Ação Monitória no Processo do Trabalho

* Alexandre Nery de Oliveira

I – INTRODUÇÃO

          O Código de Processo Civil teve acrescido, pela Lei 9.079, de 14.07.95, no bojo da denominada reforma, capítulo composto por três artigos (de numeração repetida e distintos por letras, no sentido de preservar o texto codificado), instituindo a ação monitória, com a redação que segue:

          "Capítulo XV – Da Ação Monitória:

          Art. 1102a. A ação monitória compete a quem pretender, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel.

          Art. 1102b. Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá de plano a expedição do mandado de pagamento ou de entrega da coisa no prazo de 15 (quinze) dias.

          Art. 1102c. No prazo previsto no artigo anterior, poderá o réu oferecer embargos, que suspenderão a eficácia do mandado inicial. Se os embargos não forem opostos, constituir-se-á, de pleno direito, o título executivo judicial, convertendo-se o mandado inicial em mandado executivo e prosseguindo-se na forma prevista no Livro II, Título II, Capítulos II e IV [execução para a entrega de coisa e execução por quantia certa conta devedor solvente].

          § 1º. Cumprindo o réu o mandado, ficará isento de custas e honorários advocatícios.

          § 2º. Os embargos independem de prévia segurança do juízo e serão processados nos próprios autos, pelo procedimento ordinário.

          § 3º. Rejeitados os embargos, constituir-se-á, de pleno direito, o título executivo judicial, intimando-se o devedor e prosseguindo-se na forma prevista no Livro II, Título II, Capítulos II e IV."

          A ação monitória, instituída como meio de provocação jurisdicional por via procedimental especial de jurisdição contenciosa (Livro IV, Título I, do CPC), encontra-se situada, para fins da Teoria Geral do Processo, nos limites que se formam entre o Processo Cognitivo e o Processo de Execução, porquanto permitindo a instrução ampla própria daquele, caminha desde o início através de vias coercitivas próprias deste, notadamente pela aplicação inequívoca do Processo de Execução quando não opostos embargos ou rejeitados estes.

          Como inovação inconteste no campo do Processo Civil, vamos trilhar, assim, também os caminhos pertinentes a ter ou não tal rito processual como aceitável no Processo do Trabalho, ante a regra da subsidiariedade e lamentalvelmente a desatualização dos seus preceitos que tantas inovações inspiraram junto a outros ramos do Processo.

          O elemento básico da ação monitória é estar o credor, embora desvalido de título executivo próprio, munido de prova escrita à qual pretende emprestar a qualidade de título executivo.

          Neste sentido, pela ação monitória (do latim monere – advertir, lembrar, exortar) se pretende lembrar ao pretenso devedor a existência de documento reconhecedor de determinada obrigação, advertindo-o, exortando-o a cumprir o que reconheceu que faria, ainda que indiretamente, conquanto desvalido tal documento das características de título propriamente executivo, nos termos dos artigos 584, 585 e 586 do CPC. Se falhar a advertência, então, seja pela não oposição de embargos do réu, seja pela rejeição dos mesmos, aquela prova da obrigação, título paraexecutivo na conceituação de Sérgio Bermudes ("A Reforma do Código de Processo Civil", Ed. Saraiva, 1996, 2ª edição), passará a valer como inequívoco título executivo, permitindo a execução nos próprios autos já constituídos.

          Suplanta-se, assim, a necessidade de ação ordinária onde se dava todo o procedimento cognitivo para reconhecer ao autor a obrigação aparentemente reconhecida já pelo réu no documento trazido, que apenas não se podia executar diretamente por faltar-lhe todos os requisitos exigidos pelo Processo de Execução. Com a ação monitória, pois, na falta de adimplemento voluntário do réu (CPC, artigo 1.102c, § 1º), poderá o documento ser então reconhecido como título executivo, permitindo ao credor valer-se prontamente da execução do crédito documentado.

