Arbitragem: um instituto calcado na autonomia da vontade

* Enéas Castilho Chiarini Júnior

1.0 – Introdução

É de conhecimento geral que o processo judicial, não só em nosso país, é excessivamente lento e caro, de forma a descontentar a grande maioria dos indivíduos que se vêem na necessidade de se socorrer de processo judicial para solucionar seus problemas.

Tal lentidão é fruto da modernização do Estado e sua conseqüente aumenta de demanda judicial, além da crescente conscientização da população quanto aos seus direitos de cidadão, o que aumentou o número de processos judiciais sem o necessário aumento e modernização do Poder Judiciário.

Deste contexto surge a necessidade de se buscar alternativas, rápidas, baratas e funcionais na solução de controvérsias.

Desta necessidade nasce a arbitragem, instituto que, contemporaneamente, ganha forças em todo o mundo globalizado.

No Brasil é editada a Lei nº 9.307/96 que, de forma definitiva, acolhe o instituto – o qual já era previsto em nosso ordenamento desde 1817.

Apesar disso, existem aqueles que, por desconhecimento do instituto, temem o processo arbitral, procurando evitá-lo ao máximo.

Assim, o presente trabalho pretende contribuir para a divulgação do instituto da arbitragem, na medida em que apresenta sua íntima ligação com o princípio da autonomia da vontade.

Busca-se, assim, demonstrar que a Arbitragem é decorrente da vontade das partes, e que estas, no processo arbitral, ao contrário do procedimento estatal, tudo podem. Podem escolher quem irá decidir a questão, o prazo máximo para a promulgação da sentença, e, até mesmo quais as regras de direito que serão aplicadas ao problema.

2.0 – Conceitos

Para a elaboração de um trabalho o qual se deseja compreensível, torna-se imperiosa a conceituação de seus objetos, razão pela qual o presente trabalho inicia a conceituação do instituto da arbitragem, e do princípio da autonomia da vontade, os quais são temas centrais do presente trabalho.

2.1 – Arbitragem

4font face="Arial" size="2">No Brasil, a arbitragem é regulada pela Lei nº 9307/96 a qual não traz uma definição do que seja a arbitragem, sendo necessário recorrer-se à doutrina para a sua definição.

Para Jarrosson apud Bosco Lee e Valença Filho: “A arbitragem é a instituição pela qual um terceiro resolve o litígio que opõem duas ou mais partes, exercendo a missão jurisdicional que lhe é conferida pelas partes.” (Op. cit., pág. 19).

Outra definição trazida pelos mesmos autores é a de Irineu Strenger, para quem:” Arbitragem é instância jurisdicional praticada em função de regime contratualmente estabelecido, para dirimir controvérsias entre pessoas de direito privado e/ou público, com procedimentos próprios e força executória perante tribunais estatais.” (Op. cit., pág. 20).

A arbitragem pode ser, portanto, conceituada como sendo um método extrajudicial de solução de controvérsias, onde as partes pactuam, previamente, no sentido de que a controvérsia seja decidida por pessoa – ou pessoas – neutra, imparcial, escolhida de comum acordo, e conhecedora da matéria a ser decidida, através de um processo jurídico não-estatal – menos formal que o processo estatal – e sigiloso, cuja decisão final, além de não desafiar recursos – exceto por vícios formais, nunca pelo mérito da decisão -, possui força executiva judicial.

A arbitragem possui uma natureza jurídica mista. É privada pela sua origem em um pacto de vontades, e é, ao mesmo tempo, pública pela sua função jurisdicional.

2.2 – Autonomia da vontade

A autonomia da vontade é um princípio (No sentido apresentado por Robert Alexy onde os princípios se diferenciam das regras na medida em que aqueles podem ter maior, ou menor, aplicação de acordo com o caso concreto, enquanto que estas somente podem ser aplicáveis, ou não-aplicáveis) do direito obrigacional, e que é um dos fundamentos da arbitragem.

Pode ser apresentado como corolário do direito de liberdade, segundo o qual as partes são livres para pactuarem como quiserem (desde que respeitados alguns limites mínimos, conforme se verá adiante).

