* Renato Flávio Marcão
Sumário: 1. A previsão legal; 2. Sobre a resistência à produção antecipada de provas; 3. Doutrina e jurisprudência a respeito do tema; 4. Anulação do processo, de ofício, em decorrência da produção antecipada de prova; 5. Nossa posição a respeito do tema; 6. Conclusão.
1. A previsão legal
Nos precisos termos do art. 366 do Código de Processo Penal, com a redação da Lei 9.271/96, se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar a prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312.
Na precisa lição de Pedro Henrique Demercian e Jorge Assaf Maluly: “A nova redação do art. 366 do CPP condicionou o prosseguimento da instrução probatória a um evento futuro. No entanto, esse mesmo dispositivo admitiu a produção antecipada de provas, desde que consideradas urgentes e acompanhadas pelo Ministério Público e pelo defensor dativo”.[1]
2. Sobre a resistência à produção antecipada de prova
Não obstante a redação acima transcrita, é reincidente a resistência à produção antecipada de prova na prática forense.
Muitos Juízes de 1º grau e Instâncias recursais, aos olhos muitas vezes conformado do Ministério Público, têm feito tabula rasa da necessidade inquestionável de se providenciar a produção antecipada de prova visando evitar o perecimento da mesma e em homenagem ao princípio processual penal que determina a busca da verdade real como fundamento do provimento jurisdicional, seja qual for o resultado do processo.
O debate doutrinário e jurisprudencial está posto desde o advento da nova redação do dispositivo processual penal que alberga a matéria discutida.
3. Doutrina e jurisprudência a respeito do tema
Convém ressaltar, aqui, o entendimento jurisprudencial que entendemos deva prevalecer, no sentido de que:
“O art. 366 do CPP, ao determinar que ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional quando o réu, citado por éditos, não atender ao chamamento da Justiça, nem constituir advogado, facultou ao Magistrado ordenar a produção antecipada das provas consideradas urgentes. Regulamentada pelo art. 225 do referido diploma, a produção antecipada da prova testemunhal está sujeita ao princípio da urgência, que se entende pelo fundado receio de que, ao tempo da instrução processual, as testemunhas já não existam ou se tenham mudado do território da comarca. Nesta matéria, como no mais, o prudente arbítrio do Juiz é que haverá de ditar a forma de proceder” (TACRIM-SP. – 6ª C. – HC 312.098/3 – rel. Almeida Braga – j. 01.10.97).
“Consideram-se urgentes, para os efeitos do art. 366 do CPP, as provas que, em razão do decurso do tempo – consumidor de todas as coisas (tempus edax rerum) -, poderiam perecer, tornando impossível sua realização quando acaso comparecesse o réu a Juízo, sendo forçoso preservá-las ‘ad perpetuam rei memoriam’” (TACRIM-SP. – 1a C. – HC 312.226/8 – rel. Eduardo Goulart – j. 9.10.97).
Portanto, é inconteste que, em se tratando de provas urgentes, o juiz pode, e deve, a teor do disposto no artigo 366 do Código de Processo Penal, determinar sua produção antecipada.
Para tanto, necessária a conceituação de provas urgentes, vez que a suspensão do processo, por prazo ad infinitum, induz à incerteza quanto a retomada do curso processual.
Elucidando tal conceito, a lição de Tourinho Filho[2]:
“Que provas são estas? Depende do caso concreto. Todavia, em se tratando de perícias, busca e apreensão, e até mesmo de audiência de testemunhas, não se lhes pode negar o caráter de urgência, à semelhança do que ocorre com o art. 92 do CPP, ao dispor que, sendo suscitada questão prejudicial, séria e fundada, a respeito do estado civil das pessoas, o curso da ação penal ficará suspenso até que no juízo cível seja a controvérsia dirimida por sentença passada em julgado, sem prejuízo, entretanto, da inquirição das testemunhas e de outras provas de natureza urgente”.