          Não há dúvidas de que o caminho adotado pelo legislador brasileiro foi o da cautela, preferindo instituir no panorama processual pátrio apenas uma das modalidades de ação monitória, a que se tem denominado por ação monitória documental, quando outras, baseadas em provas não escritas têm merecido desenvolvimento noutros Países. Mas, ainda assim, uma inegável evolução, suplantando-se toda a sistemática vigente da produção de provas no Processo Cognitivo, quando o autor colaciona prova documental de aparente reconhecimento pelo réu quanto a determinada obrigação, o que se traduzia, então, em provar o que já estava provado, num exarcebamento da forma em detrimento da eficácia do processo.

          Agora, a ação monitória permite que o autor, munido de prova documental onde haja aparente reconhecimento de obrigação pelo réu, provoque este ao adimplemento, lembrando-o do firmado, podendo o réu adimplir de imediato a obrigação, assim isentando-se dos ônus processuais de custas e honorários advocatícios, ou, seja por inválida a prova, seja por já cumprida anteriormente a obrigação, apresentar embargos, assim chamados por suspenderem a conversão do mandado monitório em mandado executivo, com isto dinamizando a prestação da tutela jurisdicional sem atentar a direitos de defesa do réu, se cabível a contestação da obrigação pretendida. 

II – CARACTERÍSTICAS DA AÇÃO MONITÓRIA (CÍVEL)

          No prosseguir do estudo, vamos analisar cada um dos dispositivos concernentes à ação monitória, em relação ao Processo Civil, num passo anterior à análise de pertinência e aplicabilidade no Processo do Trabalho.

          Como dito, a ação monitória tem por objetivo a cobrança de determinada obrigação, seja pagamento de soma em dinheiro, seja entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel, por quem, embora desprovido de título executivo que permitisse ação executiva direta, detém prova documental de reconhecimento da obrigação pelo réu.

          Elemento que tem sido discutido é quanto a tratar-se o procedimento especial decorrente da ação monitória de caráter obrigatório ou facultativo para o autor, de modo a poder eleger tanto a via especial quanto a via comum da ação ordinária.

          Dentre as balizadas vozes da doutrina processual civil ressai o posicionamento firme da ilustre Desembargadora Fátima Nancy Andrighi no sentido de que "ao titular de direito enquadrável no procedimento especial da ação monitória há que ser observado o princípio da disponibilidade do rito, face às suas peculiaridades; acrescentando-se que o rito imposto pela nova Lei à ação monitória não figura entre aqueles considerados irredutivelmente especiais, eis que, obedecido procedimento inicialmente especial, este converte-se em ordinário, havendo embargos ao pedido" ("Da Ação Monitória: Opção do Autor" in "Caderno de Doutrina da Tribuna da Magistratura", da APAMAGIS, julho/96). Embora possua algumas ressalvas pessoais quanto aos fundamentos que balizam tal opinião, inequivocamente que a própria característica de conversão do procedimento monitório especial em procedimento comum pela mera oposição de embargos, enquanto não julgados estes, justifica que o autor possa eleger, desde logo, o procedimento comum pela ação ordinária como modo de promover sua pretensão à cobrança de determinada obrigação instituída em prova escrita que não se constitua em título executivo, caracterizando, assim, a via especial da ação monitória como de caráter eletivo pelo autor, segundo sua discricionariedade, ainda quando isto apenas decorra da dúvida do autor em relação à consistência do documento que possua como meio de prova suficiente. Logicamente, o que não se permite de modo algum é a via do procedimento especial decorrente da ação monitória quando ausentes os requisitos próprios de tal, caso em que o Juiz poderá indeferir a petição inicial, seja por inepta, seja por falta dos pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo (CPC, artigo 267, incisos I e IV).

          Pelo contido no artigo 1102a do CPC, a prova escrita colacionada com a petição inicial da ação monitória deve ser consistente, suficiente a provar, por si própria, o reconhecimento da obrigação pelo réu, sob pena de desviar-se a prova em que baseada para forma distinta de cognição, que exigiria ação ordinária, seguindo todos os trâmites do procedimento comum. Não se veda, logicamente, a contraprova do réu, ou mesmo a do autor em contraposição a esta, de natureza não documental, mas o autor não pode valer-se de prova distinta da documental para fundar sua pretensão, podendo outras virem apenas para dar-lhe maior consistência (quando impugnado o documento pelo réu), ou para demonstrar-lhe a inconsistência (em razão dos embargos do réu).

