Acidente aéreo: antecipação de tutela – Dano Moral – caso TAM 293A

DECISÃO :   1º TACiv-SP – Voto do Juiz Relator Rizzatto Nunes, concedendo tutela antecipada, via recurso agravo de instrumento, cuja decisão semostra oportuna eatual, em face dos últimos acidentesaéreos com centenas de vítimas fatais.


*Jurisprudência – LEX nº 180 pg. 79*

VOTO Nº: 293A – julgado em 06.10.1999 – v.u.
AGRV.Nº: 836.448-9
COMARCA: SÃO PAULO
AGTE. : DÉBORA REGINA GONÇALVES TAMIELLO (E P/S/FILHOS) E OUTROS
AGDO. : TAM TRANSPORTES AÉREOS REGIONAIS

*TUTELA ANTECIPADA – INDENIZAÇÃO – Acidente Aéreo – Vítima Fatal – Antecipação parcial da tutela inaudita altera parte – Admissibilidade – Medida de rigor – Presença dos requisitos exigidos pelo art. 273 do CPC – Responsabilidade objetiva da Companhia aérea – Indiscutibilidade da culpa – Análise da Teoria do Risco em relação ao negócio – O risco integral do negócio é do fornecedor – Inteligência do Código de Defesa do Consumidor – O estabelecimento da responsabilidade de indenizar nasce do nexo de causalidade existente entre o consumidor (lesado), o produto e/ou serviço e o dano efetivamente ocorrente – Recurso parcialmente provido.*

Trata-se de agravo de instrumento interposto contra a r. decisão que, em ação de indenização decorrente de acidente aéreo, indeferiu o pedido de antecipação da tutela, por não se encontrarem presentes os requisitos legais exigidos.

Dispensadas as informações do Magistrado a quo, não foi apresentada contraminuta ao recurso por não ter a parte contrária integrado a lide.

No despacho de fls. 146 foi concedido o prazo de 5 (cinco) dias para que os agravantes comprovassem a oferta de R$ 150.000,00 feita pela Companhia Aérea agravada.

Em sessão realizada em 24/02/1999, o presente agravo foi improvido, vencido o 2º juiz que declarou seu voto (fls. 162/167).

Ofertados embargos de declaração (fls. 170/174), restaram eles acolhidos para anular o julgamento anterior, determinando a abertura de vista ao Ministério Público para manifestação, face à existência de interesse de menores.

Remetidos os autos à douta Procuradoria Geral de Justiça, manifestou-se esta pelo improvimento do agravo (fls. 191/194).

É o relatório.

A concessão parcial da tutela pretendida é medida de rigor, já que encontravam-se ___ como encontram-se ___ presentes os requisitos exigidos pelo artigo 273 do Código de Processo Civil, quais sejam:

a) prova inequívoca a convencer o Magistrado da probabilidade do direito afirmado;
b) fumus boni iuris; e
c) periculum in mora.

É fato comprovado que Luís Cláudio Tamiello encontrava-se no interior da aeronave no momento do acidente, vindo a falecer em razão do sinistro. Também o é serem os autores-agravantes, esposa e filhos do falecido.

É necessário aqui, para o deslinde da questão e exame do pedido dos agravantes, fazer-se uma avaliação dos aspectos jurídicos envolvidos.

A hipótese dos autos é de responsabilidade civil objetiva estabelecida no artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor.

Não se discute culpa.
Todavia, como ainda há dúvidas a respeito do sistema que a Lei 8.078/90 instituiu no país, é necessário, gastar algumas linhas para cuidar do assunto.

Com efeito, no Brasil, a Constituição Federal garante a livre iniciativa para a exploração da atividade econômica, numa harmonização com uma série de princípios (Cf. art. 170). Essa iniciativa de exploração da atividade econômica é, de fato, de uma forma ou de outra, a característica da sociedade capitalista contemporânea. A exploração da atividade econômica tem uma série de características, que não cabe aqui narrar. Mas, dentre elas, algumas são relevantes e alguns aspectos teóricos que embasam o lado prático da exploração interessam.