“Ora, se o pronome adjetivo ‘outras’, num discurso, retoma sempre a idéia ou conceito dado anteriormente, parece claro que o legislador reputou o testemunho como prova de natureza urgente. E, com efeito, considerando a imprevisibilidade da morte, a inquirição de testemunha é providência que deve ser tomada com certa urgência. Não são apenas os testemunhos das pessoas elencadas no art. 225 deste Código que apresentam a marca da urgência. É claro que a testemunha pode mudar de endereço, sem que se saiba onde foi morar, pode ausentar-se do Estado ou do País, ficar gravemente enferma, de molde a nem poder comunicar-se com o mundo exterior, falecer. Tais circunstâncias já indicam que, suspenso o processo, na hipótese de o Juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes, uma destas será a testemunhal. Na verdade, se com a simples suspensão do processo, em face de uma questão prejudicial, cuja solução no cível não dura mais que três ou quatro anos, o legislador determinou a ‘ouvida das testemunhas e de outras provas de natureza urgente’, é sinal de que considerou a prova testemunhal como urgente. De se concluir, pois, a nosso juízo, que, em se tratando de réu que não atendeu à citação editalícia nem constituiu Advogado, não deve o Juiz limitar-se a inquirir as testemunhas que estejam enfermas ou idosas. E se o réu comparecer dez ou quinze anos depois? As testemunhas seriam capazes de relatar pormenores? Não poderiam morrer nesse espaço-tempo? Mudar de endereço sem que se possa localizá-las? Evidente que o Juiz, em hipóteses dessa natureza, deve não só colher antecipadamente os depoimentos, como, inclusive, determinar perícias e busca e apreensão, se for o caso”.[3]
Por oportuno, vale ressaltar entendimento jurisprudencial no sentido de que:
“Na hipótese de suspensão do processo em face da revelia do réu, a memória testemunhal deve ser colhida no tempo mais próximo do fato, em face do fenômeno humano do esquecimento, sendo de rigor a sua produção antecipada. Exegese dos arts. 82 e 366 do Código de Processo Penal” (STJ – 6ª T. – RESP nº 169.324/SP – Rel. Min. Vicente Leal – DJU nº 195, de 9.10.2000, p.207).
“Tratando-se do art. 366 do CPP, é lícita a produção antecipada da prova testemunhal, por estar presente o caráter de urgência, em face da incerteza quanto à prorrogação na retomada do curso processual, uma vez que eventual demora pode vir a apagar da memória das vítimas e testemunhas o fato criminoso, bem como dar ensejo às mudanças de endereços, falecimentos etc” (TACRIM – SP – 14ª Câmara – Mandado de Segurança – Rel. Oldemar Azevedo, v. u., j. em 14.12.1999).
“Em se tratando de suspensão do processo por prazo indeterminado, nos termos do artigo 366 do CPP, é possível que o Juiz se valha do seu poder geral de cautela, com base na lei, para autorizar a produção antecipada de prova testemunhal, em face da imprevisibilidade do momento em que o feito retomará seu curso, com a ressalva de sua eventual repetição, a pedido do réu, pois é previsível a impossibilidade de sua produção em razão do decurso do tempo, quer pela fatalidade da morte, quer pelo esquecimento dos fatos distanciados do tempo de sua prática, como também por causa do fenômeno de desgastes ou de reforçamento, e ainda por motivo das várias doenças da memória, assegurando, assim, a perquirição da verdade” (TACrimSP – MS nº 354.540/4 – São Paulo – 7ª Câm. – Rel. Corrêa de Moraes – J. 20.01.2000 – v.u).
“Inocorre cerceamento por afronta ao princípio constitucional da ampla defesa na determinação da produção antecipada de provas, uma vez suspenso o processo nos termos do artigo 366 do CPP, pois é providência de interesse comum, tanto do réu quanto do Órgão Acusatório, e bem assim do Juiz, que não é mais um espectador inerte da produção das provas, podendo até mesmo determinar, no exercício do poder cautelar que lhe é ínsito, a realização das que lhe parecerem úteis, velando para que não se diluam ou se percam, porque no processo penal o que se busca é a verdade real” (TACrimSP – HC nº 317.248/0 – 5ª Câm. – Rel. Nogueira Filho – J. 11.02.98 – RJTACRIM 37/410).
“A produção antecipada de provas (C. P. P., artigo 366) é medida que a sensatez abona e a prudência recomenda, em face da imprevisibilidade do momento em que o processo retomará seu curso. Se próximo, caberá na ocasião deferir à Defesa a renovação da prova. Se distante, ter-se-á acertadamente obviado à eventualidade de apresentar-se dificuldade intransponível na produção longamente protelada. Em ambos os casos, ver-se-á assegurada a perquirição da verdade, objetivo último do esforço processual” (TACrimSP – RSE nº 1.102.971/7 – 7ª Câmara – Rel. Corrêa de Moraes – J. 30.07.98 – RJTACRIM 41/400).