          Inequívoca pois a afirmação de que a obrigação pretendida deve estar fundada na prova documental colacionada com a exordial, sob pena de ser decretada a impropriedade do rito eleito, podendo provas distintas virem apenas para afirmarem a consistência ou inconsistência da prova originária, mas nunca para inovarem o conteúdo daquela ou mesmo para complementar o que cabia estar plenamente inserido em seu contexto.

          No artigo 1102b exsurge o primeiro comando judicial, consistente no acolhimento da petição inicial, por devidamente instruída (ou seja, por colacionar a prova escrita consistente em que baseada a pretensão), caso em que o Juiz deferirá de plano a expedição do mandado de pagamento ou de entrega da coisa no prazo de 15 (quinze) dias, salvo embargos. Algumas críticas hão de ser tecidas quanto à redação do referido artigo. Logicamente, o mandado expedido igualmente contém a característica de citar o demandado, e também nele deve estar inscrita a possibilidade de embargos, sem prévia caução, inclusive porque distinguindo-se do mandado executivo, detém força precária, eis que não emite propriamente ordem de pagamento ou de entrega, mas apenas advertência para tanto, em não se opondo embargos, então sim podendo converter-se em mandado executivo, cuja distinção será exatamente o caráter constritivo decorrente. A tal modo, o mandado monitório acarreta apenas o caráter citatório do demandado e advertência ao mesmo para cumprir determinada obrigação, salvo embargos, sem implicar, então, qualquer ordem constritiva de direitos do réu, ainda quando este se disponha a satisfazer o crédito pretendido descrito no mandado.

          O parágrafo 1º do artigo 1102c, mais adiante, sinaliza, contudo, que reconhecida pelo réu a pretensão do autor, cumprindo assim voluntariamente o mandado monitório, no prazo assinalado no instrumento (quinze dias) ficará isento de custas e honorários advocatícios, cumprindo ao Juiz extinguir o processo com julgamento de mérito (CPC, artigo 269, II), denotando tal dispositivo legal a intenção memorável do legislador de desarmar os espíritos, invocando tanto quanto possível que demandas insustentáveis não prossigam, seja pelo estímulo ao reconhecimento voluntário da pretensão, em contrapartida oferecendo menores gravames processuais à parte ré, seja pelo estímulo à conciliação entre as partes. Não se há, pois, que falar em extinguir-se a execução, eis que sequer instaurada, à falta de resistência do devedor à satisfação da obrigação pretendida.

          O caput do artigo 1102c, por sua vez, sinaliza a possibilidade do réu oferecer embargos, distinguindo tal impugnação defensiva da contestação apenas pelo fato de imprimir caráter suspensivo ao mandado monitório expedido, embora, como antes dito, a eficácia do mesmo é relativa e condicionada, à falta de caráter constritivo primário. Não obstante isto, os embargos à monitória podem deduzir, como peça defensiva em que se constitui, todos os argumentos próprios de contestação, sendo, nos termos do parágrafo 2º do artigo 1102c, processados independemente de garantia do Juízo, nos próprios autos, passando a estimular o rito procedimental ordinário, até a sentença. Os embargos à monitória, portanto, constituem inequívoca peça contestatória, apenas se distinguindo da contestação pelo peculiar caráter suspensivo do mandado monitório expedido, sendo, como a contestação, processada nos próprios autos decorrentes da ação, sem necessidade de garantias, ocasionando a seqüencia pelo procedimento ordinário.

          Diz ainda o caput do artigo 1102c que não opostos embargos à monitória constituir-se-á, de pleno direito, o título executivo judicial, convertendo-se o mandado executivo e prosseguindo-se na foma prevista no Livro II, Título II, Capítulos II e IV do Código de Processo Civil.

