundação Getúlio Vargas. A análise considerou três cenários, a partir do desempenho dos estudantes brasileiros entre 2015 e 2019 no Saeb: otimista, pessimista e intermediário.

No Brasil, o único estudo disponível de avaliação da aprendizagem pós–pandemia foi realizado pela Secretaria Estadual de Educação de São Paulo.

Em março de 2021, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, em parceria com o Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora (CAED/UFJF), realizou uma avaliação de aprendizagem de Língua Portuguesa e Matemática para crianças e jovens do 5º e 9º ano do ensino fundamental e da 3ª série do ensino médio.

Algumas expectativas se confirmaram. Os anos iniciais do ensino fundamental, 1º a 5º ano, ciclo de alfabetização, foi a fase com a maior redução de aprendizagem. As perdas em matemática foram maiores que em Língua Portuguesa. Matemática é uma disciplina mais dependente da presença na escola e do apoio dos professores. Assim, em Matemática no 5º ano, as crianças atingiram 196 pontos, 46 pontos a menos que no SAEB 2019, quando foi de 242 pontos.

Segundo a pesquisa, em média, a cada ano da fase de alfabetização as crianças agregam 4 (quatro) pontos de aprendizagem. Serão necessários mais de 11 (onze) anos para recuperar a aprendizagem perdida. Em Língua Portuguesa a perda foi menor, foram 194 pontos em 2021, tendo sido 223 pontos no SAEB 2019, uma perda de 29 pontos, um resultado semelhante ao verificado dez anos atrás, 192 em 2011.

Portaria Interministerial nº 5, de 4 de agosto de 2021. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-interministerial-n-5-de-4-de-agosto-de-2021-336337628#:~:text=2%C2%BA%2C%20%C2%A7%209%C2%BA%2C%20Lei%20n%C2%BA,modalidades%20da%20educa%C3%A7%C3%A3o%20b%C3%A1sica%20nacional .

Nota de Esclarecimento do CNE – Conselho Nacional de Educação formalizada em 27.01.2022, para o fluxo do calendário escolar do ano de 2022, em todos os níveis de ensino, em virtude de ações preventivas ao aceleramento rápido da nova onda de contágio, vem a público elucidar aos sistemas e às redes de ensino, bem como às instituições públicas e particulares, de todos os níveis, etapas e modalidades de ensino.

Importante ainda salientar que o STF reconheceu expressamente a competência concorrente[4] entre Estados, Municípios e a União na fixação de diretrizes, medidas e protocolos sanitários para o combate a Covid-19, o que inclui, certamente o retorno às aulas presenciais.

Os governos estaduais já anunciaram o retorno das aulas no mês de fevereiro de 2022. Em São Paulo, por exemplo, definiu-se a volta às aulas no dia 2 e o término em 23 de dezembro.

A previsão é de que os recessos ocorram nos meses de abril e outubro enquanto as férias aconteçam em julho e janeiro. O calendário é válido para as 5.400 escolas da rede que atendem cerca de 3,5 milhões de alunos.

Ainda no segundo semestre de 2021, iniciou-se a retomada das aulas presenciais. A princípio, apostou-se no revezamento e o distanciamento mínimo de 1 (um) metro. Todavia, com o avanço da vacinação no país, houve a anulação das medidas, mantendo apenas o uso obrigatório de máscaras.

Para acompanhar as medidas oficiais, acesse o site da Secretaria de Educação de cada estado.

Adiante há rol de alguns links para auxiliar na atualização das informações:

Acre: www.see.acre.gov.br

Amazonas: www.seduc.am.gov.br

Bahia: www.educacao.ba.gov.br

Distrito Federal: www.educacao.df.gov.br

Goiás: www.educacao.go.gov.br

Maranhão: www.educacao.ma.gov.br

Minas Gerais: www.educacao.mg.gov.br

Paraíba: www.pbeduca.see.pb.gov.br

Rio de Janeiro: www.rj.gov.br

Rio Grande do Norte: www.educacao.rn.gov.br

Santa Catarina: www.sed.sc.gov.br

São Paulo: www.educacao.sp.gov.br

Sergipe: www.seed.se.gov.br

Tocantins: www.to.gov.br/seduc

De acordo com a Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro, seguindo o Calendário Escolar de 2022, as aulas em unidades da rede estadual de ensino deverão ser retomadas no próximo dia 07 de fevereiro e de modo presencial.

A retomada seguirá as recomendações e protocolos sanitários emitidos pelas autoridades estaduais de saúde e de forma preservar a segurança de discentes e servidores. Por enquanto, não existe nenhuma orientação sobre a comprovação de vacinação contra a Covid-19.

Na rede municipal do Rio de Janeiro, as aulas também estão previstas para serem retomadas obrigatoriamente de forma presencial e no dia 07 de fevereiro. A única exceção[5] feita é para os discentes dotados de comorbidades ou que sejam impedidos por algum motivo médico, comprovado, que poderá assistir aulas de forma remota.

A Secretaria Municipal de Educação (SME) do RJ informou que o rodízio feito nas escolas não é mais necessário e nem é exigido mais o distanciamento mínimo dentro da sala de aula. O que a priori, contraria as recentes Diretrizes proclamadas pelos Ministérios da Educação e da Saúde.

O ano letivo no Colégio Pedro II (federal)[6] só começa em abril, segundo informou a instituição. No dia 7 de fevereiro, as aulas retomadas serão referentes ao período de 2021, seguindo um sistema híbrido[7] –meio presencial, meio remoto – com escalas de turmas, turnos e horários.

É o parecer que, devam ser observadas e cumpridas todas as diretrizes promanadas pelos Ministérios da Saúde e da Educação, conjugadas com as orientações dos Estados e Municípios. Sendo razoável propor a ênfase ao Ensino Híbrido em situações que possibilitem contágio e disseminação do coronavírus.

A melhor solução seria o retorno às aulas presenciais de forma gradativa, mediante rodízios e, priorizando as primeiras séries e, também, paralelamente, manter as aulas remotas, instaurando um planejado ensino híbrido. Pontuando, as aulas presenciais principalmente para dirimir as principais dificuldades na aprendizagem.

 

Referências:

JOAQUIM, Nelson. Direito Educacional Brasileiro. História, Teoria e Prática. 3ª edição. Rio de Janeiro: Freitas Bastos Editora, 2015.

Ministério da Educação. Retorno às aulas presenciais em Instituições Federais de Educação Superior. Disponível em: https://www.gov.br/mec/pt-br/assuntos/noticias/retorno-as-aulas-presenciais-em-instituicoes-federais-de-educacao-superior Acesso em 02.02.2022.

Ministério da Educação. Aulas presenciais: MEC e Saúde assinam portaria orientando retorno. Disponível em: https://www.gov.br/mec/pt-br/assuntos/noticias/portaria-conjunta-ms_mec_lf Acesso em 02.02.2022.

POMPEU, Ana. STF reafirma competência de Estados e Municípios para tomar medidas contra Covid-19. Disponível em: https://www.jota.info/stf/do-supremo/stf-reafirma-competencia-de-estados-e-municipios-para-tomar-medidas-contra-covid-19-15042020 Acesso em: 02.02.2022.

UNICEF. Covid-19 e máscaras: dicas para famílias. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/covid-19-e-mascaras-dicas-para-familias Acesso em 02.02.2022.

 

 

 

 

[1] Máscaras caseiras (também chamadas de máscaras de pano/tecido): se você e sua família moram em um lugar onde novo coronavírus está ativo e não têm nenhum sintoma de covid-19, então as máscaras de pano são recomendadas.

Máscaras cirúrgicas ou médicas: As máscaras cirúrgicas estão escassas no mundo todo por causa da pandemia. Elas são recomendadas somente se você ou um membro da família corre um risco maior de doença grave devido à covid-19 (pessoas com mais de 60 anos ou com problemas de saúde subjacentes), se você está com suspeita ou é caso confirmado de covid-19 ou se você está cuidando de alguém com covid-19. Uma máscara cirúrgica/médica deve ser usada para proteger outras pessoas, se você tiver sintomas de covid-19.

A Organização Mundial da Saúde recomenda o uso de máscaras com três camadas compostas da seguinte forma: uma camada interna de material absorvente, como algodão; uma camada intermediária de material não tecido, como polipropileno; uma camada externa de material não absorvente, como poliéster ou mistura de poliéster. Lave as máscaras de tecido com sabão ou detergente, de preferência em água quente (pelo menos 60 graus Celsius). Se for lavar na máquina, use a configuração apropriada mais quente para o tipo de tecido. Se for lavar à mão, use água quente com sabão. Após a lavagem, a máscara deve secar completamente antes de ser usada novamente. Guarde as máscaras em um saco limpo.

 

[2] Crianças de 6 a 11 anos – A recomendação ou decisão de usar (ou não) máscaras em crianças de 6 a 11 anos deve levar em consideração análise de fatores de risco, como, por exemplo, a intensidade de transmissão na área de residência e a situação pessoal e familiar de cada criança. A legislação sanitária local também deve ser observada. IMPORTANTE: Crianças com deficiências cognitivas ou respiratórias graves, que tenham dificuldade em tolerar a máscara, não devem, em nenhuma circunstância, ser obrigadas a usá-las.