4. Anulação do processo, de ofício, em decorrência da produção antecipada de prova
A 10ª Câmara do Egrégio Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo julgou a apelação n.º 1.312.505/9[4], de que foi relator o Excelentíssimo Juiz Vico Mañas, apontada em processo por crimes de furto qualificado, praticados em continuidade delitiva, onde o Insigne Magistrado João Alexandre Sanches Batagelo determinou a produção antecipada da prova testemunhal com supedâneo no art. 366 do Código de Processo Penal, fundamentando sua decisão de forma a justificar a providência que se revelou imprescindível aos olhos do Juízo, considerando a suspensão do processo por tempo indeterminado, a colocar em sério e grave risco a busca da verdade real.
Julgado o processo, que seguiu depois de certo tempo, após a prisão preventiva do réu, a Douta Defesa recorreu da sentença condenatória sustentando insuficiência probatória.
O processo foi anulado em grau de recurso, ex officio, em razão da realizada produção antecipada da prova oral.
Eis as razões invocadas na fundamentação do v. Acórdão, as quais pedimos vênia para transcrever em parte:
“A nova redação do art. 366 do Código de Processo Penal procura dar validade ao preceito constitucional que assegura aos acusados o exercício da ampla defesa e do contraditório. A primeira pressupõe defesa técnica e autodefesa. Esta, por sua vez, consiste no direito de audiência e no direito de presença, inconciliáveis, à toda evidência, com a revelia decorrente de citação ficta.
A lei nada exclui da apreciação do Poder Judiciário, mas apenas condicionou a sua atuação à estrita obediência de garantia fundamental, com assento constitucional.
Com efeito, a autodefesa significa a participação pessoal do acusado no contraditório, mediante sua contribuição para a função defensiva. Divide-se, como visto, no direito de audiência e no direito de presença. Este último representa a possibilidade de o réu tomar posição a todo momento sobre o material probatório produzido, comparecendo aos atos da instrução.
Por tal motivo, afirma-se que a participação do acusado nos atos de processo-crime a que responde ‘é uma conseqüência dos princípios constitucionais que ao acusado garantem o direito de ampla defesa e o de contrariedade na instrução criminal, pois é certo que, presente o réu no ato de inquirição da testemunha, poderá ele esclarecer o seu defensor acerca de um ou outro ponto do depoimento, ensejando, assim, a formulação de reperguntas explicativas’ (RTJ 80/4).
Assim, suspenso o processo pela revelia do acusado, a produção antecipada da prova testemunhal só será cabível, respeitada a garantia constitucional da ampla defesa, prestigiada com a recente alteração legislativa, em caráter excepcional, traduzido na exigência da medida, que se configura nas hipóteses do art. 225 do mesmo diploma legal, em nenhum momento ventiladas no caso em tela.
A prevalecer o procedimento adotado neste feito, a colheita antecipada da prova testemunhal sempre seria possível, o que não se concilia com o espírito que norteou a reforma processual introduzida pela Lei 9.271/96, desvirtuando-o por completo”.
Com tais fundamentos anulou-se o processo por cerceamento de defesa, entendendo-se que a r. sentença encontrava-se fundada em provas colhidas com ofensa a garantias constitucionais básicas.
5. Nossa posição a respeito do tema
A busca da verdade real é princípio fundamental do Direito Processual Penal brasileiro.
Conforme ensina Mirabete, “com o princípio da verdade real se procura estabelecer que o jus puniendi somente seja exercido contra aquele que praticou a infração penal e nos exatos limites de sua culpa numa investigação que não encontra limites na forma ou na iniciativa das partes. Com ele se excluem os limites artificiais da verdade formal, eventualmente criados por atos ou omissões das partes, presunções, ficções, transações etc., tão comuns no direito processual civil. Decorre desse princípio o dever do juiz de dar seguimento à relação processual quando da inércia da parte e mesmo de determinar, ex officio, provas necessárias à instrução do processo, a fim de que possa, tanto quanto possível, descobrir a verdade dos fatos objetos da ação penal”.[5]
Segundo Pedro Henrique Demercian e Jorge Assaf Maluly, na Justiça Penal “o juiz não é mero espectador das provas produzidas pelas partes. Tem o dever de investigar a fundo a realidade do fato. Tão largo é o alcance desse princípio que até mesmo a confissão, no processo penal, tem valor relativo (art. 197) e deve ser valorada de acordo com as demais provas coligidas, enquanto, no processo civil, esse mesmo ato, quando não se cuidar de direitos indisponíveis, tem importância definitiva e absoluta (art. 341, § 1º, CPC), autorizando desde logo o julgamento da lide”.[6]
Após a prática do crime, conhecedor de sua real situação frente a Justiça Penal, não raras vezes o réu se põe em fuga, indo à lugar incerto e não sabido, daí a necessidade de sua citação ficta, conforme determina o artigo 361 do Código de Processo Penal.