Uma das características principais da atividade econômica é o risco . Os negócios implicam em risco. Na livre iniciativa a ação do empreendedor está aberta simultaneamente ao sucesso e ao fracasso. A boa avaliação dessas possibilidades por parte do empreendedor é fundamental para o investimento. Um risco mal calculado pode levar o negócio à bancarrota.

É claro que são muitas as variáveis em jogo e que terão que ser avaliadas, tanto mais se existir uma autêntica competitividade no setor escolhido. Os insumos básicos para a produção, os meios de distribuição, a expectativa do consumidor em relação ao produto ou serviço a ser produzido, a qualidade dos mesmos, o preço, incluído impostos etc., são preocupações constantes. Some-se a isso, o direito e o necessário desenvolvimento de todos os aspectos que envolvem o marketing do ponto de vista do empreendedor, em especial, a possibilidade ___ e, praticamente, a necessidade ___ da exploração da publicidade.

Aqui o que interessa é o aspecto do risco, que se incrementa na intrínseca relação com o custo. Esse binômio risco/custo (ao qual vai-se acrescer um outro: custo/benefício) é determinante na análise da viabilidade do negócio.

A redução da margem de risco a baixos níveis (isto é, aplicação máxima do estudo de todas as variáveis) eleva o custo a valores astronômicos, inviabilizando o projeto econômico. Em outras palavras, custo para ser suportável tem que estar definido na relação com benefício. Esse outro binômio custo/benefício tem que ser considerado.

Descobrir o ponto de equilíbrio de quanto risco vale a pena correr a um menor custo possível para se aferir uma maximização do benefício, é uma das chaves essenciais do negócio.

Dentro dessa estratégia geral dos negócios, como fruto da Teoria do Risco, um item específico é o que está intimamente ligado à sistemática normativa adotada pelo CDC. É aquele ligado à avaliação da qualidade do produto e do serviço, especialmente voltados para adequação, finalidade, proteção à saúde, segurança e durabilidade. Tudo referendado e complementado pela informação.

Em realidade, a palavra "qualidade" do produto ou do serviço pode ser o aspecto determinante, na medida em que não se pode compreender qualidade sem o respeito aos direitos básicos do consumidor.

E nesse ponto da busca da qualidade surge, então, novamente, e particularmente, o problema do risco/custo/benefício. Acrescido agora de outro aspecto considerado tanto na Teoria do Risco quanto pela lei consumerista: a produção em série.

Então, como característica da sociedade de massa, tem-se a produção em série (massificada). Em produções seriadas é impossível assegurar como resultado final que o produto ou o serviço não terá vício/defeito.

Para que uma produção em série conseguisse um resultado isento de vício/defeito, seria preciso que o fornecedor elevasse seu custo a níveis altíssimos, o que inviabilizaria o preço final do produto e do serviço e desqualificaria a principal característica da produção em série, que é a ampla oferta para um número enorme de consumidores.

Dessa maneira, sem outra alternativa, o fornecedor tem que correr o risco de fabricar produtos e serviços a um custo que não prejudique o benefício.

Aliado a isso, está o indelével fato de que produções em série envolvem milhares de componentes físicos que se relacionam, operados por outras milhares de mãos humanas que os manuseiam direta ou indiretamente . A falha é inexorável: por mais que o fornecedor queira, ele não consegue evitar que seus produtos ou serviços cheguem ao mercado sem vício/defeito

Mesmo nos setores mais desenvolvidos, onde as estatísticas apontam para percentuais de vícios/defeitos de fabricação próximos de zero, o resultado final para o mercado será a distribuição de um número bastante elevado de produtos e serviços com vícios/defeitos. E isso se explica matematicamente: supondo um índice percentual de vício/defeito no final do ciclo de fabricação de apenas 0,1% aplicado sobre alta quantidade de produção, digamos, 100.000 unidades, ter-se-á 100 produtos entregues ao mercado com vício/defeito.

Logo, tem-se que lidar com esse fato inevitável (e incontestável): há e sempre haverá produtos e serviços com vício/defeito.

Dessa maneira, nada mais adequado do que controlar, como o fez a Lei 8.078/90, o resultado da produção viciada/defeituosa, cuidando de garantir ao consumidor o ressarcimento pelos prejuízos sofridos.