          Com redação similar, diz o parágrafo 3º do artigo 1102c que, rejeitados os embargos, constituir-se-á, de pleno direito, o título executivo judicial, intimando-se o devedor e prosseguindo-se na forma prevista no Livro II, Título II, Capítulos II e IV do Código de Processo Civil.

          Não há dúvidas de que a rejeição de opostos embargos apenas ocorre pela via da sentença, de modo que por tal decisão judicial declara-se a constituição do título executivo judicial precariamente indicado no mandado monitório inicial, intimando-se da sentença o devedor para prosseguimento da execução. E veja-se: não se fala em citação do devedor, mas mera intimação, cujos meios de comunicação são menos exigentes; igualmente, há que se notar que a intimação é prévia à execução, porque se outra fosse a intenção do legislador não haveria razão para estimular a intimação do devedor se da execução ficaria logicamente ciente pela expedição do mandado executivo próprio – tal decorre da inequívoca verificação de que o mandado executivo próprio é apenas expedido quando a obrigação não seja antes cumprida pelo devedor. Isto, inclusive, porque há a possibilidade dos embargos serem parcialmente acolhidos, na hipótese em que a ação monitória pretende diversas obrigações e baseado na prova escrita colacionada se reconhecem apenas uma ou algumas delas, o que impossibilitaria a mera conversão do mandado monitório inicial, que integra a plenitude das obrigações, em mandado executivo, parte daquele; preferida, assim, a via da expedição de novo mandado, contemplando as obrigações efetivamente reconhecidas na sentença, como de regra ocorre nas execuções de título executivo judicial.

          Com relação ao caso de não oposição dos embargos, o legislador foi mais severo, eis que tal acarreta de pleno direito a constituição do título executivo judicial pela conversão do mandado monitório inicial em mandado executivo. No entanto, a conversão exige o reconhecimento judicial do fato próprio, no caso a não oposição de embargos, sendo tal decisão, ainda que sumária, inequívoca sentença.

          Difícil aceitar, por tais aspectos, que noutro momento processual concernente à ação monitória, enquanto não deflagrada a possível execução, haja a prolação de sentença judicial, ou mesmo, em maior absurdo jurídico, afronto aos princípios mínimos da Teoria Geral do Processo, possa ser aceito a inexistência de sentença ou mais de uma sentença para o mesmo processo cognitivo.

          Temos, pois, que as decisões anteriores que determinam a expedição do mandado monitório apenas evidenciam, quando muito, caráter interlocutório, dada a necessidade de prévia admissibilidade da ação pelo Juiz (CPC, artigo 1102b).

          Por sua vez, são sentenças, no processo cognitivo especial decorrente da ação monitória, as decisões que constituem o título executivo judicial, no caso de não oposição de embargos à monitória pela imediata conversão do mandado inicial em mandado executivo, e no caso de rejeição de embargos opostos pela prévia intimação do devedor constituído, com execução, em ambos os casos, na forma prevista para a execução para a entrega de coisa e execução por quantia certa conta devedor solvente, ainda quando concisos o relatório, os fundamentos e o dispositivo.

          O que se verifica como característica fundamental da ação monitória, para diferenciá-la da ação ordinária, é a expectativa depositada no reconhecimento pelo réu da obrigação elencada no mandado monitório (lembrança) ou a imediata conversão do mandado monitório em mandado executivo pela revelia do réu decorrente da falta de defesa (embargos), eis que, havendo oposição de embargos à monitória, a instrução seguir-se-á na conformidade do processo comum, apenas retornando-se à via especial por ocasião da sentença, para os efeitos próprios em caso de reconhecimento da pretensão deduzida, embora seja a sentença o inequívoco título executivo judicial a ser, eventualmente, executado, ainda quando apenas declaratório da conversão do inicial mandado monitório em mandado executivo.