Ausenta-se do distrito da culpa por opção, e assim procede no mais das vezes acreditando estar se furtando à aplicação da lei penal, e caso assim não fosse, buscaria informar o Juízo processante sobre seu atual paradeiro, o que sabemos quase nunca ocorrer, e se ocorresse não seria citado por edital e nem haveria, de conseqüência, a necessidade de se produzir prova antecipadamente.
É inegável que, por assim dizer, age o réu maliciosamente, buscando ludibriar a Justiça.
Aliás, em tais casos seu proceder está por autorizar, sem sombra de dúvida, a decretação de sua prisão preventiva, pois é cediço que a custódia preventiva para assegurar a aplicação da lei penal é a que tem encontrado maior acolhida na doutrina, sustentando alguns que essa é a principal finalidade da medida. O perigo de fuga do acusado justifica por si só a cautela, como decorre do artigo 312 do Código de Processo Penal.
De regra, os processos suspensos com fundamento no art. 366 do Código de Processo Penal só retomam seu curso após a prisão do réu, quando decretada a prisão preventiva, o que também não tem sido comum na prática forense na hipótese de que cuidamos.
Muitas vezes as implicações protelatórias decorrentes do artigo citado são “comemoradas”, e a partir de então é como se o processo deixasse de existir; de merecer atenção, cuidados e lugar em pauta de audiência. Sai do mundo dos vivos e cai no imenso vazio do descaso e do esquecimento, contribuindo sensivelmente para o descrédito da Justiça Penal; constituindo verdadeiro estímulo à criminalidade alimentada pela sensação de impunidade. É como se seu resultado deixasse de interessar à sociedade. Passa a ser um “não-processo”.
Entendemos que, suspenso o processo, a regra deve ser a produção antecipada das provas disponíveis, visando a busca da verdade real, o que não quer dizer, exatamente, prova para a condenação do réu, como muitas vezes se tem entendido de forma equivocada.
“A verdade é a concordância entre um fato real e a idéia que dele forma o espírito”, na exata conceituação de Mittermaier.[7]
A busca da verdade real interessa tanto ao Ministério Público quanto ao Poder Judiciário e ao próprio réu. Interessa à segurança das decisões judiciais. Não se pode concluir num juízo apriorístico que a produção antecipada de prova seja instrumento de violação da ampla defesa, notadamente em casos onde sequer houve alegação de prejuízo por parte do réu em seu desconformismo.
De se ressaltar, ainda, que o réu, mesmo na produção antecipada de prova sempre estará amparado por defesa técnica. Ocorrendo o contrário a nulidade do processo será absoluta, evidentemente.
A busca da verdade real, garantia constitucional e processual que é, não pode ser considerada, sob tal enfoque, instrumento gerador de nulidade por cerceamento de defesa.
O Douto entendimento esposado no v. Acórdão que anulou o processo, conforme acima indicado, permite concluir que a produção antecipada de prova nos termos em que regulada no art. 366 do Código de Processo Penal sempre acarretará a nulidade do processo por quebra da ampla defesa e conseqüente inconstitucionalidade, e não há como se sustentar o entendimento contrário.
Com efeito, se acolhidos os fundamentos do decisum em destaque, é forçoso concluir que, sendo a ampla defesa um princípio constitucional, não é possível encontrar qualquer razão justificadora para a produção antecipada de prova, baseada em preceitos infraconstitucionais, resultando inaplicável, por flagrante incompatibilidade com a Carta Magna, qualquer preceito que a autorize.
Se a ausência voluntária e injustificada do réu à audiência de instrução viola sua amplitude defensória de plano, a ponto de justificar a anulação do processo ex officio pelo E. Tribunal, não se pode invocar qualquer justificação jurídica para a colheita da prova exposta à indefinição do processo, qualquer que seja a situação.
O que se dizer, então, da hipótese em que o réu é citado pessoalmente e opta pela revelia, quando é cediço que toda a prova será colhida normalmente, sem a sua presença, e sabidamente os Tribunais não reconhecem em tal proceder qualquer violação à ampla defesa?
Dir-se-á que a nova redação do artigo 366 do Código de Processo Penal determina a suspensão do processo nas hipóteses em que regula exatamente para preservar o réu que está ausente, inclusive em razão do princípio nemo inauditus damnari potest, segundo o qual ninguém pode ser julgado sem ser ouvido.