Note-se que a questão do vício/defeito envolve o produto e o serviço em si, independentemente da figura do fornecedor (bem como de sua vontade ou atuação). É ___ como se verá ___ o produto e o serviço que causam diretamente o dano ao consumidor e não o fornecedor. Este só é considerado na medida em que é o responsável pelo ressarcimento dos prejuízos.

Nesse ponto tem-se, então, que colocar outro aspecto relevante, justificador da responsabilidade do fornecedor, no que respeita ao dever de indenizar. É ele o da origem do fundo capaz de pagar os prejuízos.

É a receita do fabricante, produtor, prestador de serviço etc., que responde pelo ônus da indenização relativa ao prejuízo sofrido pelo consumidor. O motivo, aliás, é simples: a receita abarca "todos" os produtos e serviços oferecidos. "Todos", isto é, tanto os produtos e serviços sem vício/defeito, quanto aqueles que ingressaram no mercado com vício/defeito. O resultado das vendas, repita-se, advém do pagamento do preço pelo consumidor dos produtos e serviços bons e viciados/defeituosos.

É dessa forma, então, que se justifica a estipulação de uma responsabilidade objetiva do fornecedor.
Mas, existe, ainda, um outro reforço dessa justificativa e que formatará por completo o quadro qualificador e que obrigou a que o sistema normativo adotasse a responsabilização objetiva. É o relacionado não só a dificuldade da demonstração da culpa do fornecedor, assim como ao fato de que, efetivamente, muitas vezes, ele não tem mesmo culpa do produto ou serviço terem sido oferecidos com vício/defeito.

Essa é a questão: o produto ou serviço são oferecidos com vício/defeito, mas o fornecedor não foi negligente, imprudente, nem imperito. Se não se tivesse a responsabilidade objetiva, o consumidor terminaria fatalmente lesado, sem poder ressarcir-se dos prejuízos sofridos (como era no regime anterior).

Explicando melhor: no regime de produção em série ___ característica da atual sociedade de massas ___ o fabricante, produtor, prestador de serviços etc., não podem ser considerados, via de regra, negligente, imprudente ou imperito.

Como é sabido, o negligente é aquele que causa dano por omissão; o imprudente é o que causa dano por ação; e o imperito é o profissional que não age com a destreza que dele se espera.

Ora, o produtor contemporâneo, em especial aquele que produz em série, não é negligente, imprudente ou imperito. Ao contrário, numa verificação de seu processo de fabricação, perceber-se-á que no ciclo trabalham profissionais que avaliam a qualidade dos insumos adquiridos, técnicos que controlam cada detalhe da produção, engenheiros de qualidade testam os produtos fabricados, enfim, no ciclo de produção como um todo, não há, de fato, omissão (negligência), ação imprudente ou imperícia. No entanto, pelas razões já expostas, haverá produtos e serviços viciados/defeituosos.
Vê-se, só por isso, que se o consumidor tivesse que demonstrar a culpa do produtor, não conseguiria. E, na sistemática anterior do Código Civil (art. 159), o consumidor tinha poucas chances de se ressarcir dos prejuízos causados pelo produto ou pelo serviço.

Além disso, ainda que culpa houvesse, sua prova como ônus para o consumidor levava ao insucesso, pois o consumidor não tinha e não tem acesso ao sistema de produção e, também, a prova técnica posterior ao evento danoso tinha pouca possibilidade de demonstrar culpa.

Poder-se-ía dizer que antes ___ por incrível que isso possa parecer ___ o risco do negócio era do consumidor. Era ele quem corria o risco de adquirir um produto ou serviço, pagar seu preço (e assim, ficar sem seu dinheiro) e não poder dele usufruir adequadamente ou, pior, sofrer algum dano. É extraordinário, mas esse sistema vigeu até 10/03/1991, em flagrante injustiça e inversão lógica e natural das coisas.

Mas, agora, com o CDC, o risco integral do negócio é do fornecedor.
Registre-se, também, que a Lei 8.078/90 fala em responsabilidade pelo fato do produto e do serviço. Isto é a norma, dentro do regramento da responsabilidade objetiva, é dirigida ao fato do produto ou serviço em si. É o fato do produto e do serviço causadores do dano o que importa.