          Quanto ao recurso cabível contra a sentença proferida em sede de procedimento monitório cível, logicamente é a apelação o meio de impugnação recursal próprio, detendo efeitos devolutivo e suspensivo, eis que não se encontram os embargos à monitória dentre aquelas hipóteses elencadas no artigo 520, V, do CPC, porquanto os mesmos não se podem confundir com os embargos à execução, tanto mais porque a execução apenas decorre da sentença que constituir o título executivo judicial, sendo impertinente falar-se em identidade qualquer com os embargos à execução senão pelo nome, dado o caráter suspensivo em relação ao mandado monitório. Doutro lado, contudo, os embargos à execução que se seguir pela conversão do mandado monitório em mandado executivo, ou pela própria efetivação do título executivo judicial na sentença que rejeitar os embargos à monitória, julgados constituem sentença recorrível por apelação de efeito meramente devolutivo, então sim pela aplicação do artigo 520, V, do CPC. Portanto, o recurso de apelação contra a sentença proferida no processo cognitivo decorrente da ação monitória detém duplo efeito, suspensivo e devolutivo, eis que os embargos à monitória não se encontram no elenco restrito do artigo 520, V, do Código de Processo Civil; instaurada a execução, nos próprios autos onde prolatada a sentença monitória, os embargos opostos à execução, indeferidos que sejam liminarmente, ou rejeitados ao final, propiciam, sim, apelação com efeito meramente devolutivo.

III – AÇÃO MONITÓRIA NA JUSTIÇA DO TRABALHO

          Delineados os aspectos fundamentais da ação monitória, cabe examinarmos a pertinência de tal rito procedimental especial na Justiça do Trabalho, como de regra tem, ao longo dos tempos, sido admitido, ante o disposto no artigo 769 da Consolidação das Leis do Trabalho, que enuncia o caráter subsidiário do Processo Civil em relação ao Processo do Trabalho, nas omissões que se verificarem.

          Ao contrário do que inicialmente parece, a ação monitória instaura rito especial de processo cognitivo e não de processo executório, ainda que se adotem termos como o do mandado monitório para lembrar, advertir, exortar (monere) o pretenso devedor a cumprir a obrigação baseada em prova escrita que por si não constitua título executivo.

          Neste sentido, toda a confrontação da ação monitória com o Processo do Trabalho deve situar-se no campo das ações de competência das Juntas, eis que não há que se falar em execução ou ação incidental à execução, cuja competência se desloca, segundo a CLT, para a seara singular do Juiz Presidente ou Substituto.

          Não exsurgem dúvidas de que a ação trabalhista ordinária (denominada por reclamação trabalhista) contém como objeto, em regra, a cobrança pelo trabalhador de crédito supostamente havido em decorrência de prestação de serviços para determinado patrão, ocasionando, por vezes, instrução plena no sentido de consubstanciar a veracidade das alegações fáticas deduzidas por reclamante e reclamado quanto ao modo com que transcorrida a relação laboral, para justificar ou não o crédito pretendido ou a resistência a tal pagamento ou dação.

          Como a ação ordinária de cobrança do cível, a reclamação trabalhista detém a característica básica de falta de título executivo, embora fundado seu objeto no reconhecimento de obrigação em favor do autor pelo réu.

          Como a ação ordinária de cobrança do cível, igualmente pode haver casos em que a pretensão do reclamante para o pagamento de soma em dinheiro ou entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel baseie-se em prova escrita destituída da eficácia de título executivo.

          No Processo Civil, a busca da instrumentalidade acarretou a instituição da ação monitória como via especial capaz de permitir pronta satisfação à pretensão baseada em prova escrita consistente de dívida do réu, sem impedir, como antes dito, a eleição da via comum pelo autor.

          No Processo do Trabalho, à falta de vias especiais para tais casos, e tanto mais pelo caráter alimentício dos créditos em regra perseguidos na Justiça do Trabalho, ainda mais deve prevalecer o princípio da instrumentalidade processual, permitindo que vias especiais do Processo Civil sejam colacionadas ao Processo do Trabalho, pela regra de subsidiariedade ante omissão (CLT, artigo 769), como a ação monitória, tanto mais porque, dado o princípio da disponibilidade do rito, não há prejuízo algum a que o autor prefira a via ordinária da reclamação trabalhista.