Ocorre, entretanto, que a nosso ver e sentir, a ausência de possibilidade para a oitiva e participação do réu na colheita da prova em processo penal é que faz incidir o raciocínio exato que envolve o princípio acima indicado, o que não se confunde com a hipótese de permitir ao réu que se apresente em Juízo para se ver processar, sendo a chance por ele desprezada.
O réu ausente, citado por edital, submete-se a tal condição por deliberação própria, e por assim dizer não está por merecer benefícios; ser premiado pela malícia com a paralisação indefinida do processo e perecimento da prova que no mais das vezes lhe é desfavorável.
O que se falar, ainda, da possibilidade de colheita de prova por precatória quando ausente o réu, cuja defesa só precisa ser intimada da expedição da carta?[8]
Como se justificar a possibilidade inconteste do réu ser retirado da sala de audiências quando da oitiva de vítima(s) e/ou testemunha(s) que se sintam constrangidas ou temerosas de depor na presença do mesmo, conforme autoriza o artigo 217 do Código de Processo Penal?[9]
Por fim, o que se dizer das hipóteses de julgamento no Tribunal do Júri sem a presença do réu, conforme autoriza o art. 451, § 1º, do Código de Processo Penal, nos crimes de infanticídio e de aborto provocado pela gestante ou com o seu consentimento, onde inegavelmente ocorrerá ampla produção probatória?
Em tais hipóteses também ocorrerá violação à ampla defesa?
Claro que não.
6. Conclusão
Pelas razões acima expostas, e reconhecendo a complexidade da matéria, não podemos concordar, data máxima vênia, com a r. decisão a que chegou a 10ª Câmara do Egrégio Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo no que diz respeito ao instigante tema ora colocado em debate.
A produção antecipada de prova é uma necessidade inafastável nos casos em que se verificar a suspensão do processo com fundamento no artigo 366 do Código de Processo Penal.
Tal proceder, em homenagem à verdade real, revela-se instrumento vigoroso de salvaguarda dos direitos da sociedade e do cidadão-réu, que em razão do passar dos tempos e do inevitável esquecimento que apaga da memória fatos pretéritos relevantes, não raras vezes se vê submetido ao constrangimento de uma sentença judicial absolutória por falta de provas suficientes para a condenação, a imprimir em sua história muitas vezes honrada a pergunta que provavelmente jamais se apagará perante todos:
Cometeu ou não o delito?
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[1] Curso de Processo Penal. 2ª ed., São Paulo: Atlas, 2001, p. 335.
[2] TACRIM – SP – 9ª Câm. – D.J. 13.08.1997 – Rel. Moacir Peres.
[3] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de Processo Penal Comentado, vol. 1, 2.ª ed., São Paulo: Saraiva, 1997, págs. 628/629.
[4] Em 14 de agosto de 2002.
[5] MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal, 13ª ed., São Paulo: Atlas, 2002, p. 44.
[6] Curso de Processo Penal. 2ª ed., São Paulo: Atlas, 2001, p. 28.
[7] Mittermaier, C.J.A. Tratado da prova em matéria criminal; trad. Herbert Wüntzel Heinrich, São Paulo: Bookseller, 3ª ed., 1996, p. 59.
[8] Conforme anotações de Damásio E. de Jesus (Código de processo penal anotado. São Paulo: Saraiva, 17ª ed., 2000, p. 170): “Intimada a defesa da expedição de precatória, desnecessária nova intimação da data designada para a realização da audiência no juízo deprecado. Essa providência não é tida por lei como essencial ao exercício da defesa, por considerar que, primordialmente, cabe ao defensor inteirar-se naquele juízo sobre a data escolhida para a realização da prova (TJSP, RT 525/352)”.
[9] “Se o juiz verificar que a presença do réu, pela sua atitude, poderá influir no ânimo da testemunha, de modo que prejudique a verdade do depoimento, fará retirá-lo, prosseguindo na inquirição, com a presença de seu defensor”.
Referência Biográfica
Renato Flávio Marcão – Membro do Ministério Público do Estado de São Paulo. Mestre em Direito Penal Especialista em Direito Constitucional. Professor de Direito Penal, Processo e Execução Penal Coordenador Cultural da Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo – Núcleo de São José do Rio Preto-SP. Sócio-fundador da AREJ – Academia Riopretense de Estudos Jurídicos e Coordenador do Núcleo de Direito Penal, Processo Penal e Criminologia. Membro da Associação Internacional de Direito Penal (AIDP) Autor do livro: Lei de Execução Penal Anotada (Saraiva, 2001)