O estabelecimento da responsabilidade de indenizar nasce do nexo de causalidade existente entre o consumidor (lesado) o produto e/ou o serviço e o dano efetivamente ocorrente.

É essa a teoria ___ e a realidade ___ fundante da responsabilidade civil objetiva estatuída no CDC, assim como as amplas garantias indenizatórias em favor do consumidor que sofreu o dano ___ ou seus familiares ou, ainda, o equiparado e seus familiares.

Frise-se: in casu, se o estabelecimento da responsabilidade de indenizar nasce do nexo de causalidade existente entre o consumidor (lesado), o produto e/ou o serviço e o dano efetivamente ocorrente, havia ___ como há ___ prova inequívoca a convencer o Judiciário da necessidade da antecipação da tutela inaudita altera parte.

Como dito, tais fatos estão comprovados, já que o esposo e pai dos autores encontrava-se no avião operado pela ré-agravada no momento em que o acidente ocorreu, causando-lhe a morte e, de consequência, prejuízos aos autores.

Logo, é inconteste a presença do fumus boni iuris e da prova inequívoca, necessária à demonstração da probabilidade do direito alegado.

E o mesmo pode-se dizer do periculum in mora, e com muito mais razão. A tutela antecipada pleiteada tem como função, desde já, propiciar benefício econômico capaz de aliviar, de alguma maneira, o sofrimento dos autores.

É que, em que pese o fato dessa dor não ser suscetível de avaliação econômica, vez que não atinge o patrimônio material da vítima, é preciso reparar o dano sofrido e isso se faz através da indenização. Porém, com características próprias que diferenciam-na da indenização do dano material.

Com efeito, o substantivo "indenização" ainda que utilizado de maneira recorrente para tratar do "quantum" a ser pago àquele que sofreu o dano moral, não tem o mesmo sentido do termo indenização empregado para a reparação do dano material.

Como se sabe, a palavra "indenizar" quando utilizada na relação com o dano material tem como função reparar o dano causado, repondo o patrimônio desfalcado, levando-o de volta ao "status quo ante". É isso que se pretende quando se faz a avaliação econômica da perda daquele que sofreu o dano.

Logo, o termo indenização tem teleologia voltada à equivalência econômica, especialmente fundada na idéia de que todo bem material pode ser avaliado economicamente, podendo ser reposto por intermédio de seu valor em moeda corrente.

Ora, no dano moral não há prejuízo material. Então, a indenização nesse campo possui outro significado. Seu objetivo é duplo: satisfativo-punitivo. Por um lado, a paga em pecúnia deverá proporcionar ao ofendido uma satisfação, uma sensação de compensação capaz de amenizar a dor sentida. Em contrapartida, deverá, também, a indenização, servir como punição ao ofensor, causador do dano, incutindo-lhe um impacto tal, que seja suficiente para dissuadi-lo de um novo atentado ou que resolva tomar as cautelas capazes de evitá-lo.

Remanesce-se utilizando o termo "indenização" no caso do dano moral por dois motivos, um de ordem prática: lembra reposição de dano; outro de conteúdo semântico: de fato o que se manda que o causador do dano moral faça é pagar certo valor em dinheiro. Logo, o substrato é ainda econômico, tal qual no caso do sentido da indenização para recompor a perda material.

Foi, de fato, a Constituição Federal de 1988 que criou condições para que a indenização por danos morais deixasse de ser repelida pela doutrina e pela jurisprudência (que somente a concedia em casos excepcionais).

Nesse campo das decisões judiciais, porém, o acatamento da condenação indenizatória em hipótese de dano moral sempre foi muito restrito, tendo começado a ser implementada efetivamente, como dito, a partir da edição da Carta Magna de 1988, especialmente com base nas garantias instituídas nos inciso V e X do artigo 5º. E, desde então, foi-se fixando o entendimento do cabimento do direito à indenização por dano moral, de tal maneira que atualmente não pairam mais dúvidas a respeito, quer na jurisprudência quer na doutrina.

