A Importância do Controle de Horário

* Adilson Sanchez

                                    Não raro notamos severa resistência dos trabalhadores em “bater” ou “picar” o cartão de ponto. Mesmo o avanço da tecnologia, com os pontos eletrônicos – simples crachás – não afastou essa indisposição, muita próxima de um preconceito.

                                     As empresas, pretendendo adotar uma política branda em relação a esse tema, dispensando a anotação ou existência de controle de horário, acabam vítimas do argumento da inexistência formal do controle de horário para o pleito de valiosas horas extras, nas reclamações trabalhistas. 

                                    Sabe-se, o legislador limitou a jornada de trabalho, permitindo, apenas, prestação superior em número máximo de duas horas diárias (art. 59 da CLT), mediante o pagamento de adicional de hora extra sobre o salário 

                                    Exige a legislação o controle da jornada, seja para possibilitar a fiscalização trabalhista, seja para comprovar o pagamento correto pelo empregador das horas de trabalho de seus empregados, tanto da jornada normal como da extraordinária (art, 74, § 2º da CLT). 

                                    Assim, estão obrigados a manter controle de ponto os empregadores que tenham mais de dez empregados em determinado estabelecimento, excetuados aqueles que exercem cargo de confiança ou serviço externo sem fiscalização, nos termos do artigo 62 da CLT. 

                                    O registro do horário poderá ser manual, mecânico ou eletrônico, podendo ser utilizado um simples livro de ponto, apesar de habitualmente as empresas adotarem o "relógio de ponto" para o controle de horário, ou mesmo o controle eletrônico. 

                                    No caso de reclamação trabalhista com pedido de horas extras, deve-se observar o entendimento dos tribunais que considera obrigatória a juntada pelo empregador dos registros de horário, sob pena de considerar válido o pedido de horas extras, na conformidade do Enunciado TST nº 338, como segue: 

                                       É ônus do empregador, que conta com mais de dez empregados o registro da jornada de trabalho na forma do art. 74, § 2º da CLT. A não apresentação injustificada dos controles de frequência gera presunção relativa de veracidade da jornada de trabalho, a qual pode ser elidida por prova em contrário.

                                    Outrossim, não proceder ao controle de horário poderá acarretar multa administrativa no valor equivalente a 378,20 até 3.782 ufir, em eventual autuação, além de “forte dor de cabeça” na condução de eventual reclamação trabalhista. 

                                    Ocorre que a maior preocupação é a pertinente à prova em reclamações trabalhistas pleiteando horas extras. Sabe-se, não raro, há imprecisões nos pedidos de horas extras, com argumento de horários elastecidos sem respaldo nos fatos. Por vezes, o horário declinado pelo trabalhador acaba sendo acatado como se por todo o tempo do contrato fosse verdadeiro, resultado que nem mesmo ele perseguia.

                                     Assim, mostra-se eficaz, como matéria de prova, a adoção do controle de horário, senão vejamos:

                                    Horas Extraordinárias. Limitando-se o autor, na inicial, a alegar o recebimento incorreto das horas excedentes da 8ª diária ou 44ª semanal, sem declinar o horário cumprido, acaba por permitir a possibilidade de acolhimento, como corretos, dos horários registrados nos cartões de ponto juntados com a defesa. (TRT da 2ª Reg. – 7ª T. Ac. nº 02960562199, proc. nº 02950220295, DJ/SP de 05.12.96, pág. 63).

                                     Horas Extras. Inexistência de Controle de Horário. Inversão do Ônus da Prova. Não cumprindo o empregador a determinação estabelecida no art. 74, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho, assume o ônus da prova. Não produzindo prova oral convincente, restam devidas as horas extras postuladas pelo empregado. (TRT da 12ª Reg. – 3ª T. RO nº 000743/00, DJ/SC de 14.06.00, pág. 235).

                                      Ônus da Prova. Registro de Ponto. Documento que deve existir nos arquivos da empresa, por força de lei (Consolidação das Leis do Trabalho, art. 74, § 2). Transferência do ônus da prova para o trabalhador. Ilegalidade. (TRT da 2ª Reg. – 9ª T. RO nº 200668367, DJ/SP de 23.01.01).

                                     Nota-se, desse modo, que em se tratando de constituição da prova das horas extras, tendem os tribunais a considerar a prova documental, ou seja, o controle de ponto, de força probante ímpar.

                                     Mais objetivamente, se a empresa faz a juntada dos controles de horário, além de afastar a dúvida de pertencer ao reclamante a prova da jornada alegada, terá ele de produzir prova testemunhal robusta para elidir a prova documental (os cartões de ponto).