[3] Portaria MTP/MS nº14, de 20 de janeiro de 2022. Altera o Anexo I da Portaria Conjunta nº 20, de 18 de junho de 2020. (Processo nº 19966.100565/2020-68). OS MINISTROS DE ESTADO DO TRABALHO E PREVIDÊNCIA E DA SAÚDE, no uso das atribuições que lhes conferem os incisos I e II do parágrafo único do art. 87 da Constituição, e tendo em vista o disposto na Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, resolvem: Art. 1º O Anexo I da Portaria Conjunta nº 20, de 18 de junho de 2020, que estabelece as medidas para prevenção, controle e mitigação dos riscos de transmissão do coronavírus (Covid-19) em ambientes de trabalho, passa a vigorar com a redação constante do Anexo desta Portaria.

[4] Em 15.04.2020 o STF referendou a liminar concedida pelo Ministro Marco Aurélio para explicitar a competência de Estados e Municípios de tomar medidas com o objetivo de conter a pandemia do coronavírus. A decisão unânime fora proferida no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI 6.41, na ação promovida pelo PDT onde pediu a declaração de inconstitucionalidade da MP 926, editada pelo atual Presidente da República em 20.03.2020. Por entender, ainda, que a norma desrespeita o preceito constitucional da autonomia dos entes federativos e foi editada com a finalidade política de atingir os governadores.

[5] CRIANÇAS E ADOLESCENTES COM DEFICIÊNCIA Crianças/adolescentes com transtornos de desenvolvimento ou deficiências podem enfrentar barreiras, limitações e riscos adicionais e, portanto, devem receber opções alternativas de uso de máscara, como protetores faciais. As políticas sobre máscaras devem ser adaptadas para crianças com deficiência com base em considerações sociais, culturais e ambientais. O uso de máscaras por crianças com perda auditiva ou problemas auditivos pode representar barreiras à aprendizagem e outros desafios. Essas crianças podem perder oportunidades de aprendizagem por causa da eliminação de leitura labial e expressões do orador – decorrentes do uso de máscaras – e distanciamento físico. Máscaras adaptadas, como máscaras transparentes, ou o uso de protetores faciais podem ser explorados como uma alternativa às máscaras de tecido.

 

[6] Convém recordar que em função da autonomia conferida pelo art. 207 da Constituição Federal às Instituições Federais de Educação Superior, lhes é assegura a capacidade decisória para, entre outros assuntos, sopesar a viabilidade e oportunidade para a retomada segura das atividades presenciais, e, assim, determinar quando e de que maneira isso deve ocorrer, observados os ditames legais.

[7] Ensino híbrido acontece quando se mescla períodos on-line com períodos presenciais na educação. Para a sua realização é necessário que, além da estrutura para a educação presencial, sejam estabelecidas condições, em nível de gestão e de ensino e aprendizagem, de disponibilização de recursos materiais, como equipamentos e acesso à rede, tanto para as instituições como para os estudantes. Eliane Borges explica que a centralidade do aluno em contexto de ensino híbrido pode ser realizada por meio do uso de metodologias ativas nos processos pedagógicos, o que será sempre por iniciativa do professor. “A simples utilização de tecnologias não garante, por si só, novas pedagogias. Após a pandemia, com certeza caminharemos mais fortemente para a educação híbrida”, conclui. In: Ufjf Notícias. Ensino Híbrido: entenda o conceito. Disponível em: https://www2.ufjf.br/noticias/2021/04/30/ensino-hibrido-entenda-o-conceito/ Acesso em 02.02.2022.

A dimensão humana da proteção ambiental

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EDUARDO MIRABILE – Mestre em Direito Difusos e Coletivos. Advogado. Professor de direito Constitucional, Ambiental, Civil e Biodireito dos cursos de graduação e pós-graduação.

 

Temos acompanhado rotineiramente as constantes preocupações dos países, notadamente dos mais desenvolvidos, com as questões ambientais. Inúmeras conferências, reunindo as mais altas figuras de governantes onde se mostram presentes buscando soluções que garantam ao menos um mínimo de proteção ambiental para que a Humanidade possa permanecer vivendo neste planeta pelas descendências que surgirão.

A Conferência das Nações Unidas sobre mudança do clima de 2021, realizada na Escócia, é um excelente exemplo dessa preocupação, que envolveu a presença das figuras mais ilustres e importantes da política mundial, garantindo a legitimidade do evento.

O presente estudo, porém, pretende focar no aspecto humano e sua relação com o meio ambiente. Afinal o que leva a humanidade a ter preocupação com o ecossistema?

Esse conceito de ecossistema decorre da interação de dois sistemas bem definidos, a saber, o sistema natural, composto de meio físico e biológico e o sistema cultural, criado pelo Homem que através de sua inteligência e atividade altera esse meio natural para sua conveniência.

Assim, como um artista nos dias de hoje, o Homem também altera aquilo que lhe foi dado inicialmente pela natureza, transformando o bem natural num bem artificial ou cultural. Essa transformação, a princípio realizada para a conveniência humana, acaba culminando em resultados bons ou ruins e sempre com consequências que igualmente poderão ser boas ou ruins conforme a escolha.

Aqui se faz interessante apresentar rapidamente duas ideias distintas, dentre tantas concepções existentes sobre a visão do mundo dentro do contexto dos bens naturais do planeta.

A primeira concepção que gostaríamos de abordar seria a visão criativista do mundo, que entende que todos os bens naturais existentes devem ser mantidos nesse estado, a fim de garantir a manutenção do delicado equilíbrio das coisas existentes desde a Criação do Universo. Portanto, as normas legais de proteção devem garantir a manutenção dos bens naturais no seu estado puro.

De forma antagônica, a concepção criativista, entende que o mundo é um amontoado de bens naturais que devem ser ordenados e transformados pela ação humana, de tal forma que mais lhe aprouver para sua conveniência. Aqui, ao contrário, as normas legais devem garantir que o Homem possa utilizar-se ao máximo desses bens naturais para os fins que entenda mais adequados.

O leitor, acreditamos, rapidamente, claro, chegará a conclusão que devemos abraçar a ideia da famosa frase “nem tanto o mar, nem tanto a terra”. O meio termo, em algum ponto entre essas duas concepções deve ser a melhor resposta que a humanidade deve buscar ao criar as leis protetivas ao meio ambiente.

Temos claramente aqui o confronto meio ambiente e desenvolvimento. O meio ambiente, nos dias atuais, tem se mostrado um inibidor do desenvolvimento desenfreado, que busca resultados imediatos com um alto preço a pagar no futuro.

A resposta a essa dualidade que estaria num crescimento econômico sustentável, que permitisse que os recursos naturais utilizados pudessem de alguma forma serem repostos pela natureza ou ação humana, seria facilmente encontrada se não houvesse tantos interesses, notadamente egoísticos envolvidos.

O desenvolvimento é algo que sempre é defendido, pois afinal é graças a ela que gera a criação de empregos, avanços tecnológicos, melhor qualidade de vida com as vantagens que a vida moderna oferece. Vemos que o desenvolvimento está atrelado até mesmo a dignidade da pessoa humana.

O ser humano, único animal dotado de inteligência no planeta, transforma bens naturais em qualidade de vida. Os países utilizam dos bens naturais colocados à disposição no seu território e procuram melhorar a qualidade de vida de sua população com bens naturais agora transformados em bens de consumo, com o valor agregado do trabalho humano.

Os países do primeiro mundo tiveram um forte desenvolvimento econômico no passado, com pouca preocupação ambiental, sobretudo pelo contexto e realidade que viviam. As leis ambientais só proliferaram entre os países nas últimas décadas. Na época da Revolução Industrial, por exemplo, eram pouquíssimas as sociedades que defendiam questões ambientais.

Temos grandes nações desenvolvidas que dizimaram matas nativas, florestas e um sem fim de ataques a biodiversidade e recentemente se deram conta que se outras nações seguirem pelo mesmo caminho, o resultado ambiental será muito caro para toda a Humanidade.

Hoje países em desenvolvimento também desejam um rápido crescimento e veem em questões ambientais um óbice para essas pretensões. O argumento da soberania e da autodeterminação de seus povos é sempre colocado na mesa de negociação pelos países em desenvolvimento, ansiosos pelos avanços desenvolvimentistas em que acredita.

A comunidade internacional, também é verdade, vem buscando soluções no sentido de dar uma indenização ou compensação a esses países que ainda não tiveram o desenvolvimento que o façam, mas respeitando o meio ambiente natural. É uma tentativa de demover da ideia de um crescimento ao arrepio de valores ambientais fortes.

Perceberam os países mais ricos que leis ambientais mais rígidas poderiam frear a sanha de desenvolvimento desenfreado e poluidor dos mais pobres, mas ao mesmo tempo afetariam o “status quo” da sua poderosa e poluidora economia.

Nesse norte, foi criado por exemplo, um interessante mecanismo chamado de crédito de carbono, onde os mais poluidores pagam créditos a governos/empresas que poluem menos, conforme metas pré-estabelecidas em acordos internacionais.

Esse mecanismo aprovado pelas nações veio a criar um mercado de crédito de carbono que tem seus méritos ao estabelecer limites e compensações ou indenizações a outras nações signatárias. Levam-nos, num primeiro momento, a uma ideia de justiça.

Por outro lado, também é verdade, pode ser encarado como um mecanismo que assegura o direito do poluidor, que é rico, continuar poluindo, mediante uma compensação ao mais pobre. Justo como dito acima, mas não deixa de ser perturbadora a ideia de que possa o rico fazer prevalecer seus interesses sobre o pobre no suposto direito de poluir o meio ambiente que pertence a todos.

Temos, nesse quadro, claramente um conflito de interesses envolvendo a humanidade e seu ecossistema.