Essa resistência histórica e a pouca idade do apagamento das dúvidas a respeito do cabimento do dever de indenizar os danos morais, talvez seja o motivo que ainda leve o Poder Judiciário a fixar em quantias muito tímidas as indenizações capazes de reparar o dano moral.

Aliás, esta é a grande dificuldade enfrentada pelos magistrados: a fixação do valor devido a título de indenização por danos morais.

Ora, o dano moral é caracterizado pela dor, pelo sofrimento de alguém, em decorrência de um ato danoso; e justamente por ser um sentimento de foro íntimo, pessoal, tal dor é impossível de ser mensurada e, conseqüentemente, traduzida em cifras.

Acontece que, além desse problema natural da dificuldade de mensuração, as normas constitucionais não regulam a questão. Fica o juiz, para a busca do "quantum", com os parâmetros oferecidos pela doutrina e pela jurisprudência, a partir dos casos concretos.

De qualquer maneira, inspirado nesses parâmetros e, especialmente, levando-se em conta os princípios constitucionais que garantem a inviolabilidade da dignidade da pessoa humana, do respeito à vida e da garantia a incolumidade física e psíquica, com o asseguramento de uma sadia qualidade de vida e do princípio da isonomia, e ainda a garantia da intimidade, vida privada, imagem e honra, é possível fixar-se alguns parâmetros para a fixação da indenização por danos morais, quais sejam:

a) a natureza específica da ofensa sofrida;
b) a intensidade real, concreta, efetiva do sofrimento do ofendido;
c) a repercussão da ofensa, no meio social em que vive o ofendido e também sua posição social;
d) a existência de dolo por parte do ofensor, na prática do ato danoso e o grau de sua culpa;
e) a situação econômica do ofensor;
f) a posição social do ofendido;
g) a capacidade e a possibilidade real e efetiva do ofensor voltar a praticar e/ou vir a ser responsabilizado pelo mesmo fato danoso;
h) a prática anterior do ofensor relativa ao mesmo fato danoso, ou seja, se ele já cometeu a mesma falha;
i) as práticas atenuantes realizadas pelo ofensor visando diminuir a dor do ofendido.

Além disso tudo, é preciso realçar um dos aspectos mais importantes – e que, dependendo da hipótese é o mais importante – que é o da punição ao infrator.

O aspecto punitivo do valor da indenização por danos morais deve ser especialmente considerado pelo magistrado. Sua função não é satisfazer a vítima, mas servir de freio ao infrator para que ele não volte a incidir no mesmo erro.

Esse aspecto ganha relevo nas questões de massa, como são, em regra, as que envolvem o direito do consumidor. Se, por exemplo, um banco vier a ser condenado a indenizar um consumidor, que teve seu talão de cheques furtado da agência bancária, o que gerou toda sorte de problemas (cheque voltou, foi "negativado" nos serviços de proteção ao crédito etc.) e de conseqüência casou danos morais, na fixação da indenização o magistrado tem que considerar o fato de que se o banco não for severamente punido, poderá não tomar nenhuma providência para que o mesmo evento não torne a ocorrer. E o risco de causar o mesmo dano para dezenas, centenas de consumidores existe, é real. Por isso, o quantum deve ser elevado. A condenação tem que poder educar o infrator, que potencialmente pode voltar a causar o mesmo dano. E, in casu, a hipótese avaliada impõe fixação de indenização condizente

Ressalte-se, uma vez mais, que a indenização tem como finalidade amenizar a dor sentida, trazendo à vítima uma sensação de conforto e alento, além de punir o ofensor, com o intuito de coibi-lo a não reincidir na prática do ato danoso. Ou seja, possui a indenização, como se disse, um caráter satisfativo-punitivo.

Os benefícios que o dinheiro traz, isto é, as regalias e privilégios que proporciona à pessoa, servem para amenizar, anestesiar a dor e o sofrimento sentidos ou gerar um efeito positivo relativo ao conforto oferecido, como, por exemplo, propiciando a realização de uma viagem, a compra de um bem etc., de tal forma que possa, com isso, aliviá-la. Porém, jamais a indenização restabelecerá o estado anterior da vítima, como ocorre com a indenização por danos materiais, onde o indivíduo recebe aquilo que efetivamente perdeu (danos emergentes) e/ou deixou de ganhar (lucros cessantes).