Outro princípio relacionado com o da autonomia da vontade é o princípio do pacta sunt servanda, de modo que as partes são livres para acordarem o que quiserem, e, justamente por isso, o contratado deve ser cumprido. Ou, dizendo de forma diferente, a autonomia da vontade somente existe porque o que for pactuado será cumprido, mesmo que a força.

Pode-se, assim, conceituar-se o princípio da autonomia da vontade como sendo a possibilidade de, em certos casos autorizados por lei – direitos disponíveis -, as partes convencionarem, livremente, o que lhes aprouver a cerca de seus direitos e deveres, de maneira que, o que for pactuado será juridicamente exigível, ou, não sendo a exigibilidade possível, dará ao credor a possibilidade de pedir indenização por perdas e danos decorrentes do não cumprimento da obrigação convencionada.

3.0 – Arbitragem & Autonomia da vontade

O instituto da arbitragem está intimamente ligado ao princípio da autonomia da vontade, podendo-se dizer, a exemplo de Bosco Lee e Valença Filho (Op. cit.. pág. 21), que o princípio da autonomia da vontade está onipresente no instituto da arbitragem.

Esta relação existe, em primeiro lugar, pelo fato de que, somente será estabelecido o procedimento arbitral se ambas as partes pactuarem neste sentido.

É o que se depreende da leitura do artigo 1º da Lei da Arbitragem (Lei nº 9307/96), que afirma que “as pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios…” [grifei].

Uma vez que a lei afirma que as partes “poderão” recorrer à arbitragem, ela torna este procedimento não obrigatório, e, sendo, portanto, facultativo, ambas as partes devem estar de acordo com a instauração do procedimento arbitral.

Outra razão para que o procedimento arbitral deva ser convencionado pelas partes reside no inciso XXXV do artigo 5º da Constituição Federal, segundo o qual “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

Por este dispositivo constitucional pode-se, inclusive, pugnar-se pela inconstitucionalidade da Lei de Arbitragem, no sentido de que a decisão da controvérsia deveria ser tomada, exclusivamente, pelo Poder Judiciário.

Tal raciocínio, porém, utiliza o que os estudiosos da lógica chamam de argumento a contrário, o que, do ponto de vista lógico, é inconcebível.

Se a Constituição diz que o acesso ao Judiciário não será excluído, não está dizendo, como querem alguns, que a resolução do conflito passe, obrigatoriamente, por este Poder.

O que a Constituição afirma é que, caso seja de interesse da parte, esta poderá recorrer ao judiciário, afirmação esta que não é, de forma alguma, incompatível com a Lei nº 9307/96, uma vez que esta condiciona a instauração do procedimento arbitral à anuência de ambas as partes, ao dizer que: “as partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de arbitragem…” (artigo 3º) [grifei].

A autorização para se evitar o Poder Judiciário explica-se pelo fato de que somente poderão ser dirigidos ao procedimento arbitral os litígios que tratem de direito patrimonial disponível, conforme expresso no artigo 1º da Lei.

Interessante notar-se também que: “…a competência do árbitro é de origem eminentemente contratual, visto ter a arbitragem um fundamento convencional: “o poder de julgar reconhecido aos árbitros nasce de um acordo de vontades”. Mediante uma convenção abitral, as partes submetem a resolução do litígio a um tribunal arbitral e, por conseqüência, afastam a competência da jurisdição estatal, que, de outro modo seria compulsória. Neste sentido se manifesta o Prof. Francisco Cláudio santos: ‘A nova lei brasileira (Lei nº 9.307/96), orientada para privilegiar a vontade da parte, dá realce a esta vertente significativa da liberdade, que é a(autonomia da voftade…” (Boco Lee e Valença Filho, op. cit., pág. 22).

O princípio da autonomia da vontade permeia o instituto da arbitragem ao permitir que as partes designem: o modo pelo qual o tribunal arbitral será constituído, as pessoas que ocuparão a posição de árbitros, as regras de direito a serem aplicadas no procedimento arbitral, o prazo para que a sentença seja proferida.