A humanidade, fantasiada de ideais nobres busca agora cada vez mais a criação de leis protetivas ao meio ambiente, não por acreditar naquela concepção criativista do universo, mas sim, por entender, que é preciso fazer algo senão inexistirá futuro para o Homem.

Estamos inseridos no planeta, onde criamos uma espécie de bomba-relógio ambiental, em que desconhecemos qual ao tempo que nos resta, mas onde há um senso comum que certamente precisa ser feito algo senão o tempo chegará cobrando o Homem de uma forma inexorável pela utilização pouco inteligente do ecossistema.

 

O significado da Semana da Arte Moderna de 1922. O calo de Villa-Lobos.

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Resumo: A Semana da Arte Moderna no Brasil de 1922 trouxe a tentativa de esboçar uma identidade nacional no campo das artes, e se libertar dos ditames europeus. Esse evento ao completar um século se faz presente até hoje em nosso país. Curiosamente, foi o calo de Villa-Lobos o último escândalo daquela semana.

Palavras-Chave: Arte. Modernismo. Semana de 1922. Cultura. Nacionalismo.

 

A semana da Arte Moderna no Brasil corresponde a primeira manifestação coletiva pública na história cultural brasileira em prol de espírito novo e moderno em franca oposição à cultura e à arte de teor conservador, prevalentes no Brasil, desde o século XIX.

Cada dia da referida semana tratou de um aspecto cultural, a saber: pintura, escultura, poesia, literatura e música. Marcou o início do modernismo no Brasil e se tornou referência cultural do século XX.

Participaram da Semana nomes consagrados do modernismo brasileiro, como Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Víctor Brecheret,

Plínio Salgado, Anita Malfatti, Menotti Del Picchia, Guilherme de Almeida, Sérgio Milliet, Heitor Villa-Lobos, Tácito de Almeida, Di Cavalcanti, Agenor Fernandes Barbosa entre outros, e como um dos organizadores o intelectual Rubens Borba de Moraes que,  entretanto, por estar doente, dela não participou.

Na ocasião da Semana de Arte Moderna, Tarsila do Amaral, considerada um dos  grandes pilares do modernismo brasileiro, se encontrava em Paris e, por esse motivo, não participou do evento. Muitos dos idealizadores  do evento eram quatrocentões.

Com uma renovação de linguagem, em busca de experimentação, na liberdade criadora da ruptura com o passado. Temporalmente aconteceu em meio as turbulências políticas, sociais, econômicas e culturas. E, as então novas vanguardas estéticas surgiam e, causavam espanto com as novas linguagens desprovidas de regras.

É fato que a Semana de 1922 não fora bem entendida em sua época, mas se encaixou no contexto da República Velha (1889-1930) controlada pelas oligarquias cafeeiras e as notórias famílias quatrocentonas e, ainda, azeitada pela política do café com lei.

Enfim, o capitalismo florescia no Brasil e, consolidava a república e as elites influenciadas por padrões estéticos europeus mais tradicionais. Seu propósito era a renovação artística e cultural da cidade com a perfeita demonstração do que existe em nosso meio em termos de escultura, arquitetura, música e literatura.

A intelectualidade brasileira da época sentia necessidade de abandonar os velhos ideais estéticos do século XIX ainda em voga no país. Algumas notícias a respeito de experiências estéticas que ocorriam na Europa, naquele momento, mas ainda não se tinha certeza do que realmente estava acontecendo e quais rumos seriam seguidos.

O principal descontentamento com a estética situava-se no campo da literatura e poesia. E, os exemplares do futurismo italiano já chegavam ao Brasil e passaram a influenciar alguns escritores tais como Oswald de Andrade e Guilherme de Almeida.

A pintora Anita Malfatti regressava da Europa e trouxe experiências das novas vanguarda, e, em 1917 realizou o que foi chamada de primeira exposição modernista brasileira, com nítidas influências do cubismo, expressionismo e futurismo. E, causou escândalo e fora alvo de severas críticas proferidas por Monteiro Lobato, que serviu para que a Semana da Arte tivesse sucesso e, com o passar do tempo, veio a galgar maior destaque.

Segunda exposição de Anita Malfatti, exibindo quadros expressionistas, criticados com dureza por Monteiro Lobato, no artigo “Paranoia ou Mistificação?”[1], publicado no jornal O Estado de S. Paulo, Esse artigo é considerado o “estopim” de modernismo brasileiro, já que provocou a união dos jovens artistas, levando-os a discutir a necessidade de divulgar coletivamente o movimento.

Em 17 de fevereiro (sexta-feira) de 1922 que foi o dia mais tranquilo da semana, apresentações musicais de Villa-Lobos, com participação de vários músicos.

O público em número reduzido, portava-se com mais respeito, até que Villa-Lobos entra de casaca, mas com um pé calçado com um sapato, e outro com chinelo;  o público interpreta a atitude como futurista e desrespeitosa e vaia o artista impiedosamente. Mais tarde, o maestro explicaria que não se tratava de modismo e, sim, de um calo inflamado.

Nota-se até as últimas décadas do século XX a influência da Semana de 22, principalmente no Tropicalismo e na geração da Lira Paulistana nos anos 70 (Arrigo Barnabé, Itamar Assumpção, entre outros). O próprio nome Lira Paulistana é tirado de uma obra de Mário de Andrade.

Mesmo a Bossa Nova deve muito à turma modernista, pela sua lição peculiar de “antropofagia”, traduzindo a influência da música popular norte-americana à linguagem brasileira do samba e do baião.

Entre os movimentos que surgiram na década de 1920, destacam-se: Movimento Pau-Brasil;  Movimento Verde-Amarelo; Movimento Antropofágico.

O modernismo no Brasil deu-se por força de tendências estéticas europeias e que imprimiram nova percepção da arte no século XX. Bastante influenciado por correntes antiacadêmicas de novas produções artísticas da Europa e engajadas na consolidação de nova consciência criativa brasileira que não se restringisse a copiar as escolas europeias, mas que fosse, preocupada com o estabelecimento de uma arte autenticamente nacional, os artistas, músicos e  escritores modernistas revolucionaram aquilo que se entendia por arte, até aquele momento.

É cediço que a sociedade moderna é, portanto, a sociedade industrializada e, que a noção de modernidade se relaciona ao conjunto de mudanças gestado e trazido pela industrialização, acarretando tanto transformações políticas, sociais e culturais. É passando pelas modificações abrangentes da industrialização que as sociedades se tornaram modernas. Igualmente as descobertas científicas dos idos de 1900, tais como a teoria da relatividade, de Albert Einstein e as teorias da psicanálise de Sigmund Freud, também alteraram significativamente a maneira como o ser humano compreende o Universo e a si mesmo. A invenção da fotografia e do cinema é igualmente um fator histórico que muito contribuiu para a reinvenção da arte.

[1]  A crítica violenta de Lobato reflete desastrosamente sobre a exposição e a vida familiar de Anita. A artista recebe de volta muito dos quadros que tinham sido vendidos, e evidentemente sofre bastante com tudo isso. Este acontecimento, contudo, cria as bases para uma espécie de divisor de águas. Dessa maneira, o artigo de Monteiro Lobato tem a capacidade de congregar aqueles vários artistas e intelectuais insatisfeitos com os rumos de uma tradição de pensamento e de arte, servindo como um dos estopins da Semana de Arte Moderna de 1922. (Theotonio de Paiva). (….)

 

Apontamentos sobre os fundamentos do Direito Internacional Contemporâneo.

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Resumo: Os fundamentos do Direito Internacional contemporâneo são torneados pelos fatos que vivenciamos e, deve-se adotar a corrente humanista[1], principalmente, na defesa da paz mundial. A possível invasão russa sobre a Ucrânia faz soar os alertas em toda comunidade internacional.

Palavras-Chave: Fundamentos. Direito Internacional. Princípios de Direito Internacional. Direitos Humanos. Guerras. Cláusula de Martens.

Autores:

José Luiz Messias Sales. Professor Universitário . Mestre em Direito das Relações Internacionais e a Integração. Advogado. Especialista em Direito Empresarial, Direito Processual Civil. Assessor do Instituto Jamil Sales (IJL).  Autor da obra “Segurança Jurídica dos Contratos Comerciais no Mercosul. As Relações entre Brasil e Uruguai” E-mail: messiassales@terra.com.br

Gisele Leite. Professora universitária há três décadas. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. 29 Obras Jurídicas publicadas. Presidente da ABRADE-RJ. Consultora IPAE. Pesquisadora-Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas (INPJ). E-mail: professoragiseleleite@gmail.com

 

Desde o fim da Segunda Grande Guerra Mundial as transformações trazidas para o Direito Internacional, provocaram questionamentos sobre o Direito Internacional, seus paradigmas e fundamentos. Afinal, as teorias tradicionais acerca de fundamentos do Direito Internacional não conseguiam explicar adequadamente o então Direito Internacional existente[2].

Um fato relevante foi a intensa busca de aspectos axiológicos e de legitimidade. E, combinando-se os aspetos do tema de fundamentos do Direito Internacional e sugere ainda que, combinando-se com as teorias existentes, os fundamentos do Direito Internacional contemporâneo poderiam ser descritos como sendo o consenso sobre a necessidade de segurança jurídica para a consecução de objetivos e proteção dos valores compartilhados pela sociedade internacional.

Tal definição atende à realidade internacional existente, preocupando-se, simultaneamente, com a criação de um cenário internacional ideal ou, pelo menos, idealizado.