          Se é certo que a doutrina e a jurisprudência trabalhista têm ainda resistido à possibilidade de execução de título extrajudicial perante a Justiça do Trabalho, mais por restrita indicação da execução meramente de sentença trabalhista do que por omissão do elenco dos títulos executivos extrajudiciais (pois doutro modo seria então o caso de invocar-se a regra do artigo 769 consolidado), mais certo ainda que tal restrição não pode de modo algum ser colacionada para repelir a ação monitória perante a Justiça do Trabalho decorre de ser a mesma via do processo cognitivo, que pretende a constituição de título executivo judicial a partir de prova escrita idônea e consistente da obrigação do réu, e não propriamente a execução direta da obrigação supostamente inserida em tal documento.

          Igualmente não se há como repelir a ação monitória no Processo do Trabalho pelo argumento de incompatibilidade de ritos, eis que outras ações não previstas na CLT têm encontrado guarida perante a Justiça do Trabalho, que nas Juntas, sobretudo, em regra adapta o procedimento cível às peculiaridades decorrentes da oralidade ocasionada pelas audiências de conciliação, instrução e julgamento. Por isto, há certo consenso em aplicar-se, nos processos de competência das Juntas, o rito próprio previsto na CLT para as reclamações trabalhistas, desviando-se para as peculiaridades dos ritos especiais trazidos do cível, sempre que necessário, de modo que a regra do Processo Civil como subsidiário do Processo do Trabalho permaneça, ao menos em tese, como válida (embora, atualmente, o Processo do Trabalho, de inspirador, passou a ter, cada vez mais, que invocar preceitos modernos transcritos para o Processo Civil).

          Menos justo que procurar tecnicalidades para afastar a possibilidade da ação monitória como via especial alternativa de perseguição de crédito pelo trabalhador (em regra), ainda quando detentor este de prova escrita do reconhecimento da obrigação pelo patrão havido por devedor, seria exigir instrução plena e demasiada, ainda quando ocorrente revelia e/ou confissão, para ao final prolatar-se sentença minuciosa, numa perda de tempo, ainda que curto, preciosa para quem busca crédito de natureza alimentar (em regra), tudo isto quando a ação monitória, se eleita como via própria pelo autor, perante a Justiça do Trabalho, poderia desde logo acarretar a expedição de mandado monitório pelo Juiz, se admitida a petição inicial (eis que tal decisão possui apenas caráter interlocutório), que tanto poderia ensejar o pagamento ou entrega da coisa pelo réu devedor, ante reconhecimento, com a Junta então extinguindo o processo com julgamento de mérito nos termos do artigo 269, II, do CPC, sem necessidade de instrução, quanto sentença da Junta, ante revelia e confissão, por não oposição de embargos à monitória, de procedência com declaração de conversão do mandado inicial expedido em mandado executivo, igualmente restando dispensada instrução plena, quanto ainda, por fim, havendo embargos à monitória, e então deflagrada instrução própria das reclamações, sentença de improcedência ou procedência, esta para constituir o título executivo perseguido pelo autor, como de regra ocorre nas reclamações trabalhistas.

          Constituído o título executivo judicial, seja com a conversão do mandado monitório inicial, seja com a expedição de mandado executivo próprio, tanto mais porque pressuposta a liqüidez da obrigação reconhecida, aplicar-se-á o Capítulo V do Título X da CLT, concernente às execuções trabalhistas.