Outro exemplo da autonomia das vontades reside no fato de que, enquanto no procedimento judicial estatal as partes não podem, de forma alguma, escolherem quem será o juiz a decidir a causa, na arbitragem ocorre exatamente o oposto, ou seja, somente terá poderes para decidir a questão aquele – ou aqueles, caso existam mais de um árbitro – a quem as partes delegarem poderes para tanto.

3.1 – A autonomia da vontade na Lei nº 9307/96

São exemplos da presença expressa do princípio da autonomia da vontade na lei arbitral, os artigos 1º, 2º, 3º, 5º, 6º, 8º, 9º, 11, 13 e 23.

O artigo 1º, como já citado, afirma que as partes, desde que capazes de contratar, poderão valer-se da arbitragem para solucionar seus litígios que tenham, como problema central, direitos patrimoniais disponíveis.

No artigo 2º, a lei abre a possibilidade de as partes escolherem, livremente, as regras de direito que serão aplicadas à arbitragem, ou, se a arbitragem será julgada por critérios de eqüidade (Segundo Celso Ribeiro Bastos in Curso de direito financeiro e de direito tributário, pág. 189, a eqüidade “..é uma apreciação subjetiva, cujo critério reside no senso de justiça. O Código de Processo Civil de 1939, no seu art. 114, conceituava a eqüidade nos seguintes termos: ‘Quando autorizado a decidir por eqüidade, o juiz aplicará a norma que estabeleceria se fosse legislador.’"). É importante ressaltar que o resultado prático desta possibilidade não pode ferir a ordem pública e/ou os bons costumes.

Pelo artigo 3º as partes podem optar pela arbitragem em convenção de arbitragem, que pode ser, segundo o mesmo artigo, a Cláusula Compromissória, ou o Compromisso Arbitral (aquela é uma cláusula contratual onde as partes se comprometem a submeter controvérsia futura ao procedimento arbitral – artigo 4º da lei -, e este é o contrato, posterior à controvérsia, em que as partes decidem utilizar da arbitragem como meio de solucionar o litígio – artigo 9º da lei).

No artigo 5º existe a possibilidade de as partes decidirem qual será o “órgão” que arbitrará a sentença, se uma instituição arbitral permanente, ou se um tribunal arbitral ad hoc (Observe-se que a utilização da expressão “Tribunal Arbitral ad hoc” não é correta, uma vez que todo Tribunal Arbitral é, necessariamente, ad hoc, ou seja todo tribunal arbitral é constituído para a solução do litígio em questão, e, uma vez realizado o julgamento, o tribunal é extinto, deixando de existir. A expressão é aqui utilizada, apenas para diferenciar as instituições que possuem um quadro de árbitros, cujos serviços arbitrais poderão ser contratados, dos tribunais montados exclusivamente para solução de um litígio. Ou seja, o indivíduo convocado para atuar como árbitro NÃO É arbitro, ele PERMANECE árbitro enquanto existir o tribunal arbitral, sendo correta a afirmação de que “eu não SOU árbitro, eu ESTOU árbitro”. Interessante notar, como fizeram Bosco Lee e Valença Filho (op. cit., pág. 28) que: “…o juiz exerce a função jurisdicional de forma vitalícia; seguindo a carreira da magistratura. A missão do árbitro, em contrapeso, é efêmera, não permanecendo o árbitro nesta condição para além do processo ao qual ele foi designado.”), instituído, única e exclusivamente, para o julgamento de um caso concreto e específico.

O artigo 6º explicita que deverá haver acordo prévio quanto à forma de instituição da arbitragem.

Pelo artigo 8º fica a cláusula compromissória considerada de forma autônoma em relação ao contrato que a contém. É mais um exemplo da presença do princípio da autonomia da vontade, uma vez que, tendo as partes pactuado pela preferência do procedimento arbitral, este desejo prevalece inalterável, mesmo que o contrato seja considerado nulo. Ou seja, mesmo que o contrato contenha algum vício que o anule, o desejo das partes de se socorrerem pelo processo da arbitragem deverá ser respeitado.

O artigo 9º define o compromisso arbitral como sendo uma convenção, ou seja, fruto da vontade das partes.

Já o artigo 11 apresenta, em seus seis incisos, alguns aspectos que poderão ser convencionados livremente pelas partes.