A globalização, dentre muitos fatores, provocou nas relações internacionais contemporâneas muitas transformações significativas principalmente em razão dos atores envolvidos nas mesmas, quando em relação aos temas que as compõem. E, assim trouxeram questionamentos sobre os paradigmas do ramo do Direito que as pretende regular o Direito Internacional.

Afinal, a essência do Direito Internacional, reconhecido por seu papel como sistema de ordenação das relações entre os sujeitos de direito internacional e, demais agentes não-estatais no plano internacional e, ainda, o caráter vinculante de suas normas.

Trata-se de uma análise de um tema complexo e o contemporâneo cenário internacional ainda demanda um inter-relacionamento com o contexto onde atua o Direito Internacional.

No Direito Internacional de Coexistência até chegar ao Direito  Internacional de Cooperação e Mudança de Fundamentos se deu um trajeto histórico evolucionista, pois o Direito Internacional surgiu em 1648 através dos tratados de Münster e Osnabruck que consagraram a Paz de Westphalia, e tal ramo jurídico se ocupava, principalmente, em estabelecer as normas de coexistências entre os Estados soberanos existentes.

A Paz de Westphalia[3] estabeleceu os princípios que tanto caracterizaram o Estado Moderno, destacando-se as normas da soberania, da igualdade jurídica entre os Estados, da territorialidade e, ipso facto, de não-intervenção. As referidas normas traziam, em sua maioria, as obrigações de não-fazer, de mútua abstenção, e se fundavam na vontade soberana dos Estados, os quais, por serem soberanos, eram tidos como irresponsáveis no cenário internacional.

A noção de soberania absoluta passou a ser questionada, o porquê de haver o respeito às normas de Direito Internacional, isto é, a questionar acerca dos fundamentos do Direito Internacional.

Verificava-se uma unidade ética, naquela época, os doutrinadores buscavam o equilíbrio entre os intrínsecos aspectos ao sistema (a soberania dos Estados) e extrínsecos (justiça e valores comuns). Foi assim que Hugo Grotius cogitou em uma sociedade internacional lastreada no Direito Internacional e fundada em regras de convivência baseadas em consenso.

Neste início do Direito Internacional se buscou a fundamentação que tanto valorizou o contexto internacional, principalmente, na figura do consenso, e simultaneamente, se preocupou com questões éticas, numa sociedade internacional fundada nos ideias de  justiça e em valores compartilhados.

Em razão da unidade ética, o fundamento da legitimidade era buscado fora do sistema do Direito, dado que o que se verificava era a existência da unidade ética na vida humana, na qual todos os ramos (Direito, Religião e Economia) estavam ligados pelo mesmo fundamento e, ainda, pela busca da concretização dos mesmos valores.

A iminência de uma guerra entre Rússia e Ucrânia traz desdobramentos da crise e ainda o alerta da Casa Branca (EUA) sobre possível invasão. No momento, vários países começaram a emitir avisos para que seus cidadãos deixem imediatamente a Ucrânia[4] diante de iminente invasão russa. O Ministério das Relações Exteriores do Reino Unido afirmou que todos os cidadãos britânicos devem sair agora enquanto os meios comerciais ainda estão disponíveis.

Ucrânia e Rússia permanecem em negociação, porém, um consenso é bastante improvável. E, os desdobramentos podem comprometer não apenas a segurança de toda Europa, mas principalmente, o mercado global, atingindo mesmo países distantes como o nosso, em efeito dominó. Lembremos que a Ucrânia faz fronteira com a Rússia e, também, com outros integrantes do União Europeia. É país dividido desde o fim da URSS em 1991.

O russo é amplamente falado e os laços culturais permanecem fortes. Todavia, o conflito sempre existiu, desde 2014 quando o Presidente ucraniano, Viktor Yanukovych, que era pró-Rússia, foi deposto, Moscou anexou a Crimeia e também apoiou as forças separatistas na região.

E, tais grupos rebeldes se disseminaram pelo leste da Ucrânia e, permanecem em constantes conflitos. Nesse mesmo momento, a Ucrânia tenta se aproximar amigavelmente de instituições europeias como a OTAN e, esse movimento contraria em muito o atual Presidente russo, Vladmir Putin, que deseja manter a região sob seu domínio.

Convém recordar que Moscou sofre sanções do Ocidente desde 2014 quando anexou a Crimeia e, as medidas se intensificaram após o envenenamento de espião russo no Reino Unido e ainda das acusações de interferência nas eleições norte-americanas de 2016, o que é negado veementemente pela Rússia.

O Itamaraty emitiu nota afirmando que não há recomendação de segurança contrária à permanência na Ucrânia para brasileiros. Porém a Embaixada do Brasil situada em Kiev reitera que os brasileiros devem estar e permanecer em alerto e sempre atualizados por meio de fontes locais e internacionais confiáveis.

O Secretário-Geral da OTAN, Jens Stoltenberg afirmou que o bloco está unido e preparado para qualquer cenário, enquanto os EUA alertaram que a Rússia pode atacar a qualquer momento. A Rússia, por sua vez, repetidamente qualquer plano de invasão à Ucrânia, apesar de ter reunido mais de cem mil soldados perto da fronteira. Os soldados russos realizam exercícios militares perto da Criméia.

E, o Secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken “Estamos na janela em que uma invasão pode começar a qualquer momento, e para ser claro, isso inclui acontecer durante as Olimpíadas de Inverno (que terminam em 20 de fevereiro de 2022)”, afirmou Blinken.

Moscou acaba de iniciar amplos exercícios militares com Belarus, e a Ucrânia acusou a Rússia de bloquear seu acesso ao mar. O Kremlin diz que quer impor “linhas vermelhas” para garantir que os ucranianos não se juntem à OTAN. O conselheiro de segurança nacional dos EUA, Jake Sullivan, disse que as forças russas estão “em posição de poder montar uma grande ação militar a qualquer momento” e instou os cidadãos americanos na Ucrânia a “saírem o mais rápido possível”. Os comentários e o tom de urgência nas advertências são vistos como uma clara escalada no conflito.

As tensões atuais ocorrem oito anos depois que a Rússia anexou a península da Crimeia[5], no sul da Ucrânia. Desde então, os militares da Ucrânia estão presos em uma guerra com rebeldes apoiados pela Rússia em áreas do leste perto das fronteiras da Rússia.

Moscou diz que não pode aceitar que a Ucrânia – uma ex-república soviética com profundos laços sociais e culturais com a Rússia – possa um dia se juntar à aliança de defesa ocidental Otan e exigiu que isso seja descartado.

A Rússia vem apoiando uma sangrenta rebelião armada na região de Donbass, no leste da Ucrânia, desde 2014. Cerca de 14 (quatorze) mil pessoas – incluindo muitos civis – morreram em combates desde então.

Há a possibilidade de que um foco renovado nos acordos de Minsk – que buscavam acabar com o conflito no leste da Ucrânia – poderia ser usado como base para neutralizar a crise atual. Ucrânia, Rússia, França e Alemanha apoiaram os acordos nos anos de 2014 e 2015. Vários países começaram a emitir avisos para que seus cidadãos deixem a Ucrânia diante de uma iminente invasão russa.

Com a progressiva evolução do Direito Internacional somada às mudanças no cenário internacional, particularmente, após o advento do positivismo jurídico, deu-se uma minimização dos elementos extrínsecos da fundamentação e da busca de critérios de legitimidade interna ao próprio Direito.

E, em face da unidade ética, o fundamento da legitimidade era buscado fora do sistema do Direito, dado que o que se verificava era a existência da unidade ética na vida humana, na qual todos os ramos, como Direito, Religião e Economia estavam ligados pelo mesmo fundamento e pela necessidade de concretização dos mesmos valores.

A propósito, é recomendável a leitura da obra de Fábio Konder Comparato, intitulada Ética – Direito, Moral e Religião no Mundo Moderno. São Paulo Companhia das Letras, 2006. E, a respeito da legitimidade internacional, igualmente é recomendável a leitura de Jubilut, L.L., A legitimidade da Não-Intervenção em face das Resoluções do Conselho de Segurança da ONU. Tese de doutorado apresentada à Faculdade de Direito da USP, 2007.

Aliás, a busca do fundamento da legitimidade fora do sistema jurídica em si é relevante pois em toda a vida das civilizações a moral mais elevada, a transcendência de valores é o que impulsiona a justiça, conforme aduz Comparato em obra retrocitada.

Porém, com o positivismo jurídico tal fato se altera uma vez que se opera a redução ou simplificação da vida social, não já sob forma de estruturas superpostas, mas de compartimentos estanques: o direito, como sistema normativo, existe independentemente da moral, da realidade econômica ou das formas de organização política.

Em face do que se cria, com isso, rígida separação entre direito e moral. Contrariando secular tradição de todas as civilizações, os positivistas consideram que o direito existe sem a ligação com a justiça, e os juristas não têm que julgar a ordem jurídica de acordo com os grandes valores éticos, porque não é uma tarefa científica e, sim política.

Com a influência do positivismo, verifica-se que, no que tange a fundamentação do Direito Internacional a ideia da busca da mesma dentro do próprio sistema não se tornou pacífica; surgindo, assim a principal dicotomia teórica relativa ao tema dos fundamentos do Direito Internacional: a que opõe voluntaristas e jusnaturalistas na defesa de um Direito Internacional resultante da vontade dos Estados ou como um conjunto de princípios naturais, respectivamente.