                                     Por outro lado, se a empresa não faz a juntada do controle de horário (tendo ou não o referido documento), e havendo determinação judicial para sua juntada, presume-se verdadeira a jornada alegada pelo trabalhador.

                                     Contudo, não basta manter os controles. Há necessidade que mantenham valor jurídico, ou seja, devem ser produzidos sem rasuras, com horários alternados (opõe-se à idéia do horário "britânico", por impossível todos os dias o trabalhador ter idêntico cumprimento da jornada), com cabeçalho, apontamento de horas e mediante assinatura para sua autenticidade.

                                     Neste particular acompanho o entendimento regional, eis que para que seja reconhecida a validade dos cartões de ponto é necessária a assinatura do empregado. Inexistindo assinatura, os mesmos se tornam imprestáveis como prova do controle da jornada laboral. (TST – Ac. 1ª T. 314/94, RR 77657/93.2, DJU de 08.04.94, pág. 7374).

                                      É destituído de força probante o cartão de ponto não assinado pelo empregado, pois, neste caso, se torna documento unilateral do empregador e incapaz, por isso, de atestar, quando impugnado, o cumprimento, ou não, da jornada diária de trabalho. (TST – Ac. 2ª T. 335/94, RR 62979/92.7, DJU de 06.05.94, pág. 10650).

                                     A assinatura do empregado no controle, confere ao documento autenticidade. Tanto que há decisões da sua predominância sobre a prova testemunhal, embora o tema seja dos mais polêmicos.

                                      Prova documental. Valor. Se a prova documental for autêntica e assinada pelo empregado, prevalece à oral, eis que fornece os elementos convincentes e concretos e só será infirmada pela oral se essa comprovar que existe qualquer irregularidade no conteúdo dos documentos. (TRT da 2ª Reg. – 9ª T. Ac. nº 02960335439, proc. nº 02950160608, DJ/SP de 23.07.96, pág. 25).

                                     Mostra-se, pois, de boa estratégia manter controle da jornada de trabalho.

                                     Alternativamente, como forma de abrandar o impacto da medida, a adoção de um simples “relatório de tempo”, comum na atualidade, não tem o alcance de substituir o controle de ponto previsto em lei, se especificar o início e término da jornada, mas apenas a carga horária prestada.

                                     Na verdade, pode-se adotar um controle alternativo. Ocorre que o Ministério do Trabalho baixou a Portaria nº 1120/95 autorizando a adoção de controles alternativos de horário de trabalho, conforme dispõe o seu artigo 1º que, por oportuno, transcreve-se:

                                     Os empregadores poderão adotar sistemas alternativos de controle da jornada de trabalho, desde que autorizados por convenção ou acordo coletivo de trabalho.

                                    Considerando, ainda, o reconhecimento dos instrumentos coletivos pela Constituição da República o que é cediço na jurisprudência, a negociação coletiva para criação de controle alternativo seria facilmente defensável, mesmo contra pretensão da fiscalização trabalhista para autuar a empresa, nos termos da Portaria nº 1120/95, senão vejamos:

                                      A Portaria MT nº 1120/95 possibilita, “desde que autorizados por convenção ou acordo coletivo”, controle por “exceção”, onde o empregado só registra a jornada se houver horas extras, atrasos, faltas etc., presumindo-se a jornada normal. É de duvidosa legalidade. (grifou-se) – Valentin Carrion, “in” Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho, Saraiva, 24ª ed., pág.129).

                                     Porém, a opinião do renomado jurista não é corrente na doutrina, ao contrário, em que tendência é de possibilitar a flexibilização da legislação trabalhista, matéria para uma volumosa obra e não para esse simples rascunho, o que faz pensar que voltaremos ao assunto.

                                     Enquanto isso, clamamos às empresas para que mantenham e cuidem dos controles de horário, evitando modismos que levam ao abandono desse procedimento. Da mesma forma, clamamos aos magistrados que uma vez juntados os referidos controles sob as penas do artigo 359 do CPC que emprestem o valor jurídico necessário, de modo a afastar controvérsia desnecessária ao deslinde da reclamação.


 

Referência  Biográfica

Adilson Sanchez:  Advogado Trabalhista e Previdenciário; Autor do Manual de Rescisão do Contrato de Trabalho; Professor da Escola Superior de Advocacia e da FIA / FEA / USP.

Redação Prolegis
Redação Prolegishttp://prolegis.com.br
ISSN 1982-386X – Editor Responsável: Prof. Ms. Clovis Brasil Pereira.

Fale Conosco!

spot_img

Artigos Relacionados

Posts Recentes