O artigo 13, por sua vez, autoriza às partes a escolherem, livremente, o árbitro, de forma que este poderá ser “…qualquer pessoa capaz e que tenha a confiança das partes.”

Por fim, o artigo 23 autoriza as partes a estipularem, livremente o prazo em que a sentença deverá ser proferida.

3.2 – Limites à autonomia da vontade

A autonomia da vontade, como todos os outros direitos fundamentais, não é absoluto, sofrendo limitações de ordem pública.

A primeira limitação é quanto a capacidade das partes, de sorte que o incapaz não possui autonomia da vontade necessária para decidir se quer, ou não, submeter seu litígio à arbitragem.

A autonomia da vontade é limitada, sobretudo quando se trata de questões de direitos indisponíveis, como por exemplo os de Direito Tributário, Direito Penal, Direito de Família e Sucessão, além, é claro e principalmente, dos Direitos Fundamentais.

3.2.1 – Direitos Disponíveis e Direitos Indisponíveis

“Mas o que é um direito disponível? Para Patrice Level, um direito é disponível quando está ‘sob o total domínio de seu titular, de tal modo que este pode fazer tudo em relação a aquele, principalmente alienar, e mesmo renunciar’. O critério da livre disponibilidade é na verdade de difícil apreensão. Todavia, segundo o direito brasileiro de arbitragem, o caráter patrimonial da relação litigiosa delimita a disponibilidade do direito e, por conseqüência, a abitrabilidade da matéria.” ( João Bosco Lee e Clávio de Melo Valença Filho, op. cit. pág. 62)

A contrario sensu, direito indisponível é aquele do qual não se pode dispor, ou para o qual a Lei impõe restrições de disponibilidade.

3.2.2 – Direito Tributário

O Direito Tributário, por tratar de direitos do Estado, indisponíveis por natureza, não pode, jamais, ser resolvido por meio da arbitragem.

Primeiro por que a arbitragem é um instituto que depende da vontade das partes, e o Estado não “desejou” que litígios referentes a tais direitos pudessem ser resolvidos pela arbitragem.

Segundo por que, por se tratarem de direitos do Estado são de interesse da coletividade, não existindo quem possua legitimidade para julgar tais direitos pela via arbitral.

3.2.3 – Direito Penal

O Direito Penal, é o direito público por excelência.

Intimamente ligado aos Direitos Fundamentais, não existe possibilidade de decisão acerca de direito penal que possa ser resolvida através da arbitragem, mesmo porque, trata-se de questão de interesse estatal, e, assim como o Direito Tributário, não existe legitimidade para que pessoas não-ligadas ao Poder Judiciário pudessem solucionar problemas relacionados ao Direito Penal.

Por outro lado, ainda, em muitos casos – ação penal pública incondicionada – é impossível, até mesmo para o Estado, abrir mão do direito de punir.

3.2.4 – Direito de Família e Sucessões

O direito de família e o direito das sucessões, em regra (afirmo que o direito de família é em regra indisponível pois, através da adoção, direitos de família como o de filiação, de paternidade e de alimentos tornam-se disponíveis, assim como direitos sucessórios também são, de certa forma disponíveis, uma vez que é possível ao sucesso rejeitar a herança a que teria direito), também é indisponível.

A indisponibilidade de tais direitos decorre do caráter de direito fundamental que possuem o direito de família e o direito de sucessão.

Os direitos de família são fundamentais, pois todo indivíduo possui direito à ter um pai e uma mãe, e a pertencer a uma família.

Também o direito das sucessões possui caráter fundamental, uma vez que todo indivíduo possui o direito de herdar o patrimônio de seus ascendentes.

Desse caráter de direito fundamental é que decorre a indisponibilidade dos direitos de família e sucessões, de tal sorte que, nos casos de adoção, é sempre necessário recorrer-se à via judicial para se assegurar a lisura do procedimento de adoção, assim como, no caso de sucessão onde existam menores, é necessário sempre a participação do Ministério Público a velar pelos direitos destes.