Não obstante das teorias voluntaristas e jusnaturalistas serem usadas como forma de classificar o debate, em verdade, se observa que as mesmas não compõem blocos homogêneos e, apesar de serem as teorias mais tradicionais, não exaurem o tema. E, segundo Gerson Boson, as teorias jus naturalistas diferenciam direito natural e direito positivo e, aceitam a validade intrínseca, material, das normas jurídicas, desde que preceitos justos, estejam por trás de sua elaboração.

As teorias jusnaturalistas englobam as teológicas (com fundamento em Deus), as racionais (fulcradas na razão humana); as axiológicas (fundadas na justiça), a panteísta (balizada no determinismo), sociológica (fundamentando o Direito no fato de o mesmo ser essencial para a manutenção da sociedade) e biológica (com fundamento na natureza).

Essa derradeira, merece destaque por ter como expoente a tese do Estado de natureza de Hobbes, o que denota o reflexo do tema dos fundamentos para o campo da Ciência Política e das Relações Internacionais(sobretudo no embate entre idealismo e realismo).

Assim, as teorias voluntaristas se dividem em autolimitação e vontade comum, nas concepções de Jellinek e Triepel, respectivamente. E, enquanto a teoria da autolimitação entende que o  Estado soberano, no exercício de sua soberania vem a escolher a se submeter ao Direito Internacional, isto é, que o direito internacional se funda na vontade metafísica do

Estado, que estabelece limitações ao seu poder absoluto, a teoria da vontade comum acredita que a vontade de um Estado não pode ser o fundamento do Direito Internacional, nem assim as leis concorrentes de vários Estados. Só a vontade comum de alguns Estados, fundidas em uma unidade volitiva pode ser o fundamento do Direito Internacional.

Em razão da noção de soberania absoluta, a teoria voluntaristas galgou expansão e espaço e passou a ter prevalência no próprio Direito Internacional. E, tal fato pode ser demonstrado pela crescente valoração dos tratados tidos como fonte do Direito Internacional e, ipso facto, da necessidade de concordância expressa com a norma e, na figura do objetor persistente no que tange ao costume internacional e que permite a não-vinculação à norma pela vontade do Estado que se manifeste contrariamente à esta.

Segundo a teoria voluntarista fundada na vontade e em aspectos intrínsecos do sistema normativo, verifica-se a limitação dos fundamentos do Direito Internacional às fontes do mesmo. Enfim, analisando a existência ou não de uma norma formal para se verificar o fundamento do Direito Internacional.

Isto é, preocupa-se apenas com a forma, e não propriamente com o conteúdo. Sendo tal situação viável enquanto o sistema é composto por normas de coexistência, mas passa a ser questionada quando surgem as normas de cooperação que apontam para os valores e objetivos comuns existentes.

Enfim, após a Segunda Guerra Mundial e, sobretudo, com advento da fundação da ONU, o Direito Internacional se alterou profundamente. Pois surgem novos sujeitos do Direito Internacional, particularmente, o ser humano, novos atores das relações internacionais, tais como as Organizações não-governamentais (ONGs) e novos temas internacionais como o meio ambiente, a integração econômica e os direitos humanos.

Em face disso, deu-se a necessidade de alterações no Direito Internacional que passará a produzir também, as normas de cooperação. E, acrescidas das normas de coexistência e, trazem à baila a relevante lição deixada por Norberto Bobbio, a paz positiva (desenvolvimento) que deve coexistir bem ao lado da paz negativa (ausência de guerras).

Assim, essas normas denotam igualmente a existência de valores e objetivos comuns, criando novos critérios de legitimidade e recuperando a preocupação axiológica do Direito Internacional que

tanto se reflete na relevância do conteúdo e, não apenas na forma das normas criadas.

Portanto, o Direito Internacional passa a contar com outros elementos em sua base que não somente a vontade do Estado e, que ipso facto, deve ser feita uma retomada do tema e revisão dos fundamentos Direito Internacional.

O surgimento de entes não-estatais no âmbito internacional e de normas de cooperação nos induzem aos questionamentos sobre o Direito Internacional e seus paradigmas e fundamentos.

Diante dessa crise paradigmática do Direito Internacional que não é mais possível fundá-lo apenas na vontade do Estado e que a busca por seus fundamentos e critério de legitimidade não pode ser vista como extrínseca à própria matéria. O fundamento em si pode ser extremo ao sistema, mas estará subjacente ao mesmo  tempo.

O que justifica o enorme destaque que se deu aos fundamentos não somente por tentar explicar a obrigatoriedade do Direito Internacional, mas por apontar os motivos pelos quais os Estados, como entes soberanos, respeitem e obedeçam ao Direito Internacional, mas igualmente, por que sem um fundamentação adequada, não conseguirá realizar suas quatro funções básicas, a saber:

(1) “definir o princípio normativo supremo de organização da política mundial”; (2) “estabelecer as regras de coexistência e cooperação entre os atores internacionais”; (3) “efetuar a qualificação dos comportamentos internacionais”; (4) “mobilizar obediência em relação às regras de coexistência e cooperação”. observa-se uma nova preocupação com o mesmo e a produção de teorias que direta ou indiretamente abordam a questão.

Em comum aparece a constatação da existência de valores, objetivos e interesses compartilhados no cenário internacional atual, bem como a contínua importância dos Estados, que embora tenham tido sua soberania flexibilizada com o aumento da interdependência e a diminuição dos temas que compõem o domínio reservado, seguem sendo os principais sujeitos do Direito Internacional, sobretudo em função de sua capacidade de produzir normas internacionais.

Em face do exposto parece-nos que a melhor definição dos fundamentos do Direito Internacional contemporâneo seria uma combinação de pressupostos das teorias jusnaturalistas e voluntaristas. Destas se utilizaria a ideia de vontade presente em consensos e daquelas a existência de valores externos ao sistema – e compartilhados pelos entes que o compõe-, sobretudo na busca da justiça. Cabendo ao Direito Internacional fazer a junção entre os dois extremos (vontade versus valores) por meio de suas normas.

Os fundamentos do Direito Internacional contemporâneo seriam, assim, o consenso sobre a necessidade de segurança (jurídica) para a consecução dos objetivos e proteção dos valores compartilhados pela sociedade internacional.

Verifica-se nesta definição a existência de três elementos dos fundamentos do Direito Internacional contemporâneo: (1) o consenso, que remete a ideia de vontade estatal presente nas teorias voluntaristas; (2) a consecução dos objetivos e a proteção dos valores compartilhados, que resgatam os ideias de justiça e a dimensão axiológica presente nas teorias jusnaturalistas; e (3) a segurança jurídica que seria garantida pelo Direito Internacional e que auxiliaria no apaziguamento dos critérios das duas teorias.

Com essa definição respeita-se o aspecto político que limita o cenário internacional, representado sobretudo pela soberania estatal; consagrada na fórmula acima na ideia de consenso; mas, ao mesmo tempo, destaca-se o aspecto de valores compartilhados e objetivos comuns, acrescentando-se uma dimensão axiológica ao Direito Internacional e buscando efetuar um resgate da unidade ética do mesmo, que existia, como mencionado, no início desta disciplina.

Tal definição contempla a realidade internacional existente, preocupando-se, simultaneamente, com a criação de um cenário internacional ideal. Combina, assim, aspectos descritivos e propositivos a fim de auxiliar na evolução do Direito Internacional.

Para que essa definição possa, contudo, prosperar, faz-se necessário analisar se há, efetivamente, uma sociedade internacional com objetivos e valores compartilhados que autorizem a inclusão dos mesmos como base dos fundamentos do Direito Internacional. O próximo item se ocupa da análise de tal tema.

O Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) tem como base fundamental a Declaração Universal dos Direitos Humanos adotada e proclamada pela Resolução 217 A da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948.

Observa-se que o Direito Internacional é capaz de servir e legitimar diferentes aspectos da ordem social, como por exemplo, defender a prevalência da vontade particular de uma potência mundial, em detrimento de nação hipossuficiente, mas também, esse direito é capaz de criar condições mais igualitárias para todos as nações, afirmando os princípios superiores às vontades particulares, consagrando-se, finalmente, como um complexo e denso paradoxo.

Naturalmente que foi o enfraquecimento da figura do Estado que fez com que a dinâmica da sociedade internacional evoluísse para nova perspectiva sob a qual não mais se vislumbra a intensa necessidade de reforçar as condições de manutenção do status quo desses entes coo sento os únicos a comandar e reger o sistema internacional.

A globalização do capitalismo faz com que o poder não esteja mais disponível apenas de quem detém o controle do território. Ou seja, os governantes não mais possuem o controle e a submissão da população em suas mãos e não são os únicos nem os mais importantes, pois, já não é mais o Estado o único ente capaz de fortalecer a economia e garantir a segurança aos indivíduos.

O surgimento de novos Estados, os fatos decorrentes dos desajustes de uma  sociedade internacional pautada exclusivamente na soberania, como as guerras e o incremento da cooperação pacífica para atingir certos interesses comuns de atores internacionais, fizeram com que junto a essa sociedade internacional passasse a subsistir um novo ambiente de relações  entre os Estados, qual seja, a comunidade internacional, na qual novas regras de direito internacional serão contempladas a fim de regular as ações comuns, pautadas em valores também comuns a todos os sujeitos nela envolvidos.

A comunidade internacional é hoje um grupo social em transição, porque sobre esta incide, por um lado, o passado de vários séculos como uma sociedade de Estados soberanos, ainda presente em grande medida na atualidade.