E como cada caso é um caso específico, posto que cada acidente de consumo tem suas peculiaridades, bem como cada pessoa sofre com intensidade diferente, o valor indenizatório deverá ser fixado pelo juiz, levando, especificamente, em consideração o fato em si e atendendo aos critérios acima mencionados, mas sempre considerando o aspecto punitivo que, dependendo da condição econômica do infrator e da sua potencial possibilidade de voltar a praticar o mesmo tipo de ato lesivo pode – e deve – elevar o valor da indenização.

A ação em exame é de indenização por danos morais e materiais e o agravo diz respeito a não concessão da tutela antecipada pleiteada. Esta diz respeito à antecipação de parte da indenização por danos morais que será fixada ao final.

Alegam os autores que a agravada ofertou R$ 150.000,00 como proposta de acordo para pagamento de indenização por danos morais e, por isso, esse valor é o mínimo a que terão direito ao final do processo. Daí o direito à antecipação.

No primeiro julgamento posteriormente anulado por falta de participação do I. representante do Ministério Público, foi negado provimento ao pedido, porque os autores não comprovaram a oferta da agravada.

Os autores continuaram insistindo na questão da oferta e, nesse aspecto, instruíram mal o feito.
Todavia, o pleito é procedente não pelo argumento da oferta, mas pelo evidente direito à antecipação com que se caracteriza o caso.

A má instrução e a falha na argumentação quase pôs a perder o direito dos autores em jogo. Mas, é de se dar provimento ao pleito, ainda que de forma parcial.

Esta Colenda 4ª Câmara, em caso similar, já decidiu que:
"TRANSPORTE AÉREO – RESPONSABILIDADE CIVIL – Antecipação parcial da tutela inaudita altera parte – Admissibilidade – Relação consumerista – Responsabilidade de indenizar que nasce do nexo de causalidade existente entre o consumidor (lesado), o produto e/ou o serviço e o dano efetivamente ocorrente – Fatos estes incontroversos – Fixação de pensão mensal aos autores da vítima fatal – Caráter alimentar – Necessidade – Presentes os requisitos do artigo 273 do Código de Processo Civil, tem o juiz o poder-dever de conceder, total ou parcialmente, a tutela pleiteada – Inexistência, ademais, de perigo de irreversibilidade do provimento antecipado – Recurso desprovido."

E, neste caso, também, trata-se apenas de, desde já, conferir parte da indenização que ao final será fixada.

O pedido é de R$ 150.000,00 para os quatro recorrentes.
Esta C. 4ª Câmara tem fixado indenizações por danos morais em casos que não resultaram em morte, em quantias bastante significativas.

Veja-se, por exemplo, no apelo 807.485-7 num caso de erro médico relativo à cirurgia plástica de mama: a indenização por dano moral foi fixada em 500 salários mínimos ou R$ 68.000,00 ; no apelo 754.692-3 num caso de furto de talão de cheques, foi igualmente fixada em 500 salários mínimos.

Ora, é de se supor que no caso de morte a dor a ser avaliada gere valor superior a esses.
Assim, levando-se em conta que trata-se de quatro autores ___ três menores ___ é justa a antecipação da tutela pretendida em valor ora fixado em 1.000 salários mínimos, o que gera R$ 136.000,00 a ser dividido entre os quatro recorrentes.

Isto posto, dá-se parcial provimento ao agravo nos termos acima.

RIZZATTO NUNES – Juiz Relator

 


FONTE:  www.beabadoconsumidor.com.br

 

 

Clovis Brasil Pereira
Clovis Brasil Pereirahttp://54.70.182.189
Advogado; Mestre em Direito; Especialista em Processo Civil; Professor Universitário; Coordenador Pedagógico da Pós-Graduação em Direito Processual Civil da FIG – UNIMESP; Editor responsável do site jurídico www.prolegis.com.br; autor de diversos artigos jurídicos e do livro “O Cotidiano e o Direito”.

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