3.2.5 – Direitos Fundamentais

Direitos fundamentais são, segundo corrente alemã, direitos humanos reconhecidos pelo direito interno, ou pelo direito internacional, quer seja nas constituições nacionais, quer seja em tratados internacionais (Fábio Konder Comparato, op. cit., pág. 56).

Tais direitos podem ser conceituados da seguinte forma: “Por direitos humanos ou direitos do homem são, modernamente entendidos aqueles direitos fundamentais que o homem possui pelo fato de ser homem, por sua própria natureza humana, pela dignidade que a ela é inerente. São direitos que não resultam de uma concessão da sociedade política. Pelo contrário, são direitos que a sociedade política tem o dever de consagrar e garantir. Este conceito não é absolutamente unânime nas diversas culturas. Contudo, no seu núcleo central, a idéia alcança uma real universalidade no mundo contemporâneo…” (João Baptista Herkenhoff, Gênese dos Direitos Humanos, págs. 30 e 31).

Por serem direitos ligados à dignidade da pessoa humana, estes direitos são tidos, unanimamente, por indisponíveis, chegando-se ao ponto de pugnar-se pela impossibilidade de denúncia de tratados internacionais que tratem de direitos humanos.

“Dado que eles se impõem, pela sua própria natureza, não só aos Poderes Públicos constituídos em cada Estado, como a todos os Estados no plano internacional, e até mesmo ao próprio Poder Constituinte, à Organização das Nações Unidas e a todas as organizações regionais de Estados, é juridicamente inválido suprimir direitos fundamentais, por via de novas regras constitucionais ou convenções internacionais. Uma das conseqüências desse princípio é a proibição de se pôr fim, voluntariamente, à vigência de tratados internacionais de direitos humanos […] Ora, o poder de denunciar uma convenção internacionais só faz sentido quando esta cuida de direitos disponíveis. Em matéria de tratados internacionais de direitos humanos, não há nenhuma possibilidade jurídica de denúncia, ou de cessação convencional da vigência, porque se está diante de direitos indisponíveis e, correlatamente, de deveres insuprimíveis.” (Fábio Konder Comparato, op. cit., págs. 64 e 65).

Ficando, assim, demonstrada a indisponibilidade dos direitos fundamentais, o que implica na indisponibilidade dos direitos de liberdade, e por conseqüência de todo o sistema de Direito Penal, além dos ramos do Direito de Família, e do Direito das Sucessões.

3.2.6 – Direito do Trabalho

O Direito do Trabalho é um caso diferente, onde a indisponibilidade dos direitos trabalhistas, durante a vigência do contrato de trabalho, decorre de sua posição de subordinação na relação de trabalho, de forma que o trabalhador é considerado como hipossuficiente na relação que possui com seu empregador.

Desta hipossuficiência decorre todo o sistema protetivo em favor do trabalhador e esta proteção se justifica na medida em que, num país como o Brasil, existem milhões de desempregados, e, onde a maioria dos trabalhadores recebem uma remuneração que não lhe garante, na maioria das vezes, nem o suficiente para se alimentar dignamente.

Sem esta proteção, seria fácil para que os empregadores impusessem condições, na hora de contratar seus empregados, que acabariam por transformar o trabalhador em escravo (coisa que, mesmo com toda a proteção aos trabalhadores, ainda ocorre em nosso país, para se confirmar tal afirmação basta acompanhar as notícias que são comuns neste sentido).

Porém, o motivo de toda esta proteção, e consequentemente, da indisponibilidade de tais direitos, decorre da fragilidade do empregado enquanto empregado. O que se pretende é, como dito, dar total poder aos empregadores para que façam com os empregados o que bem entenderem.

E, justamente por isso, não se justifica que tal indisponibilidade dos direitos decorrentes da relação de trabalho permaneçam para além do contrato de trabalho.

Assim, a legislação permite que, após o fim da vigência do contrato de trabalho, estes direitos possam ser livremente negociados entre ex-empregado e ex-empregador, de forma que é totalmente compatível a arbitragem e os direitos trabalhistas – apenas frise-se: desde que após o fim do contrato de trabalho -, não existindo óbice para que problemas decorrentes do contrato de trabalho sejam solucionados pela via arbitral.