Mas, também, por outro lado, as mudanças experimentadas a partir da Primeira Guerra Mundial e que têm sido acentuadas na Era das Nações Unidas (1945), orientam para outras finalidades.

A dinâmica da ordem internacional bem como do direito que a regula passa a enfraquecer a ideia exclusiva de consentimento em diversas situações na realidade internacional. Principalmente, depois do fortalecimento da busca da segurança coletiva pela punibilidade, como por exemplo, com os tribunais penais (TPI e outros), mesmo antes da ONU (1945) quando os Estados começaram a reconhecer o movimento de delegação do consentimento a entidades internacionais tais como os Tribunais.

A delegação da soberania, principalmente, no tocante à ONU demonstra o movimento dos Estados em prol de interesses comuns, em uma estrutura multilateral.

De acordo com Cançado Trindade é possível, com base na análise jurisprudencial e da doutrina internacional contemporânea, entender, in litteris: “o despertar de uma consciência jurídica universal (…), para reconstruir, neste início do século XXI, o Direito Internacional, com base em novo paradigma, já que não mais estatocêntrico, mas situando o ser humano em posição central e tendo presentes os problemas que afetam a humanidade como um todo”.

Enfim, todo novo paradigma pressupõe o fim de um velho paradigma. Ressaltando-se que a evolução do Direito Internacional não é uma ruptura de um paradigma tradicional para um novo, pois ainda não se vislumbra o fim do Direito Internacional na sua forma tradicional.

De todo jeito, há positivamente nova consciência que surge para ser a força contrária ao movimento tradicional da ordem internacional, gerando tensão que sustenta a dinâmica contemporânea do cenário internacional, ora tido com caráter societário e, ora com caráter comunitário.

Enfim, o que torna possível o Direito Internacional é se portar em prol da busca social por valores comuns.

A noção da formação de comunidade no ambiente internacional é enfaticamente refutada por grande gama de jusinternacionalistas. O termo “comunidade” é reconhecido por caracterizar ambiente de formação natural, no q qual se manifestam o prazer, os hábitos comuns, bem como onde se reconhece haver memória que une os indivíduos que pretendem ao grupo e que não se reúnem por uma escolha consciente, mas sim, por cooperação natural.

Os adeptos a existência de uma comunidade internacional defendem a união dos sujeitos, pautados em valores comuns que existiram desde sempre, mas que primordialmente e conscientemente estão cada vez mais bem definidos, desde 1945, com a criação das Nações Unidas e a necessidade de manutenção da paz e da segurança internacional.

Desde as revoluções burguesas, pode-se  perceber a preocupação dos indivíduos em retomar seu papel na sociedade como um todo.

O século XVIII, ainda arraigado do ideal estatal na ordem internacional, já dava sinais da manifestação do indivíduo enquanto senhor de si e protagonista da história, porém muito mais no âmbito interno do que no âmbito internacional.

As revoluções americana e francesa marcaram o pensamento da época encorajando a sociedade a defender a liberdade dos indivíduos acima do poderio estatal. Em decorrência de tais revoluções foi possível estabelecer os direitos liberais, considerados os direitos de primeira geração do tardio direitos humanos, mas principalmente marcando o início do pensamento dos direitos fundamentais, isto é, do âmbito interno.

Teorias sobre as liberdades individuais surgiram no pensamento político da época. A maioria desses pensamentos estava ligada ao âmbito interno.

No entanto, alguns chegaram a serem concluídas no âmbito internacional, isto é, pensadores, como Immanuel Kant, por exemplo, já percebiam que as realizações das liberdades individuais só estariam completas e só fariam sentido se findassem em uma busca para além das fronteiras estatais. Assim, percebe-se que, aos poucos, os valores internos deveriam ser transferidos para o âmbito internacional.

De acordo com Brant, parte-se, portanto, de um direito descentralizado e horizontal para se dirigir na direção de uma analogia com uma Constituição material, definida como um conjunto de valores estruturados de uma determinada sociedade.

Este conjunto normativo, independente das fontes formais e originárias, prevê uma hierarquia de valores a serem protegidos.

Com o aparecimento de novos sistemas normativos, no cenário do direito internacional, regidos por ideais não mais baseados puramente em vontades dos Estados, como por exemplo, o Direito Humanitário, que surge no século XIX, estabelecendo limites às guerras com o fim de torná-las mais digna. É o caso da cláusula Martens. A referida cláusula merece destaque, pois sua trajetória histórica permeia mais de um século.

Foi criada por Friedrich Von Martens, com base no direito natural e em regramentos das forças armadas do Reino Unido e da Escócia datados de 1643 e, apresentada à sociedade internacional na Conferência de Paz de Haia de 1899 e inserida nas convenções de 1899 e de 1907 sobre Direito Humanitário.

A cláusula Martens afirmou: que nos casos não incluídos nos Regulamentos (…), as populações e os beligerantes permanecem sob a proteção e o império dos princípios de direito internacional, tal como resultam dos usos estabelecidos entre as nações civilizadas, pelas leis da humanidade e as exigências da consciência pública. (In: MERON, 2003).

A proposta da cláusula Martens visa estender proteção aos civis e aos combatentes durante as guerras e quaisquer situações de conflito, invocando os princípios do direito internacional, com base nas leis da humanidade e de exigência de consciência pública, que demonstra patamar mínimo de dignidade do ser humano, já existentes na consciência coletiva do mundo ocidental, ou como bem retratado na própria cláusula, das nações civilizadas.

Eis que a adaptação da cláusula Martens a acepção contemporânea, numa reedição nos Protocolos Adicionais da Convenção de Haia, consolidou a noção de princípios da humanidade, ao invés de leis da humanidade, bem como a ideia de ditames de consciência pública, no lugar de exigência de consciência.

Portanto, os princípios da humanidade e os ditames da consciência pública tem sido fatores de restrição da liberdade do Estado para fazer o que não é expressamente proibido por Tratados, Convenções ou costumes.

O que consolida a existência de valores para além da vontade estatal e, que devem restringir a mesma no que diz respeito ao tratamento do indivíduo em tempo de guerra e de paz.

E, tal cláusula deve ter aplicação continuada, se sobressaindo ao longo do tempo, mesmo diante novas situações e dos avanços de tecnologias. Assim, a cláusula Martens continua a servir como advertência contra a suposição de que o que não esteja expressamente proibido pelas Convenções de Direito Internacional Humanitário poderia estar permitido; muito pelo contrário, a cláusula Martens sustenta a aplicabilidade continuada de princípios do direito das gentes, das leis de humanidade e das exigências da consciência pública, independentemente do surgimento de novas situações e do desenvolvimento da tecnologia.

A cláusula Martens[6] impede, assim, o non liquet, e ainda exerce relevante papel na hermenêutica e aplicação da normativa humanitária.

Ressalte-se que a cláusula Martens é considerada como fonte material principal do Direito Humanitário e, está, inegavelmente, dentro do domínio do jus cogens, ou seja, seu alcance está para além do próprio Direito Humanitário, sendo esta afirmada a favor de todo ser humano dentro do Direito Internacional geral.

Identificamos que a sociedade internacional está em construção e que o grau de vínculo existente entre os sujeitos do Direito Internacional que há muito preocupa os estudiosos do tema, até em razão de grau insignificantes, não haveria de se cogitar em direito para regular as condutas entre estes. Com o surgimento do Direito Internacional, com o advento do Estado moderno, nota-se que nível de relacionamento internacional denota a premente necessidade de regulação.

O Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) tem como base fundamental a Declaração Universal dos Direitos Humanos adotada e proclamada pela Resolução 217 A da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948.

Observa-se que o Direito Internacional é capaz de servir e legitimar diferentes aspectos da ordem social, como por exemplo, defender a prevalência da vontade particular de uma potência mundial, em detrimento de nação hipossuficiente, mas também, esse direito é capaz de criar condições mais igualitárias para todos as nações, afirmando os princípios superiores às vontades particulares, consagrando-se, finalmente, como um complexo e denso paradoxo.

Naturalmente que foi o enfraquecimento da figura do Estado que fez com que a dinâmica da sociedade internacional evoluísse para nova perspectiva sob a qual não mais se vislumbra a intensa necessidade de reforçar as condições de manutenção do status quo desses entes coo sento os únicos a comandar e reger o sistema internacional.

A globalização do capitalismo faz com que o poder não esteja mais disponível apenas de quem detém o controle do território. Ou seja, os governantes não mais possuem o controle e a submissão da população em suas mãos e não são os únicos nem os mais importantes, pois, já não é mais o Estado o único ente capaz de fortalecer

a economia e garantir a segurança aos indivíduos.  O surgimento de novos Estados, os fatos decorrentes dos desajustes de uma  sociedade internacional pautada exclusivamente na soberania, como as guerras e o incremento da cooperação pacífica

para atingir certos interesses comuns de atores internacionais, fizeram com que junto a essa sociedade internacional passasse a subsistir um novo ambiente de relações  entre os Estados, qual seja, a comunidade internacional, na qual novas regras de direito internacional serão contempladas a fim de regular as ações comuns, pautadas em valores também comuns a todos os sujeitos nela envolvidos.

A comunidade internacional é hoje um grupo social em transição, porque sobre esta incide, por um lado, o passado de vários séculos como uma sociedade de Estados soberanos, ainda presente em grande medida na atualidade.

Mas, também, por outro lado, as mudanças experimentadas a partir da Primeira Guerra Mundial e que têm sido acentuadas na Era das Nações Unidas (1945), orientam para outras finalidades.