          Quanto aos recursos, igualmente não decorrem maiores dúvidas, havendo impossibilidade de qualquer recurso contra as decisões interlocutórias do Juiz Presidente ou Substituto, ainda que referentes à expedição do mandado monitório (CLT, artigo 893, § 1º, e Enunciado 214/TST), sendo interponível apenas o recurso ordinário, de caráter meramente devolutivo, como em regra são os recursos trabalhistas, contra a sentença da Junta que extinguir o processo sem julgamento de mérito (no caso de indeferimento da petição inicial ou por outra das hipóteses elencadas no artigo 267 do CPC); que extinguir o processo com julgamento do mérito (no caso de pagamento ou entrega da coisa pelo réu no prazo assinalado no mandado monitório, ou ainda na audiência inaugural que se designar, por reconhecimento da pretensão deduzida, nos termos do artigo 269, II, do CPC, ou ainda por conciliação, conforme artigo 269, III, do CPC, c/c artigo 764, § 1º, da CLT, ou outro dos modos de extinção do processo com exame de mérito, com fulcro no artigo 269, IV e V, do CPC), ou que julgar procedente, ainda que em parte, ou improcedente a demanda, constituindo ou não o título executivo judicial perseguido pelo autor, eis que o agravo de petição apenas será cabível quando deflagrada propriamente a execução da eventual sentença constitutiva (seja a que haja determinado a conversão do mandado inicial em mandado executivo, seja a que haja determinado a intimação da parte e expedição de mandado executivo próprio), contra eventual sentença proferida pelo Juiz da Execução ante embargos opostos à execução. Os recursos de natureza extraordinária (recurso de revista, recurso de embargos e recurso extraordinário), assim como o recurso de destrancamento (agravo, de instrumento ou regimental) não permitem maiores dúvidas, eis que aplicados sem distinção da via eleita.

          Plenamente possível, pois, a via especial da ação monitória perante a Justiça do Trabalho, como procedimento próprio do processo cognitivo de competência originária das Juntas de Conciliação e Julgamento, permitindo a devida instrumentalidade do Processo do Trabalho, cujo objeto primordial circunscreve-se na perseguição de créditos de natureza alimentar, face a regra da subsidiariedade do artigo 769 da Consolidação das Leis do Trabalho, dada a omissão verificada e a compatibilidade, pela possibilidade de eleição do procedimento ante o princípio da disponibilidade do rito, com a reclamação trabalhista e o procedimento ordinário trabalhista que dela decorre.

          Inadmissível, havemos de crer nisso, é permitir que provas escritas de pleno e inequívoco reconhecimento de obrigação de dar ou fazer por parte de patrões, consistentes per si, não sejam aceitas, sequer, como meios aptos a advertências judiciais quanto a possível execução da obrigação supostamente nelas descritas, à falta de embargos. A suplantação da necessidade de pautas, seja por ter o devedor reconhecido o crédito descrito no mandado monitório, seja por incidente a revelia e confissão decorrente da não oposição de embargos à monitória, que permitem a imediata inclusão do feito em audiência de julgamento da Junta para extinguir-se o processo com exame de mérito por ocorrência da hipótese do artigo 269, II, do CPC, ou para declaração de procedência do pedido e conversão do mandado monitório inicial em mandado executivo, com todo o implemento do princípio da celeridade tão invocado na Justiça do Trabalho, justificam, à falta de qualquer incompatibilidade, a adoção da via especial da ação monitória perante a Justiça Especializada; doutro lado, a oposição de embargos à monitória, que enseja a deflagração da instrução plena, similar em tudo à decorrente da reclamação trabalhista, demonstra não haver qualquer cerceamento de defesa às partes, embora apenas eventual procedência, ainda que parcial, em regra deva ensejar sentença líquida, que permitiria a imediata execução (transcorrido logicamente o prazo pertinente ao trânsito em julgado da sentença proferida) por desnecessária deflagração de procedimento liqüidatório, também cá prestigiando os princípios basilares do Processo do Trabalho

 


Referência Biográfica

Alexandre Nery de Oliveira:   Juiz do Trabalho na 1ª Vara do Trabalho de Brasília (DF), professor de Direito do Trabalho, pós-graduado em Teoria da Constituição
E-mail: anery@solar.com.br

Home-page: usr.solar.com.br/~anery

Redação Prolegis
Redação Prolegishttp://prolegis.com.br
ISSN 1982-386X – Editor Responsável: Prof. Ms. Clovis Brasil Pereira.

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