4.0 – Conclusão

Fica com o presente estudo demonstrado que a arbitragem está ligada à autonomia da vontade de forma indissociável, uma vez que a vontade das partes é condição sine qua non do procedimento arbitral, pois, sem a anuência das partes, estar-se-ia contrariando o disposto no inciso XXXV do artigo 5º da Constituição Federal, o que tornaria o instituto inconstitucional.

Ninguém, ao contrário do que se poderia imaginar, tem nada a perder com a arbitragem, uma vez que o árbitro deve observar o dever de imparcialidade. Nem mesmo os advogados perderiam campo profissional, uma vez que, apesar de não obrigatória a sua presença no procedimento arbitral, sua partacipação é, sem lúvida nenhuma aconselhável. Pelo contrário, abre-se mais um campo de atuação para os profissionais do Direito que poderão ser indicados a atuarem como árbitros.

Deve-se deixar para que o Estado decida apenas as questões ligadas à direitos indisponíveis, para que, assim, diminua o número de processos judiciais, o que acabará por trazer maior celeridade ao Poder Judiciário que poderá, enfim, julgar de forma mais rápida os processos mais urgentes que, via de regra, cuidam, justamente, dos direitos indisponíveis.

Divulgar a arbitragem, e lutar pelo seu fortalecimento no plano nacional é, portanto, dever de cidadania, com o qual todos devem contribuir para que o Poder Judiciário possa cumprir com seu dever constitucional de distribuir justiça aos que dela têm fome e sede.

5.0 – Referências Bibliográficas

ALEXY, Robert. Colisão e ponderação como problema fundamental da dogmática dos direitos fundamentais. Palestra proferida na Fundação Casa Rui Barbosa, Rio de Janeiro em 10.12.98. Tradução informal de Gilmar Ferreira Mendes. Texto distribuído, via internet, pelo próprio tradutor, aos alunos do curso de especialização latu sensu em Direito Constitucional pelo IBDC – Inst. Bras. de Dir. Constitucional – em parceria com a FDSM – Faculdade de Direito do Sul de Minas;

BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito financeiro e de direito tributário. (trechos) 20ª ed., São Paulo: saraiva, 1999;

BEGALLI, Paulo Antônio. Prática forense avançada. 1ª ed., Belho Horizonte: Del Rey, 2001;

BOSCO LEE, João e VALENÇA FILHO, Clávio de Melo. A arbitragem no Brasil. 1ª ed., Programa CACB-BID de fortalecimento da arbitragem e da mediação comercial no Brasil. Brasília: 2001;

CALAIÁCOVO, Juan Luis e CALAIÁCOVO, Cynthia Alexandra. Negociação, mediação e arbitragem. (tradução de Adilson Rodrigues Pires) 1ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1999;

COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2001;

DELGADO, José Augusto. A arbitragem: direito processual da cidadania. in Mediação: métodos de resolução de controvérsias. 1ª ed., São Paulo: LTr, 1999;

HERKENHOFF, João Baptista. Gênese dos Direitos Humanos. 1ª ed., São Paulo: Editora Acadêmica, 1994;

NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Manual da monografia jurídica. 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 1999;

PIETRO DA SILVA, Tânia Braga. Desvendando a arbitragem. in Mediação: métodos de resolução de controvérsias. 1ª ed., São Paulo: LTr, 1999;

SBDA – Sociedade Brasileira para Difusão da Mediação e Arbitragem. Apostila do curso de capacitação em mediação. edição de maio de 2002.

   


Referência  Biográfica

Enéas Castilho Chiarini Júnior:   Advogado; pós-graduando em Direito Constitucional pelo IBDC – Instituto Brasileiro de Direito Constitucional – em parceria com a FDSM – Faculdade de Direito do Sul de Minas; e capacitado para exercer as funções de Mediador e Árbitro pela SBDA – Sociedade Brasileira para Difusão da Mediação e Arbitragem – em convênio com a ACIPA – Associação Comercial e Industrial de Pouso Alegre.

ernyonnet@terra.com.br

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ISSN 1982-386X – Editor Responsável: Prof. Ms. Clovis Brasil Pereira.

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