A dinâmica da ordem internacional bem como do direito que a regula passa a enfraquecer a ideia exclusiva de consentimento em diversas situações na realidade internacional.

Principalmente, depois do fortalecimento da busca da segurança coletiva pela punibilidade, como por exemplo, com os tribunais penais (TPI e outros), mesmo antes da ONU (1945) quando os Estados começaram a reconhecer o movimento de delegação do consentimento a entidades internacionais tais como os Tribunais. A delegação da soberania, principalmente, no tocante à ONU demonstra o movimento dos Estados em prol de interesses comuns, em uma estrutura multilateral.

De acordo com Cançado Trindade é possível, com base na análise jurisprudencial e da doutrina internacional contemporânea, entender, in litteris:

“o despertar de uma consciência jurídica universal (…), para reconstruir, neste início do século XXI, o Direito Internacional, com base em novo paradigma, já que não mais estatocêntrico, mas situando o ser humano em posição central e tendo presentes os problemas que afetam a humanidade como um todo”.

Enfim, todo novo paradigma pressupõe o fim de um velho paradigma. Ressaltando-se que a evolução do Direito Internacional não é uma ruptura de um paradigma tradicional para um novo, pois ainda não se vislumbra o fim do Direito Internacional na sua forma tradicional.

De todo jeito, há positivamente nova consciência que surge para ser a força contrária ao movimento tradicional da ordem internacional, gerando tensão que sustenta a dinâmica contemporânea do cenário internacional, ora tido com caráter societário e, ora com caráter comunitário.

Enfim, o que torna possível o Direito Internacional é se portar em prol da busca social por valores comuns.

A noção da formação de comunidade no ambiente internacional é enfaticamente refutada por grande gama de jusinternacionalistas. O termo “comunidade” é reconhecido por caracterizar ambiente de formação natural, no qual se manifestam o prazer, os hábitos comuns, bem como onde se reconhece haver memória que une os indivíduos que pertencem ao grupo e que não se reúnem por uma escolha consciente, mas sim, por cooperação natural.

Os adeptos a existência de uma comunidade internacional defendem a união dos sujeitos, pautados em valores comuns que existiram desde sempre, mas que primordialmente e conscientemente estão cada vez mais bem definidos, desde 1945, com a criação das Nações Unidas e a necessidade de manutenção da paz e da segurança internacional.

Desde as revoluções burguesas, pode-se  perceber a preocupação dos indivíduos em retomar seu papel na sociedade como um todo.

O século XVIII, ainda arraigado do ideal estatal na ordem internacional, já dava sinais da manifestação do indivíduo enquanto senhor de si e protagonista da história, porém muito mais no âmbito interno do que no âmbito internacional.

As revoluções americana e francesa marcaram o pensamento da época encorajando a sociedade a defender a liberdade dos indivíduos acima do poderio estatal. Em decorrência de tais revoluções foi possível estabelecer os direitos liberais, considerados os direitos de primeira geração do tardio direitos humanos, mas principalmente marcando o início do pensamento dos direitos fundamentais, isto é, do âmbito interno.

Teorias sobre as liberdades individuais surgiram no pensamento político da época. A maioria desses pensamentos estava ligada ao âmbito interno. No entanto, alguns chegaram a serem concluídos no âmbito internacional, isto é, pensadores, como Immanuel Kant, por exemplo, já percebiam que as realizações das liberdades individuais só estariam completas e, só fariam sentido se findassem em uma busca para além das fronteiras estatais. Assim, percebe-se que, aos poucos, os valores internos deveriam ser transferidos para o âmbito internacional.

De acordo com Brant, parte-se, portanto, de um direito descentralizado e horizontal para se dirigir na direção de uma analogia com uma Constituição material, definida como um conjunto de valores estruturados de uma determinada sociedade. Este conjunto normativo, independente das fontes formais e originárias, prevê uma hierarquia de valores a serem protegidos.

Com o aparecimento de novos sistemas normativos, no cenário do direito internacional, regidos por ideais não mais baseados puramente em vontades dos Estados, como por exemplo, o Direito Humanitário, que surge no século XIX, estabelecendo limites às guerras com o fim de torná-las mais digna. É o caso da cláusula Martens.

A referida cláusula merece destaque, pois sua trajetória histórica permeia mais de um século. Foi criada por Fredrich Von Martens, com base no direito natural e em regramentos das forças armadas do Reino Unido e da Escócia datados de 1643 e, apresentada à sociedade internacional na Conferência de Paz de Haia de 1899 e inserida nas convenções de 1899 e de 1907 sobre Direito Humanitário.

A cláusula Martens afirmou: que nos casos não incluídos nos Regulamentos (…), as populações e os beligerantes permanecem sob a proteção e o império dos princípios de direito internacional, tal como resultam dos usos estabelecidos entre as nações civilizadas, pelas leis da humanidade e as exigências da consciência pública. (In: MERON, 2003).

A proposta da cláusula Martens visa estender proteção aos civis e aos combatentes durante as guerras e quaisquer situações de conflito, invocando os princípios do direito internacional, com base nas leis da humanidade e de exigência de consciência pública, que demonstra patamar mínimo de dignidade do ser humano, já existentes na consciência coletiva do mundo ocidental, ou como bem retratado na própria cláusula, das nações civilizadas.

Eis que a adaptação da cláusula Martens a acepção contemporânea, numa reedição nos Protocolos

Adicionais da Convenção de Haia, consolidou a noção de princípios da humanidade, ao invés de leis da humanidade, bem como a ideia de ditames de consciência pública, no lugar de exigência de consciência.

Portanto, os princípios da humanidade e os ditames da consciência pública tem sido fatores de restrição da liberdade do Estado para fazer o que não é expressamente proibido por Tratados, Convenções ou costumes.

O que consolida a existência de valores para além da vontade estatal e, que devem restringir a mesma no que diz respeito ao tratamento do indivíduo em tempo de guerra e de paz.

E, tal cláusula deve ter aplicação continuada, se sobressaindo ao longo do tempo, mesmo diante novas situações e dos avanços de tecnologias. Assim, a cláusula Martens continua a servir como advertência contra a suposição de que o que não esteja expressamente proibido pelas Convenções de Direito Internacional Humanitário poderia estar permitido; muito pelo contrário, a cláusula Martens sustenta a aplicabilidade continuada de princípios do direito d as gentes, das leis de humanidade e das exigências da consciência pública, independentemente do surgimento de novas situações e do desenvolvimento da tecnologia.

A cláusula Martens impede, assim, o non liquet, e ainda exerce relevante papel na hermenêutica e aplicação da normativa humanitária.

Ressalte-se que a cláusula Martens é considerada como fonte material principal do Direito Humanitário e, está, inegavelmente,

dentro do domínio do jus cogens, ou seja, seu alcance está para além do próprio Direito Humanitário, sendo esta afirmada a favor de todo ser humano dentro do Direito Internacional geral.

Na década de 1990 em face, por um lado, do fenômeno da supranacionalidade na União Europeia e, por outro, do fortalecimento da sociedade civil internacional, alguns doutrinadores passem a apontar a existência da uma comunidade internacional, que abrangeria não apenas os Estados e as Organizações Internacionais, mas também os demais entes que influenciam o cenário internacional (como por exemplo os indivíduos, a sociedade civil internacional e entes que não se enquadram tão facilmente em classificações existentes, como era o caso da União Europeia antes do tratado de Lisboa quando passou a ser uma organização internacional).

De toda forma, verifica-se que o Direito Internacional contemporâneo reflete alguns objetivos e valores compartilhados, que, embora não estabeleçam um sistema axiológico uníssono e completo, permite, ao menos, dizer que há uma sociedade internacional em construção.

São exemplos que ilustram tal afirmação as normas de jus cogens e a primazia da teoria do constitucionalismo sobre a teoria da fragmentação internacional.

Doutrinariamente a noção de jus cogens é aceita tanto individual quanto coletivamente. Vários autores, ainda que questionem alguns tópicos relativos à aplicação das normas de jus cogens (como Dominique Carreau e George Schwarzenberg) aceitam sua existência, e o Instituto de Direito Internacional destacou o tema ao aprovar, em 1983, uma resolução acerca da impossibilidade de extradição

caso haja suspeita de violação de uma norma de jus cogens (como por exemplo em caso de suspeita de tortura ou perseguição em função de raça, religião ou etnia).

Já na jurisprudência internacional a existência (e relevância) do jus cogens é encontrada em vários julgados como parte da argumentação, como por exemplo nos casos: (i) North Sea Continental Shelf julgado pela Corte Internacional de Justiça em que se afirmar – nos votos dissidentes e em separado – que reservas opostas contra normas imperativas são inadmissíveis, (ii) Tadić e Furundžija do Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia, em que se determinou que as normas de jus cogens são oponíveis também ao Conselho de Segurança e que possuem efeitos impedientes (deterrent effect) além de representarem os “most fundamentals standards of the international community”, respectivamente (iii) Michael Dominguez em que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (que embora não seja um tribunal integra o sistema interamericano de proteção dos direitos humanos e é parte do sistema de solução de controvérsias deste; sendo essencial sobretudo nos casos contra Estados que não tenham aceito a competência e jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos, como, por exemplo, os Estados Unidos que são a parte contrária no caso mencionado) reconhece e aplica a noção de jus cogens44, e (iv) Al Barakat na Corte de Primeira Instância e na Corte Europeia de Justiça, em que se debate a extensão e o conteúdo do jus cogens e se reafirma a submissão do Conselho de Segurança da ONU.

 

O grande desafio da aplicação do jus cogens atualmente é a definição de seu conteúdo. Contudo, apesar de não haver um rol amplo de normas consideradas unanimemente como imperativas, já existe o que se poderia chamar de um “mínimo denominador comum”, com cinco grandes temas que são consensualmente entendidos como jus cogens.

São eles: 1) a proibição do genocídio, 2) a proibição da escravidão, 3) a proibição da tortura, 4) a proibição da pirataria, e 5) algumas normas sobre o uso da força no cenário internacional46.

Nota-se que as três primeiras se relacionam à dignidade humana – base dos direitos humanos, um novo valor da sociedade internacional. A proibição à pirataria resgata um tema tradicional do Direito Internacional (o mar) e relaciona-se com o uso da força, que é, por sua vez, tema inerente ao novo sistema regulatório trazido pela ONU e base essencial do Direito Internacional atual47.

Quanto ao uso da força vale destacar que seriam normas de jus cogens a legítima defesa  (consagrada no artigo 51 da Carta da ONU), a não-intervenção (artigo 2, 7 da Carta da ONU) e o não uso da força nas relações internacionais (artigo 2,4 do mesmo documento).

Além disso, algumas normas do Direito Internacional Humanitário (como a distinção entre civis e militares e regras sobre prisioneiros de guerra), sobretudo as presentes nas quatro Convenções de Genebra de 1949 também são imperativas (e a decisão do presidente dos Estados Unidos – Barack Obama – de fechar a prisão de Guantánamo – ainda que não em um prazo curto como se esperava – demonstra a revalorização destas normas).

A existência de jus cogens denota, assim, a existência de valores e interesse compartilhados internacionalmente, o que permite que se defenda tanto a existência de uma sociedade internacional em construção quanto um fundamento de Direito Internacional baseado em critérios axiológicos, a estas normas.

Como explica o professor português Jorge Miranda (2012), no âmbito internacional[o] desenvolvimento do jus cogens tem como pano de fundo alguns fatores ou tendências nem sempre coincidentes: a nova consciência do primado dos direitos das pessoas, após os cataclismos provocados pelos regimes totalitários e pela Segunda Guerra Mundial; as novas exigências de paz e de segurança coletiva e a crise de soberania; a ideia de autodeterminação dos povos e o aparecimento de novos Estados empenhados em refazer a ordem internacional; e o impulso dado pela ciência internacionalista (MIRANDA, 2012).

No entanto, o jus cogens só aparece como se conhece atualmente em 1963, com Humphrey Waldock na relatoria da CDI.” Jus cogens” significa uma norma peremptória do direito internacional geral, da qual nenhuma derrogação é permitida exceto em uma situação especificamente sancionada pelo direito internacional geral, e que pode ser modificada ou anulada apenas por uma ulterior norma de direito internacional geral (ONU, 1963b, p. 39).

Destacamos que a corrente humanista é, sem dúvida, uma das mais recentes doutrinas sobre o fundamento do direito internacional e, cujas bases prostam-se no jusnaturalismo.

Assim, a corrente humanista de pensamento se situa dentro do Renascimento do direito natural, movimento que é uma outra reação contra o positivismo clássico.  Sendo considerada como corrente antipositivista e idealista. E, que se lastreia na premência em se lutar contra os efeitos nefastos da anarquia das soberanias estatais.

Os derradeiros fatos presenciados nesse último século já marcaram de tal forma as concepções de tantos juristas, doutrinadores tanto do direito como da filosofia que foram capazes de consolidar novas tendências na contemporaneidade.

E, nesse sentido, nos esclarece Trindade, in litteris:

” A convivência constante, como Juiz de um tribunal internacional de direitos humanos, com os relatos comprovados de sucessivas atrocidades e abusos praticados contra a pessoa humana, nos casos submetidos ao conhecimento do Tribunal interamericano, convivência esta, refletida em mais de uma centena de sentenças internacionais de cuja elaboração e adoção tenho tido privilégio de participar ativamente, tem reforçado minha convicção quanto à premente necessidade de sustentar e promover o atual processo histórico de humanização do Direito Internacional e de buscar a consolidação do novo jus gentium do século XXI.”

Lembremos que para o grande filósofo Immanuel Kant, o Direito Internacional cuja evolução atinge seu ápice no direito cosmopolita, carrega como princípio basilar a autonomia da pessoa humana para a corrente humanista, o Direito Internacional é, e deve ser, um instrumento de garantia da dignidade da pessoa humana. Com a merecida ressalva que tanto a autonomia como a dignidade da pessoa humana são dois dos três princípios fundamentais dos Direitos Humanos.

 

Referências

BBC NEWS. Brasil. Rússia x Ucrânia: os desdobramentos da crise e o alerta da Casa Branca sobre possível invasão. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-60355992 Acesso em 13.02.20222.

BRANT, Leonardo Nemer C. A Autoridade da Coisa Julgada no Direito Internacional Público. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

________________________. Comentário à Carta das Nações Unidas. Belo Horizonte: CEDIN, 2008.

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[1] Os contemporâneos problemas que o Direito Internacional enfrenta relacionam-se com os pontos pertencentes a uma compreensão sobre a formação de comunidade universal. Que são questões já aventadas por grandes mestres da Escola Ibérica da Paz, do século XVI e XVII. Cumpre destacar ainda os valorosos estudos da Escola de Salamanca, especialmente, as contribuições de Francisco de Vitória e Francisco Suárez. As principais contribuições conceituais aportadas pela Escola de Salamanca como  fundamentação para o desenvolvimento da paz e justiça entre as nações, por meio de confrontações das noções  de razão da humanidade e razão do Estado, com vias à compreensão da comunidade universal.

[2] Quando do final da URSS, em 1991, os presidentes da Rússia, Ucrânia e Bielorrússia tentaram criar uma nova organização que, respeitando a independência política de cada uma, mantivesse o funcionamento da economia dos países. Assim surgiu a CEI, Comunidade dos Estados Independentes, que enveredava pelo sistema econômico capitalista. Essa organização recebeu a adesão relativamente rápida das outras repúblicas, compondo 12 países no final de 1993. É claro que o sucesso da CEI dependia muito do crescimento econômico da Rússia, entretanto não foi isso que se observou. No campo político, ocorreu a agitação dos movimentos nacionalistas, com conflitos generalizados na Geórgia, guerra civil no Tajiquistão e o conflito entre Armênia e Azerbaijão por territórios com minorias étnicas de ambos os grupos. Esses problemas ainda persistem hoje, mas foram suplantados por um problema mais sério: a crise econômica.

[3] A Paz de Westfália foi um acontecimento histórico marcado pela assinatura de dois tratados de paz nas cidades alemãs de Münster e Osnabrück, em 1648, e que colocou fim a Guerra dos Trinta Anos (1618 – 1648). Para lembrar, a Guerra dos Trinta Ano Para lembrar, a Guerra dos Trinta Anos marcou o século XVII como um dos conflitos mais sangrentos da história. As principais motivações da guerra foram as questões religiosas, que tiveram seu ápice com a Reforma Protestante. Em 1648, a Europa estava devastada, marcada pelos últimos 30 anos, assim a Paz de Westfália foi importante para determinar o fim do conflito, instaurar a paz e estabelecer uma nova ordem mundial marcou o século XVII como um dos conflitos mais sangrentos da história.

[4] A eminente invasão da Ucrânia pela Rússia nos traz um conceito de guerra híbrida que foi um conceito utilizado em primeira vez no início do anos 2000, relaciona-se com a implementação de estratégia de enfrentamento que não passa obrigatoriamente por um combate militar. Afinal, um país pode usar meios que prejudiquem a segurança e estabilidade de outro país. E, nem sempre são meios militares, é o caso de ataques cibernéticos ou o lançamento de onda massiva de tuítes que vão contra a posição de determinado governo. É a isso que chamamos de guerra híbrida. Também usam a insurgência das fake news e, a  desinformação que impulsiona a propaganda e a provocação como papel fundamental. “Agora, as guerras são mais assimétricas, com outros atores envolvidos”, diz ele. Outra diferença entre a guerra híbrida e a guerra tradicional é que é difícil saber quando a primeira começa.  Na guerra tradicional, geralmente um país declara guerra a outro. Mas nesses casos, a dinâmica não é a mesma.

[5] A questão da Crimeia é um revés geopolítico gerado pela invasão e anexação da Crimeia pela Rússia. Tal situação ocorreu no ano de 2014 e gera consequências político-militares até a atualidade, como a crise entre Ucrânia e Rússia em 2022. A Crimeia, antes república autônoma, era uma região da Ucrânia, mas que sempre teve fortes vínculos com a Rússia. A sua ocupação pelos russos gerou grande tensão, que abrangeu toda a Europa. As motivações de invasão e anexação da Crimeia pela Rússia envolvem questões históricas, políticas, econômicas e culturais. Essa região apresenta importância geoestratégica em áreas comerciais e militares. A crise da Crimeia perdura até hoje, com a Ucrânia defendendo a posição de que essa região é parte de seu território, enquanto a Rússia argumenta que a anexação da Crimeia foi feita legalmente, mediante a realização de um contestável plebiscito entre a população local.

[6] A Cláusula de Martens afirma textualmente: Nos casos não previstos nas disposições escritas do Direito Internacional, as pessoas civis e os combatentes ficam sob a proteção e o regime dos princípios do direito de gentes, derivados dos usos estabelecidos, dos princípios de humanidade e dos ditames da consciência.